sexta-feira, 16 de fevereiro de 2024

INTRODUÇÃO AO HINDUÍSMO. PARTE I

 

Hinduísmo. www.jnanamandiram.org.br. INTRODUÇÃO AO HINDUÍSMO. Parte I. A RELIGIÃO QUE INCLUI TODAS. O Hinduísmo é uma religião tão abrangente que resulta mais fácil dizer o que não é, do que o que é. Não se trata de uma religião inflexível, pois oferece amplo espaço para a liberdade de expressão. É possível aproximar-se dele sob um ponto de vista próprio, individual, e crescer nele de acordo com a própria personalidade. Não é uma religião exclusivista e nem reivindica ser a única verdadeira. A menos que se esteja preparado para aceitar que Deus tenha cometido vários erros, deve-se aceitar que, se uma religião é verdadeira, todas as outras devem ser verdadeiras também. Por isso, a fé hindu, sendo um sistema de sabedoria e um guia para uma vida apropriada, não é só para hinduístas, mas também para pessoas de todos os tempos, países e religiões. A pessoa pode ser um bom hinduísta sendo um bom cristão, um bom muçulmano, um bom comunista, um bom ser humano e mesmo um bom ateu. Embora eu seja hinduísta de nascimento, cresci numa escola católica, e, assim, me mantenho aberto a outras escrituras e fé religiosas. Como resultado de meus antecedentes hinduístas, não sinto aver­são por estar numa igreja ou mesquita. De fato, encontro a mesma elevação espiritual numa igreja cristã como num templo hindu. Não é uma religião missionária e não objetiva a conversão de fiéis. O leitor tem que se sentir livre, sem receio de que sua religião seja enfraquecida quando ficar entendida a verdadeira finalidade destas páginas. Na verdade, compreender o hinduísmo servirá para fortalecer sua própria religião e ajudar a acrescentar harmonia para relacio­nar-se com outras pessoas e culturas. AS ESCRITURAS DO HINDUÍSMO. Enquanto as escrituras de outras religiões derivam sua autori­dade de um Deus pessoal, anjo ou mensageiro especial, os Vedas, que são a escritura básica do hinduísmo, não fazem tal reivindicação. “VID” significa conhecer, e os Vedas representam o conhecimento infinito, não criado, eterno. O conhecimento não pode ser inventado, mas somente descoberto. A soma total do conhecimento é chamada Vedanta, que significa “verdade descoberta”, verdade descoberta pelos Rishis, almas que realizaram sua clarividência e não apenas sua vidência. O Rishi não demanda propriedade ou direitos autorais por seu pensamento ou conhecimento. Nada de novo há no universo. Só os descobrimentos parecem novos. Cristóvão Colombo (1451-1506) descobriu o que já existia: a América. Os Rishis descobriram o sempre existente Conhecimento. Este Conhecimento, representado pelos Vedas não é algo que deva ser aceito só porque está expresso em preto e branco em um livro. Não: o conhecimento dos Vedas pode ser experi­mentado por todo e qualquer ser humano por ser a Verdade. Pela experimentação pessoal pode-se verificar a eterna Verdade encerrada dentro de si mesma. Aliás, este é o desafio do hinduísmo. A fé é, certamente, necessária, mas as asserções dos Vedas não necessitam de aceitação na forma da fé cega. Questione tal conhecimento, experimente-o e, finalmente com perseve­rança, vivencie-o por si mesmo. Não é forçoso ficar satisfeito com o que já está estabelecido como, por exemplo, que “a manga é doce”. O hinduísmo o convida e o encoraja a ir além: morder, provar, sentir seu doce néctar escorrendo pelo seu ser, para saber por você mesmo que “a manga é doce”. Os Vedas – Rig Veda, Sama Veda, Yajur Veda e Atharva Veda – estão divididos em duas partes principais: a do trabalho ou ação, e a do conhecimento. Na parte do trabalho, estão incluídos os deveres da pessoa: deveres como estudante, homem do lar e monge. Já a parte final dos Vedas é chamada Vedanta e contém as UPANISHADES – essência do conhecimento espiri­tual dos Vedas. À semelhança das outras religiões, o hinduísmo possui muitas escolas com várias interpretações das escrituras. Porém, qualquer seita que reivindique ser parte do hinduísmo deve reconhecer a autoridade das Upanishades e dos Vedas. O próprio nome “hindu” é proveniente da Vedanta. Além dos Vedas, o hinduísmo também tem outras escrituras, e um resumo das mais importantes será feito neste capítulo. Presentemente direi que o hinduísmo tem os SMRTIS ou “Códigos da Lei”, cuja origem é humana. Entre os melhores conhecedores que estabeleceram as leis que regulam as sociedades está Manu. O Hinduísmo é uma religião dinâmica, e os Códigos da Lei nos SMRTIS são flexíveis e mudam de tempos em tempos segundo as necessidades do gênero humano. A relação do SMRTI com o SRUTI (Veda) equivale à do corpo com a alma. O corpo é sujeito à mudanças e a alma, não. A alma está além do tempo. O “Ramayana” de Valmiki e o “Mahabharata” de Vyasa são também escrituras do hinduísmo e podem ser descritos como “O Veda Popular” onde histórias e lendas são usadas para ilustrar os princípios da Vedanta. Os Puranas são histórias religiosas que ilustram a verdade do SRUTI, narrando os feitos dos reis, deuses e santos. Entre as maravilhosas histórias dos Puranas estão as de PRAHLADA e DHRUVA. É difícil descrever nossa própria mãe, bem como o BHAGAVAD GUITA. Nós estamos todos no campo de batalha da vida, e o Guita foi apresentado pelo Senhor Krishna ao guerreiro Arjuna num campo de bata­lha. Cada momento de nossa vida requer decisões, e o Bhagavad Guita provê as respostas a milhares de questões e problemas que surgem no decorrer da vida. O que fazer e o que não fazer estão respondidos no Guita. O caminho da devoção, do trabalho e do conhecimento estão ali descritos e unificados. As questões da vida em geral, e as de morte e vida, são abordados nele. O relacionamento entre pessoas, e entre a pessoa e Deus, também. O Guita é a essência das Upanishades. Muitos já disseram que os que estudam constantemente o Guita e vivem a vida nele indicada não necessitam de outro livro. Com frequência as pessoas ficam confusas pela grande quantidade de livros existentes. O Guita responde às questões apresentadas por Arjuna em nome de todos nós. Os conflitos de Arjuna são os mesmos que sempre tivemos e temos hoje. O que foi escrito até aqui é somente um resumo. Para o iniciante seria bom que primeiro lesse uma versão simplificada e conden­sada das várias escrituras a fim de obter uma compreensão inicial e um panorama geral de cada uma delas antes de ler o texto completo. A TEORIA DA CRIAÇÃO. A criação implica algo feito do nada. Diz a lógica que “do nada, nada procede”. “Nada” não pode ser “alguma coisa”. Por isso, “criação” não é a palavra certa para ser usada aqui. Vejamos a definição de espaço. O espaço pode conter planetas, astronaves, estrelas, mas, em si mesmo, não é substância alguma. De fato, ele nada tem a ver com nenhuma dimensão limi­tada. Em outras palavras, o espaço é infinito e a existência de planetas não diminui a infinita dimensão do espaço. Se você olha uma xícara, existe espaço fora dela, espaço dentro dela, espaço nas “paredes”, na base, e na asa da xícara. A existência da xícara não reduz ou contradiz a infinitude do espaço. Nas Escrituras cristãs, com relação à Criação, se diz que “primeiro era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus”. O conceito hinduísta é semelhante, embora não reco­nheça um começo para a Criação nem um ponto final. O hinduísmo acha a palavra “emanação” mais apropriada do que “criação”. Chame-se a isso natureza ou chame-se a isso Deus. Dessa Verdade sempre existente o universo parece projetado, parece existir, e parece dissolver-se. Tal como as ondas do oceano, “ondas” que aparecem e desaparecem todo o tempo. A continuidade entre essas oscilações é a eternidade. O apare­cimento e o desaparecimento das ondas não afetam de maneira alguma o oceano, e essa emanação e sua retirada ou absorção não atinge a Suprema Verdade a qual é sempre infinita, sempre contínua. Nas escrituras, a palavra “começo” algumas vezes é usada. Refere-se ao início de um ciclo. O que é o mundo do homem? É nada mais que o reflexo de sua própria emanação. Toda poderosa é a vontade humana, e o ambiente ou circunstâncias podem ser determinados por uma constante vontade, seja ela expressa por uma única determina­ção ou pela oração intensa e contínua. A LEI DO KARMA (AÇÃO). A lei da Física estabelece que “para cada ação há uma reação igual e oposta”, e o que é tido como verdade para os físicos também é válido para as ações do homem. O tempo de reação difere devido à diversidade das ações, mas a reação é certa. Vejamos alguns exemplos: dê uma tapa no rosto de sua esposa e você não terá que esperar muito tempo pela sua reação. Uma bofetada em resposta machucará seu rosto em questão de segundos. Claro que isto é apenas um exemplo e, de certo o leitor não precisa fazer essa experiência… Coma mais lentamente, muito mais lentamente do que você necessita, pois a energia atômica da comida é absorvida primeiro na boca. Durante alguns anos, o estômago aceita o abuso, mas, pouco a pouco, deteriorar-se-á a tal ponto que não terá mais condições de comer sequer o necessário. Em geral, atos de bondade não são apreciados pelos outros porque nosso ego, em princípio, é contrário a tudo. E ao que parece eles também nunca são bem retribuídos. Desnecessário dizer que atos de bondade nunca deveriam ser pagos ou retribuídos, já que seu motivo é a bondade. Ainda assim, a lei do Karma age sempre e, quando você menos esperar, sua bondade será retribuída e compensada com uma soma gene­rosa de juros. O que acontece com a lei do Karma quando, por exemplo, uma pessoa comete um assassinato já próximo ao fim de sua vida, e logo depois morre, antes de essa ação ser eliminada ou punida? Por outro lado, o que acontece à pessoa que pratica boas ações e morre antes de ter tempo de desfrutá-las? A lei do Karma opera com base na eterna continuidade da vida. A morte do corpo físico nada mais é do que – de acordo com o Senhor Krishna, no Bhagavad Guita – um deixar do corpo velho e usado e um adquirir de um outro, novo, da mesma maneira com que uma pessoa descarta uma roupa velha em troca de uma roupa nova. A simples troca de “roupas” não cria um indivíduo novo. A alma, com suas qualidades de “ativo e pas­sivo” do Karma, impulsiona a si mesma para o novo corpo. Sua “conta bancária” é transferida para uma nova seção. Todavia, seu saldo bancário e empréstimo permanecem os mesmos para desfrute e remuneração, respectivamente. Então, a ação do assassínio, que não foi eliminada, terá sua punição na vida seguinte. O homem bondoso, que não teve sua recompensa naquela vida, com certeza terá na seguinte. As pessoas que não estão familiarizadas com a lei do Karma criticam dizendo que Deus não é justo, e fazem perguntas tais como “Por que este bebê é cego? Que mal ele pode ter feito a alguém? Por que este homem preguiçoso ganhou um milhão de dólares na loteria?” A pessoa familiarizada com a lei do Karma apenas terá um sorriso para essas questões porque sabe que cada pessoa é responsável por seu próprio destino, já que nós mesmos o criamos. A palavra “destino” leva-me à última parte deste capítulo. Algu­mas pessoas querem tomar a saída mais fácil a este respeito e dizem que, “se tudo nesta vida é determinado pelo destino ou sorte – ou pelo resultado de suas prévias ações – então por que se aborrecer em fazer algo agora?” Elas dizem: “O que tem que acontecer, acontecerá”. É importante compreender a verdade sobre o destino. Fazer o seu próprio destino é um processo contínuo. Dizer que as ações da vida passada vão governar inteiramente esta vida é ignorar o fato de que suas ações presentes também afetam o futuro. Certamente, as ações de suas vidas prévias atingem, afetam você. Mas, a qualquer momento particular de sua vida, você terá o direito e o poder de criar um destino novo e melhor. A vontade humana, tal como eu disse anteriormente, tem grande poder. Você até pode ser influenciado pelas prévias más ten­dências. Todavia, sua vontade pode vencê-las desde que, fortalecendo-a, ela leve você a melhorar e, em consequência, melhorar seu futuro. No hinduísmo não há limites do quanto você pode avançar. Então, se seu esforço é vigoroso e constante, com a graça de Deus a onipresença em você mesmo poderá ser sua recompensa! Maior retribuição, mais desejável recompensa que essa, não existe. A bênção da onipresença! Galgue a montanha e veja o panorama extenso à sua frente, em todas as dimensões. Sinta a bênção da unidade conjuntamente com a expansão do pano­rama. Para vislumbrar a bênção – a infinita e sempre renovada bênção da onipresença, multiplique a “bênção do cume da mon­tanha” um bilhão, um trilhão, um quatrilhão, um quintilhão, um sem-fim de vezes. A ALMA DO HOMEM. Olhe para um ventilador, uma lâmpada elétrica, um aque­cedor. Se suas tomadas não forem ligadas à eletricidade, os aparelhos estarão “mortos”. Serão apenas um amontoado de metais. E se a eletricidade não estivesse permanentemente acessível, o que faria você com esses aparelhos? Certamente os jogaria fora. Quando a “eletricidade” ou a “chispa” que alenta e anima o corpo humano se vai, nós “jogamos fora” o corpo (cremamos ou enterramos). O que é essa “Chispa” que dá vida ao corpo humano? Chame-a por qualquer nome, mas é certo que existe algo que faz diferente o ser vivo, a quem amamos e cuidamos, do corpo morto, o qual não podemos sequer demorar para dele dispor. Qualquer pessoa que tenha visto um ser vivo e um corpo morto não discute se a alma humana existe. É a alma que mora no ouvido, no olho, nos sentidos do tato, gosto e olfato, e na mente. É a alma que permite a você experi­mentar os objetos dos sentidos. Um corpo sem alma – corpo morto – não grita de dor se você o finca com um alfinete ou se você o corta. E não sorri se você sorrir, e não o beija se você o beijar. De uma macieira não crescem peras. Assim, a consciência não provém da inconsciência e a alma somente pode vir da “árvore” da Consciência. Voltemos ao exemplo do ventilador, da lâmpada elétrica e do aquecedor. Nós os ligamos e desligamos, e essa ação completa o circuito elétrico. Então, a “doação da vida”, a energia, passa do gerador aos aparelhos. A mesma energia faz o ventilador girar, a lâmpada iluminar e o aquecedor aquecer, tudo de acordo com seu próprio mecanismo. Sim, a alma humana nunca se separa do “Gerador” da Consci­ência. Chame-o “Gerador”, Deus, Consciência ou Realidade. O circuito é completo. A Consciência humana é una com a Consciência Cósmica. Em cada aparelho circula a mesma eletricidade, e em cada ser humano existe aquela mesma Consciência. O grau de manifestação varia, dependendo do tipo e campo de atividade de cada aparelho. Você pode notar uma grande diferença no grau do brilho da luz entre uma lâmpada de 40 e uma de 100 Watts, embora a mesma eletricidade passe por ambas. A realização de que é a mesma Consciência, a mesma alma em todos os seres humanos, é a base para a fraternidade dos homens. Uma vez realizado que nós somos UM, sem considerar nosso exterior, isto é, se somos brancos, morenos, ou pretos e uma vez realizado que nós nunca poderemos ser felizes enquanto houver outros infelizes, então jamais nos apanharemos mago­ando os outros. E nunca permitiremos aos outros passarem fome, nunca permitiremos que uma palavra cruel escape dos nossos lábios. Pode haver eterna discussão acadêmica sobre religião, mas a realização da unidade da alma humana é a de tratar a todos com amor e bondade – um benefício prático da religião. Não esqueçamos que mesmo nos animais existe a mesma Consciência. Apenas há diferença no grau de manifestação. Por­tanto, nossa bondade para com os animais não deve ser menor. MORTE? A humanidade tem visto o que parece ser a morte milhões de vezes. Todavia, qual homem pode realmente acreditar que ele mesmo morrerá? O fato é que não acreditamos porque, na verdade, nos sentimos eternos. A questão é que, para sermos capazes de considerar a morte (a não-existência), temos que primeiro ter existido. A energia nunca pode ser criada e nem destruída. Isto é afirmado com frequência. Se Eu “sou” não pode ser que Eu “não sou”, com morte ou sem nenhuma morte, minha essência é a alma, e o Senhor Krishna disse no verso 7 do Capítulo XV do Guita: “A alma é uma parte eterna de Mim mesmo – Deus”. A morte sugere término. Mas certamente não pode haver fim para o eterno. O sol brilha no oceano e o vapor d’água se levanta. Enquanto se eleva, o vapor, que é uma parte do mesmo oceano, esfria e forma gotas isoladas que um dia vão retornar ao oceano. E quando atinge o oceano, a gota não é destruída, não termina; pelo contrário, torna-se una com o infinito oceano. Não há nenhuma eliminação de identidade, mas uma expansão infinita da Consciência. Quando uma criança cresce e chega aos vinte e um anos de idade, o evento é celebrado com uma festa pródiga. Não é lamentada de maneira alguma a perda da infância porque chegar a essa idade é cumprir uma etapa para a idade adulta. Faz poucos anos, um homem chamado Swami Tilak, um amigo e santo muito acima de comparações, foi ao encontro de um acidente fatal na Espanha. Mesmo em se tratando de pessoas comuns, com todas suas múltiplas faltas, quando elas morrem sente-se uma sensação de perda. Mas no caso de Swami Tilak, que foi meu mais íntimo amigo, houve algo a mais, pois era ele um homem cuja renúncia não conhecia apego algum. Externamente havia renunciado a todo apego a coisas como dinheiro, roupas e calçados. Nenhum bem material carregava consigo. Vestia somente dois panos de cor ocre e caminhava descalço sobre areias ardentes ou ruas neva­das. Interiormente, nenhum apego tinha quanto à popularidade ou quanto a ter muitos seguidores. Humilde além do que é possível acreditar, era o mesmo para com o pobre e com o rico, o jovem e o velho. Não construiu nenhum ashram ou fundou Instituições. Ele construía um templo no coração de cada pessoa que encontrava e que se sentia tocada pela sua santidade e humildade. De qualquer maneira, o corpo de cada um de nós tem que ir em determinado momento e não há exceções nem para os santos. Como eu disse antes, meu amigo foi ao encontro de um acidente fatal. A notícia desse evento inicialmente chocou-me. Aos poucos, porém, a tranquilidade substituiu o choque e um sorriso pairou nos meus lábios. Para a pessoa que não está totalmente pronta para aceitar a identidade com o Absoluto, a alma arrebata a mente e os senti­dos do corpo moribundo e migra para um corpo novo. Porém, para a pessoa que está preparada – e Swami Tilak estava pronto – nenhuma necessidade há de migrar de corpo em corpo. Para essa pessoa, o pulo no infinito e na eternidade é plenamente acessível. Para essa pessoa, nenhuma espera é necessária para a expansão da identidade com o Todo, algo assim como a onipresença. Então, ela virá e irá “quando quiser e como quiser”. O sorriso pairava nos meus lábios por uma boa razão. Tinha eu perdido o amigo? Não! Minha alma e a dele são simplesmente UMA e suas nobres e santas qualidades são da minha essência. Quando eu gozo ao encontrar alimento, ele, que é meu amigo também goza, porque, querido leitor, é a mesma alma. Ser capaz de ver unidade em toda esta aparente diversidade é ser real­mente capaz de “Ver”. ADORAÇÃO AS IMAGENS. Parece haver algo na natureza humana que faz uma pessoa julgar e criticar os outros sem primeiro examinar a si mesma por faltas semelhantes. A turba aglomerada estava pronta para apedrejar a prostituta até que o Senhor Cristo pediu que “o primeiro homem a atirar uma pedra fosse aquele que nunca tivesse cometido pecado”. Todos nós temos esta tendência de julgar apressadamente sem examinar os fatos. Sem pensar duas vezes. Muitas vezes as pessoas dizem que adorar imagens ou ídolos está errado. Vejamos então os fatos. Todas as religiões concor­dam que Deus é infinito e onipresente. Quem de nós pode imaginar o infinito? Esqueça a referência da infinitude. Quem de nós pode imaginar nossa própria cidade na sua totalidade? Nós não podemos, e, assim, consultamos mapas. Quem de nós pode sequer imaginar o planeta Terra na sua totalidade? Não pode­mos. O que fazemos é usar o mapa globo-terrestre a fim de podermos concentrar nossa mente e falar em termos aceitáveis a respeito de nosso planeta. Todos nós sabemos que o “mapa mundi” não é o planeta e apenas o representa. Adorar a Deus por meio de imagens é semelhante. Um hindu sabe que a imagem não é Deus, que só representa Deus. Um hindu se dá conta de que, para o homem comum, é virtualmente impossível visualizar e imaginar o infinito. Por isso ele usa imagens. Para adorar a Deus, é melhor usar imagens que deixar de fazê-lo, dizendo que “o infinito e a onipresença são muito difíceis para nós”. Adorar imagens está restrito aos hindus? Certamente que não. Vejamos por exemplo a Igreja Católica. A santa Cruz com a está­tua de Cristo está lá. Os católicos sabem que a estátua não é o Cristo e meramente o representa. Por estranho que pareça, a atitude do hindu e do cristão na adoração de imagens é a mesma. Os hinduístas são frequentemente acusados de politeístas. Eles parecem adorar muitos deuses. Mas não é assim. Não são muitos deuses. Eles adoram muitas imagens do mesmo Deus. Para facilitar a mente e adquirir maior concentração num particu­lar aspecto de Deus, os hindus usam uma particular imagem. Ganapati ou Ganesh é adorado no começo de toda oração e de cerimônias a fim de remover obstáculos da mente. Os hinduístas, nesses momentos, concentram seu coração e mente no aspecto de Deus que remove o obstáculo, e chamam esse aspecto de Ganapati. É mais fácil acercar-nos de nossa mãe e fazer-lhe pedidos do que acercar-nos do nosso próprio pai. Por isso os hinduístas adoram Deus em seu aspecto de mãe, e chamam a esse aspecto de Lakshmi – para pedir bem-estar e riqueza. Os hinduístas se dão conta de que o mesmo Senhor é o Criador, o Preservador e o Destruidor, e dá a cada aspecto do mesmo Senhor títulos e imagens como Brahma, Vishnu e Shiva, respectivamente. O objetivo da adoração do hinduísta, isto é, sua finalidade última, é a realização de Deus. Ele usa a imagem em um estágio inicial. Assim é como deve ser. Quando nós somos bebês, segura­mos no dedo de nosso pai para aprender a caminhar. Mesmo tendo obtido a realização, o hinduísta não esquece que a ima­gem de Deus o representa e, por isso, nunca deixa de reverenciar com devoção, humildade e amor quando está na frente de uma dessas imagens, tendo em conta sempre que sua homenagem é para o todo-poderoso Deus que a imagem repre­senta. O hinduísta não tem dificuldade de orar na frente do sol, do oceano ou da montanha. Tudo isso representa a onipotência de Deus para ele. Toda a criação é manifestação da chispa de Sua refulgência. Finalmente, ainda que os hinduístas não sejam politeístas, seu monoteísmo deve ser apropriadamente compreendido. Os hindu­ístas não dizem que existe um só Deus. Todas as religiões declaram que Deus é infinito. Os hinduístas dizem que só existe Deus. E se nós nos sentimos separados desse infinito, se o universo for separado do infinito, então isso significa pôr uma limitação ao infinito. Um infinito no qual não se inclua tudo não é infinito. Ademais, as religiões não podem estar todas erra­das! Nós estamos todos neste infinito, e este infinito é Deus. Existe Deus e Deus. Só. Nada fora de Deus existe. “fora de tua consciência nenhuma verdade existe. Fora de tua consciência, onde está Deus?”. GURU. O hinduísmo enfatiza a auto realização como objetivo de todas as pessoas e criaturas. Até aqui este texto discutiu claramente a filosofia hinduísta. Nos capítulos restantes discutir-se-á o sentido da auto realização. Neste capítulo será discutido o que é um guru, e o que é necessário para ser um guru. Muitos de nós tendem a esquecer que temos tido gurus ao longo de nossas vidas. Quando, a princípio, nós aprendemos a cami­nhar, não o fizemos nós com nossos pais? Que mais podemos acrescentar para dizer que a primeira linguagem aprendida é a dos nossos pais? Na escola, nossos professores são nossos gurus. Aprendemos a dirigir um veículo e o instrutor é nosso guru para tal propósito. Necessitamos aceitar o fato de que nada místico há sobre a palavra guru, que normalmente significa “professor”. Por que necessitamos de um mestre ou guru? Há muitos livros sobre qualquer matéria. Por que não podemos simplesmente ler os livros? Voltemos ao exemplo de como aprender a dirigir um veículo. Pode-se ler muitos livros a respeito, e de fato deve-se ler, mas todos os livros do mundo não podem substituir o instrutor. O instrutor – guru – senta-se no carro quando você nervosamente dá a partida pela primeira vez. Ele está lá para encorajar você com delicadeza e guiá-lo através da parte teórica e prática em todos os degraus do aprendizado. Ele também está lá para impedir e corrigir erros quando você os comete. Ele transforma, faz de você, pouco a pouco, um qualifi­cado motorista que controla seu veículo e não permite que a máquina o domine. Para a auto realização, um mestre ou guru deve atender a um conjunto de bons requisitos. Você pode – e deve – estudar todas as escrituras, mas o livro de estudo, por si só, está cheio de dificuldades e perigos. Imagine uma pessoa começando a diri­gir numa rua movimentada depois de ter lido livros, mas sem ter tomado antes aulas práticas com um professor qualificado. Essa pessoa é uma ameaça para si mesma, para os outros motoristas e para os pedestres. Pior ainda é a situação dos aventureiros da espiritualidade, que creem conhecer tudo depois da leitura de uns poucos livros. Às vezes, o conhecimento de muitos livros de filo­sofia resulta em orgulho, procedimento egoísta e desprezo pela aparente “ignorância” das pessoas. Todos esses riscos são evitados pelo verdadeiro realizado. Os eruditos – pandits – tratam também de ensinar os outros, dando a impressão de que falam pela íntima realização. Aqui citamos o caso do “cego guiando outro cego”, e o resultado é catastrófico. Aquele que busca a auto realização necessita de um mestre ou guru, isto é óbvio. Um guru não é necessariamente uma pessoa que tenha um grande ashram. Um guru não é necessariamente uma pessoa que junte ao redor de si muitos discípulos. Um guru não é necessariamente uma pessoa que tenha avião particular e muitos carros Rolls Royce. Um guru não é necessariamente uma pessoa que tenha se tornado Sanyase ou que seja um monge. Isso não quer dizer que esta pessoa não possa ser um guru. O que queremos dizer é que essas qualidades, por si mesmas, não fazem um guru. Assim como um instrutor de motorista deve ser um competente e hábil motorista, um mestre de auto realização deve ser, ele mesmo, totalmente realizado. Assim como um instrutor de moto­rista deve ter a habilidade de instruir, um mestre deve ter a habilidade de transmitir o conhecimento da auto realização a seu estudante. Assim como um instrutor o dirige um veículo sem ostentação, e com segurança, de acordo com o regula­mento de trânsito, assim também o mestre de auto realização pratica o que ele predica, vivendo uma vida na qual olha para cada um com amor e bondade, vivendo uma vida de humildade e servindo a todos. A santidade destila de cada poro de seu ser, e a luz do Conhecimento brilha em seus olhos. Você não deve se preocupar se não tem ainda um guru. Não deve se preocupar muito em como reconhecer um guru. Mas deve ter sempre em mente o que foi dito acima, perceber o que seja e o que não seja um guru. Não corra para achar um guru que venda “mantras” por dólares. Deus não pode ser comprado. Não fique cego atrás de “milagres”. Se você necessita de um mestre para a auto realização, não se fixe num mestre de “magia” ou de “milagres”. Seja prudente ao pensar que, por ser necessário um guru para a auto realização, então “não se deve fazer nenhum esforço no sentido da auto realização”. Não é isso. Um indivíduo deve fazer todo auto esforço possível para orar, ler livros, estar em boa e santa companhia, ouvir palestras espirituais e levar uma vida boa e moral. O hinduísmo afirma que quando um aspirante está pronto – pelo auto esforço, ele não tem que procurar um guru. Ao contrário, o guru virá a ele. Como um catalisador, esse guru o ajudará a tirar os véus das trevas da ignorância, protegendo o aspirante e, no seu devido tempo, o aspirante, por si mesmo, haverá de experimentar a infinda paz e a comovente autorrealização. Não se demora sendo a soma de conceitos intelectuais. Será a experiência própria! Abraço. Davi

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário