terça-feira, 22 de outubro de 2019

OS ANALECTOS - INTRODUÇÃO II.


Confucionismo. www.https://rt.br. OS ANALECTOS. Tradução do inglês de Caroline Chang. Tradução do chinês. Introdução e notas de D. C. Lau. INTRODUÇÃO II.  Isso é confirmado por uma frase de Tseng Tzu. À observação do Mestre de que apenas um fio amarrava o seu caminho, Tseng Tzu acrescentou a explicação: “O caminho do Mestre consiste em chung e shu. Isso é tudo” (IV. 15). Há outra frase que é, na verdade, também sobre shu. Em resposta a uma pergunta de Tzu-kung, Confúcio disse: Mas, por outro lado, um homem benevolente ajuda os outros a firmarem sua atitude do mesmo modo que ele próprio deseja firmar a sua e conduz os outros a isso do mesmo modo que ele próprio deseja chegar lá. A capacidade de tomar o que está ao alcance da mão como parâmetro pode ser considerado o método da benevolência. (VI.30) Daí podemos ver que shu é o método de descobrir aquilo que os outros desejam ou não desejam que seja feito para eles. O método consiste em tomar a si mesmo – “aquilo que está ao alcance da mão” – como uma analogia [9] e se perguntar sobre o que gostaríamos ou não, caso estivéssemos no lugar do outro. Shu, entretanto, não pode ser toda a benevolência, já que se trata apenas do método de aplicação. Tendo descoberto o que a outra pessoa desejaria ou não, fazer aquilo que pensamos que a pessoa desejaria ou evitar fazer à pessoa aquilo que acreditamos que ela não desejaria depende de algo mais do que o shu. Como o caminho do Mestre consiste de chung e shu, em chung temos o outro componente da benevolência. Chung é fazer o melhor de que alguém é capaz, é dar o melhor de si, e é por meio do chung que uma pessoa põe em prática aquilo que descobriu pelo método de shu. Tseng Tzu disse em outra ocasião, “Todos os dias, examino a mim mesmo sob três aspectos” e, desses, o primeiro é: “Naquilo que fiz pelo bem-estar do outro, falhei em ser chung?” (I.4). Outra vez, quando questionado sobre como um ministro deveria servir seu governante, a resposta de Confúcio foi a de que ele “deveria servir seu governante com chung” (III.19). Finalmente, também é dito que ao tratar com os outros uma pessoa deveria ser chung (XIII.19). Em todos esses casos, não resta absolutamente nenhuma dúvida de que chung significa “dar o melhor de si”. [10] Outra resposta que Confúcio deu a uma pergunta sobre a benevolência foi “Ame seus semelhantes” (XII.22). Como ele não elaborou o pensamento, o significado não é muito claro. Mas felizmente ele usou essa frase novamente em duas outras ocasiões. Em I.5 ele disse: “Ao governar um reino com mil carruagens (...) evite gastos excessivos e ame os seus semelhantes; empregue o trabalho do povo apenas nas épocas certas”. Outra vez, o Mestre, segundo Tzuy u, disse: “o cavalheiro instruído no Caminho ama seus semelhantes e que os homens vulgares instruídos no Caminho são fáceis de serem comandados” (XVII.4). No primeiro caso, o amor pelo semelhante (jen) é contrastado com o emprego das pessoas comuns (min) nas estações corretas, enquanto no segundo caso o cavalheiro que ama seus semelhantes é contrastado com o homem vulgar que é fácil de ser comandado. Se lembrarmos que “homem vulgar” provavelmente não era a mesma coisa que “pessoa comum” ou “povo”, não podemos eliminar a possibilidade de que, quando Confúcio definiu benevolência em termos de amar o seu semelhante, ele não tinha em mente as pessoas comuns. [11] Mesmo se for esse o caso, não é tão estranho quanto parece à primeira vista, e, para ver a questão em perspectiva, devemos primeiramente dar uma olhada nas bases do sistema moral de Confúcio. Confúcio tinha uma profunda admiração pelo duque de Chou [12] , que, como regente dos primeiros anos do reino de seu jovem sobrinho, rei Ch’eng, foi o arquiteto do sistema feudal Chou, uns quinhentos anos antes da época de Confúcio. Não é objetivo desta introdução discutir em detalhes a influência do duque na sociedade chinesa e no sistema político chinês. Basta simplesmente chamar a atenção para a sua mais importante contribuição, o sistema de herança de clãs conhecido como tsung fa. Sob esse sistema, a sucessão passa da esposa principal ao filho mais velho. Filhos mais jovens ou filhos de concubinas tornamse fundadores de seu próprio clã. De modo que os senhores feudais têm uma dupla relação com o rei. Em termos de relações políticas, são vassalos, ao passo que em termos de laços sanguíneos são a cabeça de uma ramificação do clã real. Obrigações políticas têm sua raiz nas obrigações familiares. O sistema social fundado pelo duque de Chou provou sua solidez com a durabilidade da dinastia Chou. Seguindo os passos do duque de Chou, Confúcio fez do amor natural e das obrigações entre membros da família a base da moralidade. As duas relações mais importantes dentro da família são aquelas entre pai e filho e entre irmão mais velho e irmão mais novo. O amor que alguém dedica aos seus pais é hsiao, enquanto o respeito devido ao irmão mais velho é t’i. Se um homem é um bom filho e um bom irmão em casa, pode-se esperar que se comporte bem em sociedade. Tzu-yu disse: É raro um homem que é bom como filho (hsiao) e obediente (t’i) como jovem ter a inclinação de transgredir contra seus superiores; não se sabe de alguém que, não tendo tal tendência, tenha iniciado uma rebelião. (I.2) Ele continua até formular a conclusão lógica de que “ser um filho bom e um jovem obediente é, talvez, a raiz do caráter de um homem”. No confucianismo posterior, foi dada ênfase indevida quanto à necessidade de ser um bom filho, mas podemos ver aqui que mesmo nos primeiros ensinamentos do confucianismo hsiao era uma das mais básicas virtudes. Se um bom filho faz um bom súdito, um bom pai também fará um bom governante. O amor de um homem pelas pessoas externas à sua casa é visto como uma extensão do amor do homem pelos membros da sua família. Uma consequência dessa visão é que o amor, e portanto a obrigação de amar, diminui gradualmente conforme se projeta para fora da família. Geograficamente, uma pessoa amará os membros da sua família mais do que a seus vizinhos; amará a seus vizinhos mais do que àqueles que são meros habitantes da mesma aldeia, e daí por diante. Socialmente, uma pessoa ama os membros da sua própria classe social mais do que os de outras classes. De modo que não seria de surpreender se a benevolência ficasse confinada aos semelhantes dessa pessoa (jen); mas o que é mais importante lembrar é que isso não significa que essa pessoa não ame as pessoas comuns. Ela as ama, mas em um grau mais baixo e, talvez, de uma maneira diferente. Na terminologia de Confúcio, uma pessoa deveria ser generosa (hui) para com as pessoas comuns (V.16). Trata-se de fazer jus à atitude de Confúcio para com as obrigações. Nossas obrigações para com os outros deveriam ter a mesma proporção que o benefício que deles recebemos. Parece ser esse o caso mesmo entre pais e filhos. Ao comentar sobre Tsai Yü, que queria abreviar o período de luto de três anos, Confúcio disse: “Não foram dados a Yü três anos de amor por parte de seus pais?” (XVII. 21). Isso pode significar que a observância do período de luto de três anos é, de alguma forma, uma retribuição do amor recebido dos pais nos primeiros anos da vida de uma pessoa. Se é esse o caso, não é difícil enxergar por que as obrigações que temos para com as outras pessoas também deveriam ter a proporção da proximidade das nossas relações com elas. Quanto à questão de como um governante deveria tratar as pessoas comuns, é um tópico ao qual voltaremos. A respeito da natureza da benevolência, há uma outra resposta dada por Confúcio que é de grande importância porque a pergunta lhe foi colocada pelo seu discípulo mais talentoso. Yen Yüan perguntou sobre a benevolência. O Mestre disse: “Voltar-se à observância dos ritos sobrepondo-se ao indivíduo constitui a benevolência. Se por um único dia um homem puder retornar à observância dos ritos ao sobrepor-se a si mesmo, então todo o Império o consideraria benevolente. Entretanto, a prática da benevolência depende inteiramente da pessoa, e não dos outros”. (XII.1) Há dois pontos nessa definição de benevolência que merecem atenção. Primeiro, benevolência consiste em superar o eu. Segundo, para ser benevolente uma pessoa precisa retornar à observância dos ritos. Consideremos primeiro o primeiro ponto. É uma crença central dos ensinamentos de Confúcio de que ser moral não tem nada a ver com interesses próprios. Para ser mais preciso, dizer que duas coisas nada têm a ver uma com a outra é dizer que não há absolutamente nenhuma relação entre elas, seja positiva ou negativa. Se ser moral nada tem a ver com buscar os próprios interesses, tampouco tem a ver com deliberadamente ir contra os próprios interesses. Por que, então – podemos perguntar –, é tão importante enfatizar a ausência de relação entre os dois? A resposta é a seguinte: de todas as coisas que podem distorcer o julgamento moral de um homem e desviá-lo de seus objetivos morais, o interesse próprio é a mais forte, a mais persistente e a mais insidiosa. Confúcio tinha plena consciência disso. Foi por isso que ele disse, mais de uma vez, que, à vista de uma vantagem a ser obtida, uma pessoa deveria pensar naquilo que é direito (XIV.12, XVI.10 e XIX.1). Em outro contexto, ele advertiu homens idosos quanto aos perigos da ganância (XVI.7). Ele também perguntou: “É realmente possível trabalhar lado a lado com um homem mau ao serviço de um senhor? Antes que ele consiga o que quer, ele se preocupa com a possibilidade de não consegui-lo. Depois de consegui-lo, ele se preocupa com a possibilidade de perdê-lo, e, quando isso acontecer, nada o deterá” (XVII.15). Confúcio chegou à conclusão de que não se conformaria com uma riqueza ou posição não-merecidas, apesar de serem coisas desejáveis (IV.5). O ponto sobre retornar à observância dos ritos é igualmente importante. Os ritos (li) eram um corpo de regras que governavam as ações de todos os aspectos da vida e eram o repositório dos ideais passados sobre a moralidade. É, portanto, importante que uma pessoa os observe, a não ser que haja fortes razões para o contrário. Embora não exista garantia de que a observância desses ritos leve necessariamente ao comportamento adequado, é provável que, de fato, assim aconteça. Voltaremos a esse ponto. Por enquanto, basta dizer que Confúcio tinha um grande respeito pelo corpo de regras que recebiam o nome de li. É por isso que, quando Yen Yüan o pressionou por mais detalhes, foi-lhe dito para não olhar ou ouvir, falar ou se mover, a não ser de acordo com os ritos (XII.1). Isso, no ponto de vista de Confúcio, não era tarefa fácil, tanto que “se por um único dia um homem puder retornar à observância dos ritos ao sobrepor-se a si mesmo, então todo o Império o considerará benevolente”. Há duas ocasiões em que são dadas respostas que enfatizam outro aspecto da benevolência. Quando Fan Ch’ih perguntou sobre benevolência, o Mestre disse: “O homem benevolente colhe o benefício apenas após vencer as dificuldades” (VI.22). Do mesmo modo, quando Ssu-ma Niu perguntou sobre benevolência, o Mestre disse: “Amarca do homem benevolente é que ele reluta em falar”, e então seguiu explicando: “Quando agir é difícil, causa alguma surpresa que alguém relute em falar?” (XII.3). Que ele considerava a benevolência algo difícil de ser atingido pode ser deduzido da sua relutância em dizer que qualquer pessoa fosse benevolente. Ele não se comprometeu quando questionado se Tzu-lu, Jan Ch’iu e Kung-hsi Ch’ih eram benevolentes (V.8). Tampouco admitiu que Ling Yin Tzu-wen ou Ch’en Wen Tzu fossem benevolentes (V.19). E se recusou a reclamar benevolência para si próprio (VII.32). Isso não é nada mais do que se poderia esperar de um homem modesto. Entretanto, ele disse de Yen Yüan: “em seu coração, Hui pode praticar a benevolência durante três meses ininterruptos” enquanto “os outros atingem a benevolência meramente por ataques repentinos” (VI.7). Essa ênfase na dificuldade de praticar a benevolência encontra eco, conforme vimos, em Tseng Tzu, que descreveu a benevolência como “um fardo pesado” (VII.7). Mas embora Confúcio tenha deu não esteja satisfeito com o Caminho do Mestre, mas me faltam forças”, o comentário de Confúcio foi: “Um homem a quem faltam forças entra em colapso ao longo do trajeto. Mas você desiste antes de começar” (VI.12). Confúcio declarou sua convicção de modo definitivo quando disse: “A benevolência é realmente algo tão distante? Tão logo a desejo e ela está aqui” (VII.30). Nas linhas das Odes As flores da cerejeira, Como ondulam no ar! Não é que eu não pense em você, Mas sua casa fica tão longe. Confúcio comentou: “Ele não a amava de verdade. Se amasse, não existiria algo como ‘longe demais’” (IX.31). Ele deve ter feito tal comentário tendo em mente sua possível aplicação quanto à benevolência. Além da benevolência, há várias outras virtudes que se esperam de um cavalheiro, e devemos discutir pelo menos as mais importantes delas. Há duas virtudes que são frequentemente mencionadas junto com a benevolência. São a sabedoria ou inteligência (chih) e a coragem (yung). Por exemplo. Confúcio disse: “O homem sábio nunca fica indeciso; o homem benevolente nunca fica aflito; o homem corajoso nunca tem medo” (IX.29), e “Os cavalheiros têm sempre três princípios em mente, nenhum dos quais consegui seguir: O homem benevolente nunca fica aflito; o homem sábio nunca fica indeciso; o homem corajoso nunca tem medo” (XIV.28). Um homem sábio nunca fica indeciso no seu julgamento sobre o certo e o errado. Um homem que não é sábio, entretanto, pode facilmente confundir o hipócrita pelo genuíno. Isso pode acontecer com casos extremos em que a aplicação de uma regra ou uma definição se torna incerta, particularmente na esfera da moral. Peguemos um exemplo concreto. Quando um governante dá à sua concubina os mesmos privilégios da sua consorte, ou dá ao seu filho mais novo o mesmo privilégio que ao herdeiro, a dúvida implanta-se na cabeça das pessoas. Para todas as aparências externas, a concubina torna-se indistinguível da consorte, ou o filho mais novo do herdeiro. É necessário um homem de sabedoria para compreender e não ficar perplexo com tal fenômeno. Outro atributo do homem sábio é que ele conhece os homens. Em outras palavras, ele é bom ao julgar o caráter das pessoas. Na visão chinesa, o fator mais importante que contribui para a dificuldade de prever o futuro reside na natureza imprevisível do homem. Assim, o estudo do homem de caráter, no qual reside a única esperança de conseguir algum grau de controle sobre eventos futuros, foi considerado uma questão de vital importância para o governante, já que a presente assim como a futura estabilidade do reino frequentemente dependiam da sua escolha de ministros. Esse tipo de estudo do caráter humano, que se tornaria, a partir da dinastia Han do Leste, uma das maiores preocupações dos pensadores chineses, já tinha grande importância na época de Confúcio. Assim, quando Fan Ch’ih perguntou sobre sabedoria, o Mestre disse: “Conheça os homens” (XII.22).ado ênfase à dificuldade de praticar a benevolência, ele também deixou absolutamente claro que ter ou não êxito quanto a isso depende inteiramente de nós. Conforme já vimos, ele disse, em resposta à pergunta de Yen Yüan, que “a prática da benevolência depende inteiramente da própria pessoa, e não dos outros” (XII.1). Ele tinha muito claro que o fracasso de praticar a benevolência não era devido à falta de força de vontade. Ele disse: “Existe um homem que, pelo período de um só dia, seja capaz de dedicar toda a sua força à benevolência? Nunca conheci um homem cuja força seja insuficiente para essa tarefa. Deve haver casos de força insuficiente, mas simplesmente não os encontrei” (IV.6). Assim, quando Jan Ch’iu pediu desculpas ao dizer “Não é que. www.https//.rt.br. Abraço. Davi

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