Teosofia. Livro
As Revelações Secretas da Religião Cristã. Autora Anne Besant (1847-1933). O
CRISTO MÍTICO E O CRISTO MÍSTICO. Ela faz uma reflexão sobre O Cristo Místico.
Segue o texto. "Chegamos, agora, ao sentido mais profundo da história do
Cristo, sentido que lhe dá o verdadeiro poder sobre o coração humano.
Aproximamo-nos desta inesgotável vida que brota das profundezas de invisível
manancial, cuja esplêndida corrente se origina daquele que a representa e, pela
virtude deste batismo, todos os corações procuram pelo Cristo e sentem mais
fácil rejeitar os fatos históricos do que negar o que reconhecemos
intuitivamente como uma verdade essencial e suprema de sua vida divina. Vamos
transpor o pórtico sagrado que dá acesso aos Mistérios, e assim podemos
levantar uma ponta do véu que oculta o santuário aos nossos olhos. Como já
vimos, encontramos por toda a parte, mesmo nas épocas remotas, a existência de
uma doutrina secreta que é transmitida a candidatos aceitos, sob condições
severas, pelos Mestres de Sabedoria. Eram estes candidatos iniciados nos
Mistérios, nome que compreendia, na antiguidade, tudo o que há de mais espiritual
em religião, de mais profundo em filosofia, de mais precioso em ciência. Por
estes Mistérios, passaram todos os grandes Instrutores dos tempos antigos,
entre os quais os maiores foram os Hierofantes. Os que se destinavam a falar à
humanidade dos mundos invisíveis, já tinham passado o limiar da Iniciação e
aprendido o segredo dos lábios dos Santos Seres; todos vinham acompanhados da
mesma história, traziam as mesmas versões dos mitos solares, idênticos em sua
Essência, embora diferentes pela cor local. Esta narração é, em princípio, a
descida do Logos ao seio da matéria. É com razão que o Logos tem por símbolo o
Deus Sol, porque o Sol é seu corpo e Ele é, muitas vezes, chamado "O que
habita no Sol". Sob um destes aspectos, o Cristo dos Mistérios é o Logos descendo
à matéria, e o grande Mito do Sol é esta suprema verdade sob a forma do
ensinamento popular. Como sempre acontece, Instrutor Divino, que traz a
Sabedoria Antiga e novamente a proclama ao mundo, é considerado como uma
manifestação especial do Logos, e o Jesus das Igrejas torna-se gradualmente o
centro das narrações que pertencem a este Ser Sublime. Jesus identificou-se
assim, na nomenclatura cristã, com a Segunda Pessoa da Trindade, o Logos ou
Verbo Divino, e as grandes datas de que fala o Mito do Deus Sol tornaram-se
datas da história de Jesus, considerado como a Divindade Encarnada, como o
Cristo Místico. Assim como, no universo, ou macrocosmo, o Cristo dos Mistérios
representa o Logos, a Segunda Pessoa da Trindade, também, no homem, ou
microcosmo, Ele representa o segundo aspecto do Espírito Divino no homem,
chamado, por esta razão, o Cristo. O segundo aspecto do Cristo dos Mistérios é,
portanto, a vida o Iniciado, a vida que se abre ao postulante, após a primeira
grande Iniciação que assinala o nascimento do Cristo no homem. No decorrer
dela, o Cristo nasce no homem, e, mais tarde, nele se desenvolve. Para tornar
isto mais inteligível, é necessário considerar as condições impostas ao
candidato que se apresenta à Iniciação e também a natureza do espírito no
homem. Somente os bons, humanamente falando, os que se conformam com a lei de
amor de uma maneira absoluta, poderiam ser considerados como candidatos à
Iniciação. Puros, santos, sem mancha, sem pecado, vivendo sem transgressão,
tais são os diversos nomes que lhes eram aplicados. Além disso, deviam ser
inteligentes, com faculdades mentais bem desenvolvidas e exercitadas. A
evolução que, nas vidas sucessivas, tem por teatro o mundo; o desenvolvimento e
a submissão das faculdades intelectuais, das emoções, do senso moral; as lições
das religiões exotéricas; o cumprimento dos deveres como meio de
aperfeiçoamento; os esforços para ajudar e elevar o próximo, tudo isto
constitui a vida ordinária do homem que evolui. Quando já executou tudo isto,
tornou-se "bom", o Christos dos gregos, e esta qualidade deve ser
adquirida antes de poder tornar-se o Christos, o Ungido. Depois de ter chegado
a viver uma vida virtuosamente exotérica, está em condições de ser candidato à
eotérica, para começar a preparar-se à Iniciação, isto é, a satisfazer
determinadas condições. Estas condições mostram as qualidades que devemos
adquirir e, enquanto lutamos para incorporá-las em nós, já pisamos, conforme
uma expressão empregada, no Caminho da Provação, a Senda que leva a Porta Estreita,
que dá acesso ao Caminho Estreito, ao Caminho da Santidade, ao Caminho da Cruz.
Não é indispensável que o candidato desenvolva estas qualidades de um modo
perfeito, mas deve tê-la bastante adiantadas antes que o Cristo possa nascer em
si, preparando, assim, a morada pura desta Criança Divina que vai crescer
dentre dele. A primeira destas qualidades, todas mentais e morais, é o
Discernimento. O Discernimento significa a distinção entre o Eterno e o
Temporário, entre o Real e o Ilusório, entre o Celeste e o Terrestre. As coisas
visíveis são por pouco tempo, mas as invisíveis são eternas, diz o apóstolo (II
Coríntios 4:18). Os homens são vítimas de uma ilusão permanente causada pelo
mundo visível que os impede de perceber o invisível. O postulante deve aprender
a distinguir entre estes dois mundos; o que é irreal, para o mundo, deve
tornar-se real para ele, porque é a única maneira de caminhar pela fé e não com
a vista (II Coríntios 5:7). É assim, ainda, que o homem se torna um daqueles de
quem fala o apóstolo neste versículo " o alimento sólido é para os homens
feitos, por terem na prática exercitado as faculdades de discernir o que é bom
e mau (Hebreus 5:14). O sentimento da falta de realidade deve produzir nele o
Desgosto pelo ilusório e passageiro, estes ranços da existência, impróprios
para satisfazerem a fome senão dos porcos (Lucas 15:16). Este estágio é
descrito por Jesus em termos enérgicos: Se alguém vier a mim e não aborrecer
seu pai, sua mãe, sua mulher, filhas e irmãos, e ainda também sua própria vida,
não pode ser meu discípulo (Lucas 14:16). Dura é, na verdade, está sentença,
mas deste aborrecimento nascerá um amor mais profundo, mais verdadeiro; é
necessário passar por ele para atingir a Porta Estreita. O postulante deve, em
seguida, aprender a dominar seus pensamentos e, por eles, fazer-se senhor das
suas ações, pois que, com a visão interior, o pensamento e a ação fazem um só
todo. Quem olhar para uma mulher com desejo, já cometeu com ela o adultério em
seu coração (Mateus 5:28). É necessário adquirir a faculdade de suportar o mal
com resignação, porque os que aspiram seguir o Caminho da Cruz deverão afrontar
longas e amargas decepções e sofrimentos, suportando-os como se eles vissem
aquele que é invisível (Hebreus 11:27). As qualidades que precedem, devemos
juntar a Tolerância, para ser filhos daquele que faz nascer o Sol sobre os maus
como sobre os bons, fazendo cair a chuva sobre justos e injustos (Mateus 5:45),
discípulo Daquele que pediu aos apóstolos que não impedissem de fazer uso do seu
nome, mesmo a quem não o tomasse como Mestre (Lucas 9:49,60). O postulante deve
ainda adquirir a Fé, para a qual nada é impossível (Mateus 17:20) e o
Equilíbrio descrito pelo apóstolo (II Coríntios 6:8-10). Deve enfim desejar as
coisas que estão no; João alto (Colossenses 3:1) e ansiar com ardor pela
felicidade de ver Deus e de se unir a Ele (Mateus 5:8; João 17:21). Quando já
fez entrar estas qualidades em seu caráter, a pessoa é considerada prestes à
Iniciação, e os Guardiães dos Mistérios lhe abrirão a Porta Estreita. É assim,
mas unicamente assim, que ela se torna candidato pronto para ser aceito.
O Espírito que habita o homem é o dom do Deus Supremo, que em si contém os três
aspectos da Vida Divina (Inteligência, Amor e Verdade) por ser a imagem de Deus.
No curso de sua evolução, começa por desenvolver o aspecto Inteligência, isto
é, suas faculdades mentais, e esta evolução se executa na vida diária. Este
desenvolvimento, levado a um alto grau e paralelamente ao desenvolvimento
moral, conduz o homem à condição de candidato. O segundo aspecto do Espírito é
o Amor; sua evolução é a do Cristo. Nos verdadeiros Mistérios é que se pode
obter esta evolução; a vida do discípulo é o Drama dos Mistérios, e as frases
são assinaladas pelas Grandes Iniciações. Para mostrar os Mistérios no plano
físico, costumava-se representá-lo de um modo dramático, e as cerimônias
copiavam, sob diferentes aspectos, o modelo sempre seguido sobre a Montanha,
porque elas eram sombras, numa época de decadência, das formidáveis Rivalidades
do mundo espiritual. O Cristo Místico é, portanto, duplo, a princípio o Logos,
Segunda Pessoa da Trindade, que desce à matéria, em seguida, o Amor ou segundo
aspecto do Espírito Divino evoluindo no homem. Um representava os processos
cósmicos executados outrora; é a raiz do Mito Solar; o outro representa um
processo que se passa no indivíduo, fase última da evolução humana, que
determinou a aparição, no mito, de novos, e numerosos detalhes; ambos se
encontram na narração dos Evangelhos, sua união nos apresenta a Imagem do
Cristo Místico. Consideremos, primeiro, o Cristo Cósmico, isto é, a Divindade
que se envolve de matéria, a encarnação do Logos, o Deus feito carne. A matéria
destinada a formar nosso sistema solar, tendo sido separada da que enche o oceano
incomensurável do espaço, recebe, da Terceira Pessoa da Trindade, o Espírito
Santo, sua vida que a anima e lhe permite tomar forma. A matéria, condensada,
é, em seguida, modelada pela vida do Segundo Logos ou Segunda Pessoa da
Trindade que se sacrifica, encerrando-se nos limites materiais e assim se
tornando o Homem Celeste, em Seu Corpo todas as formas existem, de Seu Corpo,
todas as formas fazem parte. Tal é o processo cósmico representado
dramaticamente nos Mistérios; nos verdadeiros Mistérios é mostrado tal como se
deu no espaço; nos Mistérios; nos verdadeiros Mistérios é mostrado tal como se
deu no espaço; nos Mistérios do plano físico é representado por meio de métodos
mágico ou outros, e para certos detalhes mesmo por atores. Os processos são claramente
indicados na Bíblia. Quando o Espírito de Deus se movia sobre as águas, nas
trevas que estavam na face do abismo (Gênesis 1:1,2), o imenso abismo da
matéria não tinha forma alguma, estava vazio no princípio. A forma lhe foi dada
pelo Logos, a Palavra, da qual se escreveu: Todas as coisas foram feitas por
Ela, e nada foi feito sem Ela (João 1:3). Como disse Charles Webster Leadbeater
(1854-1934) em termos admiráveis: "O resultado desta primeira grande
emanação é o aceleramento dessa admirável e gloriosa vitalidade, que
interpenetra toda matéria, por mais inerte que ela apareça aos nossos
imperfeitos olhos físicos. Eletrizados por essa vitalidade, os átomos dos
diversos planos desenvolvem toda espécie de atrações e repulsões, até então
atentes, e entram em combinações mais variadas". Só quando termina o
trabalho do Espírito, o Logos, o Cristo Cósmico Místico, pode revestir-se de
matéria; entra, então verdadeiramente, no cio da Virgem, no seio da Matéria
ainda virgem e improdutiva. Esta matéria fora vivificada pelo Espírito Santo,
que, pairando acima da Virgem, nela verteu sua vida, preparando-a, assim, para
receber a vida do Segundo Logos. Este toma-a, então, para veículo de Sua
energia. É assim que o Cristo se encarna e se faz carne, "Você não desprezou
o seio da Virgem". Nas traduções latina e inglesa do texto original grego
do Símbolo de Niceia, na passagem que exprime o período da descida do Cristo,
as preposições foram trocadas e, com elas, o próprio sentido. O texto original
diz: "e foi encarnado do Espírito Santo e da Virgem Maria, enquanto que a
tradução diz: "e foi encarnado pelo Espírito Santo, da Virgem Maria".
O Cristo não se reveste apenas da matéria virgem, mas também da matéria já
impregnada, palpitante de vida do Terceiro Logos (o Espírito Santo); e de tal
forma que a vida e a matéria o envolvem como de uma dupla vestimenta. Tal é a
descida do Logos na matéria, descrita como o nascimento do Cristo de uma
Virgem; ela se torna, no Mito Solar, o nascimento do Deus Sol, no momento em
que se levanta o signo Virgo. Então começa a ação do Logos sobre a matéria. No
Mito, o símbolo deste período primitivo é a infância do Herói. O majestoso
poder do Logos curva-se a todas as debilidades da infância, manifestando-se
quase nada nas formas frágeis de que ela é a alma. A matéria aprisiona e parece
querer sufocar seu Rei criança, cuja glória é velada pelos limites impostos por
Ele mesmo. Lentamente, Ele a modela para um destino sublime. Ele a conduz à
maturidade e estende-se sobre a cruz da matéria, a fim de poder derramar, da
cruz, todas as energias da Sua vida sacrificada. Eis o Logos do qual Platão
(428 AC 347) diz que é como uma cruz estendida sobre o universo; o Homem
Celeste de pé no espaço, os braços abertos para abençoar; o Cristo crucificado,
cuja morte na cruz da matéria impregna toda a matéria de Sua Vida. Parece morto
e sepultado, mas se levanta, revestido da própria matéria no seio da qual
parecia ter sucumbido, e transporta ao céu Seu corpo material, agora radioso,
onde recebe a vida que emana do Pai, tornando-se o veículo das vidas humanas
imortais. É a vida do Logos que forma a vestimenta da alma humana; esta
vestimenta lhe é dada para que o homem viva através das idades e alcance
"o estado de homem feito", atinja a Sua própria estatura. Somos, na
verdade, revestido por Ele, a princípio materialmente, depois espiritualmente.
Ele sacrificou-se para levar muitos dos seus filhos à glória e, por isso, está
sempre conosco até o fim das idades. A crucificação de Cristo é, portanto, uma
parte do grande sacrifício cósmico. A representação alegórica desta
crucificação, nos mistérios do plano físico, e o símbolo sagrado do homem
crucificado no espaço, se materializam a ponto de tornar-se uma verdadeira
morte sofrida na cruz e em um crucifixo trazendo um ser humano expirando. Foi
então que esta história, hoje a de um homem, foi aplicada ao Instrutor Divino,
Jesus, e se tornou a história de sua morte física, enquanto que o nascimento da
criança de uma virgem, a infância cercada de perigos, a ressurreição e ascensão
tornaram-se igualmente incidentes de Sua vida humana. Os Mistérios
desapareceram, mas suas representações grandiosas e empolgantes da obra cósmica
executada pelo Logos realçaram a figura venerada do Instrutor da Judeia; O
Cristo Cósmico dos Mistérios fica, assim, sob os traços do Jesus Histórico, a
Figura Central da Igreja Cristã. Há outro fato dá a História do Cristo um
caráter de fascinação Suprema; é que, nos Mistérios, Ele é ainda um Cristo,
intimamente ligado ao coração humano, O Cristo do Espírito humano, o Cristo que
existe em cada um de nós, que aí nasce e ai vive, é crucificado, ressuscita
dentre os mortos e sobe ao céu, no meio dos sofrimentos e do triunfo de todo o
"Filho no Homem". A vida de todo o Iniciado nos verdadeiros
Mistérios, nos Mistérios Celestes, está consignada, em suas grandes linhas, na
biografia dos evangelhos. Eis porque São Paulo fala, como já vimos, do
nascimento, da evolução e da completa maturidade do Cristo no discípulo. Todo
homem é potencialmente um Cristo; e o desenvolvimento, nele, da vida do Cristo,
segue, de um modo geral, a narração dos Evangelhos nos incidentes principais,
mas estes, com vimos, têm um caráter universal e não particular. Cinco grandes
Iniciações se sucedem na vida de um Cristo; cada uma arca um grau atingido, em
seu desenvolvimento, pela Vida do Amor. Estas Iniciações são ainda hoje
concedidas como o foram no passado; a última indica o triunfo final do Homem
que, atingindo a Divindade, já ultrapassou o nível da humanidade, tornando-se
um Salvador do Mundo. Acompanhemos a história desta carreira ou curso que, sem
cessar, se repete no domínio das experiências espirituais e contemplemos o
Iniciado reproduzindo em sua própria vida a existência do Cristo. A primeira
grande Iniciação marca o nascimento do Cristo no discípulo, que realiza pela
primeira vez, em si mesmo, a efusão do Amor Divino e experimenta esta
transformação, estranhamente maravilhosa, na qual ele se sente um com tudo o
que vive. É o segundo nascimento com o qual se regozijam as hostes celestiais,
pois o discípulo nasce no "Reino de Deus" com uma criancinha. Tais
são os nomes sempre dados aos novos Iniciados. Assim o entendia Jesus, quando
dizia: Se vocês não se tornarem criancinhas, não irão entrar no Reino dos Céus
(Mateus 18:3). Certos autores cristãos do começo de nossa era dizem, em termos
significativos, que Jesus "nasceu em uma caverna", o estábulo dos
Evangelhos. Ora, a "Caverna da Iniciação" é um termo antigo bastante
conhecido, e é sempre lá que nasce o Iniciado. Acima da caverna, onde está a
criancinha, brilha a Estrela da Iniciação, esta estrela que resplandece sempre
no Oriente quando nasce um Cristo criança. Cada uma destas crianças está
cercada de perigos e ameaças, perigos estranhos aos quais não estão sujeitas as
outras crianças, porque ela é ungida pela confirmação do novo nascimento e por
isso as Potências Tenebrosas do mundo invisível procuram sua perda. Apesar
destas provações, atinge a idade viril, porque o Cristo, tendo nascido, não
pode morrer, tendo que terminar sua evolução. Sua vida se expande em beleza e
força, crescendo em sabedoria e espiritualidade, até o momento da segunda
grande Iniciação, o Batismo do Cristo pela água e pelo Espírito, que lhe
confere os poderes necessários a um Instrutor destinado a percorrer o mundo e a
executar a tarefa do "Filho Bem Amado". Então, o Espírito divino
desce, em ondas, sobre ele e a glória do Pai invisível o ilumina com sua pura
luz. Mas, ao deixar este lugar bendito, é conduzido pelo Espírito ao deserto e
de novo exposto à prova de tentações terríveis. Os poderes do Espírito, ao se
desenvolverem nele, despertam os Setes Tenebrosos que se esforçam em lhe
dificultar o caminho: eles empregam, para isto, estes mesmos poderes,
convidando-o a servi-los para sua própria salvação, em lugar de repousar em seu
Pai com paciente confiança. Nestas transições rápidas e bruscas que as provas
trazem, sua fé e sua força não vacilam e, ao sussurro malicioso do Tentador
encarnado, sucede sempre a voz consoladora do Pai. Vencedor destas tentações, volta
ao seio dos homens, a fim de consagrar seus poderes ao serviço dos que sofrem,
poderes que não quis empregar em seu próprio benefício, recusando-se em mudar
em pão a pedra bruta para vencer a própria fome, antes alimentando com alguns
pães a cinco mil homens sem contar mulheres e crianças. Sua vida de incessante
serviço atravessa, então novamente, um curto período de glória, ao galgar uma
montanha, a Montanha Sagrada da Iniciação. Lá é transfigurado e encontra alguns
dos seus predecessores, Seres poderosos que outrora tinha trilhado o mesmo
caminho. Recebe, assim, a terceira grande Iniciação, e, logo em seguida, a
sombra da sua Paixão se aproxima, estendendo sobre ele o seu manto doloroso;
mas ele volta resolutamente sua face para Jerusalém e, repelindo as palavras
tentadoras dos seus discípulo, vai a Jerusalém, onde o espera o batismo do
Espírito Santo e do Fogo. Após a Natividade, a perseguição de Herodes; após o
batismo, a tentação no deserto; após a Transfiguração, a entrada na última
etapa do Caminho da Crus. É assim que a provocação sempre sucedeu ao Triunfo,
até o fim a ser atingido. A vida de amor não cessa de crescer, sempre mais rica
e mais perfeita, até que a presença luminosa do Filho de Deus se revele no
Filho do Homem; e, ao aproximar-se o momento da batalha, a quarta Iniciação o
leva em triunfo a Jerusalém, de onde Ele contempla o Getsêmani e o Calvário.
Neste instante, está o Cristo pronto a se oferecer no sacrifício da cruz,
prestes a afrontar a agonia do Jardim, onde adormecem aqueles que escolheu,
enquanto ele se debate na mais terrível angústia. Pede, um instante, que o copo
se afaste, mas sua vontade poderosa triunfa. Estende a mão, toma o copo e bebe,
enquanto o anjo o fortifica e consola, como fazem os anjos quando veem o filho
do Homem curvado sob a dor. bebe o copo amargo da traição, do abandono,
renegado de todos, escarnecido e só, no meio de seus inimigos que o insultam.
Caminha para a suprema prova. Torturado pela dor física, ferido pelo espinho
cruel da dúvida, despojado de suas imaculadas vestes, atirado às mãos dos seus
inimigos, desprezado, aparentemente, por Deus e pelos homens, suporta tudo com
paciência e, na angustia máxima, espera resignado o socorro no último transe.
Mas ainda lhe resta o sacrifício da cruz, em que morre a vida da forma, onde
renuncia inteiramente à vida do mundo inferior. Cercado de inimigos triunfantes
e zombadores, sentindo o horror da grande obscuridade que o envolve, sofre o
assalto de todas as forças do mal, e sua visão interior se vela. Encontra-se,
neste momento supremo, só, inteiramente só. Finalmente, seu coração heroico,
esmagado pelo desespero, lança um grito para o Pai que parece tê-lo abandonado.
A alma humana afronta, na solidão absoluta, a intolerável tortura de uma
aparente derrota. Mas, fazendo apelo a toda a sua força indomável, fazendo o
sacrifício da vida inferior, aceitando a morte voluntariamente, abandonando o
corpo dos desejos, o Iniciado desce aos infernos para que possa conhecer todas
as regiões do Universo, onde existem almas pedindo auxílio; os mais deserdados
devem ser atingidos por seu amor infinito. Surgindo, então, do seio das trevas,
ele revê a luz, sentindo-se de novo o Filho, inseparável do Pai. Levanta-se
para a vida que não tem fim, irradiando alegria, com a certeza de ter afrontado
e vencido a morte, sentindo-se bastante forte para prestar a toda a criatura um
socorro infinito, capas de derramar sua vida em toda a alma que luta. Permanece
algum tempo ainda com os discípulos, instruindo-os, explicando-lhes os
mistérios dos mundos espirituais, preparando-os a seguir o caminho que acaba de
percorrer; depois, terminada sua vida terrestre, sobe ao Pai e, por meio da
quinta Grande Iniciação, torna-se o Mestre Triunfante, o traço de união entre
Deus e o home. Tal era a história, vivida nos verdadeiros Mistérios Antigos,
como nos de hoje, história representada sob forma dramática e simbólica nos
Mistérios do plano físico, que apenas levantam uma ponta do véu. Tal é o Cristo
dos Mistérios sob seu duplo aspecto, Logos e homem, cósmico e individual. Como
nos admirar que essa história, vagamente compreendida pelos místicos, sem que
eles a conhecessem, esteja intimamente unida ao coração humano e seja a
inspiração das vidas nobres? O Cristo do coração humano é, quase sempre, Jesus
considerado como o Cristo místico e humano, que luta, sofre, morre e,
finalmente, triunfa. O Homem em quem a humanidade se vê crucificada e
ressuscitada, cuja vitória promete a vitória a todos os que, semelhantes a ele,
sejam fiéis na morte e mais além, o Cristo que jamais será esquecido enquanto o
mundo tiver necessidade de Salvadores e os Salvadores se sacrificarem pela
Humanidade. Ora, nos planos superiores, os símbolos representam igualmente os
objetos e formam um alfabeto pitoresco empregado por todos os autores de mitos,
cada um possuindo um sentido determinado. Um símbolo serve para representar
certo objeto, assim coma as palavras servem para distinguir os objetos entre
si. O conhecimento dos símbolos é, portanto, necessário para ler um mito, pois
os primeiros autores dos grandes mitos foram sempre iniciados habituados a
empregar a língua simbólica, usando símbolos fixo e convenciona. Um símbolo
oferece um sentido principal e diferentes sentidos secundários que se ligam ao
primeiro. O Sol, por exemplo, é o símbolo do Logos, eis um sentido principal.
Mas o Sol assinala também uma encarnação do Logos, ou ainda um qualquer dos
grandes Enviados que o representam momentaneamente, como um embaixador
representa seu Rei. Os grandes Iniciados, encarregados de missões especiais,
que se encarnam entre os homens e com eles vivem durante algum tempo, como Reis
e Instrutores, seriam designados pelos símbolos do Sol. Individualmente
falando, este símbolo não lhes pertence, mas lhes é conferido por sua
dignidade. Todos os que são representados por esse símbolo oferecem certas
particularidades, e se encontram em certas situações conforme seu modo de
atividade no decurso de suas vidas terrestres. O Sol é a sombra física ou, como
é chamado, o corpo do Logos; por consequência, o seu curso anual representa a
atividade dele, embora de modo imperfeito: tal uma sombra que representa os
movimentos do objeto que a produz. O Logos, o Filho de Deus baixando ao plano
material, tem por sombra o curso anual do Sol e está verdade representa o Mito
Solar. Assim, também uma encarnação do Logos, ou de um dos seus grandes
embaixadores, se representará com uma sombra em seu corpo mortal, esta
atividade do Logos. As biografias destes enviados oferecem, então,
forçosamente, pontos idênticos e, ainda mais, a ausência destes pontos
indicaria imediatamente que a pessoa em questão não é um embaixador com plenos
poderes, mas de caráter menos importante. Assim, portanto, o Mito Solar é uma
encarnação onde aparece, em primeiro lugar, a atividade do Logos ou Verbo no
Cosmos e, em seguida, os fatos da vida de um Ser que é, ou uma encarnação do
Logos ou de um dos Seus embaixadores. O Herói do mito é, geralmente,
representado como um Deus ou semideus, e sua carreira será determinada pelo
curso do Sol, por ser este astro a sombra do Logos. A parte do trajeto
percorrida durante a vida humana é a que cai entre o solstício (direção do sol
no espaço quando ele aparece em seu ponto mais distante norte ou sul entre as
estrelas) de inverno, morre no equinócio (época do ano em que o Sol, em seu
movimento próprio aparente na eclíptica, corta o Equador Celeste,
correspondendo a igualdade de duração dos dias e das noites) da primavera e,
vencedor da morte, sobe ao céu. A este respeito é interessante citar o seguinte
fragmento em que o autor, colocando-se no ponto de vista mais geral, encara o
mito como uma alegoria que traduz verdades internas. "A lenda diz Alfredo
de Vigny (1797-1863), é, na maioria das vezes, mais verdadeira que a história,
porque não refere contos incompletos e abortivos, mas o próprio gênio dos
grandes homens e de grandes Nações". Este belo pensamento pode -se aplicar
admiravelmente ao Evangelho, que não é apenas a narração do passado, mas a
verdade de tudo o que existe e existirá eternamente. O Salvador do Mundo será
sempre adorado pelos reis da inteligência, representados pelos Magos. Sempre
Ele multiplicará o pão Eucarístico para alimentar e reconfortar as almas;
sempre, quando O Invocarmos, à noite e no meio da tormenta, Ele virá a nós,
andando sobre as águas, sempre estenderá sua mão para nos ajudar a transpor a
crista das vagas; sempre há de curar nossos males e nos encher de luz; sempre,
para seus fiéis, aparecerá luminoso e transfigurado, sobre o monte Tabor (em
Israel), interpretando a lei de Moisés e moderando o zelo de Elias. Como
veremos, os Mitos estão intimamente ligados aos Mistérios, os quais consistiam,
parcialmente, em mostrar em quadros animados os acontecimentos dos mundos
superiores, que terminam tomando corpo nos Mitos. Nos pseudo (falso) mistérios,
as reproduções incompletas dos quadros animados dos verdadeiros mistérios eram
mesmo representados em um drama e em cenas, por autores. E muitos mitos
secundários são precisamente estes dramas postos em palavras. Nada de mais
claro, nestas linhas, do que a história do Deus Solar; sua vida laboriosa ocupa
os seis primeiros meses do ano solar, sendo os seis últimos um período de
proteção e de conservação gerais; nasce sempre no solstício do inverno, depois
do dia mais curto do ano, à meia noite, 24 de dezembro, quando o signo da
Virgem se eleva acima do horizonte e, nascendo no momento em que surge este
signo, ele é sempre posto no mundo por uma virgem que conserva sua virgindade
após o nascimento da Criança Solar, como a Virgo celeste permanece intacta e
pura, quando, nos céus, dá nascimento ao Sol. A criança é fraca e débil como um
recém nascidos, vindo ao mundo quando os dias são mais curtos e as noites mais
longas(ao norte do Equador); a sua infância é rodeada de perigos, pois neste
instante o reino das trevas é mais longo do que o seu; sobrevive, contudo, a
todos os perigos que a ameaçam, e o dia se alonga a medida que se aproxima o
equinócio da primavera; finalmente, chega o momento de sua passagem, a
crucificação cuja, data varia cada ano. Certas esculturas representam o Deus
Solar rodeado pelo círculo do horizonte; sua cabeça e seus pés tocam o círculo
ao norte, e ao sul, suas mãos estendidas alcançam a leste e a oeste. "Ele
foi crucificado". Em seguida, eleva-se triunfante e sobe ao céu; amadurece
a espiga e a uva, dando sua própria vida para formar sua substância e, por
eles, o corpo dos seus adoradores. O Deus, nascido no alvorecer de 25 de
dezembro, é sempre crucificado no equinócio vernal (diz das plantas cujas
flores desabrocham na primavera) dando sua vida para alimentar seus adoradores.
Tais são os caracteres mais importantes do Deus Solar. A data do nascimento é
fixa, a da morte é variável, e este fato torna-se dos mais significativos,
quando nos lembramos que a primeira responde a uma posição solar fixa e a
segunda a uma posição variável. A Páscoa é uma festa variável, calculada
segundo as posições relativas do Sol e da Lua. Isto seria um modo impossível de
fixar cada ano o aniversário de um acontecimento histórico, enquanto que é um
modo muito natural, ou melhor, inevitável, de calcular uma festa solar. Estas
datas mudáveis não se referem a história de um homem, mas ao Herói do Mito
Solar. Os mesmos acontecimentos se encontram na vida dos diferentes Deuses
Solares, e a antiguidade nos dá inumeráveis exemplos. A Ísis egípcia, como
Maria de Belém, era Nossa Senhora Imaculada, Estrela do Mar, Rainha do Céu, Mãe
de Deus; nós a vemos representada de pé sobre o crescente, coroada de estrelas;
alimenta o jovem Hórus (na mitologia é considerado o deus dos céus. Possuía
cabeça de falcão e corpo de humano, simbolizando a luz o poder e a realiza), e
a cadeira em que está assentada, com o Filho sobre os joelhos, traz uma cruz no
encosto. A Virgo do Zodíaco (relacionado aos signos Escorpião e Leão na cadeia
astrológica) é representada, em certos desenhos antigos, por uma mulher
amamentando uma criança, o que representa o tipo de todas as Madonas futuras
com seus divinos filhos, e de onde se originou o símbolo; essa mulher,
igualmente, é representada tendo em seus braços o divino Krishna (é uma figura
mitológica central do Hinduísmo. Aparece em um amplo espectro de tradições
filosóficas e teológicas hindus, sendo retratado em várias perspectivas: como
um deus do panteão hindu, como uma encarnação de Vishnu ou ainda como a forma
original e suprema de Deus. Krishna é o oitavo Avatar de Vishnu), como também
Milita ou Istar em Babilônia, sempre com a coroa de estrelas, e seu filho Tamuz
nos joelhos. Mercúrio, Hércules, Perseias, os Diosouros, Mitras e Zaratustra
eram todos de nascimento tanto divino como humano. A relação entre o solstício
de inverno e Jesus é igualmente significativo O nascimento de Mitras (ou amigo
é o deus sol, da sabedoria e da guerra na mitologia Persa) era celebrado, no
solstício de inverno, com grandes regozijos. Hórus também nasceu nesta data.
"Seu nascimento é um dos grandes mistérios da religião egípcia. Naqueles
tempos, encontram-se pinturas murais que o representam. Era filho da Divindade.
Pelo natal, exatamente correspondendo a nossa festa, sua imagem era levada fora
do santuário com cerimônias especiais, como em Roma a imagem do Bambino
(criança) é ainda conduzida fora das igrejas, Williamson exprime-se nesses
termos: "Todos os cristãos sabem que 25 de dezembro é, agora, (convencionou-se)
a festa do nascimento de Jesus, mas poucas pessoas sabem que nem sempre foi
assim. Cento e trinta e seis datas diferentes foram escolhidas por diversas
seitas (esse termo é hoje emprego em sentido geral conotativo e não mais no
aspecto estrito denotativo, estando em desuso pela linguagem culta de tradição
ocidental, pois o vocábulo traz insinuação pejorativa e discriminatória)
cristãs. Joseph Barber Lighfoot (1828-1889) coloca este acontecimento a 15 de
setembro, outro em fevereiro ou agosto. Epifânio de Salamina (310-403) menciona
duas seitas, sendo que uma celebrava o Natal em junho, a outra em julho. A
questão foi definitivamente resolvida pelo Papa Júlio I (280-352), em 337, e
São Crisóstomo (347-407), escrevendo em 390, diz: "Este dia, 25 de dezembro,
em Roma, acaba de ser escolhido como o do nascimento de Cristo, a fim de que os
pagãos, ocupados com suas cerimônias (as brumélias, em honra de Baco), deixem
os cristãos celebrarem seus próprios ritos sem serem molestados". Edward
Gibbon (1737-1794), na Decadência e Queda do Império Romano, diz também:
"Os romanos (cristãos), tão ignorantes como seus irmãos com relação a data
do nascimento do Cristo, escolheram, para festejá-la, o 25 de dezembro, no
momento das brumélias do solstício de inverno, nas quais os pagãos celebram
cada ano o nascimento do Sol". Charles William King (1818-1888), em
Gnostic and Their Remains, diz também: "A antiga festa celebrada a 25 de
dezembro, em honra do nascimento do Ser Invencível, e assinalada por grandes
jogos no Circo, foi, depois, transferida para comemorar o nascimento do Cristo,
cuja data certa, como confessam numerosos Padres da Igreja, era então, como
hoje, desconhecida". Em nossos dias, segundo o Cônego Farrar: "Todo o
esforço para descobrir o mês e o dia da Natividade tem sido inútil. Não existem
dados que nos permitam determiná-los, mesmo, de maneira aproximada".
Podemos concluir, do que precede, que a festa do solstício de inverno foi, na
antiguidade, celebrada nos países mais afastados uns dos outros, em honra do
nascimento de um Deus que se chama, quase invariavelmente, um Salvador e cuja
mãe é chamada Virgem Imaculada. Enfim, as notáveis semelhanças de que demos
exemplo, não só entre os nascimentos, como também entre as vidas desses Deuses
Salvadores, são muito mais numerosas para se explicar por uma simples
coincidência". No que concerne ao Buda (563 AC 483), é possível verificar
a maneira pela qual a um Mito se liga um personagem histórico. A história de
sua vida é bastante conhecida e, na maioria das narrações indianas, seu
nascimento é simplesmente o de um homem; mas, segundo a versão chinesa, Ele
(Buda) nasceu de uma Virgem, chamada Maiadevi, como o Mito arcaico fez dele um
novo Herói. Conta-nos Williamson que, entre os povos célticos, se acendem
fogueiras sobre as colinas; estes fogos, que os irlandeses e os montanheses da
Escócia chamam Bheil ou Baaltine, trazem, assim, o nome de Bel, Bal ou Baal, a
antiga divindade dos Celtas (atual França, Itália, Portugal, Espanha e Reino
Unido), o Deus Sol, embora eles sejam, agora, dedicados ao Cristo. Sob este
ponto de vista, a festa do Natal não poderia senão apresentar novos motivos de
regozijo e um caráter mais sagrado, já que os servidores do Cristo, vendo nela
a reprodução de antiga solenidade, a encontrariam no mundo inteiro, desde os
tempos mais remotos. Os sinos de Natal ressoam através da história da
humanidade, e a noite dos tempos nos envia o eco das suas harmonias vibrantes.
Não é a posse exclusiva, mas a aceitação universal que dá o sinal que dá o
sinal distintivo da verdade. A data da morte, como já dissemos, não é fixa como
a do nascimento. A primeira é calculada segundo as posições relativas do Sol e
da Lua no equinócio da primavera, que varia cada ano, e a morte de todos os
Heróis Solares é celebrada nesta época. O animal que simboliza o Herói é o
signo do Zodíaco, no qual o Sol atinge o equinócio vernal; ora este varia
conforme a precessão dos equinócios. Na Assíria, Oanes tinha por signo Pisces,
o Peixe; era considerado por esta forma. Mitra coincide com Tauro. Osíris
era adorado sob a forma de Osíris Ápis ou Serápis, o Touro. Na Babilônia,
Merodache era adoraedeo sob a forma de um Touro, como o era Astarteia, na
Síria. Quando o Sol está em Áries, o Carneiro ou Cordeiro, Osíris é
representado sob a forma do Cordeiro; assim também Astarteia e Júpiter
Ámnon, e é ainda o mesmo animal que se torna o símbolo de Jesus, o Cordeiro de
Deus. Encontra-se por toda a parte esculpido, nas catacumbas (edificação
subterrânea utilizada como sepultura ou depósito de ossos de pessoas mortas), o
Cordeiro como símbolo de Jesus; Ele é quase sempre assim representado
apoiando-se na cruz. Williamson diz a este respeito: "O Cordeiro acabou
por ser representado na cruz, mas foi durante o sexto sínodo de Constantinopla,
reunido em 680, que se decidiu substituir o símbolo primitivo por uma figura
humana crucificada. Este decreto foi confirmado pelo Papa Adriano I (700-795).
O Peixe, símbolo dos mais antigos, é igualmente aplicado a Jesus, e assim Ele é
representado nas catacumbas. A morte e a ressurreição do Herói Solar no
equinócio da primavera, ou perto dele, se encontram tão amplamente difundidas
como seu nascimento no solstício do inverno. É o momento em que Osíris ,
abatido por Tifon, é representado no círculo do horizonte, os braços
estendidos, como um crucificado. Esta atitude indicava primitivamente não o
sofrimento, mas a bênção. Cada ano, no equinócio da primavera, a morte de Tamuz
é chorada na Babilônia e na Síria; igualmente, na Síria e na Grécia para
Adônis, na Frígia para Átis, representado sob a forma de um homem cravado com
um cordeiro aos pés. A morte de Mitra era celebrada e maneira semelhante na
Pérsia, e a de baco e Dionísio, um só e mesmo herói, na Grécia. No México,
encontramos a mesma ideia, como de ordinário, acompanhada da cruz. Em todos
estes países, ao luto pela morte, sucedem-se imediatamente os regozijo pela
ressurreição pela ressurreição. Notemos, a propósito, o interessante fato que a
palavra "Easter" (páscoa em inglês), como verificaram os investigadores,
se deriva de istar, virgem e mãe de Tamuz imolado. É igualmente significativo
observar que o jejum que precede a morte, no equinócio vernal, a quaresma, se
encontra no México, em Babilônia, na Assíria, no Egito, na Pérsia, na Ásia
Menor (Turquia); em certos casos, a sua duração é igualmente de quarenta dias.
Nos pseudos mistérios, a história do Sol era representada sob a forma de um
drama; nos antigos Mistérios, o Iniciado a reproduzia em sua própria vida; eis
por que os Mitos Solares e os grandes fatos da Iniciação se encontram enlaçados
e confundidos. Eis por que, quando Cristo, o Messias, se torna o Cristo dos
Mistérios, se ligam a Ele, renovando, assim, as velhas narrações, e que os mais
recentes Instrutores Divinos representam mais uma vez o Logos Solar.
Então a festa de Sua Natividade torna-se a data imemorial em que o Sol nasceu
de uma Virgem, e a alegria dos exércitos celestes enche o céu da meia noite ,
cantando: "Muito cedo, muito cedo, Cristo nasceu ( ... )". Trata-se
de um verso do cântico de coral Christ Was Born on Christmas Day (Cristo Nasceu
no Dia de Natal) de John Mason Heale. A grande lenda do Sol tendo-se
ligado a pessoa do Cristo, o signo do Cordeiro torna-se o da Sua crucificação,
como o da Virgem ficou sendo o da uSua Natividade. Vimos que, se o Touro era
consagrado a Mitra e o Peixe a Oanes, o Cordeiro o era ao Cristo. A razão é
sempre a mesma: o Cordeiro era o signo do equinócio vernal, na época histórica
em que Ele transpôs o grande círculo do horizonte e foi crucificado no espaço.
Esses Mitos Solares, que se repetem através das idades, cada vez com um
herói de nome diferente, não podem ser ignorados pelo adorador. E quando são
empregados como armas para destruir a majestosa figura do Cristo, é necessário
não negar o fato, mas fazer compreender o sentido profundo dessas narrações e
verdades espirituais, expressas veladamente por estas legendas. Por que
se combinam essas lendas com a história de Jesus? Por que se condensam em torno
dele, personagem histórico? Essas narrações não se referem de modo particular a
um indivíduo chamado Jesus, mas ao Cristo Universal, o homem simbolizando um
Ser Divino e representando uma verdade natural fundamental, a um homem
investido de uma certa função gloriosa, colocado diante da humanidade em certas
condições características, tendo com ela relações particulares que se renovem
de idade em idade, à medida que as gerações se sucedem e as raças se renovam.
Jesus é, portanto, como todos os Seus Predecessores, o Filho do Homem, título
particular e distintivo, o de um ofício e não o de um indivíduo. O Cristo
do Mito Solar era o Cristo dos Mistérios, e nós encontramos no Cristo Mítico o
segredo do Cristo Místico". Livro As Revelações Secretas da Religião
Cristã. Abraço. Davi.
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