Budismo. Livro O Evangelho de Buda. Vida e Doutrina de Sidarta Gautama. PENITÊNCIA EM URIVILVA. Em busca de melhores conhecimentos, o Bodhisattva chegou a um lugar ermo onde estavam estabelecidos muitos eremitas que virtuosamente refreavam seus sentidos. Reprimiam suas paixões e se submetiam a uma severa disciplina. Eram os yogis, brahmacharia e bbikaus. Esses são os seguidores da escola Yoga, ascetas brâmanes e discípulos mendicantes, respectivamente. Renunciaram aos deveres e regalias do mundo para se consagrarem exclusivamente à vida espiritual ou mística. Esses yogis viviam separados do mundo como um rebanho lúgubre e descarnado. Uns mantinham os braços para o alto noite e dia, até que, minados por enfermidades, exaustos e com as articulações anquilosadas e os membros rígidos, seus braços pareciam ramos de uma árvore morta. Outros tinham fechado as mãos tão fortemente e por tanto tempo, que as unhas haviam atravessado as palmas como agulhas, fazendo feridas. Alguns estavam calçados com sandálias cheias de pregos, ou laceravam a fronte. O peito e os músculos com objetos cortantes, ou sacrificavam suas carnes com o fogo. Outros atravessavam-na com pontas de ferro, dormiam sobre imundícies e cobriam-se com farrapos de cadáveres. Uns moravam em lugares impuros, onde as piras ardiam, em companhia de cadáveres, rodeados de corvos que soltavam agudos gritos ao redor dos despojos fúnebres. Outros repetiam em voz alta, quinhentas vezes ao dia, o nome de Siva, com sibilantes cobras enroladas em seus quadris e os pés paralisados em buracos. Assim era aquela espantosa congregação. Os membros tinham a cabeça coberta de feridas por causa do tórrido calor. Seus olhos eram lacrimosos, os nervos e os músculos tensos, o rosto deles era fundo e pálido como se fossem defuntos de cinco dias. Com muito cuidado e bom propósito, Sakyamuni se entregou à mortificação do corpo meditando sobre as verdades abstratas. Não tardando em superar em autoridade a todos os anacoretas que o reconheceram como mestre. Durante alguns meses, o Buda mortificou pacientemente seu corpo e exercitou o seu espírito na mais rigorosa vida ascética. No final, fazia uma única refeição ao dia, com a intenção de vencer o grande oceano do nascimento e da morte, chegando a outra margem da libertação. Tão extenuado e consumido ficou, que parecia um enfermo. Porém, a fama de sua santidade se espalhou por toda a redondeza, e de lugares longínquos vinham pessoas vê-lo e receber a sua bênção. No entanto, o Bem-aventurado não estava satisfeito, porque viu que a mortificação não extingue o desejo nem traz o êxtase da iluminação. Buscava o verdadeiro conhecimento e não o encontrava. Sentado sob uma árvore, considerou o estado do seu espírito e a consequência de sua mortificação. Então disse: Meu corpo se debilita cada dia mais com abstinências, e isso não me faz adiantar um passo na busca da libertação. Este não é o verdadeiro caminho. Será melhor fortalecer o meu corpo com o alimento e pôr o meu ânimo em disposição de possuir calma. Foi até o rio tomar um banho, mas quando quis sair da água, estava tão fraco que teve que se agarrar aos ramos de uma árvore na margem para poder saltar em terra firme. Voltou então à congregação, e ao chegar ali, caiu desmaiado e os eremitas o acreditaram morto. próximo dali morava um pastor, cuja filha, chamada Nanda, chegou até onde estava desmaiado o Buda que, ouvindo a voz da moça, voltou a si. Então ela lhe ofereceu arroz com leite, que ele aceitou com prazer. Com as forças recobradas pelo alimento, a sua mente clareou e se predispôs para receber a suprema iluminação. A partir de então o Buda voltou a alimentar-se normalmente. Os cinco eremitas que presenciaram essa cena com Nanda e observaram a mudança de conduta. Acreditaram que seu fervor religioso diminuíra e que Sidarta, o tão venerado Mestre, se esquecera do seu magnífico fim. Porém Buda, fitando tristemente o maior desses infelizes, lhe disse: Há meses moro nestas montanhas buscando a verde, e vejo meus irmãos, e também você, lamentavelmente torturados. Por que acrescentar males a vida, que por si já é tão má? O eremita respondeu-lhe: Está escrito que se um homem mortifica a sua carne até que a intensidade da dor só lhe deixe um sopro de vida e esperança da voluptuosa morte. Os males que ele sofre limparão a imundície do pecado, e a alma purificada voará liberta da aflição para as gloriosas esferas de esplendor inconcebível. Buda respondeu-lhe: Esta nuvem que flutua no céu ao redor do trono do seu Deus ergue-se de um mar agitado e voltará a cair em gotas semelhante a lágrimas. Passará por caminhos ásperos e penosos, por vales e pântanos, por rios lamacentos até chegar ao Ganges - rio na Índia, voltando ao mar de onde partiu. Sabe, meu irmão, se não acontece o mesmo aos santos com toda a sua felicidade, depois de tantos sofrimentos? Porque o que sobe torna a cair, o que se compra se gasta, e se você compra o céu com o seu sangue no doloroso mercado do inferno, quando estiver concluído o negócio, o sofrimento recomeçará. O eremita respondeu-lhe suspirando. Ai, talvez recomece! Eu não sei nem estou seguro de alguma outra coisa. Todavia, atrás da noite vem o dia, e atrás da tormenta, a calma. Nós nos aborrecemos dessa maldita carne que impede a alma de tomar o seu ansiado vou. Assim, pois, para a felicidade da alma, entregamos aos deuses nossas rápidas torturas para obter as alegrias duradouras. Sidarta respondeu: Porém, mesmo que essas alegorias durem milhões de anos, elas por fim se desvanecerão. Ou, então, diga-me: há em cima ou embaixo, ou ao redor de nós, alguma existência tão diferente da nossa que não se modifique? São eternos os seus deuses? Não: só o absoluto Brahman permanece. Os deuses nada mais fazem senão viver. Então o Senhor Buda exclamou: Você quer ser tão sábio quanto os santos e esforçados? Renuncie a esses jogos cruéis em que atira seus gemidos e lamentos para ganhar as apostas que talvez não passem de sonhos passageiros. Quer, por amor à sua alma, fazer sofrer a sua carne, afligi-la e mutilá-la de tal maneira que ela já não possa aprisionar o espírito. Buscando um refúgio, se rende no caminho antes de chegar a noite como cavalo dócil, no entanto exausto? Vocês querem, tristes ascetas, estragar e destruir esta bela moradia em que habitamos depois de um doloroso passado. Cujas janelas nos dão luz, ainda que escassa, para olharmos fora e sabermos se a aurora vai surgir e qual será o melhor caminho? O eremita respondeu-lhe: Escolhemos este caminho e o seguiremos até o fim. Diga-nos se conhece outro melhor, se não, vá em paz. O Buda, ao ver os eremitas se afastarem dele, teve pena daquela falta de confiança, não sentindo mais o abandono em que vivia. Reprimiu seu desgosto e afastou-se. Os eremitas disseram: Ele procura um lugar mais agradável. Abraço. Davi
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