Judaísmo. www.morasha.com.br. A HISTÓRIA DE IRENA
SENDLER. (1910-2008). Mesmo quando dormia, Irena não conseguia esquecer. Em
sonhos, ela se via tirando uma criança, que chorava desesperadamente, dos
braços da mãe que lhe perguntava: 'jura que meu filho se salvará?' Responsável
por salvar 2.500 crianças do gueto de Varsóvia, irena jamais esqueceu aqueles
terríveis momentos em que era obrigada a separar os filhos de seus pais. Irena
Sendler faleceu no dia 12 de maio último, aos 98 anos. Jamais se considerou uma
heroína. Pelo contrário. Quando alguém mencionava sua coragem, respondia:
"Continuo com a consciência pesada de ter feito tão pouco" (...). O
Instituto Yad Vashem reconheceu o valor dessa mulher extraordinária, em 1965,
concedendo-lhe o título de "Justo entre as Nações", mas poucos
conheciam sua história até menos de uma década atrás. Em 2000, o silêncio que
se formara em volta de seu nome foi quebrado, quase por acaso, graças ao
empenho das alunas de uma escola secundária de Uniontown, Kansas, nos Estados
Unidos: Megan Stewart, Elizabeth Cambers, Jessica Shelton, de 14 anos, e
Sabrina Coons, de 16. No início do ano letivo de 1999, as quatro jovens,
estimuladas por seu professor, Norm Conard, se inscreveram no Concurso Nacional
de História de seu país para alunos do ensino médio. Na hora de escolher o
tema, Conard mostrou-lhes um recorte de 1994, do News and World Report, onde
havia uma nota sobre Irena Sendler, polonesa que salvara ao menos 2.500
crianças judias do Gueto de Varsóvia. Mas, alertara o professor, era provável
que houvesse um erro tipográfico naquele número, pois jamais ouvira falar da
tal senhora. As jovens não tardaram a descobrir que os números eram exatos, mas
que não faziam jus à coragem e valor de Irena. Nos primeiros meses de 2000,
decidiram escrever uma peça teatral baseada em sua vida, intitulada "Life
in a Jar", Vida dentro de uma garrafa. E, para grande surpresa,
descobriram que Irena ainda estava viva e bem de saúde, apesar de presa a uma
cadeira de rodas, há anos, por lesões provocadas pelas torturas que sofreu nas
mãos da Gestapo. As jovens entraram em contato com Irena e, a partir dali,
mudaram sua vida. A peça teve grande
aceitação e foi representada centenas de vezes através dos Estados Unidos e
Canadá, até finalmente chegar aos palcos da Polônia, além de ser transmitida
pelo rádio e televisão. Os primeiros anos. Irena nasceu em 15 de
fevereiro de 1910, em Otwock, cidade próxima a Varsóvia, filha única do casal
Krzyzanowski. A família sempre manteve estreitas relações com a comunidade
judaica da cidade. O pai, Stanislaw, era médico e entre seus pacientes havia
vários judeus, muito dos quais sem recursos. Ardente socialista, Stanislaw não
cansava de ensinar à pequena Irena que o ato de ajudar devia ser para todo ser
humano uma necessidade que emanasse do coração, não importando se o indivíduo a
ser ajudado era rico ou pobre, nem a que religião ou nacionalidade pertencia.
Em 1917, Otwock foi tomada por uma epidemia de tifo. Stanislaw, fiel aos seus
ideais, não deixou a cidade e continuou socorrendo os doentes. Ele mesmo
contraiu tifo, mas antes de morrer fez uma última recomendação à filha:
"Se vires alguém se afogando, deves pular na água e tentar ajudar, mesmo
se não souberes nadar". Na juventude, Irena estudou literatura polonesa e
se filiou ao Partido Socialista. Na década de 1930, quando o endêmico antissemitismo
polonês aumentava sua virulência, Irena foi expulsa da Universidade de Varsóvia
por enfrentar um professor que obrigara os alunos judeus a se sentar em local
separado, na classe. A jovem foi para o "setor judaico" da sala e
quando o professor lhe disse para mudar de lugar, respondeu: "Hoje sou
judia". Casou com Mieczyslaw Sendler, com o qual não teve filhos e passou
a trabalhar como assistente social. Quando os alemães invadiram a Polônia, em
setembro de 1939, ela trabalhava no Departamento de Bem-estar Social de
Varsóvia, única organização oficial polonesa autorizada a atuar no país, além
da Cruz Vermelha. Irena era responsável pela administração dos refeitórios
comunitários localizados em cada distrito da cidade, que, graças a ela,
distribuíam, além de alimento, roupas, medicamentos e algum dinheiro. E, quando
se tornou proibido atender os judeus, ela registrou aqueles que iam pedir ajuda
com nomes cristãos, fictícios. Para evitar visitas de inspeção, colocava nas
fichas que na família havia doença infecciosa, como tifo ou tuberculose. Atuando
dentro do Gueto de Varsóvia. Na Polônia, a perseguição nazista aos judeus
iniciara-se imediatamente após a invasão. Os alemães sabiam que o profundo antissemitismo
que permeava a sociedade polonesa facilitaria a execução de seus planos para a
comunidade judaica. Em outubro de 1940, a Gestapo decretou a transferência
imediata de todos os judeus de Varsóvia para um antigo bairro que, em poucos
meses, se tornou um gueto no sentido mais nefasto da palavra. Rapidamente,
levantou-se um alto muro isolando seus habitantes da "Varsóvia
ariana". O gueto, com apenas 4 km2, com capacidade, em condições normais,
para 60 mil pessoas, passou a abrigar 380 mil judeus. Nos meses seguintes,
outros 100 mil para lá foram levados. Em menos de um ano, meio milhão de judeus
estavam isolados e vigiados de perto pelos nazistas, para impedir contatos com
a parte 'ariana' da cidade. Dentro do gueto, as condições de vida eram
subumanas. As cotas de alimentos eram mínimas, produtos sanitários e
farmacêuticos em quantidade insuficiente. Grande parte da população sequer
tinha abrigo; quem conseguia algum cômodo o partilhava, com mais 10 pessoas.
Além das execuções sumárias, os nazistas queriam matar os judeus de fome, frio
e doenças. Entre o início de 1940 e meados de 1942, uns 83 mil morreram. Os números
só não foram maiores porque os judeus conseguiam contrabandear para dentro dos
muros alimentos e remédios. Instituições judaicas atuavam dentro do gueto
tentando aliviar o sofrimento de seus irmãos. Entre elas, a Sociedade Judaica
de Ajuda Mútua, a Federação Judaica das Associações de Orfanatos e Lares para
Crianças e a Organização de Reabilitação através do Trabalho (ORT). Até o final
de 1941, quando os Estados Unidos entraram na guerra e passou a ser proibido
aos americanos remeter fundos a países sob ocupação inimiga, as organizações
recebiam recursos principalmente do American Jewish Joint Distribution
Committee. Quando, em novembro de 1940, os portões do gueto se fecharam,
Irena se deu conta que 90% dos 3 mil judeus a quem prestava auxílio ficaram
fora de seu alcance. Mas não se deu por vencida. Em depoimento ao Yad Vashem,
conta: "Consegui, para mim e minha amiga Irena Schultz, identificações do
Gabinete Sanitário, que tinha como tarefa, entre outras, lutar contra as
doenças contagiosas. Aleguei que não íamos ajudar judeus, mas apenas fazer um
levantamento diário das condições sanitárias. Mais tarde, consegui passes para
outras colaboradoras". Irena Schultz também foi agraciada em 1965 pelo Yad
Vashem com o título de "Justa entre as Nações". Com esse estratagema,
as duas Irenas poderiam entrar no gueto quando quisessem. Uma vez dentro, as
jovens imediatamente reataram seus antigos contatos. Diariamente - e mais de
uma vez em um único dia - cruzavam os portões levando escondido em suas roupas,
alimentos, roupas, remédios e dinheiro que obtinham do próprio Departamento de
Bem-Estar Social, apresentando documentos que elas mesmas falsificavam. Para
não despertar a suspeita dos guardas alemães, entravam sempre por portões
diferentes e, uma vez dentro do gueto, Irena usava no braço a Estrela de David.
Além de ser uma forma de mostrar sua solidariedade, ela se confundia entre a
população e "ninguém me pedia documentos ou questionava o que eu
fazia". Com o passar dos meses, as condições de vida no gueto se tornaram
ainda mais terríveis. Sabe-se que a partir de junho de 1941 o número mensal de
mortes chegou a 5 mil. Irena estava definitivamente convencida de que a única
forma de salvar alguém daquele inferno era ajudando-o a fugir. Passa, então, a
trabalhar na organização das fugas. Os primeiros a serem retirados foram as
crianças órfãs. Em julho de 1942, os nazistas iniciaram a deportação em massa
para o campo de Treblinka. Tornara-se ainda mais premente remover do gueto o
maior número possível de pessoas. Irena já estava de posse de uma lista de
endereços onde os judeus poderiam ficar, principalmente as crianças, até
conseguir documentos de identidade "arianos" e encontrar um lugar
onde viver em relativa segurança. Sendler e Schultz conseguiram 3 mil documentos
falsos. Como as deportações continuavam sem tréguas, Irena decidiu procurar
ajuda e se filiou à Zegota, movimento clandestino com a infra-estrutura e o
dinheiro necessários. Esta organização, que contava com o apoio financeiro de
judeus britânicos, foi criada naquele fatídico mês de julho por poloneses
católicos, muitos, entre eles, membros da resistência, que se opunham ao
extermínio em massa de judeus. O objetivo era ajudar os judeus a sobreviver em
meio à população local. Infelizmente quando começou a operar, no final de 1942,
já era tarde para a maioria dos judeus de Varsóvia. Mais de 280 mil já haviam
sido mortos em Treblinka. No entanto, ainda havia milhares dentro do gueto e
outros tantos vivendo escondidos em Varsóvia e outras cidades. Usando o codinome
Jolanta, Irena se tornou uma das principais ativistas da Zegota. Comandava uma
equipe de 25 pessoas incumbidas de tirar crianças do gueto, obter documentos
falsos e encontrar uma família ou local onde as abrigar - algo não tão fácil de
conseguir. O resgate de uma criança judia requeria a ajuda de no mínimo dez
pessoas. O primeiro passo era fazer contato com as famílias dentro do gueto.
Persuadir pais a se separarem dos filhos era uma tarefa dolorosa. "Eu
ouvia sempre a mesma pergunta: 'Jura que o meu filho viverá?' Mas o que podia
prometer? Sequer sabia se conseguiria tirá-los com vida...", lembrava
Irena. "A única certeza era que se lá permanecessem, a probabilidade de
sobreviver era praticamente nula. Eu sabia que os primeiros a serem mortos
pelos nazistas eram as crianças. Às vezes, o pai aceitava a idéia, mas a pobre
mãe relutava; era como rasgar sua carne. Em outras ocasiões, era o contrário.
Eu entendia a dor deles, mas a indecisão foi fatal, em muitos casos. Quando
voltava para tentar fazê-los mudar de idéia, já não mais os encontrava (...).
Haviam sido levados para os campos da morte". Durante os últimos três
meses antes da liquidação do gueto, lutando contra o tempo, Sendler e Schultz
retiraram 2.500 crianças. As duas jovens levavam-nas, às vezes, por corredores
subterrâneos do edifício do Tribunal, localizado entre o gueto e o lado ariano;
outras vezes, através de uma igreja que tinha acesso pelos dois lados; ou mesmo
pelos esgotos. Alguns eram escondidos dentro de ambulâncias. Crianças pequenas eram
sedadas para não fazer barulho. Nas mãos de Irena qualquer coisa se
transformava em instrumento de fuga: sacolas, latas de lixo, sacos de batatas,
caixões. Chegou a esconder algumas dentro de seu casaco! Já fora dos muros, as
crianças eram levadas para locais onde iam ficar até serem entregues a famílias
ou instituições religiosas confiáveis. No entanto, escapar do gueto era mais
fácil do que sobreviver no lado "ariano". Irena conseguira recrutar
pelo menos uma pessoa em cada um dos centros do Departamento de Bem-estar
Social, que a ajudaram a forjar centenas de documentos. Para escondê-las,
contou com o auxílio de várias instituições religiosas. Entre estas, o Convento
da Família de Maria, dirigido pela madre superiora Matylda Getter, e o de
Turkowice, dirigido pela madre superiora Stanislawa. Neste último, Irena
contava ainda com a ajuda das Irmãs Irena e Hermana, que sempre que recebiam
uma mensagem codificada corriam a Varsóvia para buscar as crianças. As quatro
freiras foram também agraciadas pelo Yad Vashem, em 1965, com o título de
"Justos entre as Nações". Em seus relatos depois da guerra, Irena deu
os nomes de várias pessoas que a ajudaram, entre estas, Jan Dobraczynski.
Membro de um partido cristão de extrema direita, com uma plataforma antissemita,
Jan era diretor do Departamento de Bem-estar Social de Varsóvia. Graças à sua
função, ele conseguia documentos para as crianças, nos quais atestava serem
cristas, órfãs ou carentes, para que as instituições cristãs as admitissem.
Salvou assim mais de 300. Jan Dobraczynski também foi reconhecido pelo Yad
Vashem com o título de "Justo entre as Nações". No entanto, de todos
os seus colaboradores dentro do Zegota, Irena tinha mais afinidade com Julian
Grobelny, de codinome Trojan. Um homem de grande coração, completamente
devotado a salvar os que estavam em perigo. Irena contou que, certa vez, ele a
chamou para juntos buscarem uma menina judia que estava em estado de choque
havia vários dias. Assistira sua mãe ser morta de forma bestial. "Quase
fomos presos durante a viagem", lembrou Irena, "e como ele era pessoa
vital para a resistência, sugeri prosseguir sozinha, mas Grobelny recusou
indignado. Ao encontrar a menina, ele a pegou no colo e, falando devagar,
carinhosamente, conseguiu fazê-la sair do torpor, até que ela conseguiu
balbuciar: 'Não quero ficar aqui, me leva daqui'. Trojan, então, me pediu que
encontrasse um lar onde aquela inocente encontrasse afeto". Irena e todos
os demais sabiam que, se fossem presos, seriam fuzilados. Cartazes por toda
Varsóvia alertavam que a pena para quem escondia judeus era a morte e não
faltavam pessoas dispostas a ganhar com a tragédia, chantageando os judeus e,
em seguida, ganhando ainda mais ao entregá-los aos alemães, em troca de alguma
recompensa. Irena Sendler se preocupava com o futuro das crianças. Vejam como
ela mesma descreve os cuidados que tinha para, um dia poder recuperar suas
identidades: "Escrevia em papel de seda os nomes das crianças salvas.
Havia duas listas idênticas, que eu guardava em duas garrafas distintas. Por
razões de segurança não deixava as listas em casa, as enterrava em locais
distintos. À medida que aumentava o número de crianças salvas, as garrafas onde
eu guardava as listas eram desenterradas e novos nomes incluídos". Ela
tinha a esperança de, no final da guerra, localizar as crianças e informá-las
acerca de sua verdadeira origem. Queria que um dia pudessem recuperar seus
nomes, identidade, suas famílias e, principalmente, voltar à sua fé. Irena
fazia as famílias envolvidas no salvamento dos menores prometerem que os
devolveriam a qualquer parente que sobrevivesse à guerra. Infelizmente, nem
todos mantiveram sua palavra. Terminada a guerra, Irena passou anos com as
listas nas mãos, tentando localizar crianças desaparecidas e as reaproximar de
sua verdadeira família. Sendler e Schultz também ajudaram adultos a fugir do
gueto. A fuga era organizada para quando deixavam o gueto para ir trabalhar. Os
guardas eram subornados para omiti-los em sua contagem diária dos empregados.
Os judeus ficavam escondidos do lado ariano e o Zegota se incumbia de
ajudá-los. Parte das despesas das famílias que davam abrigo a judeus eram pagas
por esta organização que lhes entregava também roupas, alimentos e cupons para
leite. Geralmente, Irena colocava jovens judias para trabalhar como governantas
ou babás. Adotavam um novo nome e, sendo a Polônia um país profundamente
católico, elas deviam aprender pelos menos o básico de sua suposta fé. A
prisão de Pawiak No dia 20 de outubro de 1943, Irena foi à casa de sua mãe
para uma reunião de amigos. No final da tarde, a Gestapo invadiu o local. Por
sorte, ajudada por uma amiga, ela conseguira esconder documentos que a
incriminavam e uma grande quantia do Zegota destinada à ajuda aos judeus. A
busca durou três horas. Não encontraram nada, mas Irena foi presa e levada à
terrível prisão de Pawiak. Uma de suas colaboradoras havia sido presa e, sob
tortura, revelara seu nome. O alemão que a interrogou era jovem, com boas
maneiras e falava perfeitamente o polonês. Queria os nomes da liderança do
Zegota, endereços e a relação de todos os envolvidos. Apesar de brutalmente
torturada - quebraram-lhe as duas pernas - ela não cedeu. Sua vontade foi mais
forte que a dor. Recusou-se a trair colaboradores ou crianças. Passou três
meses nessa prisão até ser julgada e condenada à morte. "Todos os dias, ao
amanhecer, as portas das celas eram abertas e eram chamados nomes de pessoas
que nunca mais voltavam. Um dia, meu nome foi chamado"; lembrou Irena em
seus depoimentos. Irena estava sendo levada para o local onde devia ser
fuzilada quando um agente da Gestapo surgiu com a ordem de conduzi-la a outro
interrogatório. O Zegota conseguira subornar o agente minutos antes da
execução; após conduzi-la a um canto, o nazista mandou-a desaparecer. Estava livre.
Na mesma noite, Irena viu cartazes, nos muros de Varsóvia, com o nome das
pessoas executadas. Entre eles, constava o seu. A Gestapo não tardou a
descobrir o que ocorrera; isto forçou Irena a viver escondida, sob falsa
identidade, até a libertação da Polônia pelos exércitos russos - exatamente
como tantos outros a quem salvara. Mas, mesmo perseguida pela Gestapo,
continuou a atuar. Fim da guerra. Em 1945, ao término da guerra, sua primeira
providência foi desenterrar as garrafas onde havia guardado as listas com os
nomes das crianças que ajudara a salvar. Passou então a procurá-las para as
reunir com pais ou outros membros de suas famílias. Poucos, porém, estavam
vivos. Adolph Berman, um dirigente do Zegota, decidiu levar 400 crianças para
Israel. Apesar de todos os esforços, até hoje não se tem informações sobre o
paradeiro de 500. Talvez muitas não tenham sobrevivido ou estejam vivendo na
Polônia ou em outros países, sem consciência de sua identidade judaica. No fim
da guerra, os comunistas tomaram conta da Polônia. A política do novo regime,
de forte anti-semitismo oficial, fez com que a história do Zegota, de Irena
Sendler e de tantos outros fosse apagada dos livros de história do país. A
própria Irena foi tachada de fascista por seu trabalho com o Zegota, durante a
guerra, e por ter salvo judeus. Voltou a trabalhar como assistente social.
Levava uma vida simples e discreta e não falava de seu passado. Seu casamento
com Mieczyslaw Sendler acabara logo após a guerra. Divorciada, casou-se com
Stefan Zgrzembski, com quem teve dois filhos, Janka e Adam.Quando, em 1965, o
Instituto Yad Vashem concedeu a Irena o título de "Justa entre as
Nações", os líderes comunistas não permitiram que ela saísse da Polônia
para receber o prêmio. Só mais tarde, em 1983, pôde receber o título, ocasião
em que foi plantada uma árvore em seu nome. O ano de 1994 é marcado pela queda
do comunismo, na Polônia. Mas a vida de Irena só iria mudar seis anos mais
tarde, quando as 4 jovens americanas de Uniontown, no Kansas, contataram-na. Irena
vivia, à época, em um lar de idosos, em Varsóvia, presa a uma cadeira de rodas,
seu souvenir da Gestapo. Nos últimos anos, Elzbieta Ficowska, menina a quem
salvara aos 5 meses de idade, ajudava a cuidar dela. Irena rememora o momento
em que soube do projeto das jovens: "Fiquei boquiaberta e fascinada, a um
só tempo; interessada, muito feliz". Em uma das primeiras cartas de Irena
às jovens, escreveu: "Minha emoção está sendo ofuscada pelo fato de que
ninguém do meu círculo de colaboradores, que viviam arriscando suas vidas, pôde
viver o bastante para desfrutar todas as honras que hoje recaem sobre minha
pessoa... Não encontro palavras para lhes agradecer, minhas queridas meninas...
Antes de vocês escreverem a peça "Life in a Jar", ninguém em meu
próprio país e em todo o mundo se havia preocupado com minha pessoa ou com o
trabalho que desempenhei durante a guerra (...)". Em maio de 2001, as 4
jovens, acompanhadas do professor Conrad, viajaram a Varsóvia para se encontrar
com Irena. Na mesma época, a mídia internacional começa a divulgar sua
história. Emocionada, Irena diz às jovens que elas eram "as resgatadoras
da história de Irena perante o mundo". Ao publicar a história, vários
jornais colocaram uma antiga foto dela. De repente, diversas pessoas a contataram:
"Lembro-me de seu rosto... sou uma daquelas crianças, devo-lhe a minha
vida e meu futuro, preciso vê-la!" No ano de 2003, Irena Sendler recebeu
uma carta do papa João Paulo II. Em março daquele ano foi a vez da Polônia
fazer reparações oficiais. Irena é agraciada com a Ordem da Águia Branca, a
mais importante distinção concedida pelo governo daquele país. Devido ao seu
delicado estado de saúde, ela não participou da cerimônia em sua homenagem, mas
enviou Elzbieta Ficowska para ler uma carta em seu nome. Entre outros, a carta
dizia: "Nós e as gerações futuras precisamos recordar a crueldade e o ódio
humano que dominava aqueles que 'entregaram' seus vizinhos ao inimigo; o ódio
que lhes ordenou cometerem assassinato e a indiferença pela tragédia daqueles
que pereceram. Meu sonho é que esta recordação se torne um alerta ao mundo -
para que a humanidade jamais volte a vivenciar uma tragédia de igual
proporção". No ano seguinte foi publicado um livro sobre sua vida escrito
por Anna Mieszkowska: Mother of the Children of the Holocaust: The
Irena Sendler Story. Em março de 2007 a Polônia prestou-lhe uma homenagem,
em sessão solene na Câmara Superior do Parlamento, tendo seu nome sido indicado
para o Prêmio Nobel da Paz. Neste ano de 2008 em fevereiro, quando celebrou 98
anos, recebeu das jovens de Kansas a notícia de que a peça sobre sua vida fora
representada pela 254ª. vez, em Toronto, Canadá. Irena partiu deste mundo no
dia 12 de maio de 2008, em Varsóvia. Centenas de pessoas acompanharam seu corpo
até sua última morada, no cemitério de Varsóvia.Na ocasião, o Rabino-chefe
ortodoxo da Polônia, Rabi Michael Schudrich, recitou o Kadish por aquele ser
humano tão nobre. O Rabino lembrou-a dizendo que esperava que a vida de Irena
servisse de inspiração a outros: "Fomos abençoados com tantos anos em que
a tivemos como exemplo vivo... Ela não apenas salvou crianças judias; salvou
também a alma da Europa... seu exemplo pode ajudar-nos a mudar o mundo...
Bastará que cada pessoa que ouça a sua história tente fazer um ato de bondade
por outro ser humano, dia após dia". Bibliografia: Paldiel,
Mordecai, The Rightheous Among The Nations, Rescuers of Jews During The
Holocaust, Yad Vashem - The Holocaust Martyrs' and Heroes' Remembrance
Authority. Life in a jar, The Irena Sendler project, www.irenasendler.org. Artigo
do International Herald tribune, Poland holds memorial service for Irena
Sendler, 15 maio de 2008. www.morasha.com.br.
Abraço. Davi.
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