sexta-feira, 11 de junho de 2021

EXISTE A VERDADE. PARTE II

 


 

Filosofia. Livro Antologia Ilustrada de Filosofia. Das Origens à Idade Moderna. Por Ubaldo Nicola.   EXISTE A VERDADE. PARTE II. Por Ubaldo Nicola. Os Enganos do Verbo Ser. É possível formular em termos lógicos a ideia de Verdade? A revelação recebida por Parmênides consiste na doutrina do Ser, sintetizada na célebre formula o Ser É, o Não Ser Não É. Toda a argumentação baseia-se na redução da ontologia (o estudo do Ser) à linguística e, assim, a procura da realidade última do mundo coincide com a análise linguística do Verbo Ser. E enquanto aquilo que é pode ser dito, portanto, pensado, aquilo que não é afasta-se, por definição, de qualquer formulação linguística e intelectual. É impossível pensar o nada. No cotidiano, usamos o Verbo Ser de modo impróprio e acabamos por atribuir realidade a condições de ausência, a coisas que não existem; a escuridão e o silêncio, por exemplo, são condições de não ser da luz e do som, portanto, pela lógica, não existem. Somente o Ser pode ser pensado. Pois bem, eu te direi e tu acolhes a minha palavra: quais são os únicos caminhos de busca que se podem pensar; um diz que é e que não é possível que não seja, é a vereda da Persuasão (porque acompanha a Verdade). O Não Ser é uma noção contraditória em si mesma. O outro diz que não é e que é preciso que não seja, eu te digo que esta é uma vereda em que nada se pode aprender. De fato, não poderias conhecer o que não é, porque tal não é factível, nem poderia expressá-lo. Homens com duas cabeças. o Devir é pensável? Todas as vezes em que afirmamos uma negação, ou seja, a existência de uma condição de Não Ser, incorremos em um erro lógico. Por isso o Devir, que Heráclito colocava como fundamento de toda realidade, não existe. Como passagem de uma condição de ser a uma de Não Ser, toda mutação, qualquer que seja a sua espécie, é sempre pura aparência; a verdadeira estrutura do mundo consiste em um ser imutável e eterno. Os homens que usam tanto o verbo Ser quanto o Não Ser acabam por raciocinar com duas cabeças. É necessário dizer e pensar que o Ser É; de fato, o Ser É; o Nada Não É; te exorto a que consideres isso. E, portanto, desse caminho de busca te conservo distante, mas depois, também daquele sobre o qual os mortais que nada sabem seguem vagando, homens de duas cabeças; de fato, é a incerteza que ao seu peito conduz uma desatinada mente. Afirmar a existência do Não Ser leva a paradoxos insolúveis. Estes são arrastados, surdos e cegos ao mesmo tempo, estupefatos, raça de homens sem juízo, para os quais Ser e Não Ser são considerados a mesma coisa e a não mesma coisa; e, portanto, para todas as coisas, há um caminho que é reversível. O Olho que Não Vê. Real é o que é constatável pelos sentidos ou o que é demonstrável pela razão? Os cinco sentidos parecem testemunhar a todo momento a existência de muitas formas do Devir; o movimento dos corpos, por exemplo, parece uma passagem de uma condição de estar (em um lugar) a uma de não estar mais. Cada transformação natural parece poder ser descrita como a passagem de um estado a outro; como, por exemplo, negar que a morte é um Devir? Tudo isso, segundo Parmênides, não demonstra absolutamente que os sentidos enganam. É verdade que a vida cotidiana requer o uso dos órgãos dos sentidos, mas por meios deles não se chega à verdade. A razão, não o olho, vê o real. Não julgues a doutrina do ser com base em sensação, mas, sim com base na lógica racional. Mas afastes desse caminho de busca o teu pensamento, nem o hábito, nascido de muitas experiências, a esse caminho te obrigues a mover o olho que vê, o ouvido que ribomba e a língua, mas julgues com a razão a prova muito debatida que por mim te foi fornecida. E permaneças falando somente sobre o caminho que diz o que é. O Ser é uma esfera bem redonda. Os atributos do Ser não podem ser encontrados por via experimental ou sensorial, mas deduzidos com coerência lógica do próprio conceito de Ser. Isso significa que é impossível que existam todos os modos em que se explica o não ser; o nascimento (como passagem de um estado de não existência ao de existência), a morte (pelo motivo inverso), o movimento como passagem do estar em um lugar a não mais estar, e todas as formas de Devir. O que é será, portanto, por definição, eterno, imperecível, homogêneo. São teses contrárias ao senso comum, que sugerem a evidência do Devir, mas conduzidas com rigor lógico formalmente incontestável. O Ser é Eterno. Não era uma vez, nem será, porque é agora, ao mesmo tempo, uno, contínuo. Que origem poderás dele encontrar? Como e de onde teria nascido? Do não ser não te concedo dizê-lo ou pensá-lo, porque não é possível dizer nem pensar o que não é. O Ser não pode ser gerado de um Não Ser. Que necessidade te constrangeria a nascer, depois ou antes, se derivasses do nada? Por isso é necessário que sejas por inteiro, ou que não sejas por nada. Não existe uma terceira possibilidade o Ser é ou Não é. E tampouco do ser se originará a força de uma certeza que nasça de algo que esteja ao lado de uma outra coisa. Por essa razão nem o nascer nem o perecer concedem a ele a justiça, livrando-o das cadeias, mas prendendo-o fortemente. A decisão quanto a tais coisas reside nisto; é ou não é. Decidiu-se, portanto,  como é necessário, que um caminho deve ser abandonado, por ser impensável e inexprimível, porque não é o caminho da verdade e que, no entanto, o outro é, e é verdadeiro. o Ser não pode estar submetido ao Devir. E como o ser poderia existir no futuro? E como poderia ter nascido? De fato, se nasceu, não é, e tampouco é, se deverá ser no futuro. Assim, o nascimento se apaga e a morte permanece ignorada. O Ser é indivisível, não pode ser decomposto em partes. E tampouco é divisível, porque é inteiramente igual, nem existe em algum lugar um de mais que possa lhe impedir de ser unido, nem um de menos, mas todo inteiro está pleno de ser. Portanto, é continuamente todo inteiro; o Ser, de fato, se estreita com o Ser. O Ser é sempre idêntico a si mesmo. Mas imóvel, dentro dos limites de potentes liames, é sem um princípio e sem um fim, pois nascimento e morte foram expulsos para longe e os repeliu uma verdadeira certeza. E permanecendo idêntico e no idêntico, em si mesmo jaz, e deste modo lá se mantém, firme. Ao Se nada pode faltar, deve, portanto, ser perfeito. De fato, necessidade inflexível o mantém nos liames do limite, que o estreita todo em volta, pois está estabelecido que o Ser não seja sem complemento; de fato, não carece de nada; se, no entanto, o fosse, careceria de tudo. Todas as palavras que indicam uma condição de não ser são falsas. De fato nada é ou será outra coisa além do ser, pois a sorte o obrigou a ser uno, inteiro e imóvel. Por isso, serão nomes todas aquelas coisas que os mortais definiram, convencidos de que fossem verdadeiras: nascer e perecer, ser e não ser, trocar de lugar e mudar a luminosa cor. A esfera é idêntica em cada uma das suas partes, possui perfeição, homogeneidade, unidade. É a melhor imagem do Ser. Além disso, posto que tem um limite extremo, está completo em cada parte, semelhante à massa de bem redonda esfera, a partir do centro, igual em cada parte; de fato, não deve ser maior nem menor, de um lado ou do outro. Nem, de fato, existe um não ser que lhe possa impedir de alcançar o igual, nem é possível que o ser seja do ser mais de uma parte e menos da outra, pois é um todo inviolável. De fato, igual em cada parte, de modo igual se mantém entre os seus limites. O Paradoxo de Zenão (490 AC 430). É possível demonstrar com argumentações racionais a verdade da doutrina de Parmênides, segundo a qual somente o Ser existe? É possível demonstrar a existência do Não Ser? Para realizar um movimento é preciso completar a metade dele, depois a metade da metade e ir subdividindo, sucessivamente, sem jamais concluir. 1. A argumentação da dicotomia. A primeira das argumentações sustenta a inexistência do movimento, pelo motivo de que o movido deve chegar primeiro a metade, e não ao final. Motivo pelo qual a argumentação que não se pode percorrer elementos espaciais infinitos ou tocar, na translação, um a um, infinitos elementos espaciais, em um tempo determinado. Aquiles jamais alcançará a tartaruga, porque antes fará a metade do percurso, depois a metade da metade, depois a metade da metade, ao infinito. 2. O paradoxo do veloz Aquiles. Esta argumentação sustenta que o mais lento não será jamais alcançado, na sua corrida, pelo mais veloz. De fato, é preciso que aquele que segue ao encalço chegue primeiro ao lugar de onde partiu aquele que foge, de modo que necessariamente o mais lento terá sempre uma certa vantagem. Se fotografamos a flecha em cada instante do seu movimento, obteremos uma série de instantâneos em que a flecha aparece parada. Mas um movimento não pode nascer da soma de tantos momentos de repouso. 3. O movimento não é real. O raciocínio de Zenão, assumindo que tudo aquilo que ocupa um espaço igual a si mesmo ou se move ou está parado, e que nada se move em um instante e que o movido sempre ocupa um espaço igual a si mesmo em todos os instantes, parece que se processa da seguinte forma: a flecha que se move, e que em cada instante ocupa um espaço igual a si mesma, não se move, posto que nada se move em um instante; mas o que não se move está parado, posto que tudo ou se move ou está parado; então, a flecha que se move, enquanto se move, está parada durante todo o tempo da translação. Se as coisas são multíplices, então deveriam ser tanto finitas (uma quantidade determinada) quanto infinitas, porque separadas umas das outras por outras coisas (as quais precisariam de outras coisas, para resultarem separadas). 4. Esta argumentação nega a multiplicidade, sustentando que se os entes são muitos é necessário que sejam tantos quantos são e não a mais nem a menos. E se são tantos quantos são, serão limitados, finitos. Mas se os entes são muitos, são também infinitos; de fato, entre os entes sempre existem outros, e entre esses, novamente outros. E, desse modo, os entes são infinitos. Livro Antologia Ilustrada de Filosofia. Das Origens à Idade Moderna.  Abraço. Davi.

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