Islamismo. Texto de
Zuhra Mohd El Hanini. NOÇÃO DE DIREITO ISLÂMICO. Capítulo Três. DIREITO CÍVIL
ISLÂMICO I. O Casamento – A Sharia estabelece que a união de ambos os sexos é
um processo natural estabelecido por Deus para sua criação. Este fato abarca
tanto o reino animal como o vegetal. Disse Deus no Alcorão Sagrado: “E que Ele
criou (tudo) em pares: o masculino e o feminino” em 53, 45. Também falou em
78,4 “E não vos criamos, acaso, em casais?”. Deus diferenciou o homem do resto
dos animais e estabeleceu para ele um sistema de vida de acordo com a sua
supremacia, para que preserve sua dignidade e a condição humana. E por isso,
instituiu o matrimônio, para que preserve sua dignidade e a condição humana. E
por isso, instituiu o matrimônio, para que o homem e a mulher possam unir-se
honrada e livremente com a intenção de permanência e assim constituir uma
família baseada no amor e respeito mútuo. O casamento é o meio correto, para
que as pessoas satisfaçam seus desejos e para a procriação digna, além disse, é
uma forma de proteger a mulher e evitar que esta seja tratada como mero objeto
de prazer. Deus disse no Alcorão em 30, 21 “Entre os seus sinais está o de
haver-vos criado companheiras da vossa mesma espécie, para que com elas
convivais; e colocou amor e piedade entre vós. Por certo que nisto há sinais
para os sensatos”. Também em 4,1 se diz; “Ó humanos, temei a vosso Senhor, que
vos criou de um só ser, do qual criou a sua companheira e, de ambos, fez
descender inumeráveis homens e mulheres”. Vejamos a sabedoria que encerra a
legalidade do casamento na Shariah: 1 – O Casamento é a base sobre a qual se
constrói uma família sólida. Além disso, é um meio de preservar a dignidade e
para evitar o crime da fornicação, uma vez que os cônjuges que se respeitam,
amam e são felizes, encontram na vida matrimonial tranquilidade e sossego. 2 –
É o meu direito correto para a procriação e multiplicação da descendência. Além
disso, protege a genealogia das pessoas das quais surgem os vínculos de
parentesco. 3 – É a melhor maneira de satisfazer o desejo sexual e manter
relações sem risco de contrair enfermidades. 4 – Contribuir para a formação que
é o núcleo da sociedade. A obrigação do homem é trabalhar e procurar o sustento
para cobrir com as necessidades básicas do lar, e a da mulher é criar os
filhos, encarregar-se de sua casa e harmonizar a vida familiar. Quando se
respeitam essas condições, a sociedade mantém-se íntegra. Para que um casamento
seja válido é necessário que respeite determinados elementos que compõe o
contrato matrimonial, estes são quatro: 1 – Que ambas as partes se encontrem
livres de tudo aquilo que impeça a união, como por exemplo, que sejam irmãos de
amamentação. 2 – Que exista o consentimento por parte do tutor da mulher
ou seu representante legal de forma expressa e oral. 3 – Que exista a aceitação
por parte do homem interessado ou quem o represente legalmente manifestado de
forma oral. 4 – Que haja o consentimento da mulher. A Shariah proíbe e
considera nulo o contrato de casamento onde a mulher tenha sido coagida a casar
com quem não desejava. E toda a mulher que tenha sido desposada contra sua
vontade tem o direito de pedir a revogação do contrato matrimonial. É relatado
na Sunnah que o Profeta Muhamad anulou alguns contratos matrimoniais devido ao
pedido de revogação por parte de algumas mulheres que haviam sido casadas
contra sua vontade. As condições fundamentais para a validade do contrato
matrimonial no Islam são três: 1 – A Determinação da identidade dos
contraentes. 2 – O Consentimento de ambas as partes. 3 – A presença do
representante legal da mulher. Este deve ser um homem maior de idade e capaz
perante a lei e que professe a mesma religião de quem representa. Geralmente
quem desempenha essa função é o pai, pois é quem mais tem direito de
representa-la, na falta deste será quem este designou como seu representante,
na falta deste será seu avô paterno, na falta deste será seu filho (no caso da
viúva ou divorciada), na falta deste será seu irmão, seu tio paterno, ou então
o familiar mais próximo. Caso não haja nenhum destes, será representada pela
autoridade competente. Se o representante legal da mulher se opõe ao casamento
sem causa justificada, então esta deverá ser representada por quem lhe siga na
ordem legal estabelecida. O contrato matrimonial celebrado sem representante
legal da mulher é nulo. Vale ressaltar que esta exigência é estabelecida pelo
Alcorão como proteção à mulher e à sua honra. 4 – A presença de testemunhas
homens que sejam honestos e capazes perante a lei. 5 – A inexistência de todo
impedimento que invalide o contrato, como por exemplo, que estes estejam unidos
por vínculos sanguíneos. As partes contraentes poderão estipular cláusulas no
contrato que deverão ser respeitadas por ambas as partes, desde que estas cláusulas
não caracterizem um ilícito proibido pela Shariah. No caso do não cumprimento
de tais cláusulas, qualquer das partes poderá postular a revogação do contrato.
Quanto às pessoas proibidas, de se contrair casamento, de forma permanente, o
Alcorão Sagrado enumera em 4, 23-24. “Está-vos vedado casar com vossas mães,
vossas filhas, vossas irmãs, vossas tias paternas e maternas, vossas sobrinhas,
vossas nutrizes, vossas irmãs de leite, vossas sogras, vossas enteadas, as que
estão sob vossa tutela – filhas das mulheres com quem tenhais coabitado; porém,
se não houverdes tido relações com elas, não sereis recriminados por
desposá-las. Também vos está vedado casar com as vossas noras, esposas dos
vossos filhos carnais, bem como unir-vos, em matrimônio, com duas irmãs – salvo
fato consumado, anteriormente; sabei que Deus é indulgente,
misericordiosíssimo. Também vos está vedado desposar as mulheres casadas”.
Estas pessoas dividem-se em três grupos: 1 – Aquelas cuja proibição é deriva
dos laços sanguíneos. Estão são : a mãe e seus ascendentes, a filha e seus
descendestes, a irmã, a tia materna, a tia paterna, a sobrinha por parte do
irmão, a sobrinha por parte da irmã. Em geral, está proibido o casamento com
qualquer pessoa com quem se tem um vínculo sanguíneo, com exceção dos primos. 2
- Aquelas cujas proibição deriva dos laços que surgem pela amamentação.
Todas as mulheres com as que estão proibidas de casar devido à consanguinidade,
estão também proibidas, pelo vínculo que gera a amamentação. Para que ocorra esta
proibição, a amamentação deve ter ocorrido dentro dos dois primeiros anos de
vida do bebê e reiterar-se pelo menos cinco vezes. 3 – Aquelas cuja proibição
deriva dos laços de afinidade, estão são: a sogra, a filha da esposa com outro
homem em casamento anterior, a esposa do pai e a nora. Vale ressaltar que as
pessoas acima enumeradas estão vedadas quanto ao casamento de forma definitiva
e permanente. Vejamos agora as mulheres com as quais não se pode consumar o
casamento de forma temporária, enquanto subsista o impedimento, estas são as
seguintes: 1 – Um homem não pode estar casado ao mesmo tempo com duas irmãs,
nem com uma mulher e sua tia paterna ou materna, seja por vínculo de sangue ou
de amamentação. Se o homem ficar viúvo ou se divorciar, então poderá desposar
aquela que até então lhe estava proibida por esta razão. 2 – A mulher que se
encontra no seu período de espera obrigatório para poder contrair novo
matrimônio nos casos de divórcio e viuvez até que tal período se finalize. No
caso da divorciada o período é de três meses e no caso da viúva é de quatro
meses e dez dias. 3 – A mulher que o homem tenha se divorciado, até que esta
case novamente com outro homem e se divorcie. Exemplo: “A” se divorcia de “B”,
se “A” quiser casar-se novamente com “B” estará impedido até que “B” case-se
com outro homem e deste se divorcie, então desta forma será permitido “A” casar
com “B” novamente. Isso será abordado quando falarmos do divórcio. 4 – A mulher
que estiver em estado de “Ihram” para a peregrinação à Meca (Makka –
Hajj), até que termine os ritos da peregrinação e saia deste estado. 5 – A
mulher muçulmana está proibida para o não muçulmano até que aceite o Islam. 6 –
A mulher não muçulmana, exceto que seja do povo do livro (cristã ou judia),
está proibida para o homem muçulmano, até que aceite o Islam. 7 – A mulher de
outro homem, ou a que esteja ligada ainda ligada a este por estar no período de
espera obrigatório para ser divorciada definitivamente, e poder contrair novo
matrimônio. O dote – O Islam elevou a posição da mulher e lhe permitiu fazer
valer seus direitos na hora de ser desposada. Por isso, a Shariah estabelece
que a mulher tem o direito de receber um dote como maneira de honrá-la,
agradá-la, conceder-lhe a segurança do compromisso, e além de tudo deixar claro
a obrigação do homem de mantê-la e sustenta-la. O dote trata-se de um direito
da mulher, e ninguém pode dispor de seu dote sem sua autorização. Disse Deus no
Alcorão em 4,4 “Concedei os dotes que pertencem à mulheres e, se for da vontade
delas conceder-vos algo, desfrutai-o com bom proveito”. Quanto ao valor do dote
não há estipulação na Shariah. Isso dependerá das partes e da condição social
do homem. Está vedada a estipulação de dotes com valores exagerados que levem o
homem a endividar-se para cumprir com o dote. O estipulado na Sunnah é
que os dotes sejam de valor moderado, para desta forma facilitar o casamento e
não colocar empecilhos quanto à sua consumação. Casamento entre não muçulmanos
no Estado Islâmico: Até aqui analisamos o casamento no Islam quanto ao que se
refere ao casamento entre os muçulmanos. Cabe salientar e abordar a questão de
que o Estado Islâmico reconhece o casamento celebrado entre não muçulmanos
residentes em seu território. Para que um casamento entre não muçulmanos seja
convalidado no Estado Islâmico, deverá cumprir com as seguintes condições: 1 –
Que o contrato matrimonial seja válido em sua religião. Que os conjugues não
levem aos juízes muçulmanos nenhuma demanda com relação à validade do contrato,
pois desta forma será julgado conforme a legislação islâmica. Vejamos que, como
falamos anteriormente aos tratarmos dos direitos dos não muçulmanos num Estado
Islâmico, os não muçulmanos tem direitos de criarem tribunais que tratem dos
assuntos civis tal como prescrito em suas religiões, portanto se for
apresentado a um tribunal muçulmano será julgado conforme a Shariah. Se os
contraentes decidem realizar o casamento no Estado Islâmico, o contrato será
celebrado segundo a Shariah, ou seja, com a manifestação de aceitação de ambos
os cônjuges, a presença do representante legal da mulher e as duas testemunhas.
Mas se apresentarem-se já casados perante o Estado, o contrato será convalidado
com a condição que a mulher seja lícita para o homem, ou seja, que as
proibições da Shariah, como por exemplo: mãe, filha, tia, etc. Com relação ao
dote da mulher não muçulmana, será válido se o que havia sido convencionado já
tenha sido percebido pela mulher, mesmo que seja um objeto que contenha algo
considerado ilícito pela Shariah, como por exemplo, bebida alcoólica. Mas se a
mulher não tiver ainda em posse do dote, ela somente terá direito a este se o
que foi convencionado é considerado lícito pela Shariah. Direito e deveres dos
cônjuges: O contrato matrimonial gera obrigações recíprocas entre os cônjuges e
seu cumprimento garante a boa convivência e o fortalecimento dos laços
familiares. Disse Deus no Alcorão em 4,19 “E harmonizai-vos entre elas, pois se
as menosprezardes, podereis estar depreciando seres que Deus dotou de muitas virtudes”.
Dentre as obrigações do homem com relação à mulher, estipulados pela Shariah,
estão a de sustenta-la e mantê-la, bem como à sua família, economicamente,
proporcionando-lhes alimento, vestimenta e suprir suas necessidades. Além
disso, o marido deve ser tolerante, companheiro, solidário na convivência, deve
trata-la com amabilidade, ser carinhoso, deve ser paciente diante da
impaciência da esposa, deve preocupar-se com a sua saúde, ajuda-la nos afazeres
da casa, exortar-lhe que cumpra com suas obrigações religiosas e se afaste dos
pecados, ensiná-la o que ela ignorar da religião, não impor-lhe cargas
superiores ao que ela possa suportar, proteger a honra e a dignidade de sua
família. É vedado ao homem agredir, depreciar ou ignorar sua esposa. Disse o Profeta
Muhamad: “O crente mais íntegro é aquele que demonstra melhor caráter e de
melhor moralidade. E o melhor dentre vós é aquele que melhor trata sua esposa e
o que é melhor para com sua esposa”. Dentre as obrigações da mulher com relação
ao seu marido está a atenção para com seu esposo, a organização e preservação
do lar, a educação dos filhos, aconselhar seu esposo, proteger a dignidade e os
bens de seu marido, recebe-lo com agrado e cordialidade, motivá-lo, trata-lo
amavelmente, guardar seus segredos, cuidar da integridade moral de seu lar,
preocupar-se pela sua saúde. Também cabe a mulher obediência ao seu marido
naquilo que não implique em desobediência a Deus. A mulher cumpre com um rol
muito importante dentro do lar, beneficiando sua família e a sociedade, não
sendo suas funções menos importantes que as que o marido realiza fora do lar.
Poligamia. O Islam permitiu a instituição da poligamia, onde um homem pode ter
como limite máximo quatro esposas. Disse Deus no Alcorão Sagrado em 4,3 “Se
temerdes ser injustos no trato com os órfãos, podereis desposar duas, três ou
quatro das que vos aprouver, entre as mulheres. Mas, se temerdes não poder ser
equitativos para com elas, casai, então, com uma só”. A partir deste versículo,
verificamos que a poligamia no Islam trata-se de uma lei de emergência, ou
seja, excepcional, não representando qualquer princípio fundamental da lei
islâmica. A base principal do matrimônio é a monogamia. Ocorre, porém, que
determinadas situações em que a monogamia pode acabar tornando-se uma opressão.
Isso porque há lugares e épocas em que razões morais e sociais compelem para a
poligamia. Como o versículo do Alcorão acima indica, a questão da poligamia no
Islam pode ser entendida como parte das obrigações da comunidade com relação aos
órfãos e viúvas. Principalmente durante as guerras, ocorre um grande
desequilíbrio no número de homens e mulheres, e devido a isso, acaba-se tendo
um saldo enorme de viúvas e órfãos. Além disso, em muitas sociedades humanas,
as mulheres superam os homens em quantidade. O que uma sociedade deve fazer
para resolver esse desequilíbrio? Dentre as soluções, alguns podem sugerir o
celibato, outros preferem a infanticídio feminino (que ainda acontece no mundo
de hoje em alguns lugares), outros, podem achar que a única saída é a sociedade
tolerar todas as formas de permissividade sexual: prostituição, sexo fora do
casamento, homossexualismo, etc. Já o Islam, encontra a saída mais honrosa e
justa que é permitir o casamento poligâmico, como uma instituição culturalmente
aceita e socialmente respeitada. O que é exigido pelo Islam como premissa para
que seja permitido a um homem que case com mais de uma esposa é o tratamento
com igualdade plena entre as esposas, garantindo-lhes seus direitos,
sustentando-as, e concedendo a cada uma delas moradia individual, alimentação e
todos os demais direitos da esposa, e dos filhos que será perfeitamente
reconhecidos. Deve-se acrescentar que a poligamia no Islam é questão de
consenso mútuo. Ninguém pode forçar a mulher a se casar com um homem casado, e
a primeira esposa, se assim desejar, poderá divorciar-se ou revogar o contrato
nupcial se havia estipulado que este não poderia casar- novamente. Vejamos que
nas sociedades ocidentais a poligamia é considerada ilegal, ainda que com livre
consentimento da primeira esposa, por outro lado, o adultério, é perfeitamente
legitimado. Qual é a sabedoria legal por detrás de tal contradição? A lei foi
feita para premiar a decepção e punir a honestidade? A esse respeito, o Islam é
fundamentalmente uma religião honesta, que permite a um muçulmano se casar uma
segunda vez se for uma necessidade social. Mas proíbe rigorosamente todas as
associações clandestinas, condenando o adultério e a fornicação, a fim de
salvaguardar a probidade moral da comunidade. Pode-se dizer que o número de
casamentos poligâmicos no mundo é muito menor do que o de casos extraconjugais
no Ocidente. Dessa forma, verificamos que o Islam permitiu a poligamia como uma
solução para os males sociais, em proteção especial da estrutura familiar, dos
órfãos e das mulheres. Divórcio. Como vimos, ao tratarmos do casamento, Deus
estabeleceu o matrimônio para que um homem e uma mulher possam compartilhar uma
vida juntos, formar uma família baseada no amor e na tolerância, protegerem-se mutuamente
de incorrer no pecado, ter filhos e satisfazerem seus desejos. Quando esta
essência ou se distorce e existe uma má disposição de um dos cônjuges ou quando
surge problemas entre ambos, a convivência se torna insustentável ou exista
outro motivo que leve a conflitos incessantes e discussões diárias, a vida
matrimonial acaba por se tornar prejudicial para um ou ambos os cônjuges, e se
torna permitido o divórcio, pois Deus legalizou-o como misericórdia para
aqueles que chegam a esta situação extrema e não encontram outra saída. Deus
disse no Alcorão em 65,1 “O Profeta, quando vos divorciardes das vossas
mulheres, divorciai-vos delas em seus períodos prescritos e contai exatamente
tais períodos e temei a Deus, vosso Senhor”. O Islam permite o divórcio quando
for uma necessidade em circunstâncias onde o casamento já não esteja cumprindo
seu papel de trazer a felicidade comum do casal, nesse caso o divórcio é
permitido, mas vale ressaltar que deve ser a última decisão a ser tomada,
depois da tentativa de reconciliação de diversas maneiras. O Profeta Muhamad
disse: “De todas as coisas legais, a mais abominável para Deus é o
divórcio”. Antes da decisão do divórcio, deverá ser tentada a reconciliação
entre as partes, por meio de um árbitro da família do marido e um da família da
esposa. Disse Deus no Alcorão em 4,35 “E se temerdes desacordo entre ambos,
esposo e esposa, apelai para um árbitro da família dele e outro da dela. Se
ambos desejarem reconciliar-se, Deus reconciliará, porque é Sapiente,
Inteiradíssimo”. Se após isso, as partes ainda insistirem em dar continuação à
ideia de divórcio, este poderá se efetuar de maneira unilateral ou por consenso
mútuo do casal. No caso do divórcio unilateral, se for iniciado pelo marido
chama-se Talaq e se for requerido pela esposa chama-se Khul’a. No caso do
divórcio iniciado pelo marido, este será basicamente uma questão de marido e
mulher, sem intervenção judicial. A Shariah estabelece que o talaq deve ser
pronunciado três vezes com um intervalo de um mês cada anúncio. Cada um desses
pronunciamentos deve ser realizado fora do período menstrual da esposa. Esse
período de espera de três meses, chamado pela Shariah de “idaah”, tem o
objetivo de induzir a reconciliação e também para verificar se há gravidez ou
não. Disse Deus no Alcorão Sagrado em 65,1 “Ó Profeta, quando vos divorciar das
vossas mulheres, divorciai-vos delas em seus períodos prescritos e contai
exatamente tais períodos e temei a Deus, vosso Senhor”. O divórcio será
revogável se o marido houver pronunciado uma só vez ou duas vezes a intenção de
divorciar-se, nesses casos não haverá inconveniente se as partes se
reconciliarem, e o marido desistir do divórcio. Disse Deus no Alcorão Sagrado
em 2,229 “O divórcio revogável só poderá ser efetuado duas vezes. Depois, tereis
de conservá-las convosco dignamente ou separar-vos com benevolência. Está-vos
vedado tirar-lhes algo de tudo quanto lhes haveis dotado, a menos que ambos
temam contrariar as leis de Deus. Se temerdes (vós juízes) que ambos
contrariem, não serão recriminados, se ela der algo pela vossa liberdade. Tais
são os limites de Deus, não os ultrapasses, pois aqueles que os ultrapassarem
serão iníquos”. No entanto, se o divórcio for pronunciado expressamente pelo
marido as três vezes nos três meses, então ocorre o divórcio irrevogável, ou
seja, as partes não poderão voltar a contrair matrimonio exceto que a esposa se
case com outro homem e também se divorcie deste de forma espontânea e não com o
objetivo de voltar a casar com o primeiro. Assim diz o Sagrado Alcorão em 2,230
“ Porém, se ele se divorciar irrevogavelmente dela, não lhe será permitido
toma-la de novo por esposa legal até que se tenha casado com outro e também se
tenha divorciado deste; não serão censurados se se reconciliarem, desde que
sintam que poderão observar as leis de Deus. Tais são os limites de Deus, que
ele elucida para os sensatos”. Também em 65,2 “Todavia, quando tiverem cumprido
o seu término prefixado, tomai-as em termos equitativos ou separai-vos delas,
em termos equitativos. Em ambos os casos fazei-o ante testemunhas equitativas,
dentre vós, e justificai o testemunho ante Deus, com o qual se exorta quem crê
em Deus e no Dia do Juízo Final”. Com relação ao período de espera para que o
divórcio se consume é em regra de três menstruações, no caso das mulheres que
tiverem na menopausa o período será de três meses, já no caso da mulher estar
grávida, o período será até que esta tenha dado à luz. Disse Deus no Alcorão em
2,228 “As divorciadas aguardarão três menstruações”. Em 65,2 também é dito
“Quanto àquelas, das vossas mulheres, que tiverem chegado à menopausa, se
tiverdes dúvida quanto a isso, o seu período prescrito será de três meses, o
mesmo se diga, com respeito àquelas que ainda não tiverem chegado a tal
condição, e, quanto as grávidas, o seu período estará terminado quando derem a
luz”. Vale ressaltar que durante o período de espera (Idaah) a mulher deverá
permanecer em sua casa e o marido é obrigado a alimentar, vestir e abrigar a
esposa, até o termino do prazo, isto é revelado no Alcorão em 65,6 “Instalai-as
(as divorciadas) onde habitais, segundo os vossos recursos, e não as molesteis,
para criar-lhes dificuldades. Se estiverem grávidas, mantende-as, até que
tenham dado à luz. Se amamentam os filhos, pagai-lhes a sua recompensa e consultai-vos
cordialmente”. No caso, onde o marido toma a iniciativa do processo de
divórcio, não lhe é permitido exigir de volta qualquer dos presentes ou o dote
que tenha presenteado a esposa, conforme o Alcorão Sagrado em 4,20-21 “Se
desejardes trocar da esposa, tendo-a dotado com um quintal, não lhe diminuais
em nada. Tomá-lo-eis de volta, com uma falsa imputação e um delito flagrante? E
como podeis toma-lo de volta depois de haverdes convivido com elas íntima e
mutuamente, se elas tiveram, de vós, um compromisso solene?”. Não é permitido
ao marido, reconciliar-se com a esposa com o intuito de injuriá-la ou
injustiçar, sendo isso considerado pela Shariah como “zombar dos versículos de
Deus”, ou seja, um grave pecado. Disse Deus no Alcorão em 2,231 “Quando vos
divorciardes das mulheres, ao terem elas cumprido o seu período prefixado,
tomai-as de volta equitativamente, ou liberta-as equitativamente. Não as tomeis
de volta com o intuito de injuriá-las, injustamente, porque quem tal fizer
condenar-se-á. Não zombeis dos versículos de Deus e recordai-vos das suas
mercês para convosco e de quanto vos revelou no Livro, com sabedoria, mediante
o qual vos exorta. Temei a Deus e sabei que Deus é Onisciente”. No caso da
consumação do divórcio, em regra, as crianças jovens permanecem na custódia da
mãe. Porém, o pai tem que prover o custo de manutenção e sustento delas. A
mulher também tem o direito de tomar a iniciativa no processo de divórcio
pedindo ao seu marido que a divorcie mediante restituição do dote ou do equivalente
em dinheiro, ou então mediante intervenção judicial quando esta se vê
prejudicada em seu matrimonio. Esse tipo de divórcio é chamado Khul’a. Da mesma
forma que o homem, a mulher deve ter sérias razões para pedir o divórcio.
Existem várias causas que poderão leva-la a recorrer ao divórcio tais como: a
falta de manutenção digna por parte do marido, o maltrato, que este tenha-se
ausentado por um longo período, que a convivência seja insuportável, que este
sofra de uma enfermidade, como por exemplo, seja estéril, impotente ou sofra de
alguma doença infectocontagiosa. O fundamento para a permissibilidade de a
mulher pedir o divórcio, encontra-se na Sunnah, onde relata-se que uma mulher
se apresentou perante o Profeta Muhamad apud Hashimi e lhe disse, a respeito de
seu marido: “Oh Mensageiro de Allah, não culpo Thabit Ibn Qais (seu marido) por
seu caráter ou sua religiosidade, mas temo comportar-me erroneamente, não
cumprindo com seus direitos. Então o Profeta Muhamad lhe perguntou: Estás
disposta a devolver-lhe o pomar que ganhaste como dote? Ela disse: Sim! Então o
Profeta Muhamad disse a Thabit: Aceite o pomar e divorcie-se dela
definitivamente”. Na Sunnah, também encontramos a história de uma escrava
muçulmana cujo nome era “Barirah” e que foi forçada por seu amo, que não era
muçulmano, a casar-se com um escravo. Aisha, esposa do Profeta Muhamad, comprou
dita escrava e a libertou da escravidão. Ocorre que após sua liberdade, a
escrava pediu divórcio a seu marido. Este, por sua vez, não queria divorciar-se
dela, e a perseguia chorando e implorando que ela desistisse do divórcio. O
Profeta Muhamad ao ver esta situação, dirigiu-se a Barirah e disse-lhe: “Por
que não regressas com ele?” Ela respondeu: “Oh Mensageiro de Deus, acaso estás
ordenando-me a fazer isso?” Ele respondeu: “Não, estou tratando somente de
interceder a favor da conciliação”. Ela respondeu: “pois, não tenho interesse
nele”. E o divórcio foi consumado. É interessante notar, que o Islam já
garantia o direito ao divórcio a ambos os cônjuges há quinze séculos, enquanto
que na Europa esse direito foi introduzido muito mais tarde, e no Brasil só
através da Lei 6.515 promulgado em 26 de dezembro de 1977. Por fim, é permitido
à mulher, após transcorrido o período de espera (Idaah) e consumado o divórcio,
casar-se novamente com quem ela desejar, desde que respeite as regras islâmicas
quanto ao casamento, não havendo nenhuma objeção quanto a isso. Universidade da
Região da Campanha. Campus do Curso de Direito. Bagé – RS – Brasil. Abraço.
Davi.
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