Budismo.
Livro A Vida de Compaixão. Autor Tenzin Gyatso (1935 - ). O Décimo Quarto
Dalai-Lama. Capítulo IA. OS BENEFÍCIOS DA COMPAIXÃO. Minhas experiências não
têm nada de especial, são apenas experiências humanas normais. Entretanto,
graças ao meu treinamento budista, aprendi um pouco sobre compaixão e com
desenvolver um bom coração. Essa experiência revelou-se muito útil na minha
vida cotidiana. Por exemplo, a região do Tibet, de onde venho, chama-se Amdo, e
geralmente os nativos são considerados pessoas de pavio curto. Então, no Tibet,
quando alguém perde a paciência, as pessoas muitas vezes consideram isso um
sinal de que é originário de Amdo ! No entanto, quando comparo meu temperamento
de hoje ao que tinha entre meus quinze e vinte anos, vejo uma diferença
flagrante. Hoje em dia quase não fico irritado e, mesmo quando isso acontece, a
irritação dura pouco. Esse é um dos benefícios maravilhosos da minha própria
prática e treinamento – agora estou sempre alegre ! Durante a minha vida, perdi
meu país e fui obrigado a tornar-me totalmente dependente da boa vontade das
pessoas. Também perdi minha mãe, e a maioria dos meus preceptores e lamas já
morreu. É claro que são incidentes trágicos, e fico triste quando penso neles.
No entanto, não me sinto soterrado pela tristeza. Rostos velhos, conhecidos,
desaparecem, e surgem novos rostos, mesmo assim mantenho minha felicidade e
minha paz de espírito. Para mim, a capacidade de encarar os acontecimentos com
uma perspectiva mais ampla é uma das maravilhas da natureza humana e acredito
que esteja enraizada em nossa capacidade de compaixão e bondade para com os
outros. Nossa Natureza fundamental. Alguns dos meus amigos me disseram que,
embora o amor e a compaixão sejam maravilhosos e bons, eles não são realmente
relevantes. Nosso mundo, dizem eles, não é um lugar onde tais virtudes tenham
muita influência ou poder. Eles alegam que a raiva e o ódio fazem parte da
natureza humana a tal ponto que a humanidade será sempre dominada por eles. Não
concordo. Nós, humanos, existimos em nossa forma atual há cerca de cem mil
anos. Acredito que durante esse tempo, se a mente humana houvesse sido
controlada principalmente pela raiva e pelo ódio, nossa população teria
diminuído. Mas hoje em dia, apesar de todas as nossas guerras, vemos que a
população humana está maior do que nunca. Isso para mim indica claramente que,
embora a raiva e a agressão sem dúvida estejam presentes, o amor e a compaixão
predominam no mundo. É por isso que o que chamamos de “notícia” compõe-se em
sua maioria de acontecimentos desagradáveis ou trágicos. As atividades de
compaixão fazem parte da vida cotidiana a tal ponto que são consideradas
naturais e, assim, são em grande parte ignoradas. Se considerarmos a natureza
humana básica, podemos ver que ela é mais gentil do que agressiva. Por exemplo,
se examinarmos diversos animais, perceberemos que ele tem temperamentos
pacíficos. Têm uma estrutura corporal correspondente, enquanto os predadores
têm uma que se desenvolveu de acordo com seu temperamento. Comparece o tigre e
o cervo: há grandes diferenças em suas estruturas físicas. Quando conferimos
nossa estrutura corporal com a deles, vemos que nos parecemos mais com os
cervos e com os coelhos do que com os tigres. Até nossos dentes se parecem mais
com os de um coelho, não é? Não se assemelham com os de um tigre. Nossas unhas
são outro bom exemplo. Não consigo sequer fazer mal a um rato só com um
arranhão. É claro que, por causa da inteligência humana, somos capazes de
inventar e usar várias ferramentas, assim como adotar métodos para realizar
aquilo que seria difícil de ser conseguido sem eles. No entanto, por causa de
nossa situação física, pertencemos à categoria dos animais gentis. Afinal,
somos animais sociais. Sem a amizade humana, sem o sorriso humano, nossas vidas
se tornam infelizes. A solidão torna-se insuportável. Essa interdependência
humana é uma lei natural, ou seja, de acordo com a lei natural, dependemos dos
outros para viver. Se em determinadas circunstâncias, porque algo não vai bem
dentro de nós. Nossa atitude se torna hostil em relação aos seres humanos,
nossos semelhantes, dos quais dependemos. Como podemos esperar alcançar a paz
de espírito ou uma vida feliz? Segundo a natureza humana básica, ou lei
natural, a interdependência – dar e receber afeição – é a chave para a
felicidade. Esse fato pode se tornar mais evidente se refletirmos sobre o
padrão básico de nossa existência. De modo a fazer mais do que apenas
sobreviver, precisamos de abrigo, de comida, de parceiros, de amigos, da estima
dos outros, de recursos e assim por diante. Não podemos obter essas coisas
sozinhos, mas dependemos todos dos outros. Suponhamos que uma única pessoa
fosse viver sozinha em um lugar distante e desabitado. Por mais forte, saudável
ou educada que fosse, não haveria nenhuma possibilidade de ela ter uma
existência feliz e gratificante. Se, por exemplo, uma pessoa estiver vivendo em
algum lugar remoto da selva africana e for o único ser humano em uma reserva de
animais. Devido a inteligência e perspicácia dessa pessoa, o melhor que poderá
fazer será tornar-se, talvez, rei da selva. Essa pessoa poderá ter amigos?
Poderá conquistar renome? Poderá se tornar um herói, se desejar? Penso que a
resposta para todas essas perguntas seja definitivamente não. Pois todos esses
fatores só existem em relação a outros seres humanos semelhante. Quando você é
jovem, saudável e forte, algumas vezes pode ter a sensação de que é totalmente
independente e não precisa de mais ninguém. Mas isso é uma ilusão. Mesmo na
flor da idade, pelo simples fato de ser humano, você precisa de amigos, não
precisa? Isso é particularmente verdadeiro quando ficamos velhos. Por exemplo,
no meu caso pessoal, o Dalai-Lama, agora na casa dos sessenta anos, ano de
1995, começa a dar sinais de que a velhice está chegando. Posso ver mais
cabelos brancos surgirem na minha cabeça e estou começando a ter problemas nos
joelhos algumas vezes quando me levanto ou me assento. Conforme ficamos velhos,
precisamos cada vez mais da ajuda dos outros. É essa a natureza de nossas vidas
como seres humanos. Em pelo menos um sentido, podemos dizer que os outros são
realmente a principal fonte de todos as nossas experiências de alegria,
felicidade e prosperidade. Não apenas no que diz respeito ao nosso trato
cotidiano com outras pessoas. Podemos ver que todas as experiências desejáveis
que valorizamos ou às quais aspiramos dependem da cooperação e da interação com
os outros. É um fato óbvio. Do mesmo modo, do ponto de vista de um praticante
do budismo, muitos dos altos níveis de realização que você pode alcançar e do
progresso que faz em sua jornada espiritual. Dependem da cooperação e da
interação com os outros. Além disso, no estágio da iluminação completa, as
atividades de compaixão de um buda só podem surgir espontaneamente em relação à
outros seres, por serem os receptores e beneficiários dessas atividades
iluminadas. Mesmo de um ponto de vista totalmente egoísta – querer apenas nossa
própria felicidade, conforto e satisfação na vida. Sem consideração pelo
bem-estar dos outros. Ainda argumentaria que a realização de nossas aspirações
depende da existência deles. Por exemplo, para poder trapacear, você precisa de
alguém que seja o objeto de sua ação. Todos os eventos e incidentes da vida
estão tão intimamente ligados ao destino dos outros que uma única pessoa
sozinha não pode sequer começar a agir. Muitas atividades humanas comuns, tanto
positivas quanto negativas. Não podem ser concebidas separadamente da
existência de outras pessoas. Por causa dos outros, temos a oportunidade de
ganhar dinheiro, se é isso que desejamos da vida. Do mesmo modo, apoiando-se na
existência dos outros, a mídia torna-se capaz de criar fama ou desgraça para
alguém. Sozinho, é impossível criar qualquer fama ou desgraça, por mais alto
que você grite. O máximo que conseguirá fazer é criar um eco de sua própria
voz. Assim a interdependência é uma lei fundamental da natureza. Não apenas as
formas de vida mais avançadas, mas também muitos dos insetos mais diminutos são
seres sociais que. Sem nenhuma religião, lei ou educação, sobrevivem graças à
cooperação mútua baseada em um reconhecimento inato da relação existente entre
eles. O nível mais sutil de fenômenos materiais também é governado pela
interdependência. Todos os fenômenos, desde o planeta onde vivemos até os
oceanos, nuvens, florestas e flores que nos cercam. Surgem dependentes de
padrões sutis de energia. Sem sua interação adequada, eles se dissolvem e se
deterioram. Livro A Vida de Compaixão. Abraço. Davi
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