domingo, 28 de dezembro de 2014

Escritora brasileira Clarice Lispector

A contribuição da obra de Clarice Lispector (1920-1977)  na Literatura Brasileira está, sobretudo na produção de um romance introspectivo, raridade entre nossa produção literária. Para compreender sua produção literária, é necessário do leitor um preparo psicológico, já que um primeiro contato com a obra causa um estranhamento no leitor; superada essa primeira etapa, é possível reconhecer sua escrita indefinível, uma mistura de prosa, confissão, discursos internos e poesia. Clarice Lispector nasceu na Ucrânia em 1925, vindo ainda recém-nascida com seus pais para o Pernambuco, inicialmente, e depois para o Rio de Janeiro. É possível perceber na escritora uma forte identificação com o povo nordestino. Antes dos 7 anos, já inventava histórias. Sua mãe também escrevia, mas Clarice só soube disso através de suas tias, após a morte da mãe. Suas irmãs também eram escritoras. Uma delas, de livros técnicos. Quando questionada sobre como definia sua produção literária, Clarice diz ser “caótica, intensa, plenamente fora da realidade da vida”. Nunca assumiu a profissão de escritora. Para ela, escrever só quando tinha vontade. Considerava-se amadora e fazia questão de continuar sendo, para manter a liberdade. Clarice tinha momentos de intensa produção literária. Quando terminava uma obra, ficava “oca”, como ela dizia. Então, escrevia para crianças. Escreveu 3 livros de literatura infantil para seu filho. Ela considerava fácil se comunicar com crianças, pois tinha natureza maternal. Já com o adulto, achava difícil, pois quando se comunicava com o adulto, estava na verdade se comunicando com o mais secreto de si mesma. “A criança tem a fantasia, é solta”. “O adulto é triste e solitário em qualquer momento da vida, basta um choque um pouco inesperado e isso acontece”. Mas não se considerava solitária, pois tinha muitos amigos. Lispector escrevia para ficar livre de si mesma, para compreender a alma humana. Para ela, escolher a própria máscara é o primeiro gesto humano e solitário. Com uma personalidade intrigante, reconhecia o valor do mistério, do silêncio. Numa última entrevista concedida à determinada rede de TV, ela diz: “Ouve-me, ouve o meu silêncio. O que falo nunca é o que falo e sim outra coisa. Capta essa outra coisa de que na verdade falo porque eu mesma não posso”. Quando não estava escrevendo, Clarice se considerava morta. Para ela, o período entre um trabalho e outro é muito doloroso, pois é um período de esvaziamento da cabeça para nascer alguma outra coisa. “É tudo tão incerto”. Sobre o papel social da escrita, ela afirma que o que escreve não altera em nada no mundo. Não sabe por que continuar escrevendo. Diz ela: “No fundo, a gente não está querendo alterar as coisas; a gente está querendo desabrochar de um modo ou de outro”. Mas de uma coisa é certa: o papel do escritor é falar o menos possível. Daí ela dizer que “o melhor está nas entrelinhas”. Clarice Lispector relata que compreender sua obra não é uma questão de inteligência, mas de sentir, de entrar em contato. Ou sua obra “toca, ou não toca”. Às vezes, ela se sentia isolada, mas depois via que os universitários a procuravam, entendiam sua obra. O que a espantava, mas se sentia gratificada. Quando alguém fazia uma releitura de sua obra, sentia-se aliviada, pois alguém a havia compreendido. Ela acreditava que o fato de a considerarem escritora a isolava, pois as pessoas enxergavam-na através desse rótulo. E isso a incomodava. Partindo para o conjunto de sua obra, Clarice revela uma intrigante tentativa de investigar as camadas mais densas da consciência humana na procura de compreender o sentido da existência. Através de uma aparente linguagem simples, a escritora mergulha numa análise psicológica do ser humano, revelando assim uma permanente preocupação em alcançar a verdade escondida na aparente simplicidade das palavras. À medida que os personagens de Clarice Lispector crescem numa obra, eles tende a se intelectualizar e a se tornarem falsos pela incapacidade de revelar mais que pensamentos, reflexões e pequenas crueldades, exprimindo assim a dificuldade do diálogo humano quando atingem a maturidade. A linguagem de Clarice se revela como uma armadilha. A aparente linguagem simples trata-se, contudo, de uma simplicidade enganosa. O caráter introspectivo de sua produção literária mostra que há muito “dito” além da superfície do texto. A própria escritora já afirmava: “o melhor ainda não foi escrito. O melhor está nas entrelinhas”. Outra particularidade da linguagem clariceana é o tom de coloquialismo e de narração sem surpresas da escritora, bem como as formas com que chama o leitor para dentro da narrativa (“O que vai ser de Joana?”, “Vamos chorar baixinho?”). Essas formas dão uma ilusão de familiaridade. Assim, é nesse conjunto de palavras comuns que se depositam as dimensões encontradas na realidade. Além disso, convém destacar que na obra de Lispector pode-se compreender melhor a diferença entre forma e estilo. Pela ótica estilística, Clarice se encontra no primeiro plano dos escritores brasileiros, já que ela mantém uma percepção perspicaz do detalhe, fugindo da lógica prosaica para uma construção de uma prosa poética. Pela ótica formal, seus personagens vivem num mundo “opaco, caótico, raso por consequência, como efeito natural, reinando a estaticidade em suas relações”. No entanto, existem momentos em que seus personagens se abrem numa sensação de vida ou na revelação de uma verdade fragmentada. É nessa tensão entre a opacidade e o instante liberador que se concentra o conflito básico da obra de Lispector. Se o manuseio hábil da linguagem e a busca intrigante das respostas para compreender o sentido da vida humana que se esconde atrás do cotidiano monótono e vazio, se essas peculiaridades tornam difícil a leitura das obras de Clarice Lispector, essas mesmas características representam, por outro lado, o inerente esforço do homem na busca do sentido de sua existência e do mundo em que vive. Segue alguns pensamentos da Clarice; vanguardistas pra sua era.
"Compreendi que viver é ser livre… Que ter amigos é necessário… Que lutar é manter-se vivo… Que pra ser feliz basta querer… Aprendi que o tempo cura… Que magoa passa… Que decepção não mata… Que hoje é reflexo de ontem… Compreendi que podemos chorar sem derramar lágrimas… Que os verdadeiros amigos permanecem… Que dor fortalece… Que vencer engrandece… Aprendi que sonhar não é fantasiar… Que pra sorrir tem que fazer alguém sorrir…Que a beleza não está no que vemos, e sim no que sentimos… Que o valor está na força da conquista… Compreendi que as palavras tem força… Que fazer é melhor que falar… Que o olhar não mente… Que viver é aprender com os erros… Aprendi que tudo depende da vontade… Que o melhor é ser nós mesmos… Que o SEGREDO da vida é VIVER ! Já chamei pessoas próximas de “amigo” e descobri que não eram… Algumas pessoas nunca precisei chamar de nada e sempre foram e serão especiais para mim. Não me deem fórmulas certas, porque eu não espero acertar sempre. Não me mostrem o que esperam de mim, porque vou seguir meu coração! Não me façam ser o que não sou, não me convidem a ser igual, porque sinceramente sou diferente! Não sei amar pela metade, não sei viver de mentiras, não sei voar com os pés no chão. Sou sempre eu mesma, mas com certeza não serei a mesma para SEMPRE!". Clarice foi influenciada pela filósofa francesa Simone de Beauvoir (1908-1986) em sua luta sem trégua pela afirmação feminina. O livro O Segundo Sexo dessa autora, era lido por todas as intelectuais que prezavam uma busca por liberdade; inspirando outras mulheres a se posicionarem a favor da causa feminista; atuando com essa ideologia em escolas, igrejas, instituições, organizações e na comunidade em geral, tudo com muita sutileza; sendo lançada a semente da emancipação feminina no ocidente. Temas como aborto, liderança familiar, machismo, profissão em todas as áreas, trabalho digno para a mulher, greves, infidelidade e tópicos do gênero eram discutidos nas academias e fórum clandestinos, organizados por simpatizantes. A literatura da Clarice tem enfoques nessa abordagem. Como diz o filósofo Heráclito (535 AC 475), "Tudo flui, nada persiste e nem permanece o mesmo". Ele passa a ideia de que não somos os mesmos de ontem, E nem seremos os mesmos de amanhã. Princípio que se expressa nos fenômenos físicos e naturais. Assim transmutamos em valores, costumes, culturas, tradições e espiritualidades; mas nossa essência substancial continua imutável; sendo a Centelha Divina que nos vincula ao Logos Eterno. Clarice viveu intensamente sua vida até o último suspiro; tendo uma mente bem adiantada em relação aos seus contemporâneos, situando a mulher num contexto de auto afirmação e luta por igualdade e equivalência à educação, profissão, trabalho e família em relação aos homens. Desse modo, foi incompreendida em alguns aspectos, discriminada por sua posição feminista pois a Bíblia diz em Efésios 5;22 "mulher, seja submissa a seu marido". Isto posto, os moralistas religiosos machistas de sua época insinuaram que ela fosse ateísta. Uma mentira grosseira, pois sua espiritualidade fugiu do formalismo e ortodoxia oficial do catolicismo, não crendo no deus dos supersticiosos que o pintavam e pintam como desumano, carrasco e impiedoso. Um inacreditável ser pessoal, que terá a coragem e o despudor de lançar no inferno eterno, todos aqueles que não crerem e nem aceitarem o seu filho como Salvador do Mundo. Finalizo com uma profunda frase da Clarice Lispector, que deu um nó no dogmatismo religioso; e para entendê-la precisamos usar a lógica e meditação espiritual. Tirem suas conclusões: "Porque enquanto eu amar a um Deus só porque não me quero, serei um dado marcado e o jogo maior da minha vida não se fará. Enquanto eu inventar um Deus, Ele não existe". Clarice tinha uma percepção mais profunda de Deus, não apenas a pessoalidade divina, mas um Deus manifestado em toda a sua criação, misterioso e subjetivo, acima do bem e do mal, não objetivo e comportamental temperamental como a maioria do senso comum o reconhece e compreender. Beijo. Davi.

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