quinta-feira, 31 de dezembro de 2020

HARMONIA RELIGIOSA COMPAIXÃO E O ISLÃ

 

Budismo Tibetano. www.berzinachives.com.br. HARMONIA RELIGIOSA COMPAIXÃO E O ISLÃ. Sua Santidade o XIV Dalai Lama (Tenzin Gyatso (1935- ) palestrou em Milão – Itália no dia 9 de dezembro de 2007. Transcrito e ligeiramente revisado por Alexandre Benzin. "Gostaria de falar um pouco sobre a harmonia religiosa. Às vezes, os conflitos envolvem a fé religiosa. Por exemplo, na Irlanda do Norte, embora no início o conflito fosse uma questão basicamente política, depressa se transformou numa questão religiosa. Isto é muito triste. Atualmente, os seguidores Xiitas e Sunitas também lutam às vezes entre si. Isto também é muito triste. E no Sri Lanka, embora o conflito também seja político, às vezes porém, ficamos com a impressão de que o conflito é entre hindus e budistas. Isto é realmente terrível. Antigamente, os seguidores de diferentes religiões estavam, na sua maior parte, isolados uns dos outros. Mas agora estão em contato muito mais próximo e por isso precisamos fazer um esforço especial para a promoção da harmonia religiosa. No primeiro aniversário do 11 de Setembro, foi organizada na Catedral Nacional de Washington – USA, uma cerimónia de oração. Eu estava nessa reunião e referi, durante o meu discurso, que infelizmente hoje em dia algumas pessoas transmitem a ideia de que todos os muçulmanos são militantes e violentos, porque alguns deles são perversos. Depois, elas falam de um conflito de civilizações entre o Ocidente e o islão. Essa não é a realidade. É absolutamente errado caracterizar como má toda uma religião por causa de algumas pessoas perversas. Isto é igualmente verdade a respeito do islão, do judaísmo, cristianismo, hinduísmo e do budismo. Por exemplo, alguns seguidores do protetor Dorje Shugden mataram três pessoas perto da minha residência. Uma das vítimas era um bom professor, crítico de Shugden, que morreu com dezesseis facadas. As outras duas eram seus estudantes. Aqueles assassinos foram realmente perversos. Mas por causa disso, dizer que todo o budismo tibetano é militante – ninguém acreditaria nisso. No tempo de Budha também havia algumas pessoas perversas, nada de especial. Desde o 11 de Setembro de 2001 no ataque as Torres Gêmeas do World Trade Center, em Nova Iorque – USA, não obstante eu ser budista e não pertencer ao islão, tenho voluntariamente feito esforços no sentido de defender o Grande Islão. Muitos dos meus irmãos muçulmanos – muito poucas irmãs – explicaram-me que se alguém matar, isso não é do islão, porque um verdadeiro muçulmano, um verdadeiro seguidor do islão deve amar toda a criação tal como ama a Aláh e seu Profeta Muhammad. Todas as criaturas são criadas por Aláh. Se respeitamos e amamos Aláh, devemos amar todas as suas criaturas. Um meu amigo repórter passou uns tempos em Tehran, capital do Irã, na época do Aiatolá Ruhollah Khomeini (1902-1989). Posteriormente, disse-me como o Mullah da região que coletou dinheiro de famílias ricas e o distribuiu às pessoas mais pobres, para as ajudar na educação e pobreza. Este é o verdadeiro processo socialista. Nos países muçulmanos, o juro bancário é desencorajado. Assim, se tivermos conhecimento do islão e virmos como os seus seguidores o praticam com sinceridade, então, como em todas as outras religiões, é verdadeiramente maravilhoso. Em geral, se tivermos conhecimento das religiões dos outros, poderemos desenvolver o respeito, a admiração e a compreensão mútuas. Por isso, precisamos de nos esforçar constantemente para promover a compreensão religiosa entre as crenças. Recentemente, em Lisboa – Portugal, assisti a uma reunião inter-religiosa numa mesquita. Esta foi a primeira vez que uma reunião inter-religiosa foi realizada numa mesquita. Após a reunião, fomos todos para o salão principal e meditámos em silêncio. Foi realmente maravilhoso. Por conseguinte, façam sempre um esforço pela harmonia inter-religiosa. Alguns dizem que Deus existe, outros que não – isso não é importante. O que é importante é a lei da causalidade. Isto é assim em todas as religiões – não matar, não roubar, não ao abuso sexual, não mentir. As diferentes religiões podem usar métodos diferentes, mas todas têm o mesmo propósito. Olhem para os resultados, não para as causas. Quando vão a um restaurante, apreciem apenas todos os diferentes alimentos, em vez de discutirem que os ingredientes desta refeição vêm daqui ou dali. O melhor é apenas comer e apreciar. Então, essas diferentes religiões – em vez de discutirem se a sua filosofia é boa ou má – verão que todas elas têm como propósito e objetivo o ensino da compaixão, e que todas elas são boas. O uso de métodos diferentes para pessoas diferentes é realista. Nós devemos adotar uma abordagem e uma visão realistas. A paz interior está relacionada com a compaixão. Todas as principais religiões têm a mesma mensagem – o amor, a compaixão, o perdão. Nós precisamos de uma maneira secular de promover a compaixão. Para as pessoas que seguem uma religião seriamente e com sinceridade, a nossa própria religião tem um grande potencial para aumentar ainda mais a nossa compaixão. Quanto aos não-crentes – aqueles que não têm nenhum interesse religioso em particular ou aqueles que até odeiam as religiões – às vezes também não têm nenhum interesse pela compaixão, pois pensam que a compaixão é uma questão religiosa. Isso está completamente errado. Se quiserem ver a religião como algo negativo, estão no seu direito. Mas não há motivos para termos uma atitude negativa em relação à compaixão. Primeiro, nós viemos das nossas mães. As outras pessoas e animais também vieram de mães e sobreviveram devido aos cuidados que elas tiveram. Há um certo fator biológico que nos une. Esse é um fator biológico. A minha própria mãe, por exemplo, era muito bondosa. Por isso, hoje, a primeira semente da minha compaixão veio da minha mãe, e não do budismo. Depois de ter estudado o budismo, ela apenas cresceu. Se não tivesse esse tipo de mãe bondosa ou se os meus pais me tivessem abusado, então se calhar hoje teria dificuldade em praticar a compaixão. Por conseguinte, a semente da compaixão é um fator biológico. Nós precisamos dela para sobrevivermos. A afeição é um fator essencial para uma correta educação. Os cientistas fizeram experiências com macacos bebês. Como as mães eram sempre brincalhões e só lutavam em algumas ocasiões. Os separados de suas mães estavam frequentemente tensos, infelizes e lutavam muito. Portanto, o crescimento está relacionado com a afeição dos outros. De acordo com cientistas médicos, foi verificado que quanto mais praticarmos a compaixão, tanto menos estresse e ansiedade e mais paz mental teremos. Teremos melhor circulação sanguínea e a nossa pressão arterial baixará. Em alguns casos, o sistema imunitário torna-se mais forte. Mas a constante raiva e ódio enfraquece o nosso sistema imunitário. Assim, a compaixão e o perdão são muito úteis para a saúde e para uma longa vida. Podemos ensinar isto às pessoas desde a infância, como parte dos serviços de saúde. Precisamos portanto de uma adequada promoção dos valores humanos, não só através da religião como através da educação secular. A educação moderna não dá muita atenção à ternura. Isso faz falta. Algumas universidades estão pesquisando formas de introduzir a ternura no sistema moderno de educação. Isso é muito bom. Precisamos de uma forma secular para promover a ética secular. Secular não significa ser-se contra a religião ou ter-se desrespeito por ela. Quando digo "secular", é como na constituição indiana. Mahatma Gandhi (1869-1948) deu ênfase à religião secular: fez orações de todas as religiões. "Secular" significa a não-preferência de uma religião sobre outra, mas o respeito por todas as religiões, incluindo por não-crentes. Assim, precisamos de éticas seculares através de métodos seculares, baseados na educação sobre experiência comum e prova científica. Pergunta: Hoje em dia, temos muito materialismo no mundo. E as pessoas materialistas? Como lidar com isto? Sua Santidade: As coisas materiais apenas facultam o conforto físico, não o conforto mental. O cérebro de uma pessoa materialista e o nosso cérebro são iguais. Assim, ambos experienciamos a dor mental, a solidão, o medo, a dúvida, o ciúme. Estes perturbam a mente de qualquer um. Removê-los com dinheiro – isso é impossível. Algumas pessoas com mentes perturbadas, com demasiado estresse, tomam medicamentos. Estes reduzem temporariamente o estresse, mas produzem muitos efeitos laterais. Não é possível comprar a paz mental. Ninguém a vende, mas todos a querem. Muitas pessoas tomam tranquilizantes, mas a verdadeira medicina para uma mente estressada é a compaixão. Por conseguinte, as pessoas materialistas precisam de compaixão. A paz mental é a melhor medicina para uma boa saúde. Traz mais equilíbrio aos elementos físicos. O mesmo é verdade relativamente ao dormirmos o suficiente. Se dormirmos com paz mental, então não teremos distúrbios e não precisaremos de tomar comprimidos para dormir. Muitas pessoas cuidam-se para terem uma bonita cara. Mas se estiverem irritadas, nem o uso de maquilhagem ajudará. Continuarão feias. Mas se não tiverem raiva, e sorrirem, então as suas caras se tornarão atrativas e parecerão mais inteligentes. Se fizermos um forte esforço na compaixão, então, quando a raiva vier, vem apenas por um momento. É como um sistema imunitário forte. Quando um vírus aparece, não causa muitos problemas. Por isso precisamos de uma visão holística e de compaixão. Então, com familiarização e análise sobre a interconectividade de todos, obteremos mais força. Todos nós temos o mesmo potencial para a bondade. Olhem para vós próprios. Vejam todos os potenciais positivos. Negativos também existem, mas o potencial para coisas boas também existe. A básica natureza humana é mais positiva do que negativa. A nossa vida começa com compaixão. Por isso, a semente da compaixão é mais forte do que a semente da raiva. Assim, olhem para vós de um modo mais positivo. Isto trará um humor mais tranquilo. Depois, será mais fácil quando surgirem problemas. Shantideva, um grande mestre budista (685) indiano, escreveu que, quando estamos prestes a enfrentar um problema, se nós analisarmos e virmos uma maneira de o evitar ou de o superar, não há necessidade de nos preocuparmos. E se não o pudermos superar, então a preocupação não ajuda. Aceitem a realidade. Assim, se estiverem interessados naquilo que eu digo, façam então vocês mesmos experiências. Se não estiverem interessados, esqueçam. Eu amanhã vou-me embora, mas os vossos problemas continuarão convosco". http://www.berzinarchives.com.br. Abraços. Davi.

Nenhum comentário:

Postar um comentário