quinta-feira, 19 de junho de 2014

Preceitos das Antigas Escolas de Cabala. Parte II.

(C.023) Vimos na parte I desse tema a importância da constituição sócio histórica do povo Judeu e que a variedade de culturas e tradições herdadas dos povos da Civilização Mesopotâmica manifestadas nos Sumérios, Caldeus, Babilônios, Assírios e os Egípcios apesar de não fazer parte dessa região influenciaram enormemente o legado místico mostrado nos mistérios ocultos e revelados bem como os milagres realizados pelos patriarcas nos primórdios da formação do povo Hebreu. Ousarei traçar um perfil sequencial dos eventos relacionados ao sofrimento desse povo que parece marcado pela vergonha e dor para expressar a grandeza e a glória de Jeová um paradoxo enigmático que nossa mente racional é incapaz de entender mas tentarei esboçar algumas circunstâncias vinculadas a esse contexto. O primeiro templo foi chamado de Templo de Salomão pois foi construido por ele no século XI AC sobre um terreno comprado pelo rei Davi no monte Moriá sendo a construção desse templo desejada pelo seu pai com o objetivo de ter uma casa para a Arca da Aliança. A tradição diz que o desejo de Davi (1000 AC 962) em construí-lo não foi realizado por causa dos seus pecados cabendo assim ao seu filho Salomão essa tarefa sendo que o árduo trabalho durou 7 anos com madeiras vinda do Líbano trazidas por um contingente de 30 mil homens enviados com essa finalidade mais 70 mil homens foram convocados como carregadores e 80 mil como cortadores. Além desses o rei Salomão (962 AC 922) nomeou 550 homens como responsáveis pelos serviços e outros 3300 como ajudantes sendo o gigantesco templo erigido  e a Arca da Aliança colocada no interior do edifício, mas infelizmente esse templo foi destruído por Nabucodonosor em 586 AC depois de 2 anos de cerco à cidade de Jerusalém pelos exércitos dos babilônios que levaram para o cativeiro em suas terras os judeus derrotados. O segundo templo tem uma história mais complicada pois algumas décadas depois da destruição do templo de Salomão os judeus voltaram da Babilônia e puderam reconstruir o antigo templo sendo que essa primeira construção terminou em 515 AC e sua reforma foi liderada por Judas Macabeu em 164 AC. Esse segundo Templo em Jerusalém adquiriu fama e opulência devido a intervenção de Herodes o grande (37 AC 4) que ampliou de forma monumental aquilo que existia sendo que essas obras iniciadas por Herodes duraram diversos anos tendo terminado somente em 64 DC e logo a seguir no ano 70 DC esse templo foi destruído pelo Imperador Romano Tito. Um fato marcante nessa invasão foi que alguns judeus depois da queda dos muros de Jerusalém resistiram por alguns meses sobre uma fortaleza mas os exércitos de Tito conseguiram penetrar por um canal existente embaixo da cidade e os últimos amotinados não se entregarem  preferindo o suicídio coletivo. A destruição do Segundo Templo marca a dispersão (diáspora) dos judeus ocupando diferentes regiões pelo mundo convivendo em pequenas comunidades que apesar de não possuírem um Estado (Território) eram considerados uma nação (povo) procurando conservar sua identidade cultural por meio da língua, religião, cultura e hábitos. Na Europa Medieval ocuparam principalmente a região da Península Ibérica (Portugal e Espanha) isso antes do ano 1000 pois tinham liberdade religiosa influenciando o desenvolvimento cultural e científico mas no ano 1095 começaram a ser perseguidos pelos cristãos porque a Igreja Católica julgou os Judeus responsáveis pela morte de Cristo assim a partir desse fato a Civilização Judaica sofreu constantes ataques nas cidades Europeias sendo enclausurados nos guetos os milhares de judeus foram  vítimas da Santa Inquisição (Tribunal da Igreja Católica que julgava os hereges). A partir da Idade Moderna os judeus foram expulsos da Península Ibérica emigrando em sua grande maioria  para regiões protestantes ao norte da Europa, mas após os direitos universais do homem serem instituídos (liberdade, fraternidade e igualdade)  durante a Revolução Francesa eles passaram a gozar de certa liberdade religiosa desenvolvendo várias atividades no continente Europeu em diversos setores tais como: bancos, indústrias além de atividades intelectuais notadamente nas ciências, artes, e principalmente na filosofia. Com a grande ascensão econômica e intelectual no século XIX (1801-1900) vários países começaram a acusar a comunidade judaica de querer dominá-los assim nesse contexto começaram a surgir ideias de aversão e preconceitos (antissemitismo) contra os judeus sendo esse século marcado entre eles por um forte sentimento de retornarem à sua terra de origem a Palestina criando um Estado Judaico nesse território sendo esse fato conhecido na história como (sionismo) onde milhares de judeus regressariam fugindo da perseguição na Europa. No século XX (1901-2000) a comunidade judaica foi vítima de uma das maiores atrocidades da história o chamado holocausto planejado e executado por Adolf Hitler (1889-1945) e a Alemanha Nazista bem como alguns cooperadores dentre eles Benito Mussolini (1883-1945) da Itália e seu fascismo durante a segunda guerra Mundial (1939-1945) onde 6 milhões de judeus foram submetidos aos campos de concentração na Polônia e Bielorússia sendo torturados e mortos, mas após o término da guerra o Movimento Sionista liderados por intelectuais judeus como Davi Ben Gurion (1886-1973), Theodor Herzl (1860-1904), Achad Haam (1856-1927), Golda Meir (1898-1978), Moshe Dayan (1922-1995) e outros reivindicaram à Organização das Nações Unidas (ONU) a criação do Estado de Israel na Palestina sendo milagrosamente no dia 15 de maio de 1948 criado o Estado Judeu contrariando os palestinos e árabes que viviam na região junto com milhares de judeus que haviam retornado da diáspora começando assim os vários conflitos étnicos e guerras que passaram a ser constantes nas regiões conhecidas como Faixa de Gaza, Cis Jordânia ocupada e Colinas de Golan. A digressão foi necessária para entendermos  as Academias de Cabala de uma maneira voltada para o misticismo e espiritualidade dos judeus sendo ela (Cabala) a tradição esotérica por trás do judaísmo revelando uma variante do ensinamento oculto universal, mas a doutrina exotérica oral e vivencial não está contida nas obras que ela abarca. O mais antigo texto cabalista o Sepher Yetzirah ou Livro da Formação atualmente costuma ser datado entre os séculos III e IV (201-399) e o Sefer Há Bahir ou livro da Iluminação foi publicado na região da Provença nos Alpes Franceses durante o século XII (1100-1200) embora considere-se que contenha elementos mais antigos, mas o volumoso Zohar chamado de Livro do Esplendor é uma obra em vários volumes que até o presente momento não foi totalmente traduzida para nenhum idioma sendo ele originalmente em hebraico e tendo apenas três compêndios traduzidos para o inglês. Apesar do Zohar ser atribuído ao rabino Talmúdico Shimon Bar Yochai século II a maioria dos estudiosos concorda que a obra seja de um cabalista espanhol do século XIII (1201-1300) Moisés de Leon (1250-1305) com acréscimos de comentarista posteriores. Já o livro Asch Metzareph ou Fogo Purificador explica os sephiroth (Princípios) cabalísticos em termos alquímicos sendo provavelmente uma obra de tradição cristã também o Sepher Sephiroth ou o livro das Emanações explica a evolução gradual da Divindade desde uma existência negativa a uma positiva. Para compreendermos o que é a Cabala vamos partir do princípio daquilo que ela não é religião, superstição, magia, sociedade secreta, meditação, adivinhação, interpretação de sonhos, ioga, hipnose ou espiritismo embora possa estar relacionada a todas essas coisas assim Cabala é um conjunto de ensinamentos esotéricos sobre Deus, o homem, o universo, o caminho, a verdade e coisas afins sendo uma revelação de Deus para o homem. Ela nos diz porque o homem existe porque nasce porque vive qual o objetivo de sua vida de onde vem para onde vai e quando completa seu ciclo existencial nesse mundo assim independentemente de quando a Cabala tenha surgido o modo como a conhecemos hoje é o resultado da transmissão desses ensinamentos por meio da tradição judaica e seu significa é recebimento sendo uma forma de misticismo pois ensina que é possível ao homem ter um contato direto com esferas superiores da realidade ou mesmo com manifestações do próprio criador portanto grosso modo a Cabala está para o Judaísmo assim como o Gnosticismo está para o Cristianismo e o Sufismo para o Islamismo. Como misticismo essas três correntes têm muito em comum sendo que a maior parte da diferença está no modo de transmissão do conhecimento adaptado a tradição em que aquele tipo de misticismo se desenvolveu entretanto esse raciocínio não vale apenas para as três religiões chamadas Abraãmicas (por serem todas herdadas do patriarca Abraão) mas também para as místicas orientais como o Hinduísmo, Taoismo, Budismo além do Zoroastrismo só para citar as mais conhecidas. Nesse misticismo Cabalístico as interpretações da Torá (os cinco primeiros livros do Antigo Testamento) são tão importantes que foram divididos em quatro níveis de profundidade sendo o primeiro Peshat como  aquele que os leitores estão acostumados pois compreende apenas o sentido literal do texto o segundo nível Remez considera o significado alegórico da linguagem e no terceiro Derash entram as comparações entre textos similares e metáforas mas o último nível (quarto) é aquele que entende o sentido secreto e misterioso da mensagem divina chamado de Sod. Assim juntando os nomes das interpretações elas possuem um significado próprio e combinando-se as letras de cada um obtêm-se a palavra PARDES que significa paraíso e remete a realidade última do esforço de interpretação isso é compreendendo a mensagem que Deus colocou nos textos sagrados o cabalista recebia de volta o conhecimento do paraíso como se lhe fosse devolvida a chave para retornar ao Jardim do Éden do qual Adão foi expulso por desobediência nessa esfera o rabino Leonardo Alanati da Congregação Israelita Mineira diz: "É como uma gota retornando ao oceano de volta à realidade divina". Durante séculos especialmente após a destruição do Segundo Templo em Jerusalém pelos romanos no ano 70 a sabedoria da Cabala foi cuidadosamente transmitida por Mestres Iluminados somente à pequenos grupos de seus discípulos mais brilhantes e inspirados conta o rabino Alanati sendo os discípulos ideais homens maduros com mais de 40 anos pais de família de comportamento exemplar e ávidos por descobrir os segredos do universo assim eram poucos aqueles que se tornavam Mestres dando continuidade a transmissão do conhecimento oral. Para boa parte dos Cabalistas as restrições tinham razões claras pois o público não estava preparado para receber esse ensinamento dos mistérios maiores mas hoje a evolução da ciência ajuda a compreender muitos dos ensinamentos esotéricos antigos. Na verdade o motivo maior de tanto segredo não era apenas a escassez de discípulos adequados mas em diversas épocas por razões diferentes os judeus foram proibidos de professarem publicamente sua fé e a perseguição aos Cabalista atingiu o clímax no século XVI (1501-1600) durante a inquisição espanhola além disso a Cabala tem uma reinterpretação revolucionária dos textos bíblicos usando uma simbologia complexa e uma linguagem ambígua sendo essa a justificativa pela qual os Cabalistas eram considerados como hereges e alguns foram queimados nas fogueiras como bruxos ou feiticeiro e até hoje o estudo da Cabala é por várias vertentes do Judaísmo inoportuno e inconveniente mas nos últimos anos esta diferença tem diminuído. É curioso observar que na Cabala Iuriânica desenvolvida no século XVI pelo rabino Isaac Luria Arizal (1534-1572) há um conceito que lembra a teoria do Big Bang segundo essa linha Cabalística a primeira ação de Ein Sof para criar o universo teria sido uma contração por si mesmo que provocou uma catástrofe inicial chamada Tohu gerando um vácuo que em seguida teria sido preenchido com as emanações divinas de uma maneira explosiva tendo em vista a grande velocidade dos acontecimentos narrados e a seguir retificado nos mundos visíveis e invisíveis. Durante o Renascimento a Cabala despertou o interesse de grupos místicos cristãos intrigados com a compatibilidade entre as duas tradições tendo como resultado a criação da Cabala Cristã ou católica que levou novos níveis de interpretação dos textos das Sagradas Escrituras. Um sincretismo mais profundo resultou no surgimento da chamada Cabala Hermética que reúne ensinamentos esotéricos do gnosticismo, alquimia, astrologia, religiões egípcias, grego romanas e pagãs, tarô, tantra, maçonaria, hermetismo, neo platonismo, hinduísmo e budismo em uma espécie de síntese de todas as tradições místicas autênticas. Assim como a religião Judaica a Cabala ensina que tudo o que existe vem de Deus entretanto o Deus Único não é compreendido exatamente da mesma maneira assim se para a religião tradicional Deus é Todo Poderoso Criador de todas as coisas para a Cabala Ele não é somente o Criador mas é também a criação ou seja a criação não é dissociada do Criador mas parte Dele. Nesse contexto a existência de Deus não seria portanto distinta do espaço e tempo mas eles estariam contidos no próprio Deus Infinito. Mas não vá pensando que já entendeu porque isso não é assim tão simples e nem imagine que essas racionalizações vão proporcionar a você um entendimento profundo de Deus pois segundo a Cabala ou mesmo a religião Judaica o Deus Infinito não pode ser compreendido plenamente pela nossa mente física limitada. Concluo na parte III. Abraço. Davi.     

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