Budismo. www.nossacasa.net/shunya. Adaptação
de Os Segredos do Lotus. Por Donald K. Sweares. OS QUATRO FUNDAMENTOS DA PLENA
ATENÇÃO. (SATIPATTHANA SUTTA). No Budismo da Tradição Theravada existem dois
tipos fundamentais de meditação. Um deles, samatha, visa ao desenvolvimento da
tranquilidade através de estados de absorções meditativas (jhana) e o outro
tipo, vipassana, visa conseguir a visão interna da verdadeira natureza das
coisas. Essas duas formas de meditação de modo algum se excluem mutuamente; no
entanto, a Meditação Vipássana (meditação da introspecção, da percepção) sempre
foi tradicionalmente considerada como a mais elevada das duas. A meditação da
introspecção resume-se na frase “Seja atento!” Isto é, vigie a sua mente. Essa
definição contém dois decisivos pressupostos: o de que a verdadeira percepção
ou plena atenção levará à iluminação ou ao conhecimento das coisas como
realmente são e o de que a condição pessoal ou estado de ser depende da mente –
“A mente contém todas as coisas: o mundo do sofrimento e a sua origem, mas
também a cessação do sofrimento e o caminho a ela conducente. Assim a meditação
budista oferece a esperança da visão interna não somente no sentido de um novo
conhecimento, mas também de um novo ser. A essência da meditação budista é o
desenvolvimento da plena atenção ou da percepção. O programa de treinamento da
plena atenção não é arbitrário, mas baseado num dos mais populares textos do
Cânone Theravada (Cânone Páli), O Discurso Sobre os Quatro Fundamentos da Plena
Atenção ou em língua páli, Satipatthana Sutta. O Satipatthana Sutta é
essencialmente, um paradigma para alcançar a visão interna da verdadeira
natureza das coisas através do veículo da percepção total. Ele oferece um
programa sugestivo, ao mesmo tempo natural e lógico, que qualquer pessoa pode
seguir com os melhores resultados. Nada há de esotérico ou de mágico na prática
da plena atenção. Pelo contrário, o Sutta sintetiza o interesse da Escola
Theravada pela instrução concreta ou aplicação prática dos princípios em que se
baseiam os Ensinamentos do Buda, isto é, O Darma. Seus temas de meditação
incluem objetos comuns como a respiração, o corpo físico, as sensações, a
consciência e os objetos mentais. A natureza extremamente simples do
Satipatthana Sutta ilustra uma das principais convicções sobre o ideal budista:
a de que os sentidos, inclusive a mente, devem ser transformados para que se
possa perceber a verdade. O Discurso Sobre Os Quatro Fundamentos da Plena
Atenção, o Satipatthana Sutta, começa pelo pressuposto da condição ilusória do
ser humano. Em seu estado de ser habitual, o homem é fundamentalmente levado a
alhear-se da natureza das coisas, principalmente da natureza de sua própria
existência. Errônea e incorretamente atribui a sua própria vida e ao mundo que
o rodeia uma permanência que, de fato, não existe. Tal crença é o resultado da
ignorância (avijja) que, por sua vez é um produto das ilusões sensórias. A
ilusão fundamental do conhecimento sensório é o da permanência. Levados por uma
multidão de desejos egocêntricos como a avareza, o ódio, a luxúria e a ambição,
os sentidos constroem um mundo artificial e irreal. É um mundo no qual o “ego” e
a “auto satisfação” são da maior importância. Ameaçados por tudo aquilo que
desafia o lugar, o status e a posição, os sentidos perpetuam a ilusão de um mundo
no qual os “egos” vivem num meio de “coisas” que têm a capacidade de garantir a
felicidade e o bem-estar. Por força dessa ilusão os homens são levados pela
ambição a destruir outros homens, as nações a guerrear outras nações, a fim de
conquistar uma posição, ou até mesmo uma “paz permanente”. Assim, o discurso
admite que todos nós vivemos num mundo ilusório ou irreal; não no
sentido de que o mundo físico ou fenomenal não exista realmente, mas que não
existe realmente como nós o percebemos. Por isso, o objetivo do
Satipatthana consiste em sugerir um meio ou um caminho que permita a
compreensão da verdadeira natureza das coisas. Não é fácil uma tarefa dessa
ordem. A meditação budista não é um retrospectivo devaneio mental durante a
contemplação de um belo ocaso. Pelo contrário, a meditação consciente é uma
disciplina de confrontação com os processos da vida tal como realmente são. Não
depende de quaisquer estímulos externos, e menos ainda do uso de drogas. O
Sattipatthana Sutta minimiza ou elimina as distorções sensórias que contradizem
a verdade sobre a natureza das coisas. Visa proporcionar uma compreensão
objetiva do ego e do mundo através de um método analítico dentro de um ambiente
controlado. Para aquele que persevera, é grande a recompensa da meditação;
contudo, ninguém medita para “ganhar” alguma coisa. Medita simplesmente para
poder “ver” as coisas realmente como são e, portanto, para “ser” como realmente
é. O Budismo, como parte da mais elevada tradição religiosa hindu, é um
herdeiro do importante papel da respiração, sobretudo nas suas relações com as
técnicas do Yoga ou da meditação. Alguns discursos do Buda fazem referências à
conscientização da respiração (Anapanasati). No Majjhima Nikaya, uma coleção
desses discursos pertencente ao Cânone Therevada, contém um discurso totalmente
dedicado a respiração. 1º Fundamento: Plena Atenção Sobre o Corpo. O
Satipatthana Sutta começa, muito apropriadamente, com a conscientização da
respiração. Trata-se de um exercício específico destinado a conseguir a
percepção do corpo e de todos os seus processos. É importante observar que a
percepção meditativa, no Budismo Theravada, não utiliza o abstrato ou o geral
como meios de controlar a conscientização ou produzir a visão interna. Pelo
contrário, o concreto e específico oferecem o ponto focal do treinamento
mental. Consequentemente, a instrução para a percepção corpórea não começa com
a vaga afirmativa de que quem medita deve contemplar a natureza do corpo como
um organismo físico. O Satipatthana Sutta ensina o monge (bikkhu) a procurar um
lugar tranqüilo, sentar com as pernas cruzadas sobre as coxas, manter-se
perfeitamente ereto e utilizar a respiração como objeto de meditação. “Atento,
ele inspira, e atento expira. Ao pensar: “respiro lentamente”, compreende
quando está respirando lentamente; ou pensando: “respiro depressa”, compreende
quando está respirando depressa; ou pensando, “expiro depressa”, compreende
quando está expirando depressa”. A consciência da respiração através do simples
exercício de prestar atenção às inalações e exalações, prolongadas ou curtas,
produzem duplo resultado: a percepção da natureza de todo o corpo e a tranquilização
das atividades orgânicas. O inalar e o exalar da respiração, acompanhados pela
subida e descida do abdome, ilustram perfeitamente a natureza transitória e
flutuante do organismo vivo. As atividades surgem e desaparecem continuamente.
De fato, nada existe de inerentemente permanente no corpo físico. Ele não sofre
apenas o processo de envelhecimento, que produz posteriormente à morte; cada
momento de vida consciente é um processo de fluxo e refluxo idêntico ao
observado no inalar e exalar da respiração. A percepção da natureza do corpo físico
acompanha um estado de tranquilidade resultante da postura do observador. Vamos
pensar por um momento nas consequências advindas se cada um dos nossos atos
fosse executado com uma atenção consciente de cada movimento, sentimento e
pensamento. Tal conscientização não é uma atitude de investigação e
conceituação racionais, mas a simples percepção de tudo que ocorre interna e
externamente, uma consciência que observa sem apego todos os acontecimentos
mentais e físicos. Como evidencia o Sutta, ter consciência do mecanismo da
respiração é um exercício em si e por si mesmo; mas, também, como indicado aqui
e no Satipatthana Sutta, a atenção sobre a respiração destina-se a orientar a
meditação para a visão interna. Sob esse aspecto, é encarada como o primeiro
passo de um programa regular de treinamento e desenvolvimento. No entanto, no
Anapanasati Sutta, cada um dos aspectos do processo meditativo é acompanhado
pela respiração atenta. Assim, a contemplação do corpo, das sensações, da mente
ou dos objetos mentais são realizadas como parte da percepção da respiração. Em
suma, o texto afirma que o aperfeiçoamento nos quatro fundamentos da plena
atenção, isto é, corpo, sensações, mente ou consciência e objetos mentais ou
idéias, é conseguido por meio da respiração consciente. No Sutta estamos
investigando, pois a respiração consciente é apenas um aspecto de outras formas
de percepção do corpo físico. Seguem-se-lhe modos até mesmo mais analíticos de
observação, nos quais cada tipo de atividade física é cuidadosamente examinado:
“Ademais, ó monges, ao andar, um monge percebe: eu estou andando; quando se
levanta, percebe: estou de pé; quando se senta, percebe: estou sentado; quando
se deita, percebe: estou deitado e percebe todas as posições que seu corpo
toma”. O indivíduo que se esforça para alcançar a visão interna precisa
constatar com absoluta clareza todos os movimentos e atos, a partir de “abaixar-se
e estender as pernas” até “vestir as roupas, o que bebeu, comeu, mastigou e
saboreou. Em suma, nada do que faz deve passar despercebido ou não observado.
Atos que para o homem comum são motivados subconscientemente passam a fazer
parte da vida consciente. Todas as atividades físicas são “compreendidas” no
sentido de estarem sujeitas à “plena percepção pura”. Tal exame não significa
que a mente deva empenhar-se indefinidamente em descobrir as razões e os
motivos dos atos particulares. Ao contrário, seu esforço visa a eliminar a
sujeição dos hábitos irrefletidos pelo desenvolvimento de um estado de
percepção total e atenta. A meditação interna deposita um alto grau de
confiança na capacidade da mente humana em arrancar o indivíduo das agonias da
ignorância. Ignorância é apego aos objetos sensórios, e uma ausência
fundamental de compreensão da natureza da existência sensorial. Segundo o
comentário do Satipatthana Sutta, a verdadeira percepção do corpo físico e de
todas as suas atividades leva a uma única conclusão: “Existe o corpo, mas não
existe nenhum ego, nenhuma pessoa, nenhuma mulher, nenhum homem, nenhuma alma,
nada atinente a uma alma, nenhum ‘eu’, nada que seja meu, ninguém, e nada que
pertença a ninguém.” Portanto, a meditação perceptiva realiza uma compreensão
total das condições da existência. Com tal compreensão é eliminada a ilusão de
um ego. Da conscientização da respiração e da percepção consciente de todas as
formas de atividades físicas, a meditação interior conduz ao exame do corpo em
termos das suas partes constituintes. O Sutta adverte a quem medita refletir
sobre as partes do corpo, desde as solas dos pés ao alto da cabeça, em termos
de cabelos, unhas, dentes, pele, carne, nervos, ossos, medula, rins, coração,
fígado, membranas, baço, pulmões, estômago, intestinos; excremento, bile,
catarro, pus, sangue, suor, gorduras, lágrimas, saliva, muco, urina, etc. Esta
relação pode chocar alguns leitores. Mas, como é natural, seu objetivo não
consiste em pintar um quadro atraente do corpo, mas em reforçar a noção de que
ele não passa de um conjunto de partes bastante repulsivas. Existe no corpo
alguma coisa digna de apego e desejo? Não, não existe! A conscientização de um
monge funda-se na ideia de que o corpo apenas existe. Por isso, “ele vive
independentemente e não se apega a nada deste mundo”. O texto estabelece duas
tendências mutuamente interdependentes com relação à conscientização do corpo:
a natureza analítica da percepção interior e a redução do apego. A primeira
dessas tendências desenvolve-se a partir do mero exame das trintas e duas
partes físicas do corpo. Quem medita é ensinado a considerar o corpo como um
todo composto dos quatro elementos materiais primitivos, isto é, terra, água,
calor e ar. Esse esforço para reduzir o corpo aos seus elementos componentes é
parte integral da psicologia e da filosofia do Budismo Theravada. Outras
análises do ser psicofísico incluem Os Cinco Agregados (corpo, sensação,
percepção, consciência e formações mentais) e as seis bases sensoriais. O
processo analítico no qual o praticante está envolto enquanto examina o corpo é
também um exercício para o controle da mente. As definições, neste caso, são
limitadas, não no sentido lógico ou linguístico, mas como um exercício
destinado a focalizar a mente. Poder-se-ia afirmar que o Satipatthana Sutta
estabelece um contexto rigoroso para a mente, ao invés das habituais reações
mentais indisciplinadas, descontroladas e desconexas à situação humana.
Entretanto, a redução do indivíduo aos seus elementos fundamentais ou partes
constituintes é, sobretudo, destinada a eliminar o apego ao ego. Se não existe
nenhum ego, como pode alguém se apegar a ele? A redução do apego ao corpo é
acentuada no Satipatthana Sutta pelo que se menciona como as oito contemplações
do cemitério. São quadros que descrevem o corpo nas diversas fases de
apodrecimento e dissolução que se seguem à morte – um raciocínio decerto nada
agradável. A franqueza dessa passagem no texto dispensa comentários. Cada uma
das descrições varia ligeiramente, mas inclui insistentemente as passagens que
se referem à contemplação interna e externa do corpo em termos do ciclo de
origem e dissolução. Essa contemplação visa a libertar aquele que medita do
apego às coisas do mundo, e a criar um estado de independência. O termo “independência”
é bastante adequado. Num nível mais profundo, a prática da meditação budista
visa a trazer à realidade um novo estado de ser caracterizado pela liberdade
total. A velha condição de existência, ao contrário, era limitada, ou, segundo
a terminologia budista, aferrada e apegada às coisas sensoriais. È sob esse
prisma que devem ser encaradas as contemplações no cemitério. São realmente
repulsivas e, de fato destinam-se a isso. Entretanto, devem ser lidas tendo em
mente que uma das “Quatro Visões” que levaram Sidarta Gautama a iniciar a sua
peregrinação espiritual foi a de um cadáver; e deve-se recordar igualmente que
a descrição budista da existência sensória, o Ciclo da Originação Dependente,
termina com a velhice e a morte. Assim, é esse conceito da morte que prevalece
em muitos níveis do pensamento budista e que não se deve encarar como
particularmente surpreendente no contexto do Satipatthana. O aperfeiçoamento da
conscientização do corpo é um modelo para outras formas de meditação com plena
atenção. Essas formas incluem a percepção das sensações, da mente ou
consciência e dos objetos mentais ou ideias. Nenhuma delas recebe o tratamento
extensivo dado à conscientização do corpo, talvez, porque a forma de
investigação mental já tenha sido estabelecida. Os três temas restantes da
meditação, tomados em conjunto, constituem os aspectos incorpóreos ou
imateriais da existência designados por nama (literalmente, nome). Por isso,
uma das primitivas referências constante dos textos páli sobre a estrutura da
individualidade é nama-rupa (literalmente, nome e forma) ou realidade corpórea
e realidade incorpórea. Às vezes, o termo chega a ser identificado como os
Cinco Agregados usados para descrever os componentes do ser humano. 2º
Fundamento: Plena Atenção (Consciência) às Sensações. A contemplação das
sensações (vedana) é descrita no comentário ao Satipatthana Sutta como o mais
fácil dos elementos imateriais da plena consciência. No Sutta, é classificada
em três tipos: agradável, desagradável (ou dolorosa) e neutra. Quando surge uma
sensação agradável espalhando-se em todo o corpo, o fato leva a pessoa a
afirmar: “Que alegria”. Quando surge uma sensação dolorosa, que se espalha por
todo o corpo e obriga a pessoa a lastimar-se com as palavras, Ó, que desgraça.
As sensações que não são nem agradáveis nem dolorosas também tornam-se claras
para aquele que as percebe. Na meditação perceptiva tudo deve ser captado na
sua absoluta realidade. Consequentemente, se a pessoa que medita é apossada por
sentimentos agradáveis ou dolorosos, ao invés de tentar rejeitá-los ou
desprezá-los, deve tornar-se consciente do que são, do seu aparecimento e do
seu desaparecimento. Essa percepção dos substratos incorpóreos da meditação
conduz rapidamente a uma conclusão que constitui uma parte importante da
doutrina budista, isto é, à interdependência do corpo e da mente. A
interdependência da mente e do corpo produz consequências muito mais amplas do
que a possibilidade de afugentar uma dor por ter consciência dela. Revela a
preocupação budista pelo homem total. Para alguns, a meditação budista pode
parecer, a seu modo, excessivamente cerebral. Isto é, dá a impressão de ser,
sobretudo, um exercício mental. Muito embora tal interpretação não seja
inteiramente injustificada, é igualmente óbvio que o praticante bem sucedido é
capaz de treinar o corpo a ficar sentado durante muito tempo sem maior
desconforto. Num nível mais elevado, os mestres de meditação budista, antigos
ou modernos, insistem em afirmar que somente uma pessoa de grande caráter moral
será capaz de focalizar a atenção e exercitar a mente a um grau suficiente para
conquistar a verdadeira sabedoria. Além disso, e talvez de modo mais
significativo, o praticante que alcançou a verdadeira visão interna torna-se
uma pessoa diferente. Existe uma dimensão moral definida para a prática da
meditação interna, embora o estado de iluminação transcenda as categorias
morais. A liberdade conquistada por aquele que conseguiu penetrar a verdade da
natureza das coisas tem um significado ôntico de implicações profundas com
relação às atitudes pessoais e seu modo de agir. 3º Fundamento: Plena
Atenção à Mente e aos Estados Mentais. O terceiro tema de meditação
abordado no Satipatthana Sutta é citta que significa mente, consciência ou,
talvez, pensamento. Eis o texto: “Aqui, ó bikkhus, um bikkhu compreende a
consciência com ânsia, como com ânsia; a consciência sem ânsia como sem ânsia;
consciência com aversão como com aversão; a consciência sem aversão como sem
aversão; a consciência com ignorância como com ignorância; o estado retraído da
consciência como estado retraído; o estado desatento de consciência como estado
desatento; o estado de consciência que se alarga como estado que se alarga; o
estado de consciência que não se alarga como o estado de consciência que não se
alarga; o estado de consciência que tem outro estado mental que lhe é superior
como o estado que tem algo que lhe é mentalmente superior; o estado de
consciência que não tem outro estado mental que lhe é superior como e estado
que não tem nada que lhe seja mentalmente superior; o estado tranquilo da
consciência como o estado tranquilo; o estado intranquilo da consciência como o
estado intranquilo; o estado livre da consciência como livre; e o estado
não-liberto da consciência como não-liberto”. O texto não diz se quem medita e
tem consciência da aversão, da ignorância, da pequenez, da inferioridade mental,
da agitação ou limitação, deve sentir-se culpado de tais pensamentos, ou se
deve fazer um esforço imediato para eliminá-los por meio de um ato de vontade
violento. Realmente, deixar-se enredar pela agonia da culpa por ter deixado de
alimentar somente bons pensamentos é uma forma de apegar-se à derrota. O Sutta
nada mais faz senão instruir o praticante a ter consciência dessas qualidades
negativas, da mesma forma que das positivas. De acordo com o ponto de vista
budista, a única maneira de dominar a ânsia, o ódio e a ignorância consiste na
percepção da sua existência. A verdadeira percepção tem a força suficiente para
dominá-los. A afirmativa budista sobre o poder da percepção é feita dentro do
contexto da disciplina prática do exercício de meditação interna e atenta. 4º
Fundamento: Plena Atenção aos Assuntos da Doutrina (Pali:Dhamma,Scrt:Dharma). A
última parte do Satipatthana Sutta versa sobre Dhamma ou Dharma. A palavra
Dhamma pode ser compreendida de diversas formas. Ela é a verdade, a verdadeira
natureza das coisas, a realidade, a lei espiritual e moral. Ela também denota
cada um dos elementos físicos e mentais individuais que, todos juntos,
compreendem o mundo fenomenológico. Dhamma também significa “ensinamento” e no
contexto do Budismo significa especificamente Os Ensinamentos do Buda. O que o
Sutta discute nessa parte bastante extensa inclui os ensinamentos fundamentais
do Budismo Theravada:
1.
As Quatro Nobres Verdades:
§ A
Existência do Sofrimento
§ A
Causa ou origem do Sofrimento
§ A
Extinção do Sofrimento
§ O
Caminho que conduz a Extinção do Sofrimento: O Caminho Óctuplo
2.
Os Cinco Agregados:
§ Forma
Material
§ Sensações
§ Percepções
§ Elementos
Volitivos (formações mentais ou Sankhara)
§ Consciência
3.
Os Cinco Obstáculos:
§ Apego
§ Raiva
§ Indolência
§ Inquietação
§ Dúvida
4.
Os Sete Fatores da Iluminação:
§ Plena
Atenção
§ Investigação
da Doutrina (Dhamma)
§ Energia
§ Êxtase
§ Tranquilidade
§ Concentração
§ Equanimidade
Esses temas oferecem uma sinopse da
doutrina budista. Sob determinado sentido, é exatamente a verdade desses
ensinamentos que o budista que medita chega a compreender. Entretanto, de outro
ponto de vista, esses ensinamentos assim expostos são meros objetos mentais, ideias
das quais é preciso ter consciência, mas às quais não se deve ficar apegado. Se
alguém alcança a verdadeira visão interior, as ideias, tal como são formuladas,
não se diferenciam da sua percepção. Portanto, são em última análise, não o Dhamma
na acepção de “objetos mentais”, mas o Dhamma como a Verdade. “Compreende a
Verdade e a Verdade o fará livre”. Compreender a verdade no sentido mais amplo
é ser a verdade. Não é compreender um conjunto de proposição ou decorar algumas
fórmulas. A meditação perceptiva visa a nada menos que nos unificar com a
Verdade. Não é tarefa fácil, embora algumas pessoas possam ter mais aptidão e
mais capacidade que outras ou talvez fosse melhor dizer, mais visão intuitiva. O
Satipatthana Sutta estabelece o meio de conquistar a iluminação. E o faz
descrevendo a aplicação de sati ou percepção dos quatro aspectos da vida humana
– corpo, sentimentos, consciência e ideias. A importância deste método
particular dificilmente pode ser exagerada, e seu lugar no esquema budista de
treinamento da meditação está garantido para sempre. Para quem apenas ler o
texto, não há nenhuma garantia pessoal sobre a verdade das suas afirmações. No
entanto, o próprio Buda advertiu a seus adeptos para que não aceitassem nenhum
ensinamento, nem mesmo o seu, sem experimentá-lo; e nós também devemos ser
igualmente advertidos para experimentar a verdade da asserção do Buda: “Este é
o único meio, ó monges, para a purificação dos seres, para dominar a dor e os
lamentos, para a destruição do sofrimento e do pesar, para alcançar o
verdadeiro caminho, para atingir o Nirvana”. www.nossa.casa.net/shunya. Abraço.
Davi
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