Sufismo. Amigos leitores passo a transcreve a
pesquisa acadêmica feita pelo professor Carlos Frederico Barboza de Souza com o
título. O SUFISMO COMO DIMENSÃO MÍSTICA DO ISLÃ. PARTE I. Ao final menciono a
referência bibliográfica. Como introdução digo que o Islamismo é sabidamente
uma doutrina religiosa com várias vertentes filosóficas. Os seguimentos de
tradição muçulmana proclamam o amor, a paz, a compreensão, a tolerância e a
fraternidade humana. Esses nobres movimentos da espiritualidade relacionados ao
profeta Maomé em momento algum ganham destaque na mídia, falada, escrita ou nos
telejornais do ocidente. Uma crença devocional que precisamos conhecer para
melhor respeitá-la, valorizando seus conceitos, pressupostos e mistérios.
Entendendo que Allá O Eterno Bem da Humanidade a concedeu como dádiva divina,
dentre tantas, a todos os povos que o buscam com um coração sincero e contrito.
Allá seja conosco nessa leitura. Resumo da dissertação. "Diante da
realidade islâmica contemporânea e buscando estar atento às diversas vozes
presentes no "outro", este artigo tem em vista apresentar de forma
sucinta o que é o Sufismo, pensando-o como uma possibilidade entre muitas de
concretização das crenças islâmicas. Para tal, iniciar-se-á procurando
compreender como a notícia acerca de sua existência chega ao Ocidente, ou seja,
como os ocidentais o "descobrem". A seguir, centrar-se-á na busca de
compreender o Sufismo a partir de sua relação com o Islamismo por meio de suas
fontes primordiais: o Alcorão e o Profeta Muhammad (ou Maomé). Por fim, este
artigo apresentará brevemente alguns elementos que compõem e caracterizam o
repertório de crenças e práticas de várias Escolas Sufis tais como a busca da
Unicidade Divina, a prática meditativa da recitação dos Nomes Divinos e a
submissão à orientação de um "Sayh". " De maneira geral, a mídia
apresenta uma face quase que unilateral acerca do Islã, baseada em algumas compreensões
simplistas do mesmo ou compreensões exclusivas de grupos mais radicais no
seguimento e interpretação da Lei Religiosa e em questões sociopolíticas.
Assim, sendo, na maior parte das vezes, é incapaz de captar sua singularidade
enquanto experiência religiosa e, ao mesmo tempo, a diversidade que compõe o
seu espectro. Infelizmente, muitas pessoas, ao não terem acesso a uma leitura
mais ampla acerca da história e constituição da tradição muçulmana e dos
diversos grupos e concepções que a compõem, acabam desenvolvendo comportamentos
e posições intolerantes e preconceituosas sem ao menos se colocarem a questão
de que a maior parte do preconceito surge do desconhecimento do outro ou de um
conhecimento insuficiente e limitado por paradigmas que não se encaixam em seu
universo de sentido. Diante de tal situação, o primeiro passo é o conhecimento,
pois este é a primeira forma de aproximação da singularidade e alteridade que
constitui o outro enquanto outro. Porém, este esforço de aproximação cognitiva do
diverso pode ter seu resultado malogrado devido às perspectivas com que uma
pessoa se mune na realização de tal tarefa. Portanto, algumas posturas são
importantes e necessárias. Respeito e acolhida ao outro, aceitando-o como um
ser distinto e valorizando sua alteridade, que em si é uma riqueza, pois aponta
para a liberdade humana capaz de construir diversas posturas frente ao cosmo e
á realidade sócio político cultural, indicando a possibilidade de que se pode
ser diferente, de que não se é "obrigado" a ser sempre do mesmo
jeito. Além do mais, o contato com esta riqueza que a diversidade propicia gera
uma aprendizagem sobre si mesmo e sobre o locus de onde se parte e no qual cada
um se situa. Também se faz necessário munir-se de humildade, reconhecendo-se pequeno
diante da infinitude absoluta do Sagrado que ultrapassa as crenças de cada
tradição religiosa. Uma atitude como esta pode propiciar uma busca sincera da
Verdade que está para além das tematizações acerca do Divino que cada religião
elabora ou se percebe inspirada a elaborar. Assim, novas e inusitadas
manifestações compreensões acerca da própria tradição religiosa e acerca das
manifestações do Sagrado são possibilidades. Por fim, faz-se necessário
munir-se de gratuidade, pois não é uma busca de conhecimento acerca do outro
para convertê-lo, ou seja, torná-lo semelhante a nós e acabar com a diferença.
Ouvir a voz do "outro" significa entrar na relação face a face com
ele e além dos interesses pessoais de quem com ele estabelece interlocução sócio
político cultural; e permitir, assim, a revelação de seu rosto às concepções
preconcebidas e ao sistema dominante. Diante da realidade Islâmica
contemporânea e buscando estar atento às diversas vozes presentes no outro,
este artigo tem em vista apresentar de forma sucinta o que é o Sufismo,
pensando-o como uma possibilidade; entre muitas, de concretização das crenças
Islâmicas. Para tal, iniciar-se-á procurando compreender como a notícia acerca
de sua existência chega ao Ocidente, ou seja, como os ocidentais o "descobrem".
A seguir centrar-se-á na busca de compreender o Sufismo a partir de sua relação
com o Islamismo por meio de suas fontes primordiais: o Corão ou Alcorão (livro
sagrado dos muçulmanos) e o profeta Muhammad ou Maomé. Por fim, este artigo
apresentará brevemente alguns elementos que compõem e caracterizam o repertório
de crenças e práticas de várias Escolas Sufis. A Descoberta do Sufismo pelo
Ocidente. O Sufismo tem uma longa história e é cercado de um certo interesse
pelo mundo ocidental. Já na Idade Média, o contato entre cristãos e árabes
ocorreu mediado pela filosofia. Textos de origem árabe judaica provocarão uma
transformação no pensamento ocidental: novos métodos, novos conhecimentos,
novos problemas, que exigirão um esforça enorme de razão cristã. O próprio
pensamento Aristotélico chega ao ocidente, de forma sistemática e sob uma ótica
neoplatônica, por meio do filósofo persa Avicena (980-1037). Depois, os que
continuaram a trazer a obra aristotélica para o Ocidente foram os tradutores,
dentre os quais tiveram um papel significativo o Collegium de Toledo, fundado
pelo arcebispo Raymond de Sauvetat (1126-1151), e que traduziu o texto
aristotélico a partir de versões siríacas e árabes. Não se pode esquecer também
o intenso debate no seio da cristandade com o chamado "averroismo
latino", movimento que interpretava Aristóteles a partir do prisma de
Averrois (Ibn Rusd) e tinha como seus principais representantes Boécio de Dácia
(1200-1299) e Siger de Brabante (1240-1284). Mais tarde, o catalão Raimundo Lúlio
(1316) parecia haver sofrido uma influência dos místicos Sufis. Também
Joinville chanceler de Luis IX, levou em 1638, levou para a Europa o
conhecimento da figura de Rab a Al Adawiyya, no final do século XIII. No
século XVII, em 1638, Fabricius, da Rostoch University, editou e traduziu
pela primeira vez o poema do místico egípcio Ibn al Farid. E em 1651, Adam
Olearius (1599-1671) fez a primeira tradução para o alemão dos livros favoritos
da intelectualidade européia. Porém, é principalmente a partir da era moderna
que o interesse de intelectuais do ocidente pelo Sufismo aumenta, pois a
modernidade é o marco a partir do qual surge a preocupação ocidental mais
ampla. A motivação desta curiosidade se relaciona com o progressivo
empreendimento colonial, mormente à medida que este vai se tornando, em termos
políticos, um dos principais escopos das nações europeias. O Sufismo como
Dimensão mística do Islã. 1. O intuito de conhecer a religião dos povos
"colonizados" era propiciar um melhor meio de dominá-los, pois muitos
de seus mestres possuíam, em vários países, lugar de destaque e, em outros,
muitas rebeliões estavam associadas a suas lideranças. Para isto, investiu-se
em especialistas sua língua e cultura, o que gerou vários volumes de estudos e
traduções de vários de seus textos, além de gerar uma especialidade científica:
o orientalismo. 2. Assim, "Naqueles ambientes, o estudo do Sufismo se
tornava uma via mediana entre a constituição de um dossiê policial e a análise
de cultos perigosos". O início dos estudos ocidentais modernos sobre o
Sufismo se encontra ao redor do século XVIII, quando se criaram os conceitos
fundamentais que condicionaram a compreensão a seu respeito, e se estende pelo
século XIX. Os primeiros trabalhos se baseiam nos relatos fragmentários de
viajantes europeus pelos territórios árabes e que viam os Sufis como um grupo
exótico e referindo-se vagamente ao Islã. Sua terminologia sublinhava o
elemento bizarro e os comportamentos que mais se distanciavam dos
comportamentos europeus. Neste sentido, os termos mais utilizados para se
referir a seus adeptos foram a palavra árabe faqsr e a persa dervish, que
significam, ambas, pobre. Porém, a utilização destes termos também era marcada
pelo exotismo. Para se abordar os dervishes por exemplo, ressaltavam-se os
grupos urlantes, dançantes e rodopiantes. Quanto ao termo faqsr, a confusão era
maior. Além de não se faer a diferenciação entre os ascetas não muçulmanos e os
muçulmanos, o termo se assemelhava à palavra inglesa "faker", falsificador,
o que deixava uma impressão de que os Sufis eram charlatães e impostores. Nesta
ambiência de forte cunho político, surge o termo Sufismo, proveniente de
"Sooffess", forma como os ingleses nomeavam os adeptos da
"Tasawwuf", palavra pela qual estes grupos se autodenominavam em
árabe "Safs e Safiyya". Diferentemente de "faqsr e
dervish", embora se referisse a mesma realidade, este termo
"Sooffess" era carregado de um sentido positivo. Eram admirados por
sua poesia, música e danças. Além do mais, eram vistos como livres pensadores
que tinham pouco a ver com a "rígida fé muçulmana". A palavra
Sufismo, portanto, surge no fim do século XVIII como uma forma de apropriação
de alguns aspectos que os europeus achavam atraentes na cultura oriental.
Porém, seu conhecimento ainda era insuficiente. Não se percebia nitidamente sua
relação como o Islã, além de se associá-lo, muitas vezes, ao Hinduísmo e
cristianismo. O primeiro livro escrito sobre o Sufismo por um ocidental foi o
tratado do teólogo alemão Tholuck (1799-1877). Este livro, escrito em latim e
publicado em 1821, reconhece o papel dos ingleses na "descoberta" do
Sufismo e afirmava a relação débil entre este e o Islã. Citando um registro
missionário de 1818, no qual se afirmar a existência de um número ao redor de
oitenta mil pessoas na Pérsia (atual Irã), chamados Sufi, que cerca de 10 ou 12
anos atrás, abertamente repudiou o maometismo, ainda retrata o desejo ocidental
de separar sua realidade da religião islâmica. Segundo Carl W. Ernst
(1950- ), este desejo é presente também na leitura que Tholuck faz
do mesmo, imprimindo-lhe conceitos bem ocidentais como Panteísmo e Teosofia.
Embora Tholuck reconheça a existência junto a Muhammad (Maomé) de seguidores
que cultivavam elementos do que mais tarde seria chamado de Sufismo, ele
acredita que havia se distanciado das propostas originárias do Profeta. O
principal problema destas primeiras leituras é que, ao separar o
"Tasawwuf" do Islã, não reconhecem o papel fundamental que tem o
Corão ou Alcorão, o Profeta, a Sarsa e os ritos islâmico para sua
espiritualidade mística. Porém, após estes estudos, a aproximação aos textos
Sufis começa a crescer e um número maior deles passa a ser traduzido ou editado
em suas línguas originais, seja em países muçulmanos ou ocidentais. Todavia,
ainda é pequeno o conhecimento deles, principalmente se pensarmos que, segundo
Carl Ernst, escrevendo em 1977, só se tem acesso a menos de dez por cento dos
manuscritos árabes, sem falar nos manuscritos persas, turcos, swahili, urdus e
em outras línguas utilizadas na região. Definição. Segundo Annemarie Schimmel
(1922-2003) o Sufismo é a dimensão mística do Islã. Isto quer dizer que ele se
centra no aspecto esotérico, interior da religião muçulmana, distinguindo-se de
outros grupos que se centram mesmo sem perder sua dimensão de interioridade, no
aspecto exotérico, exterior. É como a contemplação da realidade espiritual que
se distingue da observância estrita da lei religiosa recebida por meio dos
rituais, textos sagrados e autoridades religiosas. Como tradição mística do
Islã, não é uma espiritualidade distinta e aparte dele, pois procura assumir os
seus preceitos, suas leis e pilares, seu livro sagrado, enfatizando, no
entanto, a perspectiva de interioridade que isto tudo propicia. Como nos afirma
Roger Garaudy (1913-2012), o Sufismo é uma dimensão da fé muçulmana: sua
dimensão de interioridade. Qualquer tentativa para fazer dele uma corrente
autônoma, ou uma função separada, degrada-o inevitavelmente ( ... ). Seria,
portanto, falso identificar o Sufismo com a mística cristã ou com a meditação
hindu. Sem dúvida, devido à própria expansão do Islã, houve contatos e trocas
com os padres do deserto e sua mística cristã, como os gnósticos de Alexandria
e os escritos de Plotino (204-270), com as sabedorias da Índia e a ascese
budista. Essa fecundação recíproca pôde enriquecer a visão de cada um, mas as
origens profundas do Sufismo continuam no Corão. Em árabe, o Sufismo é
denominado "Tasawwuf" e deriva da palavra "sãf", que
significa "lã" e se relaciona com a veste utilizada pelos primeiros
Sufis, que era associada, segundo a tradição, à predileção da maioria dos
profetas por tais tipos e vestimentas. Nesta etimologia está a contestação do
mundo, útil particularmente nos primeiros tempos islâmicos, quando as
conquistas muçulmanas criaram um ambiente de fartura e de uma vida voltada aos
prazeres e bens materiais. também se encontra nesta relação com a veste de lã o
valor que os Sufis dão à pobreza e ao despojamento de tudo o que não é Deus. Por
isso, são também chamados de "faqsr" ou "derivsh". Outras
tentativas de explicação associam a origem de seu nome à pureza
"safa" e a banco, "suffa". O primeiro significado
corresponderia a busca de descrever o Sufismo como a "purificação dos
corações", tasfiyat al qulub". Já a palavra "suffa" procura
estabelecer uma correspondência entre os Sufis e o "Povo do Banco ou Povo
do Caminho", um grupo de seguidores do Profeta Maomé que não possuía
moradia e dormia em banco, criando uma comunidade que partilhava tudo entre si.
Também houve a associação, por parte de al Biruni, de "Tasawwuf" à
palavra grega "sophos" sabedoria, o que filologicamente não faz
sentido. O termo "Tasawwuf" significa o processo de se tornar Sufi. É
um termo dinâmico que permite a captação do assumir uma identidade religiosa.
Por isso, a denominação de Sufi pode ser utilizada tanto para quem está
percorrendo o caminho a tarsqa, quanto para quem já alcançou a haqsqa a
doutrina proveniente da iluminação da Verdade. Portanto, os Sufis desenvolvem
um caminho e uma doutrina, nos quais propõem um método de iniciação que prepara
o fiel para o recebimento da bênção "baraka" e, ao mesmo tempo, um
conhecimento esotérico. Porém, mesmo utilizando-se de uma única palavra,
Sufismo, a realidade a qual ele se refere é pluriforma. Ele adquiriu, ao longo
de sua história, configurações variadas, a ponto de não existir uma única
expressão Sufi, mas várias escolas e tradições, com variadas nuanças e
especificidades. Fontes Principais do Sufismo. Fontes Principais do Sufismo. As
fontes da linguagem mística Sufi assim como de sua experiência são variadas,
sendo que as primordiais se referem ao mundo muçulmano. Neste sentido, sua
fonte primordial é o Corão. Os Sufis se caracterizam por uma aproximação ao
Corão baseada numa releitura frequente do mesmo e na sua recitação global, qira
ah, cujas principais características são a recitação em comum e em voz alta,
instituição de sessões regulares de recolhimento e sessões com temas corânicos
para meditação. Estas sessões podem se desenvolver rumo a um tipo de concertos
espirituais ou oratórios. Os muçulmanos devem meditar e recitar continuamente o
Corão com a finalidade de adquirir a ciência da istinb, ou seja, a elucidação
imediata do sentido profundo de cada versículo. Segundo Louis Massignon
(1883-1962), os textos do Alcorão são a base dos termos técnicos do Sufismo.
Assim, são comuns em todo o Sufismo termos como recitação, segredo, mistério do
coração, desvelamento, revelação, irradiação, manifestação. A paz divina que
habita em um santuário ou no coração do crente, arrependimento. Continuamos na
parte II. Abraço. Davi.
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