sexta-feira, 13 de abril de 2018

O CORAÇÃO DE UMA IMAGEM DE PEDRA.


Amigos do Mosaico.
Por motivo de viagem (16 a 29/4) não poderei fazer as pesquisas para as postagens no blog. Será meu (Hamadan, Yom Kipur, Kumbh Mela) descanso espiritual. Espero voltar as atividades, se Deus assim o permitir, a partir de 30 de abril. Que a Imaculada Conceição Maria, Nossa Senhora – Mãe Divina, Mestra e Rainha do Universo continue abençoando os leitores, fazendo-os evoluir pela Senda Espiritual. “Até que todos cheguemos a unidade da fé, e ao conhecimento do Filho de Deus, a homem perfeito, a medida da estatura completa de Cristo”. Que possamos nos esforçar para imitar os homens perfeitos como: Krishna, Muhammad, Massiach, Buda, Shantideva, Shankara, Abravam, Moshe, Jesus, Ishaqu, Yaqub, Dawud, São Francisco de Assis, Santa Tereza D’ávila, São João da Cruz, Isa, Yusuf, Shu’aib, Ayyub e tantos outros mestres e santos que alcançaram o samadhy (iluminação, despertar) divino.

Autobiografia de Um Iogue – Paramahansa Yogananda (1893-1952). Capítulo 22. O CORAÇÃO DE UMA IMAGEM DE PEDRA. COMO LEAL ESPOSA HINDU, não quero me queixar de meu marido. Mas gostaria muito que ele mudasse suas opiniões materialistas. Ele tem prazer em ridicularizar os retratos dos santos em minha sala de meditação. Querido irmão, tenho muita fé em sua ajuda. Fará isso? Suplicante, minha irmã mais velha, Roma, olhava para mim. Eu estava fazendo uma breve visita à sua casa em Calcutá – Índia, situada na Girish Vidyaratna Lane. Seu apelo me comoveu porque, na infância, Roma exercera profunda influência espiritual sobre mim e amorosamente tentara preencher o vazio deixado no círculo familiar com a morte de mamãe. Amada irmã, certamente farei tudo o que puder. Sorri, ansioso por afastar a tristeza visível em sua face, em contraste com sua expressão habitualmente tranquila e alegre. Roma e eu oramos silenciosamente por alguns momentos, em busca de orientação. Fazia um ano que minha irmã havia pedido que a iniciasse em KRYA YOGA, na qual estava fazendo progressos notáveis. Tive uma inspiração. Amanhã – eu disse – vou ao templo de Kali em Dakshineswar. Por favor, venha comigo e convença seu marido a nos acompanhar. Sinto que nas vibrações daquele santo lugar a Divina Mãe lhe tocará o coração. Mas não revele o motivo pelo qual queremos que ele vá conosco. Minha irmã concordou, cheia de esperança. Muito cedo, na manhã seguinte, tive a satisfação de encontrar Roma e seu marido prontos para a viagem. Enquanto nossa carruagem rangia ao longo da Upper Circular Road para Dakshineswar, meu cunhado, Satish Chandra Bose, divertia-se escarnecendo do valor dos gurus. Notei que Roma chorava silenciosamente. Alegre-se, irmã! – murmurei. Não dê a seu marido a satisfação de acreditar que levamos a sério suas zombarias. Mukunda, como pode admirar impostores desprezíveis? Dizia Satish. A própria aparência de um sadhu é repugnante: ou é magro como um esqueleto, ou tão profanamente gordo como um elefante! Eu me sacudi de tanto rir, reação que aborreceu Satish. Ele se fechou em silêncio, mal-humorado. Quando nossa carruagem entrou nos jardins do templo de Dakshineswar, ele sorriu sarcasticamente. Esta excursão, suponho, seria um plano para me converte? Como eu lhe desse as costas sem responder, ele segurou meu braço. Jovem senhor Monge, disse – não se esqueça de tomar as devidas providências com as autoridades do templo para que nos forneçam o almoço. Satish desejava poupar-se de qualquer conversa com sacerdotes. Agora vou meditar. Não se preocupe com o almoço – retruquei secamente. A Mãe Divina cuidará dele. Não confio na Mãe Divina para me fazer nada. Mas o torno responsável por minha comida. O tom de Satish era ameaçador. Caminhei sozinho para o pórtico fronteiro ao grande templo de Kali (Deus sob o aspecto de Mãe Natureza). Escolhendo um lugar na sombra junto a uma das colunas, sentei-me na postura de lótus. Embora fossem apenas sete horas da manhã, o sol em breve seria insuportável. O mundo foi-se distanciando à medida que eu me absorvia em devoção. Minha mente concentrou-se na Deusa Kali. Sua estátua neste templo de Dakshineswar fora objeto de especial adoração por parte do grande mestre Sri Ramakrishna Paramahansa (1836-1886). Em resposta a seus ansiosos apelos, a imagem de pedra frequentemente assumia forma viva e conversava com ele. Silenciosa Mãe de pedra – rezei. Tu te encheste de vida pela súplica de teu amado devoto Ramakrishna, por que não atendes também aos lamentos e súplicas deste filho teu? Minha aspiração fervorosa foi aumentando ilimitadamente, acompanhada de uma paz divina. Apesar disso, transcorridas cinco horas sem que a Deusa que eu interiormente visualizava respondesse, senti-me um pouco desanimado. Às vezes, a demora em atender as orações é uma prova a que Deus nos submete. Ele, porém, mais cedo ou mais tarde se apresenta, assumindo a forma adorada pelo devoto persistente. Um cristão devoto vê Jesus; um hindu vê Krishna ou a Deusa Kali. Ou então uma Luz que se expande, se a adoração assumir aspecto impessoal. Abri com relutância os olhos e vi que as portas do templo estavam sendo fechadas por um sacerdote, de acordo com o costume, ao meio-dia. Levantei-me de um isolado lugar no pórtico e fui para o pátio. A superfície de pedra era um braseiro no sol a pino, meus pés descalços foram dolorosamente queimados. Mãe Divina – protestei silenciosamente – Tu não vieste a mim em visão e agora estás escondida no templo, por trás de portas fechadas. Eu queria oferecer-te uma oração especial, hoje, em nome de meu cunhado. Minha petição interna foi instantaneamente deferida. Primeiro, uma deliciosa onda refrescante passou por minhas costas e foi até a sola dos pés, eliminando todo o desconforto. Então, para minha surpresa, o templo ampliou-se prodigiosamente. Sua grande porta abriu-se devagar, revelando a imagem de pedra da Deusa Kali. Pouco a pouco a estátua transformou-se numa forma viva, acenando-me sorridente em saudação, envolvendo-me, emocionado, em alegria indescritível. A respiração foi retirada de meus pulmões, como se extraída por uma seringa mística; meu corpo tornou-se muito quieto, embora não inerte. Em êxtase, minha consciência se expandiu. Eu podia ver claramente vários quilômetros pra além do rio Ganges, à minha esquerda, e distinguia por trás do templo os arredores completos de Dakshineswar. As paredes de todos os edifícios bruxuleavam, transparentes; através delas, em áreas distantes, observei pessoas indo e vindo. Embora não respirasse e meu corpo se mantivesse em estado de estranha quietude, eu podia mover mãos e pés livremente. Durante vários minutos experimentei fechar e abrir os olhos; em qualquer caso, via distintamente o panorama inteiro de Dakshineswar. A visão espiritual, como raios X, penetra toda a matéria; o olho divino tem o centro em toda parte e a circunferência em parte nenhuma. De pé, no pátio ensolarado, mais uma vez percebi que, ao cessar o homem de ser um filho pródigo de Deus, de absorver-se num mundo físico de sonho, inconsistente como bolha de sabão, ele herda novamente seu reino eterno. Se o escapismo é uma necessidade do homem, apertado em sua estreita personalidade, pode qualquer outra fuga comparar-se com esta para a onipresença? Em minha sagrada experiência em Darkshineswar, os únicos objetos extraordinariamente aumentados eram o templo e a forma de Deusa. Tudo o mais apareceu em suas dimensões normais, embora cada objeto estivesse envolto num halo de tênue luz – branca, azul e matizes pastel do arco-íris. Meu corpo parecia de substância etérea, pronto para levitar. Tendo consciência perfeita do ambiente que me cercava, olhava à minha volta e dava alguns passos sem perturbar a continuidade da beatífica visão. Subitamente vislumbrei, atrás do templo, meu cunhado sentado sob os galhos espinhosos de uma árvore sagrada bel. Sem nenhum esforço, podia discernir o curso de seus pensamentos. Sua mente, um pouco elevada pela santa influência de Dakshineswar, ainda se entregava a reflexões pouco amáveis sobre mim. Voltei-me diretamente para a graciosa forma da Deusa. Mãe Divina – orei – não podes modificar espiritualmente o esposo de minha irmã? A bela imagem, até então silenciosa, finalmente falou: Teu desejo será concedido! Olhei, feliz, para Satish. Apesar de instintivamente consciente de que algum poder espiritual estaria em operação, ele se levantou, ressentido, de seu lugar no chão. Eu o vi correr por trás do templo, aproximou-se de mim, sacudindo o punho. A visão que tudo englobava desapareceu. Não pude mais ver a gloriosa Deusa; o templo perdeu sua transparência e retomou às dimensões comuns. De novo meu corpo se derretia sob os raios violentos do sol. Saltei para o abrigo do pórtico, onde Satish, furioso, me perseguiu. Consultei meu relógio. Era uma hora da tarde; a visão divina durara sessenta minutos (uma hora). Seu tonto – exclamou meu cunhado – ficou aí sentado, de pernas cruzadas e de olhos vesgos, durante horas. Caminhei de um lado para outro, observando-o. Onde está nossa comida? Agora o templo está fechado; você não comunicou nossa presença às autoridades; é tarde demais para providenciar nosso almoço! A exaltação espiritual que eu sentira com a presença da Deusa continuava comigo. Exclamei: A Mãe Divina nos alimentará! De uma vez por todas – gritou Satish – gostaria de ver sua Mãe Divina nos dar comida aqui, sem combinação prévia! Assim que pronunciou essas palavras, um sacerdote do templo atravessou o pátio e veio até nós. Filho, disse-me, estive observando seu rosto serenamente iluminado durante horas de meditação. Vi a chegada de seu grupo, pela manhã, e senti o desejo de guardar bastante comida para seu almoço. É contra as regras do templo alimentar àqueles que não fizeram um pedido antecipado, mas abri uma exceção para você. Agradeci e olhei diretamente nos olho de Satish. Ele corou de emoção, abaixando o olhar em mudo arrependimento. Quando nos serviram uma lauta refeição, que incluía mangas fora da estação, reparei que o apetite de meu cunhado era escasso. Ele estava confuso, profundamente mergulhado num oceano de pensamentos. Na viagem de volta para Calcutá, Satish, com expressão mais suave, às vezes me dirigia um olhar de súplica. Todavia, desde que o sacerdote aparecera e nos convidara para o almoço, como em resposta a seu desafio, Satish não havia dito uma só palavra. Na tarde seguinte, fui fazer uma visita à minha irmã. Ela me saudou muito afetuosamente. Querido irmão – exclamou – que milagre! Ontem à noite meu esposo chorou abertamente diante de mim. Amada Devi (1), disse ele, sinto-me feliz, mais do que é possível expressar, porque o plano reformador de seu irmão operou uma transformação. Vou desfazer todo o mal que já fiz a você. A partir desta noite usaremos nosso grande dormitório unicamente como lugar de adoração; sua saleta de meditação será nosso quarto de dormir. Lamento sinceramente ter ridicularizado o seu irmão. Pela vergonhosa maneira como eu vinha agindo, vou me punir não falando com Mukund até haver progredido no caminho espiritual. Daqui por diante buscarei profundamente a Mãe Divina; algum dia, sem dúvida, hei de encontrá-la! Anos mais tarde em 1936, visitei Satish em Nova Delhi, capital da Índia. Fiquei incrivelmente feliz ao perceber que ele estava muito adiantado em auto realização e que fora abençoado e que fora abençoado com uma visão da Mãe Divina. Durante minha estada em sua casa, notei que Satish passava secretamente a maior parte das noites em meditação profunda, embora sofresse de grave moléstia e trabalhasse durante o dia em seu escritório. Veio-me o pensamento de que a vida de meu cunhado não seria longa. Roma deve ter lido meu pensamento. Querido irmão, disse ela, estou com saúde e meu marido está doente. Contudo, desejo que você saiba: como dedicada esposa hindu, serei a primeira a morrer (2). Logo partirei. Surpreendido por suas palavras de mau presságio, senti, entretanto, seu ferrão de verdade. Eu estava nos Estados Unidos quando minha irmã faleceu, cerca de 18 meses depois de sua previsão. Meu irmão mais jovem, Bishnu, deu-me posteriormente os detalhes. Roma e Satish estavam em Calcutá no dia da morte de nossa irmã – contou-me Bishnu. Naquela manhã, ela vestiu seus trajes nupciais. Por que esta roupa especial? Perguntou Satish. Este meu último dia de serviço para você na Terra, respondeu Roma. Pouco depois, teve um ataque cardíaco. Como seu filho corresse para buscar auxílio, ela disse: Filho, não me deixe. É inútil, terei partido antes que o médico chegue. Dez minutos mais tarde, segurando os pés de seu esposo, em reverência, Roma abandonou conscientemente o corpo, feliz e sem sofrimento. Satish isolou-se muito, depois da morte de sua esposa, continuou Bishnu. Um dia, ele e eu olhávamos uma fotografia em que Roma sorria. Por que sorri? Satish exclamou repentinamente, como se sua esposa estivesse presente. Pensa que foi esperta em ir antes de mim. Provarei que não pode permanecer muito tempo longe de mim: logo estarei com você. Naquela época, apesar de Satish ter se restabelecido inteiramente de sua doença e gozar de excelente saúde, morreu sem causa aparente pouco depois de seu estranho comentário diante da foto. Assim, profeticamente, ambos se foram, minha amada irmã Roma e seu esposo Satish – transformado, em Dakshineswar, de um homem mundano como tantos outros, num santo silencioso. REFERÊNCIA: (1). Deusa: literalmente, “a que brilha”, da raiz do verbo sânscrito div, brilhar. (2). Uma esposa indiana acredita ser sinal de desenvolvimento espiritual morrer antes de seu marido, como prova dos leais serviços a ele prestados, ou seja, “morrer servindo”. Livro Autobiografia de Um Iogue – Paramahansa Yogananda. Abraço. Davi   

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