Islamismo. Livro Jesus um
Profeta do Islã. Por Muhammad Ata Ur-Rahim. Capítulo VIII. O
CRISTIANISMO DE HOJE. Parte I. Para podermos descobrir a natureza do cristianismo nos
nossos dias, é necessário termos presente a distinção entre o conhecimento que
nos chega através da observação, da dedução e o conhecimento que é revelado ao
homem independentemente. O conhecimento dedutivo está em mudança permanente, de
acordo com as novas experiências e observações, faltando-lhe, portanto,
certeza, enquanto o conhecimento revelado provém de Deus. Ora, em cada mensagem
revelada há sempre dois aspectos: o metafísico, que revela a natureza da Divina
Unidade e o físico, que fornece um código de comportamento. Além disso, o
conhecimento revelado foi sempre transmitido por alguém que deu corpo a uma
mensagem, através do modo como a viveu e difundiu; portanto, comportar-se como
o Mensageiro, corresponde a ter conhecimento da mensagem e é neste conhecimento
que se encontra a certeza. Diz-se que o Cristianismo atual se baseia no conhecimento
revelado, mas parte alguma da Bíblia contém a mensagem de Jesus intacta,
exatamente como lhe foi revelada, pois não há, praticamente, quaisquer
documentos sobre o modo como Jesus se comportou, além do que, os livros do Novo
Testamento nem sequer contêm descrições feitas por testemunhas oculares acerca
de suas ações ou daquilo que disse, pois foram escritos por pessoas a quem o
conhecimento chegou de segunda mão. Assim, tais documentos não são completos,
uma vez que, nada do que Jesus disse e fez ficou registrado, perdendo-se para
sempre. Aqueles que investigam o que está contido no Novo Testamento afirmam
que, mesmo incompleto, está pelo menos correto. No entanto, é significativo que
todos os antigos manuscritos do Novo Testamento que sobreviveram e de que
derivam todas as nossas traduções da Bíblia, foram escritos depois do Concílio
de Niceia, ao passo que o Código Sinaiticus, o Código Vaticanos data do século
IV e o Código Alexandrius do século V. Após o Concilio de Niceia, foram
sistematicamente destruídas cerca de trezentas outras descrições da vida de
Jesus, muitas das quais de testemunhas oculares. Aliás, os acontecimentos do
Concílio de Niceia mostram que a Igreja de Paulo tinha todas as razões para
alterar os quatro Evangelhos que sobreviveram. Torna-se claro, portanto, que os
manuscritos do Novo Testamento, escritos depois do Concílio de Niceia, são
diferentes dos que existiam antes do Concílio e torna-se, também, compreensível
que alguns Pergaminhos do Mar Morto, que não se coadunavam com os manuscritos
posteriores ao Concilio de Niceia, tenham sido escondidos. A própria Igreja
parece admitir a falta de credibilidade dos Evangelhos, pois o pensamento do
Cristianismo de nossos dias, nem sequer se baseia no que vem nos Evangelhos; a
Igreja oficial fundamenta-se nas doutrinas do pecado original, da expiação e
redenção, da Divindade de Jesus, da Divindade do Espírito Santo e da Trindade,
nenhuma das quais aparece nos Evangelhos, nem foi ensinada por Jesus, pois são
fruto das inovações de Paulo, da influência da cultura e da filosofia gregas.
Paulo nunca acompanhou Jesus, nem teve conhecimento direto de seus
ensinamentos. Antes de sua "conversão", perseguiu violentamente os
seguidores de Jesus e, depois dela, foi ele o grande responsável por se terem
abandonado as regras de vida que Jesus seguia, na ocasião em que levou o
"Cristianismo" aos não-judeus da Grécia e a terras ainda mais
distantes. A figura de "Cristo", que ele afirmava ter-lhe sido
transmitido pela nova doutrina, é pura imaginação e os seus ensinamentos se
fundamentam num acontecimento que nunca teve lugar — a suposta morte e
ressurreição de Jesus. Apesar de terem uma origem duvidosa, estas doutrinas
constituem parte integrante do condicionamento de todos aqueles a quem é dada
uma "Educação Cristã" e, embora muitos tenham rejeitado parte dela ou
a tenham mesmo rejeitado na integra, a magia que essas doutrinas exercem é tal,
que aqueles que lhe dão alguma credibilidade são levados, pela sua lógica, a
acreditar no princípio muito difundido de que: «Fora da Igreja não há
salvação». A idealização metafísica da Igreja é a seguinte: A doutrina da
expiação e redenção afirma que Cristo, que pertencia a Deus, recebeu uma forma
humana e se transformou em Jesus, o qual veio a morrer a fim de expiar todos os
pecados da humanidade. A Igreja garante o perdão dos pecados e a salvação no
"Dia do Juízo Final" a todos aqueles que crêem em "Cristo"
e seguem os seus ensinamentos. Mais ainda, acredita-se que este contrato está à
disposição de todas as pessoas, até ao fim do mundo. As consequências naturais
dessa crença são as seguintes. Em primeiro lugar, o pressuposto de que homem
não é responsável por suas ações, nem terá que prestar conta delas depois de
sua morte, pois, tenha ele feito o que quer que seja, acredita que vai ser
redimido pelo "sacrifício de Cristo". No entanto, isto não significa
uma vida de alegria na terra, na medida em que a sua crença na doutrina do
pecado original — segundo a qual, devido À falta que Adão cometeu, todos os homens
nascem em estado de pecado — significa que, enquanto estiver vivo, a sua
condição é de indignidade e imperfeição. Esta visão trágica da vida está
refletida na seguinte declaração do cristão J. G. Voss, quando compara o
Islamismo com o cristianismo: “Não existe nada no Islamismo que leve um homem a
dizer: "Oh, que homem malvado eu sou! Quem libertará o meu corpo desse
destino mortal"? ou "Eu sei que em mim, isto é, na minha carne não
mora boa coisa". Uma religião com objetivos razoáveis e realizáveis... não
dá ao pecador a angústia duma consciência pesada, nem a frustração de, através
da vida prática, tentar atingir, sem sucesso, as exigências de um padrão moral
absoluto. Em poucas palavras, o Islamismo faz com que o homem se sinta bem,
enquanto o Cristianismo, desde o início e pelos séculos fora, tem feito com que
o homem se sinta mal. A religião que despedaça o coração é o Cristianismo, não
o Islamismo». Em segundo lugar, a crença na doutrina da expiação e redenção dá
origem a uma grande confusão, sempre que um cristão tenta conciliar os outros
ensinamentos que Deus revelou ao homem com a sua própria crença, pois pressupõe
que o "sacrifício de Cristo" e a sua "mensagem" são únicos
e definitivos e, portanto, não pode aceitar os ensinamentos de outros Profetas,
ao mesmo tempo que não pode negar a verdade que eles revelam. Desta forma, um
cristão rejeita o judaísmo, mas aceita o Antigo Testamento que provém dos
ensinamentos que Moisés legou aos judeus, colocando-se assim na posição
impossível de ter que aceitar duas crenças que se contradizem, como mostra a
seguinte passagem: «Existem elementos relativamente bons nas crenças
não-cristãs. Embora a Bíblia faça vários apelos para que nos afastemos das
falsas religiões e as Escrituras falem do caráter demoníaco das crenças
pagãs... a verdade, é que se encontram elementos relativamente bons nessas
religiões. Embora seja verdade que têm caráter demoníaco, é igualmente verdade
(e vem nas Escrituras) que elas são um produto das falsas interpretações que o
homem faz, relativamente à revelação de Deus na natureza. Apesar de poderem ser
obra do diabo, mesmo assim, não são, apenas, obra do diabo, pois em parte são
um produto da graça comum a Deus e, em parte, são um produto dos abusos do
homem pecador em relação à revelação de Deus na natureza. É significativo que
J. G. Vos não tenha mencionado as distorções que a Bíblia já sofreu. Numa
tentativa de evitar o dilema da simultânea aceitação e rejeição das crenças
não-cristãs, há quem defenda que alguns cristãos “separam neles a influência do
'Cristo cósmico' que, como Logos eterno e revelador da vontade de Deus, 'é a
luz que ilumina todos os homens'”. Esta opinião... foi resumida por William
Temple (1881-1944), quando escreveu o seguinte: «Através da palavra de Deus —
que é o mesmo que dizer, de Jesus Cristo — Isaias, Platão, Zoroastro, Buda e
Confúcio proferiram e escreveram algumas verdades, tal como eles declararam. Há
uma única Luz Divina e cada homem, à sua medida, é iluminado por ela». O
raciocínio dessa passagem se baseia no pressuposto de que "uma Luz
Divina" e "Cristo" são a mesma coisa. Ora uma vez que
"Cristo" é um fruto da imaginação, a doutrina falha, logo, o dilema
permanece e apenas poderá ser resolvido recorrendo ao "pensamento duplo"
de George Orwell (1903-1950), assim definido pelo próprio: «O "pensamento
duplo" significa que é possível manter simultaneamente duas crenças
contraditórias, aceitando ambas. A inteligência sabe que brinca com a
realidade, mas através do exercício do "pensamento duplo" também se
persuade de que a realidade não é violentada». O "pensamento duplo"
está na base do pressuposto de que Cristo é Deus, em torno do qual se propaga,
com toda a intensidade, a controvérsia acerca das duas naturezas de Jesus. Num
momento é humano e no momento seguinte é Divino; primeiro é Jesus, depois é
Cristo. Só através do exercício do "pensamento duplo" o homem pode
aceitar, simultaneamente, essas duas crenças contraditórias, assim como manter
a doutrina da Trindade. O Artigo VII dos Trinta e Nove Artigos da Igreja da
Inglaterra começam assim: «O Antigo Testamento não é contrário ao Novo ...».
Como Milton já demonstrara com toda a clareza, o Antigo Testamento está cheio
de passagens afirmando a Unicidade de Deus, sem que qualquer delas descreva a
Realidade Divina nos termos da doutrina da Trindade. O fato de se afirmar o que
está no Antigo Testamento ou nos Evangelhos e, ao mesmo tempo, defender-se a
crença na doutrina da Trindade é, talvez, a melhor demonstração do exercício do
"pensamento duplo" no cristianismo de hoje. Dessa forma, a lógica do
pensamento da Igreja, na medida em que se baseia em doutrinas que nunca foram
ensinadas por Jesus, obscurece não só a natureza de Jesus, mas também a Unidade
Divina. Atualmente, a metafísica do Cristianismo é totalmente oposta à que
Jesus trouxe. O seu aspecto físico, o seu comportamento, estão
irrecuperavelmente perdidos. Viver como Jesus viveu significa, apenas,
compreender sua mensagem, pois, praticamente, não há quaisquer documentos sobre
a maneira como Jesus viveu e o pouco que existe é ignorado. O ato mais
importante e fundamental de Jesus foi o da adoração do Criador, propósito para
o qual o homem foi criado. No entanto, é evidente que nenhum cristão pratica os
mesmos atos de adoração de Jesus, que todos os dias rezava habitualmente na
sinagoga, a horas fixas, de manhã, ao meio do dia e à noite. Já não se conhecem
exatamente as orações que Jesus rezou, então, mas sabe-se que se baseavam nas
orações que foram dadas a Moisés. Jesus disse que tinha vindo para fazer
cumprir a Lei e não para destruí-la, nem na menor fração, educaram-no, desde os
onze anos, numa sinagoga que costumava limpar, em Jerusalém. Hoje, nenhum
cristão executa essas tarefas. Além disso, quantos cristãos foram circuncidados
tal como Jesus? Os serviços religiosos das Igrejas atuais foram criados muito
depois de Jesus ter desaparecido e muitos deles descendem mesmo dos rituais
mitológicos greco-romanos. As orações que rezam não são as que Jesus orou e os
hinos que cantam não são os louvores que Jesus entoou a Deus. Devido a estas
inovações de Paulo e de seus seguidores, já não há qualquer ensinamento quanto
ao que se deve comer e não comer. Hoje, qualquer pessoa a quem tenha sido dada
uma "educação cristã" come aquilo que lhe apetece, embora Jesus e os
seus verdadeiros seguidores apenas comessem carne limpa, segundo a lei judaica,
estivessem proibidos de comer carne de porco. Pensa-se que a última refeição
que Jesus tomou, antes do seu desaparecimento, foi a Ceia. Nenhum cristão, hoje
em dia, celebra essa velha tradição judaica que Jesus cumpria tão
meticulosamente. Já não se sabe de que maneira Jesus comia e bebia, com quem
comeria, onde comeria, quando comeria e não comeria. Jesus jejuava, mas, de
novo, não se sabe como, onde ou quando o fazia. A sua ciência do jejum se
perdeu. Não há qualquer referência aos alimentos de que ele pudesse,
especialmente, gostar. Jesus não se casou enquanto viveu na terra, mas não
proibiu o casamento. Não há qualquer passagem na Bíblia indicando que um
seguidor de Jesus tenha que ser celibatário, nem qualquer mandamento no sentido
da criação de comunidades de um só sexo como os mosteiros ou os conventos,
embora essas possam ter sido originadas em comunidades como as dos Essênios.
Abraço. Davi
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