segunda-feira, 30 de setembro de 2024

RELIGIÃO NÃO É LUTA É PURA COMPREENSÃO.

 

Espiritualidade. Texto de Osho (1931-1990). RELIGIÃO NÃO É LUTA É PURA COMPREENSÃO. Pergunta: Osho, frequentemente eu ouço você falar sobre rebelião. Os padres e as freiras e os pais que definiram minha educação, agora estão velhos. A maioria já morreu. Parece que não vale a pena rebelar-me contra aquelas pessoas velhas e desamparadas. Agora, eu mesmo sou o padre e as doutrinas. Eu sinto que me rebelar contra qualquer coisa do lado de fora de mim é um desperdício de tempo e esse não é exatamente o ponto. Isso torna a situação muito mais frustrante e embaraçosa. Parece que algo dentro de mim  tem que se rebelar contra algo dentro de mim. Eu aceito que não é o meu ser essencial – a face original – que tem que se rebelar. É o self treinado – o subterfúgio. Mas, para me rebelar, eu tenho que usar esse "self", pois ele é o único que eu conheço. Como pode o subterfúgio se rebelar contra o subterfúgio?". A rebelião da qual eu tenho falado não tem que ser feita contra ninguém. Ela não é na verdade uma rebelião, mas somente uma compreensão. Não, você não tem que lutar contra os padres, as freiras e os pais externos. E você não tem também que lutar contra os padres, freiras e pais internos. Porque, internos ou externos, eles estão separados de você. O externo está separado, e o interno também está separado. O interno é apenas o reflexo do externo.  Você está perfeitamente certo ao dizer: 'parece que não vale a pena rebelar-me contra aquelas pessoas velhas e desamparadas'. Eu não estou dizendo a você para se rebelar contra aquelas pessoas velhas e desamparadas.  E eu também não estou dizendo a você para se rebelar contra tudo o que eles incutiram em você. Se você se rebelar contra sua própria mente, isso será uma reação, não uma rebelião. Note a diferença. A reação surge a partir da raiva; a reação é violenta. Numa reação você se torna cego de raiva. Numa reação você passa para o outro extremo. Por exemplo, se os seus pais ensinaram você a ficar limpo e tomar um banho todo dia, e mais isso e mais aquilo, e se foi ensinado a você desde pequenino que a limpeza está próxima de Deus; o que você fará, se um dia você começar a se rebelar? Você vai parar de tomar banho. Você vai começar a viver imundo. Isso é o que os Hippies seguiram fazendo ao redor do mundo. Eles pensavam que isso era rebelião. Eles passaram para o outro extremo. A eles foi ensinado que a limpeza era divina; agora eles estão pensando que a imundície é divina, que a sujeira é divina. De um extremo, eles passaram para o outro. Isso não é rebelião. Isso é raiva, isso é ira, isso é desforra. Enquanto você estiver reagindo aos seus pais e às suas ideias de limpeza, você ainda está apegado àquelas mesmas ideias. Elas ainda estão dentro de você, elas ainda têm um poder sobre você, elas ainda são dominantes, elas ainda são decisivas. Elas ainda decidem a sua vida, embora você tenha se tornado o oposto delas; mas elas decidem. Você não pode tomar um banho tranquilo, pois você se lembrará de seus pais que o forçavam a tomar banho todos os dias. Agora você não quer tomar mais banho, de jeito algum. Quem está dominando você? Ainda os seus pais. O que eles fizeram com você, você ainda não foi capaz de desfazer. Isso é uma reação, isso não é rebelião. Então o que é rebelião? Rebelião é pura compreensão. Você simplesmente compreende qual é o caso. Então você não fica mais obcecado por limpeza, e isso é tudo. Isso não quer dizer que você vá se tornar sujo. A limpeza tem sua própria beleza. Mas a pessoa não deve ficar obcecada por ela, porque obsessão é doença. Por exemplo, uma pessoa lavando suas mãos continuamente por todo o dia – isso é neurose. Lavar as mãos não é coisa ruim, mas, lavar suas mãos por todo o dia é loucura. Mas se, de lavar as mãos por todo o dia, você passar a não as lavar; se você parar de lavá-las para sempre, então de novo você terá caído na armadilha, num outro tipo de loucura, o tipo oposto. Um homem de compreensão lava suas mãos quando é necessário, ele não está obcecado com isso. Ele é simplesmente espontâneo e natural a respeito disso. Ele vive inteligentemente e isso é tudo. Mas, se você não prestar muita atenção nos pequenos detalhes, não verá muita diferença entre obsessão e inteligência. Por exemplo, se você cruzar com uma cobra no caminho e você der um salto, naturalmente você deu um salto devido ao medo. Mas esse medo é inteligência. Se você não for inteligente, for estúpido, você não vai pular para fora do caminho e, desnecessariamente, colocará a sua vida em perigo. A pessoa inteligente irá pular imediatamente - a cobra está ali. Isso é devido ao medo, mas esse medo é inteligente, positivo, está a serviço da vida. Mas esse medo pode se tornar obsessivo. Por exemplo, você pode não querer sentar dentro de uma casa. Quem sabe? Ela pode desmoronar. E sabe-se que casas se desmoronam, isso é verdade. Algumas vezes, elas têm desmoronado; você não está absolutamente errado. Você pode argumentar: 'se outras casas desmoronaram, por que não esta?' Agora você está com medo de viver sob qualquer teto - ele pode desabar. Isso é uma obsessão. Isso agora se tornou não inteligente. É bom estar alerta de que você está comendo um alimento limpo. Mas eu conheço um homem, um grande poeta (...). Certa vez ele viajava comigo. Sua esposa me contou, 'Agora você saberá o quanto é difícil viver com esse homem.' Eu perguntei: 'Qual é o problema?'. Ela disse: 'Você vai saber por si próprio.' Ele não bebia nenhum chá, nem água, em nenhum lugar. Era muito difícil, porque ele dizia, 'quem sabe se não existem germes no chá ou na água?' Ele não comia em nenhum hotel. Isso se tornou um tal problema... E nós tínhamos que viajar trinta e seis horas de trem e ele estava morrendo de fome e com sede e ele não bebia água. Eu tentei de toda maneira persuadi-lo. Ele dizia, 'Não. Quem sabe? E se houver germes? É melhor,' dizia ele, 'passar fome por trinta e seis horas e não comer. Eu não vou morrer, não se preocupe,' Mas eu podia ver que o homem estava torturando a si mesmo. Era um verão muito quente e ele estava com sede. E eu tentava em toda estação - eu trazia soda, trazia coca cola, eu trazia tudo que podia. Mas ele dizia, 'Esqueça isso - eu não posso tomar nada a não ser que eu esteja absolutamente seguro. Qual é a segurança? Qual é a garantia?' E ele não estava absolutamente errado, isso é verdade. Você conhece a Índia, e você conhece as estações indianas e os hotéis indianos. Você sabe. Ele está certo, mas agora ele está levando essa lógica longe demais. Então eu disse a ele, 'Pare de respirar também!' Ele disse: 'Por quê?' Eu disse: 'Quem sabe, qual é a garantia? Pare de respirar! Ou beba esta água ou pare de respirar!' Então ele olhou para mim assustado, porque eu estava realmente raivoso. 'Por que você segue respirando? Quem sabe, podem existir germes, existem germes em toda parte. Ele tomou uma xícara de chá, mas a maneira como ele tomou (...)! Sua face (...). Eu não consigo esquecer. Já se passaram dez anos, mas eu não consigo esquecer a sua face – era como se eu estivesse matando aquele homem! Eu era um assassino! E ele estava obrigando-me a isso. Na estação seguinte, ele desceu e disse, 'Eu não posso viajar com você; eu vou voltar para casa. 'Eu disse, 'Qual é o problema? 'Ele disse, 'Você estava com tanta raiva, e parecia que você ia começar a me bater ou alguma coisa assim. E você disse: Não respire mais. Como eu posso parar de respirar?' Eu disse, 'Eu só estava dando a você um argumento, que se você pode respirar, por que não beber a água? É a mesma água indiana e o mesmo ar indiano. Não há com que se preocupar. Ele se recusou a viajar comigo. Eu tive que viajar sozinho. Ele retornou e desde então eu nunca mais o vi. A pessoa pode se tornar obsessiva a respeito de qualquer coisa. Qualquer coisa que pode ser inteligente dentro de certos limites, pode se tornar uma neurose se você ampliar esses limites. Reagir é passar para o outro extremo. Rebelião é uma compreensão muito profunda, compreensão profunda de um certo fenômeno. A rebelião sempre mantém você no meio, ela dá a você um equilíbrio. Você não tem que brigar com ninguém, as freiras e os padres e os pais, externos e internos. Você não tem que brigar com ninguém, porque numa briga você nunca sabe onde vai parar. Numa briga a pessoa perde a consciência; numa briga a pessoa passa logo para os extremos. Você pode observar isso. Por exemplo, você está sentado com seus amigos e, no meio da conversa, você diz, 'Aquele filme que eu vi ontem não vale a pena ser visto.' Isso pode ter sido um comentário à-toa, mas então alguém diz, 'Você está errado. Eu também vi o filme. Ele é um dos mais belos filmes que já foram feitos.' Você foi provocado, desafiado; e agora você se enche de argumentos. Você diz, 'ele não tem valor, é a coisa mais sem valor que existe!'  E você começa a criticar. E se o outro também insistir, você vai se tornar mais e mais raivoso e vai começar a dizer coisas que você nem mesmo tinha pensado a respeito. E mais tarde, se você olhar para trás e ver todo o fenômeno que aconteceu, você ficará surpreso pois quando você mencionou que o filme não valia a pena ser visto era uma afirmação muito moderada, mas com o passar do tempo você adotou argumentos e você já estava numa posição extremada. Você usou tudo que era possível, todas as palavras mais desagradáveis que você conhecia. Você condenou de toda maneira, você usou toda a sua habilidade para condenar. E você não estava com disposição para fazer isso no começo. Se ninguém tivesse contestado você, você poderia ter esquecido aquele assunto, você não iria nunca fazer aquelas afirmações pesadas. Isso acontece – quando você começa a brigar, a tendência é você passar para os extremos. Eu não estou ensinando você a brigar com seus condicionamentos. Compreenda-os. Torne-se mais inteligente a respeito deles. Simplesmente veja como eles dominam você, como eles influenciam o seu comportamento, como eles modelam a sua personalidade, como eles seguem atingindo você pela porta dos fundos. Simplesmente observe! Seja meditativo. E um dia, quando você tiver visto o funcionamento dos seus condicionamentos, de repente um equilíbrio será alcançado. Em sua real compreensão você estará livre. Compreensão é liberdade, e essa liberdade eu chamo rebelião. O verdadeiro rebelde não é um lutador; ele é um homem de compreensão. Ele simplesmente cresce em inteligência, não em raiva, não em ira. Você não consegue transformar a si mesmo tendo raiva de seu passado. Dessa maneira, o passado irá continuar dominando você, o passado continuará sendo o centro de seu ser, o passado permanecerá o seu foco. Você permanecerá focado, preso ao passado. Você poderá passar para o outro extremo, mas você ainda continuará preso ao passado. Fique alerta quanto a isso! Esse não é o caminho de um meditador, esse não é o caminho de um sannyasin. Sannyas é rebelião – rebelião através da compreensão. Simplesmente compreenda. Você passa ao lado de uma igreja e um profundo desejo surge em você de ir ao interior e orar. Ou você passa ao lado de um templo e inconscientemente você se curva diante de uma divindade do templo. Simplesmente observe. Por que você está fazendo essas coisas? Eu não estou dizendo para brigar. Eu estou dizendo para observar. Por que você se curva diante do templo? Porque foi ensinado a você que esse é o templo certo, que a divindade desse templo é a imagem verdadeira de Deus. Você sabe? Ou isso foi simplesmente dito a você e você continua seguindo isso? Observe! Vendo isso, que você está simplesmente repetindo um programa que foi dado a você, que você está simplesmente repetindo um mesmo disco em sua cabeça, que você está sendo um autômato, um robô, você irá parar de se curvar. Não que você tenha que fazer qualquer esforço, você simplesmente irá se esquecer de tudo a respeito disso. Isso irá desaparecer, isso abandonará você sem deixar qualquer traço. Quando você reage, o traço permanece lá. Mas, na rebelião não fica nenhum traço; é liberdade completa. Você tem simplesmente que ser um observador. E o observar é a sua face original; aquele que observa é a sua consciência verdadeira. Aquilo que é observado é o condicionamento. Aquele que observa é a fonte divina de seu ser.www.oshobrasil.com.br. Abraço. Davi. 

sábado, 28 de setembro de 2024

PRINCÍPIOS GERAIS

 

Teosofia. Livro Introdução a Teosofia. Por Charles Webster Leadbeater (1854-1934). Capítulo II. PRINCÍPIOS GERAIS. É meu desejo tornar esta explicação sobre a Teosofia tão clara e prontamente compreensível quanto possível. Por esta razão, a cada momento, darei apenas preceitos gerais, remetendo aqueles que desejam informações mais detalhadas a livros mais específicos. Apresento, ao final de cada capítulo, uma lista de tais livros. Devendo ser consultados por aqueles que desejam aprofundar-se nesse sistema tão fascinante. Começarei com uma declaração das mais surpreendentes dos princípios gerais que emergem como resultado do estudo teosófico. Alguns poderão encontrar aqui assuntos que considerarão incríveis. Ou então completamente contrários a suas ideias preconcebidas. Se assim for, gostaria de lembrá-los que eu não estou apresentando isso com teoria, como especulação metafísica ou uma piedosa opinião. Mas como fato científico definido, provado e examinado muitas e muitas vezes, não apenas por mim mesmo, porém por muitos outros. Além disso, afirmo que é um fato que pode ser verificado em primeira mão por qualquer pessoa que esteja desejosa de devotar tempo e trabalho necessários para capacitar-se a essa investigação. Não estou oferecendo ao leitor um credo, para ser engolido como uma pílula. Estou tentando colocar diante dele um sistema para estudo, e acima de tudo uma vida para viver. Não lhe peço fé cega. Apenas lhe sugiro consideração do ensinamento teosófico como uma hipótese, embora para mim não seja contingência e sim um fato visto. Se ele achar esse sistema mais satisfatório do que outros que lhe forem apresentados, se ele lhe parecer resolver muitos dos problemas da vida e responder muitas interrogações que inevitavelmente surgem para o homem pensante. Então levará esses estudos adiante, e encontrará neles, eu espero e acredito, cada vez mais, a mesma satisfação e alegria que eu próprio encontrei. Se, por outro lado, achar possível algum outro sistema, nenhum mal foi causado. Ele simplesmente aprendeu algo dos princípios de um grupo de pessoas com as quais ainda é incapaz de concordar. Eu mesmo tenho bastante fé nesses princípios pra acreditar que,  mais cedo ou mais tarde, chegará o tempo em que ele concordará, quando também conhecer o que nós conhecemos. As Três Grandes Verdades. Num dos nossos primeiros livros teosóficos está escrito que existem três verdades absolutas, que não podem ser perdidas. Que, todavia, podem permanecer no silêncio por falta de quem as pronuncie. São tão grandes quanto a própria vida. Apesar disso, tão simples quanto a mente do mais simples dos homens. Posso apenas parafrasear essas verdades, como os maiores dos meus princípios gerais. Oferecerei então alguns corolários que naturalmente derivam dessas verdades. Alguns dos mais importantes entre os vantajosos resultados que necessariamente acompanham esse conhecimento definido. Tendo assim organizado o esquema, eu o tomarei ponto por ponto, buscando oferecer explanações tão elementares quanto possível, dentro do escopo deste livro introdutório. 1. Deus existe, e Ele é bom. Ele é o grande doador de vida que reside dentro e fora de nós. É imortal e eternamente beneficente. Não pode ser ouvido, nem visto, nem tocado, e ainda assim pode ser percebido pelo homem que o desejar. 2. O homem é imortal e o seu futuro é tal que sua glória e esplendor não tem limites. 3. Uma lei divina de justiça absoluta governa o mundo, de modo que cada homem é na verdade seu próprio juiz. O dispensador de glória ou tristeza para si próprio. O decretador de sua vida, sua recompensa, sua punição. Corolários – consequência. Ligados a cada uma dessas três grandes verdades estão algumas outras, subsidiárias e explanatórias. Da primeira delas segue: 1. Que o verdadeiro homem é a alma, e que este corpo é apenas um apanágio. 2. Ele deve, portanto, considerar cada coisa do ponto de vista da alma, e que toda vez que uma luta interna ocorrer. Ele deve reconhecer sua identidade com o mais elevado e não com o mais inferior. 3.Aquilo a que comumente chamamos sua vida e apenas um dia de sua vida verdadeira e mais ampla. 4. A morte é um assunto de muito menor importância do que geralmente se supõe. Já que não é de modo algum o fim da vida, mas meramente a passagem de um estágio para outro. 5. O homem tem uma enorme evolução atrás de si, cujo estudo é extremamente fascinante, interessante e instrutivo. 6. Ele tem também uma esplêndida evolução diante de si, cujo estudo será ainda mais instigante e instrutivo. 7. Há uma certeza da realização final para toda alma humana, não importando o quão distante ela possa parecer ter-se desviado do caminho da salvação. Da terceira grande verdade segue: 1. Que cada pensamento, palavra ou ação produz seu resultado definido, não uma recompensa ou punição imposta de fora. Contudo um resultado inerente à própria ação, definitivamente conectado com esta na relação de causa e efeito. Sendo estes na realidade nada mais que duas partes inseparáveis de um todo. 2. É tanto dever quanto interesse do homem estudar essa lei divina com o máximo de atenção, para que possa ser capaz de adaptar-se a ela e usá-la como usamos outras grandes leis da natureza. 3. Necessário se faz para o homem obter controle perfeito sobre si mesmo, para que possa guiar sua vida inteligentemente de acordo com essa lei. Vantagens obtidas com esse conhecimento. Quando esse conhecimento é completamente assimilado, muda o aspecto de vida tão integralmente que seria impossível computar todas as vantagens que dele fluem. Posso apenas mencionar umas poucas linhas principais ao longo das quais essa mudança é produzida. O pensamento do próprio leitor, irá, sem dúvida, suprir algumas das intermináveis ramificações que são sua consequência necessária. Mas deve-se compreender que nenhum conhecimento vago será suficiente. Tal crença, já que a maioria dos homens estão acordes com as afirmações de suas religiões. Será totalmente inútil, já que não produz qualquer efeito prático em suas vidas. Mas se acreditarmos nessas verdades como reconhecemos as leis da natureza. Como aceitamos que o fogo queima e que a água afoga. Então o efeito que produzem em nossas vidas será enorme. Pois a nossa crença nas leis da natureza é suficientemente real para nos induzir a ordenar as nossas vidas de acordo com ela. Cremos que o fogo queima, tomamos toda precaução para evitar o fogo. Acreditamos que a água afoga, evitamos entrar em águas profundas demais para nós, a não ser que saibamos nadar. Ora, essas crenças são tão definidas e reais que para nós porque estão fundamentadas no conhecimento e ilustradas pela experiência diária. AS crenças do estudante teosófico são igualmente reais e definidas para ele exatamente pelas mesmas razões. É por isso que descobrimos a partir delas os resultados a serem agora descritos: 1. Nós conseguimos uma compreensão racional da vida, sabemos como devemos viver e por quê. Aprendemos que a vida vale a pena ser vivida quando apropriadamente entendida. 2. Treinamos a governar a nós mesmo, portanto, com desenvolver a nós mesmos. 3, Desempenhamos como melhor ajudar aqueles a quem amamos, como nos tornar úteis a todos com quem entramos em contato e por fim a toda a raça humana. 4. Exercitamos a visualizar tudo a partir do ponto de vista filosófico mais amplo. Jamais do lado mesquinho e puramente pessoal. Consequentemente: 5. Os problemas da vida já não parecem mais tão grandes. 6. Não temos qualquer senso de injustiça em relação ao nosso derredor ou com o nosso destino. 7. Estamos totalmente libertos do temor da morte. 8. A nossa dor em relação a morte daqueles a quem amamos é grandemente diminuída. 9. Ganhamos uma visão diferente da vida após a morte e compreendemos o seu lugar na nossa evolução. 10. Estamos totalmente livres das preocupações ou temores religiosos, ou por nós mesmos ou por nossos amigos. Temores quanto a salvação da alma, por exemplo. 11. Não estamos mais preocupados por incertezas quanto ao nosso destino futuro. Vivemos em perfeita serenidade e sem temor algum. Agora tomemos esses pontos em detalhes e nos esforcemos para explaná-los resumidamente. Abraço. Davi

 

 

 

 

quinta-feira, 26 de setembro de 2024

A RELIGIÃO DO ISLAM. Parte IV

 

Islamismo. Livro Manual para o Novo Muçulmano. Por Jamaal Zarabozo (1960 - ). A RELIGIÃO DO ISLAM. Parte IV. Objetivos do Islam. Os ensinamentos do Islam não são meros rituais ou mistérios sem nenhum tipo de razão. Pelo contrário, a revelação assinala metas bem claras e almejadas. Entre elas estão as seguintes:  A adoração exclusiva a Allah, sem dúvida, a maior meta do Islam, como também sua maior contribuição ao bem-estar da humanidade, é a verdadeira e pura adoração a Allah, sem que se associe a Ele nenhum companheiro. Esse é, na realidade, o principal objetivo e propósito de um ser humano. Allah disse: “Não criei os gênios e os humanos, senão para Me adorarem.” (51:56). Não há meta mais honrosa ou nobre para um ser humano. O monoteísmo puro é o único sistema de crença que traz as verdadeiras respostas às perguntas que desconcertam praticamente todos os seres humanos: “de onde venho? Para onde vou? Qual a finalidade da minha existência?” Quanto à pergunta “de onde venho?”, o Islam explica que os seres humanos são criaturas honradas e criadas por Allah de uma maneira muito especial e têm a liberdade de escolher ser a mais nobre das criaturas ou estar no plano mais baixo da criação. Assim, disse Allah: “Que criamos o homem na mais perfeita proporção. Então, o reduzimos a mais baixa das escalas, salvo os fiéis, que praticam o bem; estes terão uma recompensa infalível.” (95:4-6). A resposta à pergunta “para onde vou?” é que o ser humano volta a se reunir com seu Senhor e Criador. Isso ocorrerá depois de sua morte. Não haverá escapatória para este encontro. Neste momento, a pessoa será julgada com justiça e equidade. Todas as ações que foram praticadas na sua vida serão analisadas. “Nesse dia, os homens comparecerão, em massa, para verem as suas obras. Quem tiver feito o bem, quer seja do peso de um átomo, vê-lo-á. Quem tiver feito o mal, quer seja do peso de um átomo, vê-lo-á.” (99:6-8). Este juízo começará com sua ação mais importante: sua atitude frente ao Criador Misericordioso e Cheio de Graça, Aquele que o criou, proveu, enviou a orientação, advertiu do castigo para os que se afastassem da verdade e prometeu uma grande recompensa aos que aceitassem a verdade, fossem agradecidos e submissos a Ele. No que concerne à pergunta “qual a finalidade da minha existência?”, o ser humano foi criado com o mais nobre dos fins: adorar a Allah somente ou, em outras palavras, ser um verdadeiro e sincero servo de Allah. Pode-se imaginar todo tipo de objetivos que as pessoas têm nesse mundo; pode-se ter como objetivo acabar com as doenças ou atingir a paz mundial. Em geral, essas admiráveis metas estão, de certa forma, corrompidas. Pode-se persegui-las por motivos egocêntricos, como ser recordado ou louvado como aquele que fez tal coisa. Pode-se conquistá-las dando as costas ao Criador, demonstrando arrogância e ingratidão, como também ignorância de como se atingem as verdadeiras metas mais nobres. Sem dúvidas, todas estas metas, que podem ser consideradas submetas, não estão à altura da que lidera a excelência da alma e das ações de uma pessoa, além da felicidade eterna na próxima vida. Em verdade, toda meta realmente boa desta vida deve ser uma parte verdadeira da adoração a Allah. Cumprir com o verdadeiro fim do ser humano e ter êxito no encontro com o Senhor depende totalmente da prática de um monoteísmo verdadeiro e intacto. Esse é o monoteísmo do qual se fala no Islam. Muitas pessoas dizem crer no “monoteísmo” e no fato de que só existe um Deus. Porém, em muitas ocasiões, este “monoteísmo” está manchado de várias maneiras. Em algumas das primeiras civilizações pré-modernas, começaram a atribuir filhos e filhas a Deus. Lamentavelmente, está clara contradição ao monoteísmo puro foi mantida até a era moderna por uma religião tão popular que é o Cristianismo. É habitual ouvir os cristãos falarem de Jesus, agradecer a ele e inclusive rezar para ele, em muitos casos esquecendo-se do “Pai”. Os cristãos podem recorrer a diversos jogos lógicos para afirmar que adoram a um só Deus, mas, na realidade, não se pode considerá-los verdadeiros monoteístas. De fato, a maioria – se não todos – dos que seguem a trindade sustentam que Jesus está no mesmo nível do Pai. Em outras palavras, perderam o monoteísmo. O novo muçulmano pode levar certo tempo para se dar conta das maneiras que as pessoas associam companheiros a Allah, sem praticar o verdadeiro monoteísmo. O cristão convertido ao Islam pode reconhecer rapidamente que o que lhe foi dito sobre a trindade não pode ser considerado monoteísmo. Ao mesmo tempo, sem dúvidas, pode ser que não se dê conta de que os sacerdotes, por exemplo, como portadores da palavra final, no que diz respeito à lei, é outra forma de associar parceiros a Allah. Nenhum sacerdote – nem nenhum ser humano – tem o direito de anular ou suplantar nenhuma lei de Allah. Isto também contradiz o monoteísmo puro. Por isso, Allah disse: “Tomaram por senhores seus rabinos e seus monges em vez de Deus, assim como fizeram com o Messias, filho de Maria, quando não lhes foi ordenado adorar senão a um só Deus. Não há mais divindade além d’Ele! Glorificado seja pelos parceiros que Lhe atribuem!” (9:31). O Islam é uma religião que estabelece o monoteísmo puro e erradica todas as formas de associação de parceiros a Allah, desde a mais óbvia até a menos clara. Sem dúvida alguma, o Islam é a única religião que pode afirmar tal coisa. À medida que o convertido aprende mais sobre sua fé, a luz do monoteísmo puro, Allah estando no topo do processo, brilhará cada vez mais forte em seu coração. - Livrar os seres humanos da adoração de quaisquer outros seres humanos ou objetos Obviamente esta é uma consequência direta do primeiro princípio de se adorar somente a Allah. Sem dúvidas, merece uma menção especial já que a dominação e subjugo dos seres humanos, por parte de seus iguais, é uma das tragédias mais graves da história da humanidade; talvez superada somente pela tragédia dos seres humanos que aceitam tal situação e se submetem voluntariamente a outros seres humanos. Há poucas coisas piores que um ser humano que se submete e adora a outros seres humanos. É algo totalmente degradante porque, na essência, todos os seres humanos compartilham da mesma natureza e debilidades humanas. Ninguém tem o direito de se colocar no lugar de Allah – o que inclui o tirano, o ditador ou o clero – perante os demais, subjugando-os com suas ordens sem se importar se estas são compatíveis ou não com o que Allah revelou. Esta meta do Islam foi expressa eloquentemente por dois dos primeiros muçulmanos. Quando foram perguntados pelo imperador da Pérsia o que trazia os muçulmanos às suas terras, dois diferentes companheiros do Profeta (que a paz e as bênçãos de Allah estejam com ele) responderam de forma similar: “Allah nos enviou para levar quem deseje da servidão à humanidade à servidão a Allah e da estreiteza deste mundo à grandeza e da injustiça na forma de vida (deste mundo) à justiça do Islam.” É interessante destacar que os seres humanos reconhecem facilmente os males de um governo tirano, ou seja, um ser humano dominando os demais.

tão, submetem-se voluntariamente à manipulação e opressão desta elite, muitas vezes disfarçada de democracia. Na realidade, ambos são maus e só podem ser remediados através da aceitação de Allah como Legislador e Autoridade máxima. Como discutiremos adiante, somente Allah pode estabelecer leis e ordens justas, pois só Ele está livre de paixões e preconceitos. Há muitas coisas que os seres humanos tendem a “adorar” ou das quais se tornam “escravos”, como as próprias paixões, o Estado ou nação e os desejos materiais. Allah descreve aos que tomam como deus seus próprios desejos: “Não tens reparado naquele que idolatrou a sua concupiscência! Deus extraviou-o com conhecimento, ensurdecendo os seus ouvidos e o seu coração, e cobriu a sua visão. Quem o iluminará, depois de Deus (tê-lo desencaminhado)? Não meditais, pois?” (45:23). O Profeta (que a paz e as bênçãos de Allah estejam com ele) disse: “Que o escravo das moedas de ouro e prata e das finas vestimentas pereça, pois se compraz se lhe dão essas coisas e não está satisfeito se não as dão.” (Bukhari). Na realidade, esta é uma forma de escravidão ou servidão – uma escravidão a algo que não é Allah. Ibn Taimiyah escreveu o seguinte: “Se ele for bem-sucedido, sente prazer; mas se falhar torna-se infeliz. Tal pessoa é abd (escravo) de seus desejos, pois a escravidão e a servidão são, na realidade, a escravidão e a servidão do coração. Portanto, o coração se torna escravo de tudo que o ponha nessa posição. Por esta razão se diz que: ‘O escravo é livre em tudo quanto está conforme o que Allah lhe proporcionou e o livre é escravo enquanto é presa de seus desejos. O Islam liberta as pessoas dessas falsas formas de adoração. Isso é alcançado através da libertação do coração dos caprichos e desejos. Liberta o coração desta forma de adoração fazendo com que este se apegue somente a Allah e construindo uma relação forte entre a pessoa e Allah (como será tratado mais à frente). A pessoa simplesmente deseja contentar Allah. Será feliz com tudo o que implique agradar a Allah e ficará insatisfeito com tudo o que não for do agrado de Allah. Este aspecto do Islam deve estar bem claro para um novo muçulmano. Deve reconhecer com facilidade em si mesmo todos esses falsos deuses que costumava seguir e adorar em sua vida pregressa. Toda sua vida pode haver girado em torno desses objetos de adoração. Pode ser que houvesse praticado qualquer coisa para alcançar suas metas, não se importando se os meios utilizados eram éticos. Essas metas o transformaram num tipo específico de pessoa. Avaliava sua vida inteira segundo essas metas. Se as alcançava, então, esta seria sua felicidade. Era um verdadeiro escravo desses objetivos. Agora pode compreender que a forma com que atingia suas metas, na realidade, estava afastando-o da adoração a Allah. - Fazer com que a vida na terra floresça O Islam é uma religião bela que satisfaz as necessidades do corpo e também da alma. O ser humano é composto de um lado espiritual e um material. Ambos os lados de uma pessoa devem ser reconhecidos como “verdadeiros”, sem negar nem ignorar nenhum deles. Além disso, o indivíduo precisa ser guiado em ambos os aspectos de sua personalidade. Do contrário, um aspecto dominará ou estará em conflito com o outro e a pessoa nunca alcançará a verdadeira felicidade. Por exemplo, há aqueles que destacam as necessidades espirituais, mas ignoram os aspectos materiais do mundo. Ao mesmo tempo, sem dúvidas, vêem-se obrigados a participar dos aspectos materiais deste mundo que são parte da natureza humana. Tais pessoas se encontram num conflito quando percebem que não podem se libertar totalmente das necessidades materiais que tanto desprezam. Por outro lado, existem os sistemas econômicos, como o capitalismo e o socialismo, que buscam satisfazer as necessidades materiais – de fato, os capitalistas afirmam trazer “o melhor de todos os mundos possíveis.” Mas, na realidade, pode-se provocar um grande buraco na psique da pessoa, pois a satisfação das necessidades materiais não preenche o vazio interno. Allah fez dos seres humanos os sucessores desta terra: “(Recorda-te ó Profeta) de quando teu Senhor disse aos anjos: Vou instituir um legatário na terra...”(2:30). Assim, a postura do islam é que os seres humanos foram postos sobre a terra intencionalmente por Allah e utilizam os meios materiais para construir uma vida positiva neste mundo passageiro, o qual, eventualmente, os levará a uma próxima vida eterna e satisfatória. Nesse sentido, Allah disse: “Mas procura, com aquilo com que Deus te tem agraciado, a morada do outro mundo; não te esqueças da tua porção neste mundo, e sê amável, como Deus tem sido para contigo, e não semeies a corrupção na terra, porque Deus não aprecia os corruptores.” (28:77). De fato, inclusive depois de finalizada a oração de sexta-feira, um dos atos de adoração mais significativos do Islam, Allah nos ordena sair e buscar o sustento deste mundo: “Porém, uma vez observada a oração, dispersai-vos pela terra e procurai as graças de Deus, e mencionai muito Deus, para que prospereis.” (62:10). Na realidade, os seres humanos são os guardiões desta grande criação e supõese que devem se comportar de maneira apropriada. Não são donos e nem têm a liberdade para usar da criação da forma que desejam. Não podem explorá-la visando benefícios pessoais ou por vingança. Tampouco, devem desperdiçar os recursos desta terra por extravagância ou com fins prejudiciais. Pelo contrário, devem se comportar como Allah estabeleceu: “São aqueles que, quando os estabelecemos na terra, observam a oração, pagam o zakat, recomendam o bem e proíbem o ilícito. E em Deus repousa o destino de todos os assuntos.” (22:41). Este ensinamento do Islam também é mencionado em diversos versículos onde Allah proíbe a corrupção (fasaad) na terra – como consta no 28:77, mencionado anteriormente. Allah também disse: “E não causeis corrupção na terra, depois de haver sido pacificada. Igualmente, invocai-O com temor e esperança, porque Sua misericórdia está próxima dos benfeitores.” (7:56). “...Recordai-vos das mercês de Deus para convosco e não causeis flagelo, nem corrupção na terra.” (7:74). Por outro lado, Allah promete uma grande recompensa àqueles que vivem suas vidas mediante o princípio de não promover ou buscar o mal ou a corrupção. Disse Allah: “Destinamos a morada, no outro mundo, àqueles que não se envaidecem nem fazem corrupção na terra; e a recompensa será dos tementes.” (28:83). Allah deixou claro que quando as pessoas estiverem em frente a Ele, no Dia da Ressurreição, os que causaram mal na terra não serão tratados de igual maneira que os que praticaram o bem. Disse Allah: “Porventura, trataremos os fiéis, que praticam o bem, como os corruptores na terra? Ou então trataremos os tementes como os ignóbeis?” (38:28). Lamentavelmente, o que muitas pessoas advertem é que a melhor forma de se espalhar a corrupção e o mal sobre a terra é dando as costas ao que Allah nos ordenou. Abraço. Davi.

 

terça-feira, 24 de setembro de 2024

PRÓLOGO

 

Cristianismo. Livro Catecismo da Igreja Católica. PRÓLOGO. “Pai, (...) esta é a vida eterna: que conheçam a ti, o Deus único e verdadeiro, e a Jesus Cristo, aquele que enviaste” João 17,3. Deus nosso Salvador, “quer que todos sejam salvos e cheguem ao conhecimento da verdade” I Timóteo 2,3-4. “Não existe debaixo do céu outro nome dado à humanidade pelo qual devamos ser salvos” Atos 4,12, exceto o nome de Jesus. 1. A vida do homem – Conhecer e amar a Deus. Deus infinitamente perfeito e bem-aventurado em si mesmo, em um desígnio de pura bondade, criou livremente o homem para fazê-lo participar de sua vida bem-aventurada. Eis por que, desde sempre e em todo lugar, está perto do homem. Chama-o e ajuda-o a procurá-lo, a conhecê-lo e a amá-lo com todas as suas forças. Convoca todos os homens dispersos pelo pecado, para a unidade de sua família, a Igreja. Faz isto por meio do Filho, que enviou como Redentor e Salvador, quando os tempos se cumpriram. Nele e por ele, chama os homens a se tornarem, no Espírito Santo, seus filhos adotivos “legítimos” e, portanto, os herdeiros de sua vida bem-aventurada. A fim e que este chamado ressoe pela terra inteira, Cristo enviou os apóstolos que escolhera, dando-lhes o mandato de anunciar o Evangelho: “Ide, pois, fazer discípulos entre todas as nações, e batizai-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Ensinai-lhes a observar tudo o que vos tenho ordenado. Eis que estou convosco todos os dias, até o fim dos tempos” Mateus 28,19-20. Fortalecidos com esta missão, os apóstolos “foram anunciar a Boa Nova por toda a parte. O Senhor os ajudava e confirmava sua palavra pelos sinais que a acompanhavam” Marcos 16,20. Os que, com a ajuda de Deus, acolheram o chamado de Cristo e lhe responderam livremente foram, por sua vez, impulsionados pelo amor de Cristo a anunciar, por todas as partes do mundo, a Boa Notícia. Este tesouro recebido dos apóstolos foi guardado fielmente por seus sucessores. Todos os fiéis de Cristo são chamados a transmiti-lo de geração a geração, anunciando a fé, a vivendo na partilha fraterna e a celebrando na liturgia e na oração. 2. Transmitir a fé – A catequese. Bem cedo se passou a chamar de catequese o conjunto de esforços empreendidos na Igreja para fazer discípulos, para ajudar os homens a crerem que Jesus é o Filho de Deus. A fim de que, por meio da fé, tenham a vida em nome dele, para educá-los e instruí-los nesta vida, e assim construir o Corpo de Cristo. A catequese é uma educação da fé das crianças, dos jovens e dos adultos, a qual compreende especialmente o ensino da doutrina cristã. Ministrado, em geral, de maneira orgânica e sistemática, com o fim de iniciá-los na plenitude da vida cristã. Sem confundir-se com eles, a catequese articula-se em torno de determinado número de elementos da missão pastoral da Igreja. Os quais têm um aspecto catequético e preparam a catequese ou dela derivam: primeiro anúncio do Evangelho ou pregação missionária para suscitar a fé. Busca das razões de crer. Experiência de vida cristã. Celebração dos sacramentos. Integração da comunidade eclesial e testemunho apostólico e missionário. “A catequese está intimamente ligada a toda a vida da Igreja. Não somente a extensão geográfica e o aumento numérico, mas também e mais ainda o crescimento interior da Igreja. Sua correspondência ao desígnio de Deus depende da própria catequese”. Os períodos de renovação da Igreja são também tempos fortes da catequese. Eis por que, na grande época dos Padres da Igreja, vemos santos bispos dedicarem uma parte importante de seu ministério à catequese. É a época de São Cirilo de Jerusalém (315 - ?) e de São João Crisóstomo ( ? – 407), Santo Ambrósio ( ? – 397) e de Santo Agostinho (354 – 430), e de muitos outros Padres cujas obras catequéticas permanecem como modelos. O ministério da catequese sempre colhe dos Concílios renovadas energias. O Concílio de Trento (1545-1563) constitui, neste ponto, um exemplo a ser sublinhado. Deu a catequese prioridade em suas constituições e em seus decretos. Está ele na origem do Catecismo Romano, que também leva seu nome e constitui uma obra de primeira grandeza como resumo da doutrina cristã. Este concílio suscitou na Igreja uma organização notável da catequese. Graças a santos bispos e teólogos como São Pedro Canísio (1521-1597), São Carlos Borromeu (15381584), São Turíbio de Mogrovejo (1538-1606), São Roberto Belarmino (1542-1621), levou a publicação de números catecismos. Diante disto, não é de estranhar que, no dinamismo que seguiu o Concílio Vaticano II (1962-1965). Considerado pelo Papa Paulo VI (1897-1978) como grande catecismo dos tempos modernos, a catequese da Igreja tenha novamente despertado a atenção. Dão testemunho deste fato o Diretório Geral da Catequese de 1971. As sessões do Sínodo dos Bispos dedicadas à evangelização, 1974 e à catequese de 1977. As exortações apostólicas correspondentes, Evangelii nuntiandi de 1975 e a Catechesi tradendae de 1979. A sessão extraordinária do Sínodo dos Bispos de 1985 pediu: “Seja redigido um catecismo ou compêndio de toda a doutrina católica tanto sobre a fé como sobre a moral. O Santo Padre João Paulo II (1920-2005) endossou este anseio expresso pelo Sínodo dos Bispos. Reconhecendo que este desejo responde plenamente a uma verdadeira necessidade da Igreja universal e das Igrejas particulares”. Ele empenhou todos os esforços em prol da realização desta aspiração dos Padres do Sínodo. 3. Objetivo e os destinatários deste Catecismo. O presente Catecismo tem por objetivo apresentar uma exposição orgânica e sintética dos conteúdos essenciais e fundamentais da doutrina católica tanto sobre a fé como sobre a moral. À luz do Concílio Vaticano II e do conjunto da tradição da Igreja. Suas fontes principais são as Sagradas Escrituras, os santos Padres, a Liturgia e o Magistério da Igreja. Destina-se ele a servir como um ponto de referência para os catecismos ou compêndios que venham a ser elaborados nos diversos países. O presente Catecismo é destinado principalmente aos responsáveis pela catequese: em primeiro lugar aos bispos, como mestres da fé e pastores da Igreja. É oferecido a eles como instrumento no cumprimento de seu ofício de ensinar o povo de Deus. Por meio dos bispos, ele se destina aos redatores de catecismos, aos presbíteros e aos catequistas. Será também útil para a leitura de todos os demais fiéis cristãos. 4. Estrutura deste Catecismo. O projeto deste Catecismo inspira-se na grande tradição dos catecismos que articulam a catequese em torno de quatro pilares: a profissão da fé batismal, o símbolo. Os sacramentos da fé. A vida de fé, os mandamentos. A oração do crente, o “Pai-nosso”. Primeira Parte – A profissão de fé. Aqueles que, pela fé e pelo Batismo, pertencem a Cristo devem confessar sua fé batismal diante dos homens. Por isso, o Catecismo começa por expor em que consiste a Revelação, pela qual Deus se dirige e se doa aos homens. Bem como a fé, pela qual o homem responde a Deus. O Símbolo da fé resume os dons que Deus, como Autor de todo bem, como Redentor, como Santificador, outorga ao homem e os articula em torno dos “três capítulos” de nosso Batismo – a fé em um só Deus. O Pai Todo Poderoso, o Criador. Jesus Cristo, seu Filho, nosso Senhor e Salvador. O Espírito Santo, na Santa Igreja. Segunda Parte – O sacramento da fé. A segunda parte do catecismo expõe como a salvação de Deus, realizada uma vez por todos por Cristo Jesus e pelo Espírito Santo, torna-se presença nas ações sagradas da liturgia da Igreja, particularmente nos sete sacramentos. Terceira Parte – A vida de fé. A terceira parte do catecismo apresenta o fim último do homem. Criado a imagem e semelhança de Deus – a bem-aventurança – e os caminhos para chega a ela, mediante um guiar reto e livre. Com a ajuda da fé e da graça de Deus, por meio de um agir que realiza o duplo mandamento da caridade, desdobrado nos dez Mandamento de Deus. Quarta Parte – A oração na vida da fé. A última parte do catecismo trata do sentido e da importância da oração na vida dos crentes. Ela termina com um breve comentário sobre os sete pedidos da oração. Com efeito, nesses sete pedidos encontramos o conjunto dos bens que devemos esperar e que nosso Pai celeste quer nos conceder. 5. Indicações práticas para o uso deste Catecismo. Este catecismo foi pensado como uma exposição orgânica de toda a fé católica. É preciso o ler como uma unidade. Numerosas referências dentro do próprio texto, bem como o índice analítico no fim do volume, permitem ver a ligação de cada tema com o conjunto da fé. Muitas vezes os textos da Sagrada Escritura não são citados literalmente, mas são feitas apenas referências, mediante a indicação “conforme Para a compreensão mais profunda de tais passagens é preciso consultar os próprios textos. Essas referências bíblicas constituem um instrumento de Trabalho para a catequese. Quando em certas passagens usa-se graficamente, “corpo menor” isso indica que se trata de observações de tipo histórico, apologético ou de exposição doutrinais complementares. As citações, em corpo menor, de fonte patrística, litúrgicas, magisteriais ou haglográficas são destinadas a enriquecer a exposição doutrinal. Com frequência, esses textos foram escolhidos para uso diretamente catequético. No final de cada unidade temática, uma série de textos breves apresentam, de modo resumido, o essencial do ensinamento. Esses “resumos” têm por objetivos oferecer fórmulas breves e memorizáveis à catequese local. 6. As adaptações necessárias. Neste Catecismo, a ênfase é posta na exposição doutrinal. Quer ele ajudar a aprofundar o conhecimento da fé. Por isso mesmo está orientado para o amadurecimento desta fé, para seu enraizamento na vida e sua irradiação no testemunho. Por sua própria finalidade, este Catecismo não se propõe a realizar as adaptações da exposição e dos métodos catequéticos exigidos pela diferença de cultura, idade, maturidade espiritual, situações sociais e eclesiais daqueles a quem a catequese é dirigida. Tais indispensáveis adaptações cabem aos catecismos próprios e mais ainda aos que ministram instruções aos fiéis. “Aquele que ensina deve “fazer-se tudo para todos” I Coríntios 9,22, a fim de conquistar todos para Jesus Cristo (...). Particularmente, não imagine ele que lhe é confiado um único tipo de alma e que, consequentemente, lhe é permitido ensinar e formar de modo igual todos os fiéis à verdadeira piedade, com um só e mesmo método, sempre igual! Saiba ele que alguns são, em Jesus Cristo, como criancinhas recém-nascidas. Outros, como adolescentes, ainda outros como estando na posse de todas as suas forças. É necessário considerar com diligência que uns têm necessidades de leite, e outros de alimento sólido (...). O apóstolo (...) indicou tal dever. Ou seja, aqueles que são chamados ao ministério da pregação devem, na transmissão dos mistérios da fé e das regras dos costumes, adaptar suas palavras ao espírito e a inteligência de seus ouvintes. Acima de Tudo – A Caridade. Para concluir este prólogo, é oportuno lembrar este princípio pastoral enunciado pelo Catecismo Romano. “Toda finalidade da doutrina e do ensinamento deve ser posta no amor que não acaba. Com efeito, pode-se facilmente expor aquilo que é preciso crer, esperar ou fazer. Mas sobretudo é preciso fazer sempre com que apareça o Amor de Nosso Senhor, para que cada um compreenda que o ato de virtude perfeitamente cristão não tem outra origem senão o Amor, nem outro fim senão o Amor. Abraço. Davi

domingo, 22 de setembro de 2024

O QUE É TEOSOFIA

 

Teosofia ou Sabedoria Divina. Livro Introdução a Teosofia. Por Charles Wesbter Leadbeater (1854-1934). Capítulo I. O QUE É TEOSOFIA. Por muitos anos os homens têm discutido, arguido, inquirido sobre certas grandes verdades básicas: a existência e a natureza de Deus, a sua relação com o homem, o passado e o futuro da humanidade. Eles têm discordado de forma tão radical sobre esses assuntos, e tão severamente tem sido atacado e ridicularizado quanto às suas crenças. Que chegou a se criar uma firme opinião popular de que, com referência a esses tópicos, não há certeza disponível. Nada a não ser uma vaga especulação em meio a uma nuvem de deduções sem fundamentos extraídas de premissas mal estabelecidas. E isso apesar das afirmações muito bem definidas, embora frequentemente incríveis, feitas sobre esses assuntos em favor das várias religiões. Essa opinião popular, ainda que seja imprópria nessas circunstâncias, é inteiramente falsa. Existem muitos fatos definitivos disponíveis. A Teosofia nos fornece esses fatos. Porém, não como os fazem as religiões, apresentando-os como matéria de fé, Mas sim trazendo-os como material para estudo. Ela, a Teosofia, não é em si uma religião, mas mantém com respeito as religiões a mesma relação que as filosofias antigas mantinham. Não as contradiz e sim as explica. A Teosofia rejeita o que quer que nessas filosofias seja absurdo, como sendo algo depreciativo e não necessariamente digno de divindade. Reúne o que quer que seja razoável em cada uma e em todas elas. Esclarece e enfatiza, e assim combina tudo num todo harmônico. Ela sustenta que a verdade sobre todos esses pontos de suma importância é atingível. E que já existe uma grande gama de conhecimento sobre eles. Considera todas as várias religiões como declarações daquela verdade oriunda de diferentes pontos de vista. Uma vez que, embora diferindo muito quanto à nomenclatura e quanto aos artigos de fé. Todas concordam quanto aos únicos assuntos que são de real importância. O tipo de vida que um homem bom deve levar, as qualidades que deve desenvolver, os vícios que deve evitar. Sobre esses pontos práticos o ensinamento é idêntico no Hinduísmo e no Budismo, no Zoroastrismo e no Islamismo, no Judaísmo e no Cristianismo. A Teosofia pode ser descrita para o mundo exterior como uma teoria inteligente do universo. Todavia, para aqueles que a têm estudado, ela não é uma teoria, todavia um fato. Sendo que é uma ciência definida, passível de ser estudada, e os seus ensinamentos são verificáveis pela investigação e experimentação por aqueles desejosos de se dar o trabalho de qualificarem-se para tal investigação. É uma declaração dos grandes fatos da natureza até onde são conhecidos. Um esboço do esquema do nosso canto do universo. Como a Teosofia é conhecida. Pode-se perguntar como esse esquema se tornou conhecido e por quem foi descoberto. Contudo, na realidade, ele sempre foi conhecido pela humanidade. Embora às vezes tenha sido temporariamente esquecido em certas partes do mundo. Sempre existiu um certo grupo de homens altamente desenvolvidos, não de uma nação em particular, mas de várias nações. Esses detinham essa verdade em sua totalidade. E sempre houve discípulos desses homens, que estiveram especialmente estudando a Verdade. Enquanto os seus vastos princípios sempre foram conhecidos no mundo externo. Esse grupo de homens altamente desenvolvidos existe tanto agora quando no passado. E o ensinamento teosófico é publicado no Ocidente por inspiração desses seres, através de uns poucos discípulos. Aqueles que ignoram isso têm insistido, as vezes clamorosamente, que, se assim é essas verdades deveriam ter sido publicadas há muito tempo. E de maneira bastante injusta acusam aqueles que possuem tal conhecimento de serem excessivamente reservados, sonegando-o ao mundo em geral. Eles se esquecem de que todos os que realmente buscaram essas verdades sempre foram capazes de as encontrar. E que é somente agora que nós no Ocidente estamos verdadeiramente começando a procurá-las. Por muitos séculos a maior parte da Europa esteve satisfeita em viver na superstição mais grosseira. Quando uma reação finalmente se estabeleceu devido ao absurdo e fanatismo dessas crenças, fez surgir um período de ateísmo que foi igualmente vaidoso e intolerante, em outra direção. De modo que somente agora é que algumas das pessoas mais humildes e moderadas estão começando a admitir que nada conhecem, e a indagar se não existe informação real disponível em algum lugar. Embora esses indagadores moderados não sejam por enquanto nada além de uma minoria, a Sociedade Teosófica foi fundada para atraí-los e mantê-los juntos. Os seus livros são colocados para o público. Para que aqueles que desejam possam ler, anotar, aprender e internamente digerir essas grandes verdades. A sua missão não é forçar seus ensinamentos a mentes relutantes, porém simplesmente oferecê-los para aqueles que o desejam obtê-los. Nós não estamos de modo algum sob a ilusão do fanatismo religioso arrogante que ousa condenar a uma eternidade de sofrimentos todo aquele que não pronunciar sua pequena senha provinciana. Estamos perfeitamente cientes de que tudo no fim estará bem para aqueles que ainda não podem ver seu caminho para aceitar a verdade. Como também para aqueles que a recebem com avidez. Todavia o conhecimento dessa verdade tornou a vida para nós e para milhares de outros mais fácil de suportar, e a morte mais fácil de enfrentar. É apenas o desejo de partilhar esses benefícios com nossos irmãos que faz com que nos devotemos a escrever e dar palestras sobre esses assuntos. Os amplos esboços das grandes verdades têm sido vastamente conhecidos no mundo há milhares de anos, e o são hoje em dia. Apenas nós no Ocidente, com nossa incrível autossuficiência, é que temos permanecido ignorantes dessas verdades. Zombando de qualquer fragmento delas que possa ter chegado até nós. Como no caso de qualquer outra ciência, também nessa ciência da alma os detalhes completos são conhecidos apenas por aqueles que devotam suas vidas à sua procura. Os homens que a conhecem a fundo, aqueles que são chamados adeptos, pacientemente desenvolveram dentro de si os poderes necessários para a perfeita observação. Pois a esse respeito há uma diferença entre os métodos de investigação oculta e os das formas mais modernas de ciência. Os últimos devotam toda sua energia ao aperfeiçoamento de seus instrumentos, enquanto os primeiros visam preferencialmente o desenvolvimento do observador. O método de observação. O detalhe desse desenvolvimento tomaria mais espaço do que lhe pode ser dedicado num manual preliminar como este. O esquema inteiro poderá ser encontrado com explicações completas em outras obras teosóficas. Por enquanto basta dizer que é inteiramente uma questão de vibração. Toda informação que chega ao homem vinda do mundo exterior alcança-o por meio de vibrações de algum tipo, quer seja pelo sentido da vida, da audição ou do tato. Consequentemente, se um homem puder tornar-se sensível a vibrações adicionais, ele adquirirá informações complementares. Ele irá tornar-se o que é comumente chamado de clarividente. Esta palavra, como é normalmente usada, significa nada mais que uma leve extensão da visão norma. Todavia é possível para um homem tornar-se mais e mais sensitivo às vibrações mais sutis até que sua consciência, agindo através de muitas faculdades despertas. Funcione livremente em novos e mais elevados caminhos. Ele então encontrará novos mundos de matéria mais sutil abrindo-se diante dele. Embora na realidade sejam eles apenas porções novas do mundo que ele já conhece. Desse modo ele aprende que existe um vasto universo invisível à sua volta durante toda a sua vida, e que o está afetando constantemente de muitas maneiras. Embora ele permaneça cegamente inconsciente do fato. Mas quando desenvolve faculdades através das quais pode sentir esses outros mundos, torna-se possível para ele observá-los cientificamente. Repetir suas observações muitas vezes, compará-las com as dos outros, organizá-las e tirar deduções a partir delas. Tudo isso tem sido feito, não uma vez, mas milhares de vezes. Os adeptos sobre os quais falei tem assim agido até o grau mais elevado possível, porém muitos esforços nessa mesma direção têm sido envidados pelos nossos estudantes teosóficos. O resultado de nossas investigações tem sido não apenas verificar muitas informações que nos foram passadas no começo por esses adeptos. Todavia também as explicar e ampliá-las consideravelmente. A visão dessa porção geralmente invisível do nosso mundo traz de imediato ao nosso conhecimento um vasto conjunto de fatos inteiramente novos que são do mais profundo interesse. Gradualmente ele soluciona para nós muitos dos mais difíceis problemas da vida. Esclarece muitos mistérios, de modo que agora os vemos como tendo sido mistérios para nós. Por tanto tempo, apenas porque até aqui víamos uma parte bem pequena dos fatos. Porque olhávamos debaixo, para os vários assuntos, como fragmentos isolados e desconectados, em vez de nos elevarmos acima deles até um ponto de observação de onde eles apresentam-se como partes compreensíveis de um poderoso todo. Isso de imediato soluciona muitas questões que foram bastantes discutidas, como, por exemplo, a da existência contínua do homem após a morte. Fornece-nos a verdadeira explanação de todas as afirmações totalmente impossíveis feitas pelas igrejas a respeito do céu, inferno e purgatório. Dissipa nossa ignorância e remove nosso temor do desconhecido, trazendo-nos um esquema racional e metódico. Abraço. Davi 

sexta-feira, 20 de setembro de 2024

II. O EVANGELHO DE BUDA

 

Budismo. Texto do Yogi Kharishnanda Saraswati (1922-2001). Livro O Evangelho de Buda – Vida e Doutrina de Sidharta Gautama. II. O EVANGELHO DE BUDA. Capítulo três. A verdade redentora. As coisas do mundo e seus habitantes estão sujeitos a mudanças. São produtos de algo que já existiu anteriormente. Todo ser vivente é produto de seus anteriores, porque a lei de causa e efeito é inflexível e sem exceções. Porém, nas coisas que mudam sem cessar existe sempre um Verdade oculta. A Verdade dá realidade às coisas. A Verdade é imutável. E a Verdade deseja revelar-se; a Verdade aspira ser consciente; a Verdade se esforça por conhecer-se a si mesma. A Verdade existe na pedra, porque a pedra existe verdadeiramente, e não há força no mundo. Deus, homem ou demônio, que possa fingir que não exista. Porém, a pedra não é consciente. A Verdade existe na planta e sua vida pode expressar-se: nasce, floresce e frutifica. Sua beleza é maravilhosa, mas não é consciente. A Verdade existe no animal; o animal se move, percebe as coisas que o rodeiam, distingue e escolhe. Nele há consciência; porém, não tem ainda a consciência da Verdade. Existe unicamente a consciência do eu. A consciência do eu cega os olhos do espírito e oculta a Verdade. É a origem do erro, a fonte das ilusões e o germe do pecado. O eu engendro o egoísmo. Todo mal procede do eu. Toda injustiça é produto da afirmação do eu. O eu, é o princípio de todo ódio, da iniquidade, da calúnia, da impudicícia, da obscenidade, do roubo, da fadiga, da opressão e do derramamento de sangue. O eu é Mara, o tentador; o malfeitor, o criador do mal. O eu, seduz pelos prazeres. O eu prometo um paraíso encantador. O eu, é o véu do feiticeiro Mara. Porém, os prazeres do eu são ilusórios; seu labirinto paradisíaco é o caminho do inferno, e sua beleza uma chama ao calor do desejo. Quem nos livrará da tirania do eu? Quem nos salvará de nossas misérias? Quem nos restabelecerá a vida feliz? Tudo é miséria no mundo de Samsara; tudo é miséria e sofrimento. Porém, a felicidade da Verdade sobrepuja toda miséria. A Verdade dá a paz ao espírito ansioso; vence o erro, extingue as chamas do desejo e conduz ao nirvana. Bem-aventurado é aquele que encontra a paz no nirvana. Está livre das lutas e tribulações da vida, está ao abrigo de todas as transformações, desafia o nascimento e a morte, e permanece indiferente nos males da vida. Bem-aventurado é aquele em que encarnou a Verdade, porque conseguiu seu fim e se unificou com a Verdade. É vencedor sem que nada mais possa feri-lo; é glorioso e feliz sem sofrimento; é forte mesmo sobrecarregado sob o peso do trabalho; é imortal embora morra. A imortalidade é a essência de sua alma. Bem-aventurado aquele que alcançou o sacro estado de Buda, porque salvará os seus irmãos. A Verdade reside nele. A perfeita sabedoria esclarece o seu entendimento. A justiça inspira as suas ações. A Verdade é um poder ativo para o bem, indestrutível e invencível. Cultivem a Verdade em seu espírito e difundam-na pela humanidade, porque unicamente a Verdade salva do pecado e da miséria. A Verdade é o Buda, e o Buda é a Verdade. Bendito seja o Buda. A filosofia hindu divide o ser humano em Eu superior, que é imortal, espiritual e eterno, e o eu inferior, que é mortal, material e transitório. O texto se refere ao eu inferior. O Príncipe Sidharta Alcança o Budado. Capítulo Um. O Nascimento do Buda. Havia em Kapilavastu um rei sákia, firme em seus propósitos e reverenciado pelos homens, um dos descendentes de Ikchvaku, chamado Suddhodana. Sua esposa, Mayadevi, era maravilhosamente bela, como um lírio aquático, e de coração tão puro quanto o lótus. Qual rainha do céu, vivia na Terra, imaculada e pura de desejos. Seu real marido a reverenciava pela sua santidade, e o espírito da Verdade desceu sobre ela. Quando compreendeu que a hora de ser mãe estava próxima, pediu ao rei que a levasse à casa de seu pai, e Suddhodan, atencioso para com sua esposa e pelo filho que ia nascer, atendeu, feliz, a esse pedido. Quando Mayadevi atravessava o jardim de Lumbini, (atual Nepal), chegou a hora: preparou-se então um leito sob uma árvore com um enorme tronco, e a criança nasceu no alvorecer do dia, radiante e perfeita. A feliz notícia chegou ao palácio, e o rei Suddhodana mandou que levassem ao jardim de Lumbini o palanquim de cores refulgentes para transportar o recém-nascido. Então os Anjos, os Lípicas que anotam as ações dos homens, ocultando o seu angélico esplendor sob humildes roupas de carregadores, desceram dos mundos superiores para segurar os varais de palanquim. O rei Suddhodana, porém, que ignorava a presença dos quatro Anjos na Terra, receou presságios funestos que só findaram no momento em que seus adivinhos previram que o menino seria um príncipe dominador do mundo e dotado dos sete dons celestiais. Naquele tempo, o rishi Asita levava no bosque uma vida de eremita. Era um brâmane de cabelos grisalhos, cujos ouvidos há muito tempo estavam cerrados às coisas da Terra e percebiam somente os sons celestiais. Estando ele em oração sob a árvore baniana, ouviu os cânticos pelos devas (anjos) em louvor ao nascimento do Budha. Pela sua idade e pelos jejuns que fazia. Asita era afamado tanto pela sua sabedoria como pela sua habilidade de interpretar os desígnios humanos e fazer profecias. Por isso, o rei o convidou para ver a regia criança recém nascida. Quando o velho contemplou o príncipe, chorou e suspirou profundamente. O rei, ao ver as lágrimas de Asita, perguntou-lhe assustado: O que o Senhor viu em meu filho que lhe causou tanto sentimento e tanta mágoa? Mas o coração de Asita transbordava de felicidade, e reconhecendo que o rei estava preocupado, respondeu-lhe: Ó rei, qual Lua em sua plenitude, Sua Majestade deve sentir viva alegria, porque gerou um filho de maravilhosa nobreza. Não adoro o Brahma, porém adoro este menino, que os próprios deuses abandonaram seus templos para virem adorá-lo. Afaste todo temor e toda dúvida. Os presságios (prognóstico) espirituais indicam que o recém-nascido libertará o mundo. Porém, lembre-se de que sou velho e não pude reter as lágrimas, pois o meu fim se aproxima. O seu filho governará o mundo. Nasceu para o bem de toda criatura e de todo ser vivente. A pureza de sua doutrina se assemelhará à margem que recebe o náufrago. Seu poder de meditação será com o fervor de um lago, e toda criatura inflamada no ardor da luxúria se tranquilizará espontaneamente. Sobre o fogo da concupiscência se estenderá a nuvem da compaixão, apagando-o com a chuva da Lei. Ele abrirá as pesadas portas do desespero, e livrará todas as criaturas da trama das redes que elas mesmas teceram com sua loucura e ignorância. O rei da Lei apareceu para libertar da escravidão os pobres, os miseráveis e os desesperados. E prostrando-se diante do berço da criança. Asita exclamou: Ó criança! Eu adoro você. Você é Ele. Vejo a rosada luz impressa na planta dos pés, o suave desenho da suástica, os 32 sagrados signos capitais e os 80 secundários. Você será Buda. Pregará a Lei e salvará a todos os que a aprenderem. Não o ouvirei, porque estou próximo da morte. E dirigindo-se o rei, Asita acrescentou: Sabe, ó rei, que este seu filho é a Flor da árvore humana, que só produz uma flor após miríades de anos; porém, quando aberta, enche o mundo como o aroma da Sabedoria e o mel do Amor. Depois, disse à rainha: E a senhora, doce rainha, amada dos deuses e dos homens. Devido a este magno acontecimento, já está sagrada demais para continuar sofrendo. Como a vida é sofrimento, daqui a sete dias chegará sem dor ao fim da dor. Quando o rei e a rainha ouviram essas palavras de Asita, ficaram felizes em seus corações e deram ao menino que acabara de nascer o nome de Savarthasiddh, que quer dizer: Completa prosperidade, ou Êxito feliz, e num diminutivo carinhoso e familiar o chamaram de Sidharta. Então, a rainha disse à sua irmã Pradjapati: A mãe que deu à luz um futuro Budha não terá outro filho. Eu abandonarei logo este mundo, o rei meu esposo e meu filho Sidharta. Quando eu não mais existir, seja você a mãe dele! E Pradjapati, chorando, prometeu isso a ela. Na sétima noite, a rainha Mayadevi dormiu sorrindo e não despertou mais do seu sono. Passou feliz ao seu Trayastrinshas, onde inumeráveis devas (anjos) adoram e servem a radiante Mãe. Quando a rainha morreu. Pradjjapati tomou o menino Sidharta e o educou. E assim como pouco a pouco brilha cada vez mais a luz da Lua, a régia criança cresceu dia a dia em espírito e em corpo: a Verdade e o amor residiam em seu coração. (2). Rishi, literalmente revelador. Trata-se de um santo sábio ou iluminado, cantor ou poeta de divina inspiração.  Capítulo Dois. Sua juventude e seu casamento. Quando o príncipe Sidharta completou 18 anos, o rei mandou construir para ele três magníficos palácios; um de madeira de cedro, quente, para o inverno; outro de mármore betado, para o estio, e outro de ladrilhos cozidos para o outono. Ao redor desses palácios floresciam amenos jardins regados de alegres arroios e soalhados de formosos bosquezinhos com lindos caramanchões, onde Sidharta passava horas felizes, pois sua vida era saudável e em suas veias corria sangue jovem. Logo, porém, as sombras do tédio obscureceram a alegria do príncipe, como se algo lhe faltasse para completar esse bem-estar. O rei consultou seus ministros, e o mais ancião deles lhe respondeu: O amor curará esse leve descontentamento. Seu coração virgem deve ser entretido com o feitiço da graça feminina. Que sabe este jovem da formosura, o que sejam os encantadores lábios, ou os olhos que jogam o céu no esquecimento? Una-o, a uma esposa, porque facilmente um cabelo de mulher ata melhor os pensamentos que nem cadeias de bronze poderiam sujeitar. E o rei replicou: Se lhe buscarmos esposas, o amor seguramente escolherá com outros olhos, e se lhe apresentarmos um jardim de belezas para que escolha a flor que mais o agrade, receberá com doce sorriso o gozo que ignora. O ministro retrucou: O rei deve ordenar um festival em que as donzelas do reino desfilem em graça e juventude nos famosos desportes dos sákias. Que o príncipe outorgue o prêmio à formosura, e quando as vencedoras passarem em frente do seu trono, notaremos se alguma consegue desvanecer a persistente tristeza de seu semblante juvenil. Desse modo poderemos escolher para o Amor com os próprios olhos de Amor. O rei aceitou esse conselho, e, consequentemente, a partir do dia seguinte os pregoeiros convidaram donzelas formosas para participarem do concurso de beleza que se celebraria no palácio, onde o príncipe distribuiria prêmios; um objeto de arte para cada uma, e um de maior valor para a mais formosa. As donzelas de Kapilavastu encheram os jardins do palácio, vestidas de vistosos trajes de lindas cores. Lentamente, elas desfilaram diante do trono, com os olhos fixos no chão, sem se atreverem a erguê-los. Chegou a última, a jovem Yasodhara. Os que estavam junto ao príncipe viram que ele pareceu ficar perturbado quando a radiante jovem, cujas formas pareciam esculpidas no céu, se aproximou. Seu ar era como o da deusa Parpati, seus olhos como os de uma corça na estação do amor, e seu rosto de inefável encanto. Foi a única que ousou olhar o príncipe de frente, com as mãos cruzadas sobre o peito e erguido o graciosos colo. A donzela perguntou-lhe sorridente: Há prêmio para mim? O príncipe respondeu-lhe: Acabaram-se os prêmios; porém toma este em compensação, querida irmã, porque de sua graça se orgulhará toda a nossa ditosa cidade. Dito isso, o príncipe tirou o seu colar de esmeraldas e colocou o fio de contas verdes no pescoço da jovem Yasodhara. Seus olhos se encontraram e desse olhar brotou o amor. Yasodhara era filha de Suprabudha, monarca do reino vizinho, e, segundo a lei dos sákias, quando alguém pedia em casamento uma mulher de nobre estirpe, tinha que demostrar sua destreza nas artes da guerra e em torneios contra os demais pretendentes. Sidharta venceu todos seus rivais nas provas de arco, de espada e de corrida hípica. O rei Suprabudha disse então a Sidharta: Nosso coração desejava ver você alcançar o prêmio, porque você é o preferido; porém, como conseguiu aprender em meio a uma vida calma e sonhadora o que outros não conseguiram aprender na caça nem na guerra, nem nas porfias do mundo? Receba, ó príncipe, o tesouro a que fez jus. A essas palavras a amável jovem levantou-se de sua cadeira e, passando entre a multidão, pegou uma grinalda de jasmins, cobriu sua fronte com o véu preto salpicado de ouro e aproximou-se de onde estava Sidharta. A jovem, cujo semblante irradiava a alegria celeste de um amor feliz, inclinou-se diante do príncipe e, apoiando a cabeça no peito de Sidharta, prostrou-se aos seus pés, dizendo com os olhos radiantes de felicidade: Amado príncipe. Olhe-me. Sou sua. O rei Suddhodana deu a eles o belo palácio de Vishramvan. Abraço. Davi.

quarta-feira, 18 de setembro de 2024

XINTOISMO. MITOLOGIA E INFLUÊNCIA. Parte III

 

Xintoísmo. Bushidobr.com. MITOLOGIA E INFLUÊNCIA na formação da cultura e do carácter do povo japonês. Parte III. O conceito de michi. Derivado do Tao chinês (mesmo kanji - - ), definido como "a essência de todas as virtudes,[...] o que está perto, ao alcance das mãos e que erroneamente os homens o procuram longe" (HARADA, op. cit., p. 55). Discorre Yang Chu e Hu Shi sobre o Tao: A natureza é a atividade natural, o silente fluir dos acontecimentos tradicionais, a majestosa ordem das estações e do céu; é o Tao, ou o Caminho, corporificado e exemplificado em cada fonte, rocha ou estrela; é essa impessoal, imparcial e,  no  entretanto,   racional lei das coisas, com a qual a lei da conduta do homem tem que se conformar, caso ele deseje viver em sabedoria e paz. Esta lei das coisas é o Tao ou o caminho do universo, do mesmo modo que a lei da conduta é o  Tao   ou  o  caminho  da vida; na verdade, pensa Lao-Tze, os dois Taos são um só,  e a vida humana, em seus ritmos essenciais e normais, faz  parte  do   ritmo   do universo (Yang, Chu, 16, 19. Schneider, ii, 810, Hu Shih, 14 in  WILHELM, R., Short  story  of chinese civilization, New York, 1929 apud in DURANT, 1942, p. 185-186). Confúcio falando mais diretamente sobre o Tao como conduta do homem, dizia que Caminho é a harmonia com as coisas da natureza, que provêm do Céu: Sinceridade é o Caminho do Céu; realizar a sinceridade é o Caminho do homem. Aquele que possui a sinceridade é quem, sem esforço, faz o que é certo e compreende sem necessidade do pensamento: ele é o sábio que natural e facilmente incorpora o Caminho (m. t. apud in HARADA, op. cit., p. 54). Numa cultura em que os deuses são extremamente abundantes (fala-se em 800 ou 8000 as divindades do Xintô), mas cujos desejos em relação ao homem é apenas um, o japonês o resume em apenas um conceito: “michi”, caminho ou via. Seguir a via dos deuses, é a mensagem indelével fortemente introjetada no inconsciente coletivo desse povo, o que molda seu caráter, pensamento e a vida. As artes, a cultura e os esportes de origem nipônica trazem esta mensagem: shodô (書道) é o caminho da escrita; kadô (花道)ou(華道), o caminho das flores ou dos arranjos florais também conhecido como ikebana; kadô (歌道), com outro kanji para “ka” significando poesia, é o caminho da poesia ou a arte do poeta; butsudô (仏道), o caminho dos ensinamentos budistas; sadô ou chadô (茶道), o caminho do chá ou a arte da cerimônia do chá; kendô (剣道), o caminho da espada; judô (柔道), caminho suave ou caminho da luta suave; karatê-dô (空手道), caminho da arte marcial de mãos vazias. “Michi”, caminho ou via, guarda estreita relação com o comportamento do nipônico. Embora impreciso, amplo e vago, como sói nos conceitos dessa cultura, para 15 .o japonês, “michi” não precisa ser explicitado, definido, ensinado nem imposto: é algo que lhe parece claro, sem necessidade de palavras para se conceituá-lo. É, muito possivelmente, o termo mais antigo e de mais largo significado dentro da ética e da religião na cultura japonesa, "uma inconsciente observância do Caminho" (HARADA, op. cit., p. 48). Ao homem de michi regras morais ou conjunto de mandamentos não lhe parecem necessários. Suas ações são livres e sua autoexpressão, nessa condição de natural liberdade, está mais verdadeiramente de acordo com o Caminho (ibidem p. 50). Ele entenderá com o coração e aprenderá na convivência que seguir a “via dos deuses” é seu caminho natural: é portar-se como um deus, é sentir plenamente seu deus interior, ou seja, internamente é onde está o controle moral, inato ao homem, independendo, pois, de controle externo por leis e normas. Estar no Caminho é apenas seguir sua natureza, seu impulso natural. Estar fora do Caminho constitui um insulto, significa acusar alguém de levar vida errante (HARADA, op. cit., p. 49). A natureza das coisas é determinada por leis divinas. Estar em harmonia com a Natureza é estar no Caminho (ibidem p. 50-51). "Kami nagara no michi" - ou a Via dos deuses - é apenas o estado natural das coisas, onde inexiste a ideia do certo ou errado, ou seja, a ética e a moral não entram na apreciação. Os deuses venerados e os maus espíritos são igualmente reverenciados, o que torna desimportante um enquadramento ético para esses seres. A ética ou a sua ausência, ainda que temporária, é aceita como natural aos deuses, tal qual nos humanos. Não que seja impossível apreciar sob esse ângulo - na mitologia, os principais deuses têm seus momentos de cólera ou decepção - , mas o xintoísmo não se ocupa disso, porque não tem importância, não é significante, ensina Nyozekan Hasegawa (HASEGAWA, 1939, p.10). Ao japonês como crença e prática do xintoísmo, basta-lhe estar no Caminho, ou seja, ser naturalmente si próprio. O japonês primevo era já um ser despreocupado com o enquadramento ético, era "naturalmente puro, santo e correto", afirmava Griffis (GRIFFIS, op. cit., p. 72). O japonês não se sente vigiado, não conhece punição e recompensa como mecanismos   ligados às ações provenientes do seu arbítrio. Não existe a ideia de que deuses punem comportamento contrário à sua vontade e premiam os que lhes obedecem. "Recompensas e punições não são oferecidas como meio de tornar o homem bom" (HITCHCOCK, 1893, p. 503). Nesse sentido, inexiste uma pedagogia divina para a educação do homem. 16 .Muro Kiuso considera o amor como a essência do Caminho, a virtude cardeal. "[...] assim como o homem morre quando seu pulso para, então também, seu coração morre quando o princípio do amor perece. Por isso o amor pode ser chamado a vida do coração" (apud in op. cit. HARADA, p.58). Ainda com foco na naturalidade interior, Nakae-Toju identifica o Michi com "a verdade adquirida com o conhecimento de si mesmo" que provém não do mundo à nossa volta nem de livros, senão do nosso próprio interior, isto é, "da nossa alma" (idem). O conhecimento então está no nosso interior, na nossa alma divina. Para esse comentarista o Caminho é algo imanente, invisível, imperceptível, mas onipresente em nossas vidas. "É o que habita no universo, assim como a alma habita o homem". (ibidem p. 61) Seguir o caminho não é obedecer, se submeter à vontade de um ser superior; é apenas viver, ser si próprio. Tão natural como apreciar flores da cerejeira: para isso não é preciso nada, apenas o coração em sintonia com a beleza da flor, ou como dizem os zen-budistas e haicaístas, sentir seu coração, uma flor de cerejeira. (D. T. SUZUKI in FROMM, 1960, p. 13, 21). Para o homem nipônico “michi” é mais do que conceito filosófico, regra de vida ou mandamento religioso. É a própria essência da vida. Na sua obra “The Faith of Japan”, o professor Tasaku Harada, assim se expressa a esse respeito: Por michi, a via, entende-se um conceito misterioso, não formulado, e, todavia, influente, que é acompanhado de terror religioso e de solenidade. O termo michi é provavelmente o mais expressivo de todo o vocabulário japonês em matéria de ética e de religião. A princípio, e como na língua corrente, significa carreira ou caminho. Em religião e em ética, significa via, ensinamento, doutrina ou, como às vezes se traduz, princípio. (O seu equivalente chinês é tao). Na sua presença, respira-se uma atmosfera edificante. Um homem de michi é um homem de caráter, um justo, que tem princípios e convicções e que obedece à natureza da sua humanidade. Acusar alguém de se ter afastado do michi é um insulto, porque isso implica perversidade para com aquilo que existe de mais essencial no homem. Michi é uma componente recebida do Céu, é o ideal celeste que deve ser realizado na humanidade. Michi é também o modo de vida que nos é dado como ideal e que aceitamos seguir. Diz-se que o confucionismo é o michi dos sábios e dos sensatos, o budismo o michi de Buda, o xintô o michi dos kami. A moralidade é michi, a harmonia entre a vida e o ideal, e considera-se mesmo que a razão constitui a essência do michi. Mas, seja qual for o sentido em que se empregue, michi exprime uma convicção muito profunda e sincera que liga o indivíduo, de maneira solenemente impressionante, à altura e à profundidade do grande Todo. Ele implica que a essência da vida humana se liga a uma vida sobre-humana. Num poema de Michizane Sugawara, lê-se: “Se no secreto do nosso coração/ Seguirmos a via sagrada/ Os deuses certamente nos terão em sua guarda/ Mesmo que nunca lhes dirijamos nenhuma oração”. [...] kannagara representava o ideal religioso do povo, “uma obediência inconsciente à via”, que julgavam existir desde tempos imemoriais. Agir em conformidade com o curso da Natureza, sem esforço consciente, obedecendo ao impulso que nos sugere a nossa constituição, é, para o xintô, a mais elevada virtude. Esse curso da Natureza é a vontade dos 17 .deuses.  A vontade dos deuses realiza-se em tudo o que age naturalmente. Encontramos aí uma extrema simplicidade, uma fé total na justeza do que é natural. Tal é o coração do michi japonês ( HARADA, op. cit., p.50 traduções de José Pinto apud in op. cit. ROCHEDIEU, p. 108-109). O santuário xintô e o culto Como vimos, nascido e cultuado no meio da natureza, os santuários são invariavelmente localizados em meio a árvores, alguns no meio de florestas, perto de montanhas ou corrente de água. É comum a veneração de árvores no Xintô. Em tempos antigos, o termo mori (floresta) era sinônimo de santuário e as árvores do entorno, chamadas de kannabi (abrigo dos deuses) (ONO, op. cit., p. 98). Diante dos santuários, sem que se compreenda nada, pode-se ser um adorador, impressionar-se com as indefectíveis árvores, o lago, o ambiente, independentemente da especificidade que sustente aquele santuário (HERBERT, 1964, p. 24). Nos santuários não se dá importância ao aspecto filosófico ou doutrinário que sustentam a fé, mas aos fatos históricos e costumes que o envolvem. Quase nada se encontra que fale sobre a natureza do kami, dos ritos e práticas do santuário (ONO, op. cit., p. 92). O estudioso Yanagita Kunio afirma que “não há nos santuários xintoístas instrução doutrinária e só se aprende o xintoísmo pela convivência e pelo exemplo”(apud in BARROS, 1988, p. 46). O santuário e seus ritos, aceitos como símbolos da fé comunitária,  ao mediarem a relação do homem com os deuses, faz as instruções doutrinárias desnecessárias (ONO, op. cit., p. 11) De fato, os japoneses mais seguem os exemplos e tiram lições de conduta das personagens mitológicas do que obedecem a alguma instrução ou mandamento. Não há combate do mal com o bem. Nos seus primórdios também não havia necessidade de templo ou santuário. Como vimos, as celebrações eram feitas ao ar livre, geralmente à beira de um rio, cachoeira ou no elevado de uma colina, num espaço cercado para esse fim. Fala sobre o santuário xintô Jean Herbert: O templo xintô é uma manifestação visível e sempre eficaz da relação de consanguinidade que existe entre o indivíduo e o mundo inteiro, a humanidade, os seres vivos e não vivos, os mortos, a terra toda, os corpos celestes e os deuses, qualquer que seja o nome que se lhes dê. A pessoa que entra no templo torna-se mais ou menos consciente, inevitavelmente, desta relação íntima e, a certa altura, dá-se conta de que todos os sentimentos de ansiedade, de antagonismo, de solidão, de desânimo, desaparecem, do mesmo modo que a criança vem repousar tranquilamente nos braços da mãe. Uma sensação quase palpável de paz e de segurança invade o visitante à medida que vai avançando para o interior do recinto sagrado .... ( HERBERT, 18 .1964, p. 155-156,  tradução de José Pinto apud in op. cit.  ROCHEDIEU, p. 129-130). Produto desse sentimento de irmandade, o xintoísmo "é essencialmente o credo que afirma a vida", e trata muito pouco da morte e do mundo pós-morte. (LITTLETON, op. cit., p. 89). Suas cerimônias e ritos comemoram não apenas o cotidiano do indivíduo como nascimento, aniversário e casamento, mas também os da comunidade e da nação (ONO, op. cit., p. 50). Crê-se no xintoísmo que o tama (espírito) por algum tempo ainda exerça influência na vida antes de se tornar um antepassado kami (entidade elevada, deus) da família à qual pertenceu, o que dá raízes identitárias à ancestralidade da família ou do clã. (idem). Alguns se tornavam até mesmo o kami venerado por trabalhadores de sua guilda. (HEARN, 1984, p. 124) Os aprendizes eram introduzidos no trabalho e no culto ao kami de seus colegas (ibidem p.125). Havia profunda identificação entre o trabalho e o Xintô. O carpinteiro vestido como monge xintô, invocava a proteção de deuses e realizava certos ritos ao designar o local de sua obra (idem). O alfageme submetia-se a ritual religioso na confecção de sua espada:  "trabalhava vestido como monge, submetia-se a ritos de purificação enquanto trabalhava para obter uma boa lâmina". Seu local de trabalho era protegido pela corda sagrada shimenawa, onde não entrava nem seus familiares e só se alimentava de comida preparada no fogo sagrado. Durante seu trabalho não falava com ninguém, nem mesmo com gente de sua família (idem). O culto extremamente simples, é feito diante de um oratório doméstico (kamidana). Crê-se que os espíritos (kami e ancestrais) protegem sua família e "não deixam de servir ao seu senhor, aos pais, à esposa e aos filhos, como quando estavam ainda em vida" (Hirata apud in BRILLANT et alii, op. cit., p. 183). O kamidana deve estar sempre limpo e imaculado. Oferecem-se geralmente pequenas porções de comida e água; é costume também oferecer coisas de que o morto gostava  (ONO, op. cit., p.59). Porta-se como se o familiar venerado estivesse ainda vivo, oferecendo-lhe ou comunicando-lhe promoções, recebimento de salários, diplomas, nascimentos, casamentos e todo fato importante da família, como expressão de agradecimento (idem). Idealmente o ritual deve ser diário, mas não se lhes devotam mais do que os cumprimentos e gentilezas que fazemos quotidianamente aos nossos familiares. As crianças costumam fazer a comunicação no kamidana de suas notas escolares, antes mesmo de exibi-las aos pais (HERBERT, 1964, p. 250). Sobre o culto familiar, discorre Wenceslau: [...]os avós, pelas suas próprias virtudes durante a apagada existência, e pelas propiciações que os vivos lhes tributam, no desempenho dos ritos familiares. Abraço. Davi

segunda-feira, 16 de setembro de 2024

JESUS. Parte IV

 

Judaísmo. Livro Judaísmo e Cristianismo – As Diferenças. Por Trude Weiss (1908-1989). Capítulo 8. JESUS. Parte IV. A atitude de Jesus em relação a vida e às leis que a regulam, de acordo com os ensinamentos do judaísmo, difere grandemente da postura dos rabinos reconhecidos e dos verdadeiros mestres da Lei de sua época. Os evangelhos mostram claramente que o próprio Jesus se sentiu em oposição aos rabinos, “os fariseus”. De modo ostensivo, Jesus não se considerava um “rabino” nem estava interessado nos pontos mais refinados da Torá ou na exposição deles, que era o interesse predominante dos rabinos da época. Sua atitude com relação à principais instituições sociais e Leis foi tal, entretanto, que por si só já eram suficientes para colocá-lo em oposição eterna ao judaísmo e seus rabinos. Os Evangelhos fornecem ampla evidência de que Jesus achava que os rabinos eram de pouca utilidade e sentia por eles um amor menor ainda. Pois as suas próprias visões e atitudes eram diametralmente opostas à filosofia e modo de vida judaico. O judaísmo é essencialmente otimista. Ensina que a vida e o mundo são bons e que a piedade consiste na integração religiosa e espiritual do físico e do material em vez da total abnegação e ascetismo. Jesus era de natureza ascética. Seu reino não era neste mundo e seus ensinamentos, portanto, preocupavam-se principalmente com o mundo vindouro. Enquanto os rabinos daquela época se empenhavam em resolver o problema da pobreza por meio de legislação e disposições legais adequadas. Jesus, despreocupado dos problemas decorrentes da necessidade, lidava com eles simplesmente do ponto de vista irreal do mundo por vir. Para ele, a pobreza não era uma condição degradante e deplorável que necessitasse erradicação, mas pelo contrário, a considerava como um passaporte para o Reino dos Céus. E então aconselhava aos discípulos: Se desejas a perfeição. Vá! Venda sua propriedade e doe o dinheiro aos pobres e gozarás de riqueza nos céus. Depois, volte e seja meu seguidor” Mateus 19,21. Claro que essa não é uma solução para o problema da necessidade e do sofrimento social. Pelo contrário, agrava o problema acrescentando mais pessoas pauperizadas as fileiras daqueles que estão passando necessidades. O problema social agitou, desde os primórdios, os corações e mentes dos mestres judeus. Tentaram solucioná-lo e obtiveram bastante êxito em sua tentativa, promulgando leis e taxando os ricos em benefício dos pobres. Além da taxação, e acima dela, eles também ressaltavam insistentemente a importância da caridade. Mesmo assim, não defendiam que o ser humano se despojasse de tudo que tivesse. Pelo contrário, depreciavam a generosidade imprevidente e a consideravam insensata e contrária a Lei. Promulgaram a norma de que não se deve doar para caridade mais do que um quinto de suas posses. O ser humano ideal do judaísmo leva uma vida plena como membro de sua família, devidamente integrado à comunidade e na feliz busca de um trabalho produtivo. Para poder ser um seguidor de Jesus, entretanto, seria preciso romper todos os vínculos com a vida social normal. Ele exigia; “Nem um de vocês que não se despedir de tudo o que possui não poderá ser um dos meus discípulos” Lucas 14,33. Essa renúncia não se estendia somente às pessoas materiais, mas também à eliminação das afeições mais naturais pelos membros da família. Contrariamente à atitude judaica positiva com relação ao matrimônio e à família, Jesus se opunha quase que hostilmente a essas instituições. Não era casado e dirigia palavras extremamente contundentes contra a lealdade a pais, irmãos e irmãs, considerando esses vínculos como afastadores do amor de Deus. O mandamento de honrar pai e mãe tem sido invariavelmente tido pelos rabinos e mestres como uma das leis mais importantes da Torá. A literatura judaica está repleta de histórias inspiradoras do amor e fidelidade exemplar dos grandes sábios. Jesus, por outro lado, desmerecia e envergonhava sua mãe e irmãos em público. Assim, está registrado que quando Jesus se dirigia a multidão, “sua mãe e seus irmãos permaneciam fora dela, desejando falar com ele. Mas, dizia a quem o avisava: Quem é minha mãe e quem são meus irmãos?” Apontava aos discípulos e dizia; “Aqui estão minha mãe e meus irmãos! Todo aquele que realiza a vontade de meu Pai do céu é meu irmão e minha irmã e minha mãe” Mateus 12,46-50. Em outra ocasião, quando um dos ouvintes exclamou: “Abençoado seja a mãe que o gerou e nutriu”. Jesus respondeu: “Você poderia expressar-se melhor: “Abençoados sejam aqueles que ouvem a mensagem de Deus e as observa” Lucas 11,27 e seguintes. Ele também ensinava: “Não deves chamar qualquer um na terra de seu pai, pois tens somente um, o Pai dos Céus” Mateus 23,9. Abraço. Davi.

sábado, 14 de setembro de 2024

OS ANALECTOS - LIVRO V

 

Confucionismo. www.rl.art.br. OS ANALECTOS – LIVRO V. Texto de Confúcio (551-479). 1. O Mestre disse de Kung-yeh Ch’ang que ele era uma boa escolha para marido, pois, embora estivesse preso, não havia feito nada errado. E lhe deu sua filha em casamento. 2. O Mestre disse de Nan-jung que, quando o Caminho prevaleceu no reino, este não foi posto de lado e, quando o Caminho caiu em desgraça, ele ficou longe da humilhação e da punição. E lhe deu a filha do seu irmão mais velho em casamento. 3. O comentário do Mestre sobre Tzu-chien foi “Que cavalheiro! Onde ele teria adquirido as suas qualidades, se não houvesse cavalheiros no reino de Lu?”. 4. Tzu-kung perguntou: “O que acha de mim?”. O Mestre disse: “Você é um navio”. “Que tipo de navio?” “Um navio sacrificial”. 5. Alguém disse: “Yung é benevolente, mas não fala muito bem”. O Mestre disse: “Qual a necessidade de ele falar bem? Um homem rápido nas respostas frequentemente provocará o ódio dos outros. Não posso dizer se Yung é benevolente ou não, mas qual a necessidade de ele falar bem?”. 6. O Mestre aconselhou Ch’i-tiao K’ai a assumir um cargo oficial. Ch’i-tia o K’ai disse: “Acho que ainda não estou pronto”. O Mestre ficou satisfeito. 7. O Mestre disse: “Se o Caminho não pudesse prevalecer e eu fosse lançado ao mar em uma jangada, aquele que me seguiria seria Yu, sem dúvida alguma”. Tzu-lu, ao ouvir isso, transbordou de alegria. O Mestre disse: “Yu tem mais amor à coragem do que eu, mas lhe falta juízo”. 8. Meng Wu Po perguntou se Tzu-lu era benevolente. O Mestre disse: “Não posso dizer”. Meng Wu Po repetiu a pergunta. O Mestre disse: “A Yu pode ser dada a responsabilidade de coordenar as tropas de um reino de mil carruagens, mas se ele é benevolente ou não, não posso dizer”. “E quanto a Ch’iu?” O Mestre disse: “A Ch’iu pode ser dada a responsabilidade de administrar uma cidade de mil casas ou uma família nobre de cem carruagens, mas se ele é benevolente ou não, não posso dizer”. “E quanto a Ch’ih?” O Mestre disse: “Quando Ch’ih coloca a sua faixa e toma lugar na corte, a ele pode ser dada a responsabilidade de conversar com os convidados, mas se ele é benevolente ou não, não posso dizer”. 9. O Mestre disse a Tzu-kung: “Quem é o melhor homem, você ou Hui?”. “Como eu ousaria me comparar a Hui? Quando lhe é dita uma coisa, ele compreende cem coisas. Quando me é dita uma coisa, eu entendo apenas duas.” O Mestre disse: “De fato, você não é tão bom quanto ele. Nenhum de nós dois é tão bom quanto ele.” 10. Tsai Yü estava na cama durante o dia. O Mestre disse: “Um pedaço de madeira podre não pode ser esculpido, tampouco pode uma parede de esterco seco ser aplainada. Em se tratando de Yü, de que adianta condena-lo?”. O Mestre acrescentou: “Eu costumava ouvir as palavras de um homem e confiar que ele agiria de acordo. Agora, tendo ouvido as palavras de um homem, parto para observar suas ações. Foi por causa de Yü que mudei quanto a isso.” 11. O Mestre disse: “Nunca conheci alguém que fosse verdadeiramente constante”. Alguém perguntou: “E quanto a Shen Ch’eng?”. O Mestre disse: “Ch’eng é cheio de desejos. Como pode ser constante?12. Tzu-kung disse: “Do mesmo modo que não quero que os outros mandem em mim, também não quero mandar nos outros”. O Mestre disse: “Ssu, isso ainda está bem acima de você”. 13. Tzu-kung disse: “Pode-se ouvir sobre as realizações do Mestre, mas não se pode ouvir suas opiniões sobre a natureza humana e o Caminho para o Céu”. 14. A única coisa que Tzu-lu temia era que, antes que pudesse colocar em prática algo que aprendera, lhe ensinassem outra coisa diferente. 15. Tzu-kung perguntou: “Por que K’ung Wen Tzu foi chamado de wen?”. O Mestre disse: “Ele era rápido e ávido por aprender: não teve vergonha de buscar o conselho daqueles que lhe eram inferiores em posição. É por isso que ele é chamado wen”. 16. O Mestre disse sobre Tzu-ch’an que sob quatro aspectos ele tinha as maneiras de um cavalheiro: era respeitoso no modo como se comportava; era reverente no serviço ao seu senhor; ao tratar com as pessoas comuns, ele era generoso e, ao empregar os serviços destas, era justo. 17. O Mestre disse: “Yen P’ing-chung era um excelente amigo: mesmo quando conhecia seus amigos há muito tempo, ele os tratava com reverência”. 18. O Mestre disse: “Ao fazer uma casa para sua grande tartaruga, Wen-chung mandou esculpir os capitéis dos pilares na forma de montanhas e pintar os caibros do telhado com desenhos de plantas aquáticas. O que se deve pensar sobre a inteligência dele?19. Tzu-chang perguntou: “Ling Yin Tzu-wen não demonstrou júbilo algum quando por três vezes foi feito primeiro-ministro. Tampouco demonstrou desgosto quando por três vezes foi removido do cargo. Ele sempre dizia ao seu sucessor o que havia feito durante seu mandato. O que acha disso?” O Mestre disse: “Ele pode, de fato, ser considerado um homem que dá o melhor de si”. “E pode ele ser chamado de benevolente?” “Sequer pode ser chamado de sábio. Como poderia ser chamado de benevolente?” “Quando o senhor de Ch’i foi assassinado por Ts’ui Tzu, Ch’en Wen Tzu, que possuía dez grupos de quatro cavalos cada, abandonou-os e deixou o reino. Ao chegar em outro reino, ele disse: ‘Os oficiais aqui não são melhores do que o nosso ministro Ts’ui Tzu’e partiu de novo. O que acha disso?” O Mestre disse: “Ele pode, de fato, ser considerado um homem puro”. “Pode ele ser chamado de benevolente?” “Sequer pode ser chamado de sábio. Como poderia ser chamado de benevolente?” 20. Chi Wen Tzu sempre pensava três vezes antes de agir. Quando o Mestre ficou sabendo disso, comentou: “Duas vezes é suficiente”. 21. O Mestre disse: “Ning Wu Tzu era inteligente enquanto o Caminho prevalecia no reino, mas foi estúpido quando não prevaleceu. Outros podem igualar sua inteligência, mas não podem igualar sua estupidez”. 22. Quando estava em Ch’en, o Mestre disse: “Vamos para casa. Vamos para casa. Em casa, nossos jovens rapazes são furiosamente ambiciosos e têm grandes talentos, mas não sabem usá-los”. 23. O Mestre disse: “Po Yi e Shu Ch’i nunca lembravam de velhas rixas. Por essa razão, muito raramente provocavam ressentimentos”. 24. O Mestre disse: “Quem disse que Wei-sheng era correto? Uma vez, quando um pedinte lhe mendigou vinagre, ele foi e pediu-o para um vizinho”. 25. O Mestre disse: “Palavras ardilosas, rosto adulador e absoluta subserviência: essas coisas Tso-ch’iu considerava vergonhosas. Eu também as considero vergonhosas. Ser amigável com alguém enquanto escondemos nossa hostilidade: também isso Tso-ch’iu considerava vergonhoso. Eu também considero vergonhoso”. 26. Yen Yüan e Chi-lu estavam presentes. O Mestre disse: “Sugiro que cada um de vocês me conte os seus desejos mais fortes”. Tzu-lu disse: “Eu desejaria partilhar minha carruagem e cavalos, roupas e peles com meus amigos sem me arrepender, mesmo que eles ficassem gastos”. Yen Yüan disse: “Eu desejaria nunca me vangloriar da minha própria bondade e nunca impor tarefas pesadas aos outros”. Tzu-lu disse: “Eu gostaria de ouvir quais os seus desejos secretos, Mestre”. O Mestre disse: “Trazer paz aos velhos, ter confiança nos meus amigos e dar afeto aos jovens”. 27. O Mestre disse: “Acho que devo abandonar as esperanças. Ainda estou para conhecer o homem que, ao ver os próprios erros, seja capaz de se criticar internamente”. 28. O Mestre disse: “Em um vilarejo de dez casas, sempre haverá aqueles que são meus iguais quanto a fazer o melhor que podem pelos outros e quanto a ser fiéis às próprias palavras, mas dificilmente terão tanta vontade de aprender quanto eu tenho”. www.rl.art.br. Abraço. Davi