terça-feira, 10 de dezembro de 2024

II. LIVRO JUDAICO DOS PORQUÊS

Judaísmo. Por Alfred J. Kolatch (1916-2007). II. LIVRO JUDAÍCO DOS PORQUÊS. 4. Por que os judeus rejeitam a doutrina do pecado original? Santo Agostinho (354-430) foi o primeiro teólogo que ensinou que o ser humano vem a este mundo em estado de pecado. A base desta crença é dada na Bíblia (Gênesis 3.17-19, onde Adão aparece desobedecendo a Deus por haver comido do fruto proibido da árvore do conhecimento no Gan Éden. Este primeiro pecado do ser humano passu a ser conhecido como pecado original. Muitos cristãos, ainda em nossos dias, em especial, os anglicanos, católicos, luteranos, metodistas, presbiterianos, aderem a este princípio. Segundo eles, o pecado de Adão foi transferido a todas as gerações posteriores, maculando assim os que nem haviam nascidos. Justificando este ponto de vista, São Paulo escreveu em Romanos 5,12 “Portanto, como o pecado entrou no mundo por meio de um homem, e pelo pecado a morte, assim a morte passou a todos os homens, porque todos pecaram. Mais adiante, acrescente que “porque assim como, ocorreu, pela desobediência de um homem, os muitos foram constituídos em pecadores ...” Então, como alguém pode remover de si mesmo a carga do pecado original? O cristianismo responde que somente através da aceitação de Jesus Cristo a “graça” de Deus pode retornar aos seres humanos. Portanto, um cristão só tem que crer em Jesus para se salvar. Nada mais é exigido dele. Para os judeus, assim como para as seitas cristãs fundamentalistas, tais como os batistas e as Assembleias de Deus, a doutrina do pecado original é totalmente inaceitável. Os judeus creem que o homem chegou a este mundo sem pecado, com a alma pura, inocente e sem mácula. Ainda que tenha havido mestres judeus nos tempos talmúdicos que acreditavam que a morte era um castigo imposto por Deus sobre a humanidade por causa do pecado de Adão. Prevaleceu a tese de que os pecados do ser humano são consequência de sua imperfeição e não, como prega o cristianismo, uma herança. 5. Por que os judeus rejeitam o conceito cristão de expiação através de outro? Segundo a doutrina cristã, I Coríntios 15,22, a carga de pecado original foi retirada dos seres humanos quando Jesus morreu por eles na cruz. Jesus teria sido, portanto, o cordeiro sacrificado para que o ser humano, nascido em estado de pecado, fosse salvo e restaurado a um estado de pureza. Este conceito da expiação dos pecados através de outro, que segundo os cristãos já foi previsto na profecia de Isaías. Especialmente a descrita no capítulo 53, está em desacordo com a crença judaica de que o ser humano não somente nasceu livre de pecado, mas também que cada indivíduo é responsável por seus próprios atos. Desde os tempos de Moisés, o judaísmo acredita que um terceiro não pode trazer absolvição ou redenção a um indivíduo. Moisés pediu a Deus que fosse o único a pagar pelo pecado de Israel pela adoração do bezerro de ouro Êxodo 32,33. Mas Deus lhe respondeu que “Aquele que pecar contra mim, a este riscarei de meu livro”. Este conceito é repetido em Jeremias 31,29-30 e em Ezequiel 18,2. Ainda que o judaísmo se oponha definitivamente a esta ideia da expiação dos pecados através de outro ser humano, não descarta completamente a expiação que possa ser realizada através de animais ou objetos. A Bíblia fala do bode expiatório, sa’ir laazazel, que tornou seus os pecados dos filhos de Israel e foi enviado ao deserto no Iom Kipúr Levítico 16,10. Até o presente, está em vigor o costume das caparót, uma galinha, um galo ou dinheiro é usado como instrumento pra que alguém fique livre de seus pecados. 6. Por que os judeus e os cristãos estão em desacordo a respeito do fruto que Adão e Eva comeram no Gan Éden? A Bíblia não especifica o tipo de fruto que Eva ofereceu a Adão. O Gênesis 3,6 diz simplesmente: “E viu a mulher que a árvore era boa para comer, e árvore cobiçável para alcançar a sabedoria. E tomou de seu fruto e comeu. E deu a seu marido, que comeu assim como ela”. O capítulo em questão não menciona em momento algum o nome do fruto. Na tradição cristã, o fruto oferecido por Eva é uma maça. É assim que a Vulgata, tradução latina da Bíblia, apresenta as palavras da Bíblia Hebraica. Na tradição judaica, o fruto é o figo, pois no versículo seguinte, Gênesis 3,7, está escrito que, como resultado de comer o furto, “foram abertos os olhos de ambos, e perceberam que estavam nus. Então coseram folhas de figueira, e fizeram pra si cintos”. É razoável, assim, presumir que, como foi uma figueira que proporcionou a Adão e Eva as folhas necessárias, o fruto comido por ambos é o fruto desta árvore. O Talmud e o Midrash sugerem outros frutos, tais como o etrog, cidra, e a alfarroba. Outros vão mais além e sustentam que foi trigo o que comeram. Já que a palavra hebraica para trigo é chita, que é similar ao vocábulo pra pecado, chet. Tais hipóteses se baseiam geralmente em interpretações exegéticas. 7. Por que os judeus rejeitam o dogma da virgindade da progenitora de Jesus? Baseando-se em Isaías 7,14, os cristãos afirmam que o nascimento de Jesus foi predito muito antes do evento em si. O versículo diz: “Eis que a almá conceberá e dará a luz um filho e chamará seu nome Emanuel”. Ainda que a palavra hebraica almá signifique literalmente “mulher jovem”, quando o Evangelho segundo Mateus 1,23 cita o versículo de Isaías, traduz almá como “virgem”. Esta tradução se acomoda ao argumento de que o milagroso nascimento de Jesus foi previsto já no Antigo Testamento. Apesar de a Septuaginta, redigida por judeus, também traduzir almá como “virgem”, o conceito de milagre no caso de uma virgem dando à luz se opõe àquilo que o judaísmo normativo aceita como milagre. Além disto, os sábios judeus rejeitam a noção de uma virgem dando à luz pois, em Isaías 7,14 a palavra almá faz parte da frase há-almá que significa “almá está grávida”. Considerando-se que o tempo presente é usado, é claro que esta jovem já estava grávida, sendo assim, havia deixado de ser virgem. Sendo este o caso, o versículo em questão não pode ser interpretado como uma predição do futuro. Por outro lado, os estudiosos judeus, em alguns casos apoiados por colegas cristãos, sublinharam o fato de que a palavra almá citada em Isaías 7,14 mal pode significar “virgem”. Posto que, em toda a Bíblia, é a palavra hebraica betulá que aparece quando se faz qualquer referência a uma virgem. Quando, em 1952, publicou-se uma versão revisada da Bíblia em inglês, as palavras “mulher jovem” foram usadas no lugar de “virgem” ao traduzir-se o vocábulo amá de Isaías 7,14.Isto irritou a comunidade fundamentalista cristã, que continua sustentando que almá refere-se à mãe de Jesus, que concebeu milagrosamente sem haver copulado com homem algum. Estes fundamentalistas expressaram sua veemente oposição a nova tradução queimando a edição revisada da Bíblia. Abraço. Davi

 

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