Filosofia. Livro Antologia Ilustrada de Filosofia. Das Origens a Idade Moderna. Texto escrito por Ubaldo Nicola. Parmênides (530 AC 460) e Zenão (490 AC 430). EXISTE A VERDADE. PARTE I. Se existe uma coisa com a qual
todos os filósofos do passado e do presente poderiam concordar é a grandeza
perturbadora do pensamento de Parmênides. Pelo rigor das suas argumentações e
pela profundidade das suas análises, Platão o definiu como venerando e
terrível, dedicando a ele um diálogo específico, O Parmênides, e o reconheceu
como pai espiritual; a ponto de achar que ao divergir de algumas das reflexões
do mestre cometia uma espécie de parricídio (pessoa que mata o pai, mãe ou
qualquer outro ascendente legítimo). Esse prestígio é justo, pois Parmênides
foi o primeiro a sustentar a superioridade da interpretação racional do mundo e
a negar a veracidade da percepção sensível. Ver, ouvir, escutar não produzem
certezas, somente crenças e opiniões. Erra quem (como Heráclito) deixa-se
enganar pelos sentidos e considera a realidade em Devir, pois a transformação,
uma passagem do Ser a um Não Ser, não é em si pensável. O Não Ser não é jamais
pensável, não mais do que ver a escuridão (o Não Ser da luz) ou escutar o
silêncio (o Não Ser do som). Sabe-se muito pouco sobre a vida de Parmênides,
até mesmo as datas prováveis de seu nascimento e morte são incertas. Membro de
uma família aristocrática, ele nasceu e viveu em Eleia (hoje chamada Velia),
próxima ao Cabo Palinuro, fundando ali a Escola denominada Eleata. Foi também o
autor das leis aplicadas em sua cidade. Tudo indica que nos últimos anos de sua
vida foi com o discípulo Zenão para Atenas, onde encontrou Sócrates (469 AC
399). Certamente, as suas doutrinas tiveram um forte impacto no ambiente
ateniense, Plutarco (45-120) conta que Péricles assistia às suas aulas com
interesse. Da sua obra, restam somente 154 versos do poema filosófico Sobre a
Natureza, do qual propomos aqui as leituras, estruturado em hexâmetros e
divididos em duas partes: Verdade e Opinião. Zenão, o discípulo mais próximo e
predileto do seu mestre. Fez da defesa da doutrina do Ser o escopo do seu filosofar,
acentuando o caráter provocador das argumentações parmenidianas até as últimas
e perturbadoras consequências; se o movimento é uma passagem de um corpo da
situação de estar em um lugar para a de não estar mais naquele lugar, então o
movimento não existe; assim como não existe o tempo, a velocidade, o espaço. A
Viagem em Direção a Verdade. Pode-se distinguir o verdadeiro conhecimento da
opinião? Em que condições se pode alcançar a verdade? A alta densidade
simbólica dificulta a interpretação do poema de Parmênides, principalmente na
primeira parte, dedicada a ilustrar, por meio da metáfora da viagem, o processo
que conduz ao conhecimento. O percurso em direção a verdade inicia-se nas Casa
da Noite, o bairro popular da cidade de Eleia, símbolo da escuridão em que vive
o homem que se deixa levar pelos sentidos. A viagem termina diante das portas
do tempo, no interior do qual, depois de ali ser admitido com dificuldade.
Parmênides recebe a doutrina do Ser, ideia central da sua filosofia,
diretamente da boca da deusa Necessidade. O sentido da metáfora é que a
verdade não é alcançável sem esforço e, principalmente, não é alcançável por
todos. A meta de Parmênides. As éguas que me levam até onde os meu desejo quer
chegar me acompanharam, após me conduzirem e me colocarem no caminho que diz
muitas coisas, que pertence a divindade e que conduz o homem que não sabe a
todos os lugares. Para lá fui levado. As jovens indicam aquilo que impulsiona a
verdade. De fato para lá me levaram as sagazes éguas, tirando meu carro, e as
jovens a indicar o caminho. O eixo do meão soltava um silvo agudo,
incandescendo-se, porque premido entre dois rotantes, círculos de um lado e de
outro, enquanto apressavam o passo, ao me acompanhar, as jovens Filhas do Sol,
após deixar as Casas da Noite, em direção à luz, retirando com as mãos os véus
da cabeça. A porta simboliza a passagem do erro (a escuridão) para a verdade da
luz. Lá está a porta das veredas da Noite e do Dia, tendo nos dois extremos uma
arqui trave e umbral de pedra; e a porta, erguida no Éter, é fechada por
grandes batentes, dos quais a Justiça, que muito pune, tem as chaves qua abrem
e fecham. A Verdade que Parmênides comunica é fruto de uma revelação divina (a
passagem através da porta sagrada. As jovens, então, dirigem-lhe suaves
palavras, e sutilmente a persuadem a que os ferrolhos sem tardar removesse da
porta. E logo esta, ao se abrir, dos batentes fez uma vasta abertura, fazendo
girar nos gonzos, em sentido inverso, os brônzeos umbrais ajustados com pregos
e com ombreiras. Logo, por lá, através da porta, direto para a estrada mestra,
as jovens levaram carro e éguas. A deusa justiça personifica as noções de
racionalidade, necessidade e destino. E a deusa benévola me acolheu, e com a
sua mão a minha mão direita tomou, e assim começou a falar, dizendo-me: O
jovem, companheiro de imortais boleeira, tu, que chegas conduzido pelas éguas à
nossa morada, alegra-te, pois não foi infausto (infelicidade, desafortunado) o
destino que te fez percorrer este caminho (de fato ele está fora da via seguida
pelos homens), mas a lei divina e a justiça. A Verdade é, metaforicamente, uma
esfera: homogênea, compacta, única e sempre igual a si mesma. É preciso que tu
tudo aprendas; o sólido coração da bem redonda Verdade e as opiniões dos
mortais, nas quais não há verdadeira certeza. E, no entanto, também isso
aprenderás; coma as coisas que parecem deviam verdadeiramente ser, sendo todas
em todos os sentidos. Ser é o termo fundamental do pensamento filosófico
ocidental. A sua ambiguidade nasce do fato de poder ser usado em dois modos
distintos: como cópula, ou seja, com forma verbal ligada a um sujeito (Sócrates
é ... ), ou, então, em absoluto, tornando-se ele mesmo sujeito; o Ser
(que por sua vez é ou não é). A possibilidade de usar uma palavra como
atributo ou em absoluto não é exclusividade do verbo ser; outras noções podem
sofrer o mesmo tratamento linguístico. Por exemplo, o termo Belo pode ser
entendido como adjetivo ou como substantivo (o Belo, em absoluto). Ontologia ou
Metafísica. Ambas definem o estudo do Ser em geral. O mundo é feito de coisas
multíplices, mas todas, enquanto são, participam da categoria do existir, ou
seja, do Ser. A Metafísica, prescindindo dos aspectos acidentais presentes em
todas as coisas, estuda o Ser enquanto Ser. As posições podem ser diferentes,
porque, como Parmênides, pode-se colocar a hipótese da Unicidade do Ser
(Monismo), a sua Duplicidade (Dualismo de ideia realidade para Platão, mente
corpo para Descartes) ou, ainda, o Pluralismo Metafísico proposto por Aristóteles.
Verdade e Opinião. A contraposição posta por Parmênides entre Verdade
(Aletheia) e opinião (Doxa) tornar-se um tema clássico do pensamento
ocidental. Opinião é a crença que se baseia em dados sensíveis e perceptíveis,
mesmo quando estes parecem certos e evidentes. Verdade é a convicção baseada em
argumentações racionais, mesmo quando essas argumentações parecem em total
oposição às evidências sensíveis. Livro Antologia Ilustrada de Filosofia. Das
origens à Idade Moderna. Beijo. Davi.
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