sexta-feira, 20 de setembro de 2024

II. O EVANGELHO DE BUDA

 

Budismo. Texto do Yogi Kharishnanda Saraswati (1922-2001). Livro O Evangelho de Buda – Vida e Doutrina de Sidharta Gautama. II. O EVANGELHO DE BUDA. Capítulo três. A verdade redentora. As coisas do mundo e seus habitantes estão sujeitos a mudanças. São produtos de algo que já existiu anteriormente. Todo ser vivente é produto de seus anteriores, porque a lei de causa e efeito é inflexível e sem exceções. Porém, nas coisas que mudam sem cessar existe sempre um Verdade oculta. A Verdade dá realidade às coisas. A Verdade é imutável. E a Verdade deseja revelar-se; a Verdade aspira ser consciente; a Verdade se esforça por conhecer-se a si mesma. A Verdade existe na pedra, porque a pedra existe verdadeiramente, e não há força no mundo. Deus, homem ou demônio, que possa fingir que não exista. Porém, a pedra não é consciente. A Verdade existe na planta e sua vida pode expressar-se: nasce, floresce e frutifica. Sua beleza é maravilhosa, mas não é consciente. A Verdade existe no animal; o animal se move, percebe as coisas que o rodeiam, distingue e escolhe. Nele há consciência; porém, não tem ainda a consciência da Verdade. Existe unicamente a consciência do eu. A consciência do eu cega os olhos do espírito e oculta a Verdade. É a origem do erro, a fonte das ilusões e o germe do pecado. O eu engendro o egoísmo. Todo mal procede do eu. Toda injustiça é produto da afirmação do eu. O eu, é o princípio de todo ódio, da iniquidade, da calúnia, da impudicícia, da obscenidade, do roubo, da fadiga, da opressão e do derramamento de sangue. O eu é Mara, o tentador; o malfeitor, o criador do mal. O eu, seduz pelos prazeres. O eu prometo um paraíso encantador. O eu, é o véu do feiticeiro Mara. Porém, os prazeres do eu são ilusórios; seu labirinto paradisíaco é o caminho do inferno, e sua beleza uma chama ao calor do desejo. Quem nos livrará da tirania do eu? Quem nos salvará de nossas misérias? Quem nos restabelecerá a vida feliz? Tudo é miséria no mundo de Samsara; tudo é miséria e sofrimento. Porém, a felicidade da Verdade sobrepuja toda miséria. A Verdade dá a paz ao espírito ansioso; vence o erro, extingue as chamas do desejo e conduz ao nirvana. Bem-aventurado é aquele que encontra a paz no nirvana. Está livre das lutas e tribulações da vida, está ao abrigo de todas as transformações, desafia o nascimento e a morte, e permanece indiferente nos males da vida. Bem-aventurado é aquele em que encarnou a Verdade, porque conseguiu seu fim e se unificou com a Verdade. É vencedor sem que nada mais possa feri-lo; é glorioso e feliz sem sofrimento; é forte mesmo sobrecarregado sob o peso do trabalho; é imortal embora morra. A imortalidade é a essência de sua alma. Bem-aventurado aquele que alcançou o sacro estado de Buda, porque salvará os seus irmãos. A Verdade reside nele. A perfeita sabedoria esclarece o seu entendimento. A justiça inspira as suas ações. A Verdade é um poder ativo para o bem, indestrutível e invencível. Cultivem a Verdade em seu espírito e difundam-na pela humanidade, porque unicamente a Verdade salva do pecado e da miséria. A Verdade é o Buda, e o Buda é a Verdade. Bendito seja o Buda. A filosofia hindu divide o ser humano em Eu superior, que é imortal, espiritual e eterno, e o eu inferior, que é mortal, material e transitório. O texto se refere ao eu inferior. O Príncipe Sidharta Alcança o Budado. Capítulo Um. O Nascimento do Buda. Havia em Kapilavastu um rei sákia, firme em seus propósitos e reverenciado pelos homens, um dos descendentes de Ikchvaku, chamado Suddhodana. Sua esposa, Mayadevi, era maravilhosamente bela, como um lírio aquático, e de coração tão puro quanto o lótus. Qual rainha do céu, vivia na Terra, imaculada e pura de desejos. Seu real marido a reverenciava pela sua santidade, e o espírito da Verdade desceu sobre ela. Quando compreendeu que a hora de ser mãe estava próxima, pediu ao rei que a levasse à casa de seu pai, e Suddhodan, atencioso para com sua esposa e pelo filho que ia nascer, atendeu, feliz, a esse pedido. Quando Mayadevi atravessava o jardim de Lumbini, (atual Nepal), chegou a hora: preparou-se então um leito sob uma árvore com um enorme tronco, e a criança nasceu no alvorecer do dia, radiante e perfeita. A feliz notícia chegou ao palácio, e o rei Suddhodana mandou que levassem ao jardim de Lumbini o palanquim de cores refulgentes para transportar o recém-nascido. Então os Anjos, os Lípicas que anotam as ações dos homens, ocultando o seu angélico esplendor sob humildes roupas de carregadores, desceram dos mundos superiores para segurar os varais de palanquim. O rei Suddhodana, porém, que ignorava a presença dos quatro Anjos na Terra, receou presságios funestos que só findaram no momento em que seus adivinhos previram que o menino seria um príncipe dominador do mundo e dotado dos sete dons celestiais. Naquele tempo, o rishi Asita levava no bosque uma vida de eremita. Era um brâmane de cabelos grisalhos, cujos ouvidos há muito tempo estavam cerrados às coisas da Terra e percebiam somente os sons celestiais. Estando ele em oração sob a árvore baniana, ouviu os cânticos pelos devas (anjos) em louvor ao nascimento do Budha. Pela sua idade e pelos jejuns que fazia. Asita era afamado tanto pela sua sabedoria como pela sua habilidade de interpretar os desígnios humanos e fazer profecias. Por isso, o rei o convidou para ver a regia criança recém nascida. Quando o velho contemplou o príncipe, chorou e suspirou profundamente. O rei, ao ver as lágrimas de Asita, perguntou-lhe assustado: O que o Senhor viu em meu filho que lhe causou tanto sentimento e tanta mágoa? Mas o coração de Asita transbordava de felicidade, e reconhecendo que o rei estava preocupado, respondeu-lhe: Ó rei, qual Lua em sua plenitude, Sua Majestade deve sentir viva alegria, porque gerou um filho de maravilhosa nobreza. Não adoro o Brahma, porém adoro este menino, que os próprios deuses abandonaram seus templos para virem adorá-lo. Afaste todo temor e toda dúvida. Os presságios (prognóstico) espirituais indicam que o recém-nascido libertará o mundo. Porém, lembre-se de que sou velho e não pude reter as lágrimas, pois o meu fim se aproxima. O seu filho governará o mundo. Nasceu para o bem de toda criatura e de todo ser vivente. A pureza de sua doutrina se assemelhará à margem que recebe o náufrago. Seu poder de meditação será com o fervor de um lago, e toda criatura inflamada no ardor da luxúria se tranquilizará espontaneamente. Sobre o fogo da concupiscência se estenderá a nuvem da compaixão, apagando-o com a chuva da Lei. Ele abrirá as pesadas portas do desespero, e livrará todas as criaturas da trama das redes que elas mesmas teceram com sua loucura e ignorância. O rei da Lei apareceu para libertar da escravidão os pobres, os miseráveis e os desesperados. E prostrando-se diante do berço da criança. Asita exclamou: Ó criança! Eu adoro você. Você é Ele. Vejo a rosada luz impressa na planta dos pés, o suave desenho da suástica, os 32 sagrados signos capitais e os 80 secundários. Você será Buda. Pregará a Lei e salvará a todos os que a aprenderem. Não o ouvirei, porque estou próximo da morte. E dirigindo-se o rei, Asita acrescentou: Sabe, ó rei, que este seu filho é a Flor da árvore humana, que só produz uma flor após miríades de anos; porém, quando aberta, enche o mundo como o aroma da Sabedoria e o mel do Amor. Depois, disse à rainha: E a senhora, doce rainha, amada dos deuses e dos homens. Devido a este magno acontecimento, já está sagrada demais para continuar sofrendo. Como a vida é sofrimento, daqui a sete dias chegará sem dor ao fim da dor. Quando o rei e a rainha ouviram essas palavras de Asita, ficaram felizes em seus corações e deram ao menino que acabara de nascer o nome de Savarthasiddh, que quer dizer: Completa prosperidade, ou Êxito feliz, e num diminutivo carinhoso e familiar o chamaram de Sidharta. Então, a rainha disse à sua irmã Pradjapati: A mãe que deu à luz um futuro Budha não terá outro filho. Eu abandonarei logo este mundo, o rei meu esposo e meu filho Sidharta. Quando eu não mais existir, seja você a mãe dele! E Pradjapati, chorando, prometeu isso a ela. Na sétima noite, a rainha Mayadevi dormiu sorrindo e não despertou mais do seu sono. Passou feliz ao seu Trayastrinshas, onde inumeráveis devas (anjos) adoram e servem a radiante Mãe. Quando a rainha morreu. Pradjjapati tomou o menino Sidharta e o educou. E assim como pouco a pouco brilha cada vez mais a luz da Lua, a régia criança cresceu dia a dia em espírito e em corpo: a Verdade e o amor residiam em seu coração. (2). Rishi, literalmente revelador. Trata-se de um santo sábio ou iluminado, cantor ou poeta de divina inspiração.  Capítulo Dois. Sua juventude e seu casamento. Quando o príncipe Sidharta completou 18 anos, o rei mandou construir para ele três magníficos palácios; um de madeira de cedro, quente, para o inverno; outro de mármore betado, para o estio, e outro de ladrilhos cozidos para o outono. Ao redor desses palácios floresciam amenos jardins regados de alegres arroios e soalhados de formosos bosquezinhos com lindos caramanchões, onde Sidharta passava horas felizes, pois sua vida era saudável e em suas veias corria sangue jovem. Logo, porém, as sombras do tédio obscureceram a alegria do príncipe, como se algo lhe faltasse para completar esse bem-estar. O rei consultou seus ministros, e o mais ancião deles lhe respondeu: O amor curará esse leve descontentamento. Seu coração virgem deve ser entretido com o feitiço da graça feminina. Que sabe este jovem da formosura, o que sejam os encantadores lábios, ou os olhos que jogam o céu no esquecimento? Una-o, a uma esposa, porque facilmente um cabelo de mulher ata melhor os pensamentos que nem cadeias de bronze poderiam sujeitar. E o rei replicou: Se lhe buscarmos esposas, o amor seguramente escolherá com outros olhos, e se lhe apresentarmos um jardim de belezas para que escolha a flor que mais o agrade, receberá com doce sorriso o gozo que ignora. O ministro retrucou: O rei deve ordenar um festival em que as donzelas do reino desfilem em graça e juventude nos famosos desportes dos sákias. Que o príncipe outorgue o prêmio à formosura, e quando as vencedoras passarem em frente do seu trono, notaremos se alguma consegue desvanecer a persistente tristeza de seu semblante juvenil. Desse modo poderemos escolher para o Amor com os próprios olhos de Amor. O rei aceitou esse conselho, e, consequentemente, a partir do dia seguinte os pregoeiros convidaram donzelas formosas para participarem do concurso de beleza que se celebraria no palácio, onde o príncipe distribuiria prêmios; um objeto de arte para cada uma, e um de maior valor para a mais formosa. As donzelas de Kapilavastu encheram os jardins do palácio, vestidas de vistosos trajes de lindas cores. Lentamente, elas desfilaram diante do trono, com os olhos fixos no chão, sem se atreverem a erguê-los. Chegou a última, a jovem Yasodhara. Os que estavam junto ao príncipe viram que ele pareceu ficar perturbado quando a radiante jovem, cujas formas pareciam esculpidas no céu, se aproximou. Seu ar era como o da deusa Parpati, seus olhos como os de uma corça na estação do amor, e seu rosto de inefável encanto. Foi a única que ousou olhar o príncipe de frente, com as mãos cruzadas sobre o peito e erguido o graciosos colo. A donzela perguntou-lhe sorridente: Há prêmio para mim? O príncipe respondeu-lhe: Acabaram-se os prêmios; porém toma este em compensação, querida irmã, porque de sua graça se orgulhará toda a nossa ditosa cidade. Dito isso, o príncipe tirou o seu colar de esmeraldas e colocou o fio de contas verdes no pescoço da jovem Yasodhara. Seus olhos se encontraram e desse olhar brotou o amor. Yasodhara era filha de Suprabudha, monarca do reino vizinho, e, segundo a lei dos sákias, quando alguém pedia em casamento uma mulher de nobre estirpe, tinha que demostrar sua destreza nas artes da guerra e em torneios contra os demais pretendentes. Sidharta venceu todos seus rivais nas provas de arco, de espada e de corrida hípica. O rei Suprabudha disse então a Sidharta: Nosso coração desejava ver você alcançar o prêmio, porque você é o preferido; porém, como conseguiu aprender em meio a uma vida calma e sonhadora o que outros não conseguiram aprender na caça nem na guerra, nem nas porfias do mundo? Receba, ó príncipe, o tesouro a que fez jus. A essas palavras a amável jovem levantou-se de sua cadeira e, passando entre a multidão, pegou uma grinalda de jasmins, cobriu sua fronte com o véu preto salpicado de ouro e aproximou-se de onde estava Sidharta. A jovem, cujo semblante irradiava a alegria celeste de um amor feliz, inclinou-se diante do príncipe e, apoiando a cabeça no peito de Sidharta, prostrou-se aos seus pés, dizendo com os olhos radiantes de felicidade: Amado príncipe. Olhe-me. Sou sua. O rei Suddhodana deu a eles o belo palácio de Vishramvan. Abraço. Davi.

quarta-feira, 18 de setembro de 2024

XINTOISMO. MITOLOGIA E INFLUÊNCIA. Parte III

 

Xintoísmo. Bushidobr.com. MITOLOGIA E INFLUÊNCIA na formação da cultura e do carácter do povo japonês. Parte III. O conceito de michi. Derivado do Tao chinês (mesmo kanji - - ), definido como "a essência de todas as virtudes,[...] o que está perto, ao alcance das mãos e que erroneamente os homens o procuram longe" (HARADA, op. cit., p. 55). Discorre Yang Chu e Hu Shi sobre o Tao: A natureza é a atividade natural, o silente fluir dos acontecimentos tradicionais, a majestosa ordem das estações e do céu; é o Tao, ou o Caminho, corporificado e exemplificado em cada fonte, rocha ou estrela; é essa impessoal, imparcial e,  no  entretanto,   racional lei das coisas, com a qual a lei da conduta do homem tem que se conformar, caso ele deseje viver em sabedoria e paz. Esta lei das coisas é o Tao ou o caminho do universo, do mesmo modo que a lei da conduta é o  Tao   ou  o  caminho  da vida; na verdade, pensa Lao-Tze, os dois Taos são um só,  e a vida humana, em seus ritmos essenciais e normais, faz  parte  do   ritmo   do universo (Yang, Chu, 16, 19. Schneider, ii, 810, Hu Shih, 14 in  WILHELM, R., Short  story  of chinese civilization, New York, 1929 apud in DURANT, 1942, p. 185-186). Confúcio falando mais diretamente sobre o Tao como conduta do homem, dizia que Caminho é a harmonia com as coisas da natureza, que provêm do Céu: Sinceridade é o Caminho do Céu; realizar a sinceridade é o Caminho do homem. Aquele que possui a sinceridade é quem, sem esforço, faz o que é certo e compreende sem necessidade do pensamento: ele é o sábio que natural e facilmente incorpora o Caminho (m. t. apud in HARADA, op. cit., p. 54). Numa cultura em que os deuses são extremamente abundantes (fala-se em 800 ou 8000 as divindades do Xintô), mas cujos desejos em relação ao homem é apenas um, o japonês o resume em apenas um conceito: “michi”, caminho ou via. Seguir a via dos deuses, é a mensagem indelével fortemente introjetada no inconsciente coletivo desse povo, o que molda seu caráter, pensamento e a vida. As artes, a cultura e os esportes de origem nipônica trazem esta mensagem: shodô (書道) é o caminho da escrita; kadô (花道)ou(華道), o caminho das flores ou dos arranjos florais também conhecido como ikebana; kadô (歌道), com outro kanji para “ka” significando poesia, é o caminho da poesia ou a arte do poeta; butsudô (仏道), o caminho dos ensinamentos budistas; sadô ou chadô (茶道), o caminho do chá ou a arte da cerimônia do chá; kendô (剣道), o caminho da espada; judô (柔道), caminho suave ou caminho da luta suave; karatê-dô (空手道), caminho da arte marcial de mãos vazias. “Michi”, caminho ou via, guarda estreita relação com o comportamento do nipônico. Embora impreciso, amplo e vago, como sói nos conceitos dessa cultura, para 15 .o japonês, “michi” não precisa ser explicitado, definido, ensinado nem imposto: é algo que lhe parece claro, sem necessidade de palavras para se conceituá-lo. É, muito possivelmente, o termo mais antigo e de mais largo significado dentro da ética e da religião na cultura japonesa, "uma inconsciente observância do Caminho" (HARADA, op. cit., p. 48). Ao homem de michi regras morais ou conjunto de mandamentos não lhe parecem necessários. Suas ações são livres e sua autoexpressão, nessa condição de natural liberdade, está mais verdadeiramente de acordo com o Caminho (ibidem p. 50). Ele entenderá com o coração e aprenderá na convivência que seguir a “via dos deuses” é seu caminho natural: é portar-se como um deus, é sentir plenamente seu deus interior, ou seja, internamente é onde está o controle moral, inato ao homem, independendo, pois, de controle externo por leis e normas. Estar no Caminho é apenas seguir sua natureza, seu impulso natural. Estar fora do Caminho constitui um insulto, significa acusar alguém de levar vida errante (HARADA, op. cit., p. 49). A natureza das coisas é determinada por leis divinas. Estar em harmonia com a Natureza é estar no Caminho (ibidem p. 50-51). "Kami nagara no michi" - ou a Via dos deuses - é apenas o estado natural das coisas, onde inexiste a ideia do certo ou errado, ou seja, a ética e a moral não entram na apreciação. Os deuses venerados e os maus espíritos são igualmente reverenciados, o que torna desimportante um enquadramento ético para esses seres. A ética ou a sua ausência, ainda que temporária, é aceita como natural aos deuses, tal qual nos humanos. Não que seja impossível apreciar sob esse ângulo - na mitologia, os principais deuses têm seus momentos de cólera ou decepção - , mas o xintoísmo não se ocupa disso, porque não tem importância, não é significante, ensina Nyozekan Hasegawa (HASEGAWA, 1939, p.10). Ao japonês como crença e prática do xintoísmo, basta-lhe estar no Caminho, ou seja, ser naturalmente si próprio. O japonês primevo era já um ser despreocupado com o enquadramento ético, era "naturalmente puro, santo e correto", afirmava Griffis (GRIFFIS, op. cit., p. 72). O japonês não se sente vigiado, não conhece punição e recompensa como mecanismos   ligados às ações provenientes do seu arbítrio. Não existe a ideia de que deuses punem comportamento contrário à sua vontade e premiam os que lhes obedecem. "Recompensas e punições não são oferecidas como meio de tornar o homem bom" (HITCHCOCK, 1893, p. 503). Nesse sentido, inexiste uma pedagogia divina para a educação do homem. 16 .Muro Kiuso considera o amor como a essência do Caminho, a virtude cardeal. "[...] assim como o homem morre quando seu pulso para, então também, seu coração morre quando o princípio do amor perece. Por isso o amor pode ser chamado a vida do coração" (apud in op. cit. HARADA, p.58). Ainda com foco na naturalidade interior, Nakae-Toju identifica o Michi com "a verdade adquirida com o conhecimento de si mesmo" que provém não do mundo à nossa volta nem de livros, senão do nosso próprio interior, isto é, "da nossa alma" (idem). O conhecimento então está no nosso interior, na nossa alma divina. Para esse comentarista o Caminho é algo imanente, invisível, imperceptível, mas onipresente em nossas vidas. "É o que habita no universo, assim como a alma habita o homem". (ibidem p. 61) Seguir o caminho não é obedecer, se submeter à vontade de um ser superior; é apenas viver, ser si próprio. Tão natural como apreciar flores da cerejeira: para isso não é preciso nada, apenas o coração em sintonia com a beleza da flor, ou como dizem os zen-budistas e haicaístas, sentir seu coração, uma flor de cerejeira. (D. T. SUZUKI in FROMM, 1960, p. 13, 21). Para o homem nipônico “michi” é mais do que conceito filosófico, regra de vida ou mandamento religioso. É a própria essência da vida. Na sua obra “The Faith of Japan”, o professor Tasaku Harada, assim se expressa a esse respeito: Por michi, a via, entende-se um conceito misterioso, não formulado, e, todavia, influente, que é acompanhado de terror religioso e de solenidade. O termo michi é provavelmente o mais expressivo de todo o vocabulário japonês em matéria de ética e de religião. A princípio, e como na língua corrente, significa carreira ou caminho. Em religião e em ética, significa via, ensinamento, doutrina ou, como às vezes se traduz, princípio. (O seu equivalente chinês é tao). Na sua presença, respira-se uma atmosfera edificante. Um homem de michi é um homem de caráter, um justo, que tem princípios e convicções e que obedece à natureza da sua humanidade. Acusar alguém de se ter afastado do michi é um insulto, porque isso implica perversidade para com aquilo que existe de mais essencial no homem. Michi é uma componente recebida do Céu, é o ideal celeste que deve ser realizado na humanidade. Michi é também o modo de vida que nos é dado como ideal e que aceitamos seguir. Diz-se que o confucionismo é o michi dos sábios e dos sensatos, o budismo o michi de Buda, o xintô o michi dos kami. A moralidade é michi, a harmonia entre a vida e o ideal, e considera-se mesmo que a razão constitui a essência do michi. Mas, seja qual for o sentido em que se empregue, michi exprime uma convicção muito profunda e sincera que liga o indivíduo, de maneira solenemente impressionante, à altura e à profundidade do grande Todo. Ele implica que a essência da vida humana se liga a uma vida sobre-humana. Num poema de Michizane Sugawara, lê-se: “Se no secreto do nosso coração/ Seguirmos a via sagrada/ Os deuses certamente nos terão em sua guarda/ Mesmo que nunca lhes dirijamos nenhuma oração”. [...] kannagara representava o ideal religioso do povo, “uma obediência inconsciente à via”, que julgavam existir desde tempos imemoriais. Agir em conformidade com o curso da Natureza, sem esforço consciente, obedecendo ao impulso que nos sugere a nossa constituição, é, para o xintô, a mais elevada virtude. Esse curso da Natureza é a vontade dos 17 .deuses.  A vontade dos deuses realiza-se em tudo o que age naturalmente. Encontramos aí uma extrema simplicidade, uma fé total na justeza do que é natural. Tal é o coração do michi japonês ( HARADA, op. cit., p.50 traduções de José Pinto apud in op. cit. ROCHEDIEU, p. 108-109). O santuário xintô e o culto Como vimos, nascido e cultuado no meio da natureza, os santuários são invariavelmente localizados em meio a árvores, alguns no meio de florestas, perto de montanhas ou corrente de água. É comum a veneração de árvores no Xintô. Em tempos antigos, o termo mori (floresta) era sinônimo de santuário e as árvores do entorno, chamadas de kannabi (abrigo dos deuses) (ONO, op. cit., p. 98). Diante dos santuários, sem que se compreenda nada, pode-se ser um adorador, impressionar-se com as indefectíveis árvores, o lago, o ambiente, independentemente da especificidade que sustente aquele santuário (HERBERT, 1964, p. 24). Nos santuários não se dá importância ao aspecto filosófico ou doutrinário que sustentam a fé, mas aos fatos históricos e costumes que o envolvem. Quase nada se encontra que fale sobre a natureza do kami, dos ritos e práticas do santuário (ONO, op. cit., p. 92). O estudioso Yanagita Kunio afirma que “não há nos santuários xintoístas instrução doutrinária e só se aprende o xintoísmo pela convivência e pelo exemplo”(apud in BARROS, 1988, p. 46). O santuário e seus ritos, aceitos como símbolos da fé comunitária,  ao mediarem a relação do homem com os deuses, faz as instruções doutrinárias desnecessárias (ONO, op. cit., p. 11) De fato, os japoneses mais seguem os exemplos e tiram lições de conduta das personagens mitológicas do que obedecem a alguma instrução ou mandamento. Não há combate do mal com o bem. Nos seus primórdios também não havia necessidade de templo ou santuário. Como vimos, as celebrações eram feitas ao ar livre, geralmente à beira de um rio, cachoeira ou no elevado de uma colina, num espaço cercado para esse fim. Fala sobre o santuário xintô Jean Herbert: O templo xintô é uma manifestação visível e sempre eficaz da relação de consanguinidade que existe entre o indivíduo e o mundo inteiro, a humanidade, os seres vivos e não vivos, os mortos, a terra toda, os corpos celestes e os deuses, qualquer que seja o nome que se lhes dê. A pessoa que entra no templo torna-se mais ou menos consciente, inevitavelmente, desta relação íntima e, a certa altura, dá-se conta de que todos os sentimentos de ansiedade, de antagonismo, de solidão, de desânimo, desaparecem, do mesmo modo que a criança vem repousar tranquilamente nos braços da mãe. Uma sensação quase palpável de paz e de segurança invade o visitante à medida que vai avançando para o interior do recinto sagrado .... ( HERBERT, 18 .1964, p. 155-156,  tradução de José Pinto apud in op. cit.  ROCHEDIEU, p. 129-130). Produto desse sentimento de irmandade, o xintoísmo "é essencialmente o credo que afirma a vida", e trata muito pouco da morte e do mundo pós-morte. (LITTLETON, op. cit., p. 89). Suas cerimônias e ritos comemoram não apenas o cotidiano do indivíduo como nascimento, aniversário e casamento, mas também os da comunidade e da nação (ONO, op. cit., p. 50). Crê-se no xintoísmo que o tama (espírito) por algum tempo ainda exerça influência na vida antes de se tornar um antepassado kami (entidade elevada, deus) da família à qual pertenceu, o que dá raízes identitárias à ancestralidade da família ou do clã. (idem). Alguns se tornavam até mesmo o kami venerado por trabalhadores de sua guilda. (HEARN, 1984, p. 124) Os aprendizes eram introduzidos no trabalho e no culto ao kami de seus colegas (ibidem p.125). Havia profunda identificação entre o trabalho e o Xintô. O carpinteiro vestido como monge xintô, invocava a proteção de deuses e realizava certos ritos ao designar o local de sua obra (idem). O alfageme submetia-se a ritual religioso na confecção de sua espada:  "trabalhava vestido como monge, submetia-se a ritos de purificação enquanto trabalhava para obter uma boa lâmina". Seu local de trabalho era protegido pela corda sagrada shimenawa, onde não entrava nem seus familiares e só se alimentava de comida preparada no fogo sagrado. Durante seu trabalho não falava com ninguém, nem mesmo com gente de sua família (idem). O culto extremamente simples, é feito diante de um oratório doméstico (kamidana). Crê-se que os espíritos (kami e ancestrais) protegem sua família e "não deixam de servir ao seu senhor, aos pais, à esposa e aos filhos, como quando estavam ainda em vida" (Hirata apud in BRILLANT et alii, op. cit., p. 183). O kamidana deve estar sempre limpo e imaculado. Oferecem-se geralmente pequenas porções de comida e água; é costume também oferecer coisas de que o morto gostava  (ONO, op. cit., p.59). Porta-se como se o familiar venerado estivesse ainda vivo, oferecendo-lhe ou comunicando-lhe promoções, recebimento de salários, diplomas, nascimentos, casamentos e todo fato importante da família, como expressão de agradecimento (idem). Idealmente o ritual deve ser diário, mas não se lhes devotam mais do que os cumprimentos e gentilezas que fazemos quotidianamente aos nossos familiares. As crianças costumam fazer a comunicação no kamidana de suas notas escolares, antes mesmo de exibi-las aos pais (HERBERT, 1964, p. 250). Sobre o culto familiar, discorre Wenceslau: [...]os avós, pelas suas próprias virtudes durante a apagada existência, e pelas propiciações que os vivos lhes tributam, no desempenho dos ritos familiares. Abraço. Davi

segunda-feira, 16 de setembro de 2024

JESUS. Parte IV

 

Judaísmo. Livro Judaísmo e Cristianismo – As Diferenças. Por Trude Weiss (1908-1989). Capítulo 8. JESUS. Parte IV. A atitude de Jesus em relação a vida e às leis que a regulam, de acordo com os ensinamentos do judaísmo, difere grandemente da postura dos rabinos reconhecidos e dos verdadeiros mestres da Lei de sua época. Os evangelhos mostram claramente que o próprio Jesus se sentiu em oposição aos rabinos, “os fariseus”. De modo ostensivo, Jesus não se considerava um “rabino” nem estava interessado nos pontos mais refinados da Torá ou na exposição deles, que era o interesse predominante dos rabinos da época. Sua atitude com relação à principais instituições sociais e Leis foi tal, entretanto, que por si só já eram suficientes para colocá-lo em oposição eterna ao judaísmo e seus rabinos. Os Evangelhos fornecem ampla evidência de que Jesus achava que os rabinos eram de pouca utilidade e sentia por eles um amor menor ainda. Pois as suas próprias visões e atitudes eram diametralmente opostas à filosofia e modo de vida judaico. O judaísmo é essencialmente otimista. Ensina que a vida e o mundo são bons e que a piedade consiste na integração religiosa e espiritual do físico e do material em vez da total abnegação e ascetismo. Jesus era de natureza ascética. Seu reino não era neste mundo e seus ensinamentos, portanto, preocupavam-se principalmente com o mundo vindouro. Enquanto os rabinos daquela época se empenhavam em resolver o problema da pobreza por meio de legislação e disposições legais adequadas. Jesus, despreocupado dos problemas decorrentes da necessidade, lidava com eles simplesmente do ponto de vista irreal do mundo por vir. Para ele, a pobreza não era uma condição degradante e deplorável que necessitasse erradicação, mas pelo contrário, a considerava como um passaporte para o Reino dos Céus. E então aconselhava aos discípulos: Se desejas a perfeição. Vá! Venda sua propriedade e doe o dinheiro aos pobres e gozarás de riqueza nos céus. Depois, volte e seja meu seguidor” Mateus 19,21. Claro que essa não é uma solução para o problema da necessidade e do sofrimento social. Pelo contrário, agrava o problema acrescentando mais pessoas pauperizadas as fileiras daqueles que estão passando necessidades. O problema social agitou, desde os primórdios, os corações e mentes dos mestres judeus. Tentaram solucioná-lo e obtiveram bastante êxito em sua tentativa, promulgando leis e taxando os ricos em benefício dos pobres. Além da taxação, e acima dela, eles também ressaltavam insistentemente a importância da caridade. Mesmo assim, não defendiam que o ser humano se despojasse de tudo que tivesse. Pelo contrário, depreciavam a generosidade imprevidente e a consideravam insensata e contrária a Lei. Promulgaram a norma de que não se deve doar para caridade mais do que um quinto de suas posses. O ser humano ideal do judaísmo leva uma vida plena como membro de sua família, devidamente integrado à comunidade e na feliz busca de um trabalho produtivo. Para poder ser um seguidor de Jesus, entretanto, seria preciso romper todos os vínculos com a vida social normal. Ele exigia; “Nem um de vocês que não se despedir de tudo o que possui não poderá ser um dos meus discípulos” Lucas 14,33. Essa renúncia não se estendia somente às pessoas materiais, mas também à eliminação das afeições mais naturais pelos membros da família. Contrariamente à atitude judaica positiva com relação ao matrimônio e à família, Jesus se opunha quase que hostilmente a essas instituições. Não era casado e dirigia palavras extremamente contundentes contra a lealdade a pais, irmãos e irmãs, considerando esses vínculos como afastadores do amor de Deus. O mandamento de honrar pai e mãe tem sido invariavelmente tido pelos rabinos e mestres como uma das leis mais importantes da Torá. A literatura judaica está repleta de histórias inspiradoras do amor e fidelidade exemplar dos grandes sábios. Jesus, por outro lado, desmerecia e envergonhava sua mãe e irmãos em público. Assim, está registrado que quando Jesus se dirigia a multidão, “sua mãe e seus irmãos permaneciam fora dela, desejando falar com ele. Mas, dizia a quem o avisava: Quem é minha mãe e quem são meus irmãos?” Apontava aos discípulos e dizia; “Aqui estão minha mãe e meus irmãos! Todo aquele que realiza a vontade de meu Pai do céu é meu irmão e minha irmã e minha mãe” Mateus 12,46-50. Em outra ocasião, quando um dos ouvintes exclamou: “Abençoado seja a mãe que o gerou e nutriu”. Jesus respondeu: “Você poderia expressar-se melhor: “Abençoados sejam aqueles que ouvem a mensagem de Deus e as observa” Lucas 11,27 e seguintes. Ele também ensinava: “Não deves chamar qualquer um na terra de seu pai, pois tens somente um, o Pai dos Céus” Mateus 23,9. Abraço. Davi.

sábado, 14 de setembro de 2024

OS ANALECTOS - LIVRO V

 

Confucionismo. www.rl.art.br. OS ANALECTOS – LIVRO V. Texto de Confúcio (551-479). 1. O Mestre disse de Kung-yeh Ch’ang que ele era uma boa escolha para marido, pois, embora estivesse preso, não havia feito nada errado. E lhe deu sua filha em casamento. 2. O Mestre disse de Nan-jung que, quando o Caminho prevaleceu no reino, este não foi posto de lado e, quando o Caminho caiu em desgraça, ele ficou longe da humilhação e da punição. E lhe deu a filha do seu irmão mais velho em casamento. 3. O comentário do Mestre sobre Tzu-chien foi “Que cavalheiro! Onde ele teria adquirido as suas qualidades, se não houvesse cavalheiros no reino de Lu?”. 4. Tzu-kung perguntou: “O que acha de mim?”. O Mestre disse: “Você é um navio”. “Que tipo de navio?” “Um navio sacrificial”. 5. Alguém disse: “Yung é benevolente, mas não fala muito bem”. O Mestre disse: “Qual a necessidade de ele falar bem? Um homem rápido nas respostas frequentemente provocará o ódio dos outros. Não posso dizer se Yung é benevolente ou não, mas qual a necessidade de ele falar bem?”. 6. O Mestre aconselhou Ch’i-tiao K’ai a assumir um cargo oficial. Ch’i-tia o K’ai disse: “Acho que ainda não estou pronto”. O Mestre ficou satisfeito. 7. O Mestre disse: “Se o Caminho não pudesse prevalecer e eu fosse lançado ao mar em uma jangada, aquele que me seguiria seria Yu, sem dúvida alguma”. Tzu-lu, ao ouvir isso, transbordou de alegria. O Mestre disse: “Yu tem mais amor à coragem do que eu, mas lhe falta juízo”. 8. Meng Wu Po perguntou se Tzu-lu era benevolente. O Mestre disse: “Não posso dizer”. Meng Wu Po repetiu a pergunta. O Mestre disse: “A Yu pode ser dada a responsabilidade de coordenar as tropas de um reino de mil carruagens, mas se ele é benevolente ou não, não posso dizer”. “E quanto a Ch’iu?” O Mestre disse: “A Ch’iu pode ser dada a responsabilidade de administrar uma cidade de mil casas ou uma família nobre de cem carruagens, mas se ele é benevolente ou não, não posso dizer”. “E quanto a Ch’ih?” O Mestre disse: “Quando Ch’ih coloca a sua faixa e toma lugar na corte, a ele pode ser dada a responsabilidade de conversar com os convidados, mas se ele é benevolente ou não, não posso dizer”. 9. O Mestre disse a Tzu-kung: “Quem é o melhor homem, você ou Hui?”. “Como eu ousaria me comparar a Hui? Quando lhe é dita uma coisa, ele compreende cem coisas. Quando me é dita uma coisa, eu entendo apenas duas.” O Mestre disse: “De fato, você não é tão bom quanto ele. Nenhum de nós dois é tão bom quanto ele.” 10. Tsai Yü estava na cama durante o dia. O Mestre disse: “Um pedaço de madeira podre não pode ser esculpido, tampouco pode uma parede de esterco seco ser aplainada. Em se tratando de Yü, de que adianta condena-lo?”. O Mestre acrescentou: “Eu costumava ouvir as palavras de um homem e confiar que ele agiria de acordo. Agora, tendo ouvido as palavras de um homem, parto para observar suas ações. Foi por causa de Yü que mudei quanto a isso.” 11. O Mestre disse: “Nunca conheci alguém que fosse verdadeiramente constante”. Alguém perguntou: “E quanto a Shen Ch’eng?”. O Mestre disse: “Ch’eng é cheio de desejos. Como pode ser constante?12. Tzu-kung disse: “Do mesmo modo que não quero que os outros mandem em mim, também não quero mandar nos outros”. O Mestre disse: “Ssu, isso ainda está bem acima de você”. 13. Tzu-kung disse: “Pode-se ouvir sobre as realizações do Mestre, mas não se pode ouvir suas opiniões sobre a natureza humana e o Caminho para o Céu”. 14. A única coisa que Tzu-lu temia era que, antes que pudesse colocar em prática algo que aprendera, lhe ensinassem outra coisa diferente. 15. Tzu-kung perguntou: “Por que K’ung Wen Tzu foi chamado de wen?”. O Mestre disse: “Ele era rápido e ávido por aprender: não teve vergonha de buscar o conselho daqueles que lhe eram inferiores em posição. É por isso que ele é chamado wen”. 16. O Mestre disse sobre Tzu-ch’an que sob quatro aspectos ele tinha as maneiras de um cavalheiro: era respeitoso no modo como se comportava; era reverente no serviço ao seu senhor; ao tratar com as pessoas comuns, ele era generoso e, ao empregar os serviços destas, era justo. 17. O Mestre disse: “Yen P’ing-chung era um excelente amigo: mesmo quando conhecia seus amigos há muito tempo, ele os tratava com reverência”. 18. O Mestre disse: “Ao fazer uma casa para sua grande tartaruga, Wen-chung mandou esculpir os capitéis dos pilares na forma de montanhas e pintar os caibros do telhado com desenhos de plantas aquáticas. O que se deve pensar sobre a inteligência dele?19. Tzu-chang perguntou: “Ling Yin Tzu-wen não demonstrou júbilo algum quando por três vezes foi feito primeiro-ministro. Tampouco demonstrou desgosto quando por três vezes foi removido do cargo. Ele sempre dizia ao seu sucessor o que havia feito durante seu mandato. O que acha disso?” O Mestre disse: “Ele pode, de fato, ser considerado um homem que dá o melhor de si”. “E pode ele ser chamado de benevolente?” “Sequer pode ser chamado de sábio. Como poderia ser chamado de benevolente?” “Quando o senhor de Ch’i foi assassinado por Ts’ui Tzu, Ch’en Wen Tzu, que possuía dez grupos de quatro cavalos cada, abandonou-os e deixou o reino. Ao chegar em outro reino, ele disse: ‘Os oficiais aqui não são melhores do que o nosso ministro Ts’ui Tzu’e partiu de novo. O que acha disso?” O Mestre disse: “Ele pode, de fato, ser considerado um homem puro”. “Pode ele ser chamado de benevolente?” “Sequer pode ser chamado de sábio. Como poderia ser chamado de benevolente?” 20. Chi Wen Tzu sempre pensava três vezes antes de agir. Quando o Mestre ficou sabendo disso, comentou: “Duas vezes é suficiente”. 21. O Mestre disse: “Ning Wu Tzu era inteligente enquanto o Caminho prevalecia no reino, mas foi estúpido quando não prevaleceu. Outros podem igualar sua inteligência, mas não podem igualar sua estupidez”. 22. Quando estava em Ch’en, o Mestre disse: “Vamos para casa. Vamos para casa. Em casa, nossos jovens rapazes são furiosamente ambiciosos e têm grandes talentos, mas não sabem usá-los”. 23. O Mestre disse: “Po Yi e Shu Ch’i nunca lembravam de velhas rixas. Por essa razão, muito raramente provocavam ressentimentos”. 24. O Mestre disse: “Quem disse que Wei-sheng era correto? Uma vez, quando um pedinte lhe mendigou vinagre, ele foi e pediu-o para um vizinho”. 25. O Mestre disse: “Palavras ardilosas, rosto adulador e absoluta subserviência: essas coisas Tso-ch’iu considerava vergonhosas. Eu também as considero vergonhosas. Ser amigável com alguém enquanto escondemos nossa hostilidade: também isso Tso-ch’iu considerava vergonhoso. Eu também considero vergonhoso”. 26. Yen Yüan e Chi-lu estavam presentes. O Mestre disse: “Sugiro que cada um de vocês me conte os seus desejos mais fortes”. Tzu-lu disse: “Eu desejaria partilhar minha carruagem e cavalos, roupas e peles com meus amigos sem me arrepender, mesmo que eles ficassem gastos”. Yen Yüan disse: “Eu desejaria nunca me vangloriar da minha própria bondade e nunca impor tarefas pesadas aos outros”. Tzu-lu disse: “Eu gostaria de ouvir quais os seus desejos secretos, Mestre”. O Mestre disse: “Trazer paz aos velhos, ter confiança nos meus amigos e dar afeto aos jovens”. 27. O Mestre disse: “Acho que devo abandonar as esperanças. Ainda estou para conhecer o homem que, ao ver os próprios erros, seja capaz de se criticar internamente”. 28. O Mestre disse: “Em um vilarejo de dez casas, sempre haverá aqueles que são meus iguais quanto a fazer o melhor que podem pelos outros e quanto a ser fiéis às próprias palavras, mas dificilmente terão tanta vontade de aprender quanto eu tenho”. www.rl.art.br. Abraço. Davi

 

quinta-feira, 12 de setembro de 2024

I. O EVANGELHO DE BUDA

 

Budismo. Livro o Evangelho de Buda. Vida e doutrina de Sidharta Gautama – o Inspirador do Budismo. Escrito por Yogi Kharishnanda Saraswati (1922-2001). I. O EVANGELHO DE BUDA. Da Lua cheia de maio de 1954 à Lua cheia do mesmo mês de 1956, realizou-se na República da União de Burma ou Myanmar o Sexto Grande Congresso Budista, que foi o 60º dos congressos desde a fundação do Budismo. Tratou-se de um acontecimento histórico notável. A ele compareceram dois mil representantes de povos budistas, dos mais eruditos, com a finalidade principal de estudar, comparar, corrigir ou aprovar textos doutrinários. O primeiro congresso foi realizado pouco depois da morte de Buda, sob os auspícios do Rei Ajatasattu, do norte da Índia. O segundo Grande Concílio teve lugar no ano 443 a.C., apoiado pelo Rei Kalasoka. O terceiro, sob o patrocínio do Imperador Asoka, foi celebrado no ano 308 a.C., o quarto, em Ceilão ou Sri Lanka entre os anos 29 e 13 a.C., quando pela primeira vez foram escritos os textos que antes eram preparados de memória. O quinto Grande Concílio foi efetuado em Mandalay – Myanmar, no ano de 1871, sob o Rei Mindon, quando então os textos foram escritos em 729 em lousas de mármores. Com a técnica moderna de impressão e vulgarização, e o substancial auxílio prestado pelo Parlamento da União República de Burma (Myanmar), o Sexto Grande Congresso foi de inigualada eficiência, e a sua difusão teve uma amplitude jamais alcançada no passado. Manifestando sua descrença nos processos simplesmente materiais adotados pelos povos e governos para solucionar os problemas que afligem a humanidade, e justificando sua assistência ao referido Congresso, o Parlamento Burmense proclamou sua firma crença de que esses processos proporcionam aos povos uma solução meramente parcial de seus problemas, e que era necessário planejar e levar a cabo outras medidas, que visassem ao bem estar moral e espiritual do homem e o ajudassem a vencer a avareza, o ódio e o engano, as inveteradas raízes de toda violência, destruição e conflagração que consomem o mundo (...). Essas raízes foram assinaladas por Buda em sua época. Outra não é ainda hoje a opinião de todos os que, como nós, sentem que a ausência de princípios espirituais sadios na conduta dos indivíduos tem sido a maior fonte proliferadora de seus desatinos e sofrimentos. Esse foi o sentimento que nos levou a promover a publicação deste pequeno Evangelho dos ensinos fundamentais de Gautama Buda. Figura ímpar entre os mais aureolados instrutores espirituais que a humanidade conheceu. Sua Majestade tem se agigantado e projetado ao compasso de marcha dos séculos tormentosos, qual rutilante Sol sobre densas e encapeladas nuvens. Somente esse fato bastaria para comprovar a veracidade e segurança de sua doutrina, pois só a verdade pode resistir ao embate destruidor do tempo. A essência dos ensinamentos de Buda se acha condensada em três livros ou coleções, chamados os cânones budistas (Tripitakas), cuja idade se pode fixar, de maneira geral, no século IV a.C, e possivelmente na época do grande Instrutor. O primeiro (Vinaya Pitaka), atribuído aos primeiros budistas, trata da Disciplina da Ordem (Sangha); o segundo (Sutta Pitaka) se refere às Pregações Leigas, ou às regras para os sacerdotes e ascetas, e o terceiro (Abidharma), condensa dissertações filosóficas e metafísicas, e instruções a respeito da meditação (Dhyana). Foi dessa fonte, sobre a qual têm se debruçado e abeberado tantos e tão notáveis sábios e orientalistas, que o autor desta obra colheu os preciosos ensinamentos e informações que ele denominou: “O Evangelho de Buda” e que com feliz maestria procurou amoldar à mentalidade ocidental num estilo simples e elegante. O fato de ter sido também um oriental, e acima de tudo, de ter podido aprender, assimilar e viver a cultura oriental em sua mais pura nascente, o capacitou, naturalmente, para penetrar até o âmago dos ensinamentos budistas, e assim sentir todo o seu calor, luz e dinamismo, para formar uma verdadeira antologia do que há de mais magnífico, essencial e inspirador na vida do venerando sábio que um terço da humanidade adora. Neste formoso livro existem, por certo, frases que pertencem totalmente ao seu autor, mas é inegável que elas exalam o mesmo perfume da fonte que as inspirou e visam acomodar alguns ensinos por demais metafísicos à inteligência ocidental, não raro objetiva e prática em excesso. Mas o fundamento e o espírito das ideias expostas em toda a obra são nitidamente budistas, ou seja, práticos, lógicos e enquadrados num impecável bom senso, que é a sua característica dominante. Para muitos, poderá ser um poderoso foco de inspiração em sua vida moralmente atribulada, e para outros constituirá um pequeno, mas bem-acabado vestíbulo que os poderá conduzir ao interior da nave de uma das mais esplêndidas e antigas filosofias do mundo. Esse livro foi escrito tendo em vista esse objetivo, e tem sido traduzido para várias línguas das mais cultas, tendo encaminhado muitas almas para o caminho da retidão, do dever e do amor a todas as criaturas vivente. Eis o motivo de sua publicação, agora; em nosso idioma. Capítulo Um. Alegria. Regozijem-se com a boa nova. Nosso Senhor descobriu a raiz do mal. Ele nos mostra o caminho da salvação. O Buda dissipa as ilusões da nossa mente e nos livra dos terrores da morte. O Buda, nosso Senhor, traz descanso ao fatigado, ao desanimado e ao descontente; proporciona paz aos acabrunhados sob o pesa da vida. Dá valor aos fracos, que estão prestes a perder a esperança e a confiança em si mesmos. Todos os que sofrem as tribulações da vida, que lutam e padecem, que aspiram à vida verdadeira, regozijem-se com a boa nova. Eis aqui um bálsamo para os feridos, bem como o pão para os famintos. Eis aqui a água para os sedentos, e a esperança para os desesperados. Eis aqui a luz pra os que estão nas trevas, e a inesgotável ventura para os justos. Os feridos serão curados de suas feridas; os famintos terão pão para se fartarem; os sedentos serão saciados. Ergam os olhos para a luz, vocês que estão nas trevas e recobrem ânimo, vocês que estão abatidos. Tenham confiança na verdade os que amam, porque o reinado da Verdade está fundado na Terra. A luz da Verdade já dissipou as trevas do erro. Podemos ver o nosso caminho e andar com passos firmes e seguros. O Buda, nosso Senhor, revelou a Verdade. A verdade cura as nossas enfermidades e nos salva da perdição. A Verdade fortalece-nos na vida e na morte. Só a Verdade pode destruir os males do erro. Regozijem-se com a boa nova. Capítulo dois. Samsara e Nirvana. Olhem ao redor e contemplem a vida. Tudo é passageiro, nada dura para sempre. Só nascimento e morte, crescimento e decadência, combinação e dissolução. A glória do mundo é como uma flor esplêndida pela manhã que murcha à tarde. Para onde quer que olhemos, ali está o receio e o impulso, a corrida ávida aos prazeres, o medo da dor e da morte, a vaidade e o desejo de mudanças e transformações. Tudo é Samsara. Não há nada permanente no mundo? Na inquietude universal não há um lugar de repouso onde o nosso coração encontre a paz? Nada, há de eterno? Nunca cessará a angústia? Não se extinguirão os desejos ardentes? Quando o espírito poderá estar sossegado e tranquilo? O Buda, nosso Senhor, sentiu os males da vida. Viu a vaidade na infelicidade do mundo, e procurou a salvação em algo que não se deteriora, que é imperecível e permanente. Aqueles que aspiram à vida saibam que a imortalidade se oculta no ser perecível. Aqueles que desejam a felicidade sem os germes da inquietude ou do desgosto sigam os conselhos do Grande Mestre e conduzam-se retamente. Aqueles que desejam avidamente riquezas venham para receber os tesouros eternos. A Verdade é eterna; não conhece nascimento nem morte; não tem começo nem fim. Chamem a Verdade, ó mortais. Que a Verdade se aposse de suas almas. A Verdade é o dom imortal do espírito. A posse da Verdade é grandeza, e uma vida de Verdade é felicidade. Estabeleçam a Verdade no espírito, porque a Verdade é a imagem do eterno. O seu retrato é imutável; revela o perdurável; imortaliza os homens. O termo sânscrito Samsara significa literalmente ação de vagar, constante mutação ou transição. É a passagem alternativa da alma pelos três mundos: físico, astral e mental; os sucessivos renascimentos e mortes. Nirvana, o oposto de Samsara; é um estado permanente e eterno de consciência desperta e liberta. Esse termo significa, literalmente, sem combustível, extinto, e foi definido primitivamente por alguns orientalistas ocidentais como um estado de aniquilamento do ser. A semelhança de uma gota d’água diluída no oceano, o que é totalmente incorreto. Representa, ao contrário, um estado de plena consciência, cuja beleza, intensidade e poder excedem toda capacidade descritiva da linguagem humana. É a vida do Espírito, que se desabrochou e expandiu em seu próprio mundo ou lar, liberto de qualquer limitação de espaço e tempo a que se condicionam as formas transitórias. Quem tem a ventura de atingi-los, longe de se aniquilar, converte-se numa tremenda força liberadora, que perpetuamente projeta poderosas torrentes de espiritualidade e vida sobre a humanidade sofredora. Abraço. Davi.

 

terça-feira, 10 de setembro de 2024

OS MISTÉRIOS. Parte III

 

Religião Afrobrasileira. Umbanda. Livro Código de Umbanda. Por Rubens Saraceni (1951-2015). OS MISTÉRIOS. Parte III. Os Orixás são mistérios de Deus e nunca os conheceremos em sua totalidade. Mas os estudos dos mistérios vão nos mostrando onde e como eles atuam. Muitos se tem escrito acerca dos mistérios de “Elêusis” dos mistérios “Egípcios”, dos “mistérios da Tábua de Esmeraldo” etc. Mas a nenhum estudioso ocorreu que os Orixás são todos esses mistérios naturais, ocultados por rituais religiosos, normalmente fechados aos não iniciados. As castas religiosas guardavam a sete chaves os modos de ativar estes mistérios ou suas chaves rituais. Assim conservavam em suas mãos o poder e controlavam a mente e os corações dos seus fiéis. Toda uma pompa religiosa ocultava das massas a forma simples de se entrar em contato com as divindades. Os fiéis só obtinham os favores delas caso se curvassem diante dos mystas, dos magos, dos hierofantes e dos sacerdotes de então. E hoje, apesar de toda a evolução espiritual e de todo o progresso material, ainda assistimos a ostentação ridícula de alguns sacerdotes dos Orixás, que se paramentam espalhafatosamente. Denotando uma superioridade sem substância alguma e que não resiste a um exame acurado de sua capacidade intelectual ou de seus supostos dons ou pendores naturais. Mas, com relação a religião e comportamento humano, nada de novo surgiu na face da terra desde o desaparecimento dos antigos mystas, magos e hierofantes. Assim aqueles que aprendem um pouco mais a respeito dos mistérios, logo se cobrem de forma a impressionar as massas de fiéis. Achando-se superiores aos comuns mortais. Mas a verdade é que os tão procurados mistérios de Elêusis, da Tábua de esmeralda e o dos Egípcios estão ocultos por trás dos nomes simbólicos usados pelos espíritos guias de Umbanda. Sendo conservados em suas essências pelos Orixás. São as mesmas divindades invocadas pelos mystas, pelos magos, pelos hierofantes, pelos cabalistas, só que com outros nomes. Dado que, eles falavam em outras línguas e os mostravam com outras aparências em razão de outras culturas e etnias os humanizarem para serem mais bem cultuados ... e ocultados. Simples, não? Muito simples sim, senhor. Afinal, seria um contrassenso Deus criar a todo instante uma divindade e um novo mistério só para atender às nossas necessidades imediatistas acerca do mundo sobrenatural. A verdade é que as divindades maiores ou planetárias são só umas poucas e sempre foram as mesmas. Todavia possuem inúmeras hierarquias e recorrem a elas quando precisam atender a um povo ou mesmo, a um numeroso grupo de espíritos afins e igualmente no nível evolutivo. Aí, a hierarquia intermediária escolhida acerca-se de espíritos intermediários afins. Coma as necessidades dos espíritos confiados a ela, e abre ao plano material o seu mistério intermediário. O qual atrairá todos os espíritos afins nos dois planos da vida. Assim, surge na fase da terra uma nova religião ou uma seita dissidente de uma religião já existente e muito antiga. Afinal Deus cria a todo instante novas divindades e novos mistérios só para nossa satisfação pessoal. Mas Ele, em sua infinita bondade, renova antigas divindades e antigos mistérios, adaptando-os as nossas necessidades atuais. Assim, nunca nos deixa desamparados em nossa contínua renovação íntima, que acontece toda vez que reencarnamos. Atentem para isso e entenderão que os antigos mistérios, famosos, mas desconhecidos de todos, na verdade, estão renovados, e dentro do Ritual de Umbanda Sagrada. Eles não são outros senão os nossos sagrados Orixás, tão cantados, mas pouco conhecidos. Porque ninguém e nenhum dos seus estudiosos se dispôs a analisá-los segundo o modelo preconizado pela doutrina de Umbanda Sagrada. Que, inicialmente, estudo o humano por meio do divino e vice-versa. Só assim, cruzando os mistérios humanos com os divinos, descobrimos que macro e micro se correlacionam e que realmente fomos feitos à imagem e semelhança de Deus! Tentar estudar os mistérios por intermédio das lendas é uma tarefa árdua e, às vezes, Inócua. Mas estudá-los a partir das qualidades divinas dos Orixás e das qualidades “humanas” dos espíritos. Aí sim, sempre chegamos a bom termo pois descobrimos que a pedra que forma o ápice de uma pirâmide e as que formam sua base são feitas da mesma substância. Então, se quisermos saber da consciência da pedra localizada no ápice inalcançável, o melhor meio é estudarmos a pedra da base, que está ao nosso alcance e sustenta toda a construção erigida sobre ela. Uma das dificuldades de se estudar uma divindade ou um mistério reside na facilidade com que ambos se adaptam a todos os povos e níveis evolutivos. Assim, o mito hebraico do dilúvio, que já é uma “versão”, sendo que ocorreu muito antes do surgimento dos hebreus, foi adaptado posteriormente aos povos vizinhos sob a forma mítica. Por isso, nem sempre uma lenda reflete as reais qualidades, atributos e atribuições de um Orixá, ainda que as verdadeiras sejam identificadas no micro, ou nos espíritos – seus manifestadores humanos – regidos por eles. E todos os estudos acerca dos Orixás têm se fundamentado em alguns poucos estudos antropológicos. Realizados desde o final do século XIX (1801-1900), e em deficientes estudos da cabala, que se entrecruzaram de forma aleatória ou incorreta. Dando à Umbanda prática uma aparência não muito afim com os mistérios ocultados pelos nomes simbólicos reveladores das divindades manifestadoras deles. Classificações espúrias das hierarquias surgiram e tornaram mais difícil a compreensão do Ritual de Umbanda Sagrada. Simbólico por sua natureza iniciática e sagrado por ser manifestador dos mistérios divinos trazidos ao nível vibratório e consciencial por meio dos médiuns de Umbanda. Abraço. Davi

domingo, 8 de setembro de 2024

INTRODUÇÃO

 

Cristianismo. Livro Catecismo da Igreja Católica. Constituição Apostólica ”Fidei Depositum”. Para a publicação do Catecismo da Igreja Católica redigido depois do Concilio Vaticano II (1962-1965). João Paulo II (1920-2005), Bispo Servo dos Servos de Deus Para Perpétua Memória. Aos veneráveis irmãos, cardeais, arcebispos, bispos, presbíteros, diáconos e restantes membros do povo de Deus. INTRODUÇÃO. 1. Guardar o depósito da fé. É a missão que o Senhor confiou à sua Igreja e que ela cumpre em todos os tempos. O Concílio Ecumênico Vaticano II, aberto há trinta anos por meu predecessor João XXIII (1881-1963), de feliz memória, tinha como intenção e como finalidade pôr em evidência a missão apostólica e pastoral da Igreja e, fazendo resplandecer a verdade do Evangelho, levar todos os homens a procurar e acolher o amor de Cristo, que excede toda a ciência (cf. Efésios 3,19). Ao Concílio, o Papa João XXIII tinha confiado como tarefa principal guardar e apresentar melhor o precioso depósito da doutrina cristã, para o tomar mais acessível aos fiéis de Cristo e a todos os homens de boa vontade. Portanto, o Concílio não devia, em primeiro lugar, condenar os erros da época, mas sobretudo empenhar-se por mostrar serenamente a força e a beleza da doutrina da fé. "Iluminada pela luz deste Concílio dizia o Papa a Igreja ... crescerá em riquezas espirituais...e, recebendo a força de novas energias, olhar intrépida para o futuro... E nosso dever ... dedicar-nos, com vontade pronta e sem temor, àquele trabalho que o nosso tempo exige, prosseguindo assim o caminho que a Igreja percorre há vinte séculos."' Com a ajuda de Deus, os Padres conciliares puderam elaborar, em quatro anos de trabalho, um conjunto considerável de exposições doutrinais e de diretrizes pastorais oferecidas a toda a Igreja. Pastores e fiéis encontram ali orientações para aquela "renovação de pensamentos, de atividades, de costumes e de força moral, de alegria e de esperança, que foi o objetivo do Concílio" Depois de sua conclusão, o Concílio não deixou de inspirar a vida da Igreja. Em 1985 pude afirmar: "Para mim que tive a graça especial de nele participar e colaborar ativamente em seu desenvolvimento o Vaticano II foi sempre, e é de modo particular nestes anos de meu Pontificado, o constante ponto de referência de toda a minha ação pastoral, no consciente empenho de traduzir suas diretrizes em aplicação concreta e fiel, no âmbito de cada Igreja e da Igreja inteira. E preciso incessantemente recomeçar daquela fonte". Neste espírito, em 25 de janeiro de 1985, convoquei uma Assembleia Extraordinária do Sínodo dos Bispos, por ocasião do vigésimo aniversário do encerramento do Concílio. A finalidade dessa Assembleia era celebrar as graças e os frutos espirituais do Concílio Vaticano II (1962-1965), aprofundar seu ensinamento para aderir melhor a ele e promover seu conhecimento e sua aplicação. Nessa ocasião, os Padres sinodais manifestaram o desejo "de que seja composto um Catecismo ou compêndio de toda a doutrina católica, tanto em matéria de fé como de moral, para que seja como um texto de referência para os catecismos ou compêndios que venham a ser preparados nas diversas regiões. A apresentação da doutrina deve ser bíblica e litúrgica, oferecendo ao mesmo tempo uma doutrina sã e adaptada à vida atual dos cristãos". Depois do encerramento do Sínodo, fiz meu este desejo, considerando que ele "corresponde à verdadeira necessidade da Igreja universal e das Igrejas particulares". Como não havemos de agradecer de todo o coração ao Senhor, neste dia em que podemos oferecer a toda a Igreja, com o título de Catecismo da Igreja Católica, este "texto de referência" para uma catequese renovada nas fontes vivas da fé? Depois da renovação da Liturgia e da nova codificação do Direito Canônico da Igreja Latina e dos cânones das Igrejas Orientais Católicas, este Catecismo trará um contributo muito importante àquela obra de renovação da vida eclesial inteira, querida e iniciada pelo Concílio Vaticano II. 2. Itinerário e Espírito da redação do texto. O Catecismo da Igreja Católica é fruto de uma vastíssima colaboração: foi elaborado em seis anos de intenso trabalho, conduzido num espírito de atenta abertura e com apaixonado ardor. Em 1986, confiei a uma Comissão de doze Cardeais e Bispos, presidida pelo senhor Cardeal Joseph Ratzinger (1927-2022), o encargo de preparar um projeto para o Catecismo requerido pelos Padres do Sínodo. Uma Comissão de redação, composta por sete Bispos diocesanos, peritos em teologia e em catequese, coadjuvou a Comissão em seu trabalho. A Comissão, encarregada de dar as diretrizes e de vigiar o desenvolvimento dos trabalhos, seguiu atentamente todas as etapas da redação das nove sucessivas composições. A Comissão de redação, por seu lado, assumiu a responsabilidade de escrever o texto e inserir nele as modificações pedidas pela Comissão e de examinar as observações de numerosos teólogos, exegetas e catequistas, e sobretudo dos Bispos do mundo inteiro, a fim de melhorar o texto. A Comissão foi sede de intercâmbios frutuosos e enriquecedores para assegurar a unidade e a homogeneidade do texto. O projeto tornou-se objeto de vasta consulta de todos os Bispos católicos, de suas Conferências Episcopais ou de seus Sínodos, dos Institutos de teologia e de catequética. Em seu conjunto, ele teve um acolhimento amplamente favorável da parte do Episcopado. E justo afirmar que este Catecismo é fruto de uma colaboração de todo o Episcopado da Igreja Católica, o qual acolheu com generosidade meu convite a assumir a própria parte de responsabilidade numa iniciativa que diz respeito, intimamente, à vida eclesial. Tal resposta suscita em mim um profundo sentimento de alegria, porque o concurso de tantas vozes exprime verdadeiramente aquela a que se pode chamar a "sinfonia" da fé. A realização deste Catecismo reflete, deste modo, a natureza colegial do Episcopado: testemunha a catolicidade da Igreja. 3. Distribuição da matéria. Um catecismo deve apresentar, com fidelidade e de modo orgânico, o ensinamento da Sagrada Escritura, da Tradição viva na Igreja e do Magistério autêntico, bem como a herança espiritual dos Padres, dos Santos e das Santas da Igreja, para permitir conhecer melhor o mistério cristão e reavivar a fé do povo de Deus. Deve ter em conta as explicitações da doutrina que, no decurso dos tempos, o Espírito Santo sugeriu à Igreja. E necessário que ajude a iluminar, com a luz da fé, as novas situações e os problemas que ainda não tinham surgido no passado. O Catecismo incluirá, portanto, coisas novas e velhas (cf. Mateus 13,52), porque a fé é sempre a mesma e simultaneamente é fonte de luzes sempre novas. Para responder a esta dupla exigência, o Catecismo da Igreja Católica por um lado retoma a "antiga" ordem, a tradicional, já seguida pelo Catecismo de São Pio V (1504-1572), articulando o conteúdo em quatro partes: o Credo; a sagrada Liturgia, com os sacramentos em primeiro plano; o agir cristão, exposto a partir dos mandamentos; e, por fim, a oração cristã. Mas, ao mesmo tempo, o conteúdo é com frequência expresso de modo "novo", para responder às interrogações de nossa época. As quatro partes estão ligadas entre si: o mistério cristão é o objeto da fé (primeira parte); é celebrado e comunicado nos atos litúrgicos (segunda parte); está presente para iluminar e amparar os filhos de Deus em seu agir (terceira parte); fundamenta nossa oração, cuja expressão privilegiada é o "Pai-Nosso", e constitui o objeto de nossa súplica, de nosso louvor e de nossa intercessão (quarta parte). A Liturgia é ela própria oração; a confissão da fé encontra seu justo lugar na celebração do culto. A graça, fruto dos sacramentos, é a condição insubstituível do agir cristão, tal como a participação na liturgia da Igreja requer a fé. Se a fé não se desenvolve nas obras, está morta (cf. Tiago 2,14-16) e não pode dar frutos de vida eterna. Lendo o Catecismo da Igreja Católica, pode-se captar a maravilhosa unidade do mistério de Deus, de seu desígnio de salvação, bem como a centralidade de Jesus Cristo, o Filho Unigénito de Deus, enviado pelo Pai, feito homem no seio da Santíssima Virgem Maria por obra do Espírito Santo, para ser nosso Salvador. Morto e ressuscitado, ele está sempre presente em sua Igreja, particularmente nos sacramentos; ele é a fonte da fé, o modelo do agir cristão e o Mestre de nossa oração. 4. Valor doutrinal do texto. O Catecismo da Igreja Católica, que aprovei no passado dia 25 de o Junho e cuja publicação hoje ordeno em virtude da autoridade apostólica, é uma exposição da fé da Igreja e da doutrina católica, testemunhadas ou iluminadas pela Sagrada Escritura, pela Tradição apostólica e pelo Magistério da Igreja. Vejo-o como um instrumento válido e legítimo a serviço da comunhão eclesial e como uma norma segura para o ensino da fé. Sirva ele para a renovação, à qual o Espírito Santo chama incessantemente a Igreja de Deus, Corpo de Cristo, peregrina rumo à luz sem sombras do Reino! A aprovação e a publicação do Catecismo da Igreja Católica constituem um serviço que o Sucessor de Pedro quer prestar à Santa Igreja Católica, a todas as Igrejas particulares em paz e em comunhão com a Sé a Apostólica de Roma: o serviço de sustentar e confirmar a fé de todos os, discípulos do Senhor Jesus (cf. Lucas 22,32), como também de reforçar os laços da unidade na mesma fé apostólica. Peço, portanto, aos Pastores da Igreja e aos fiéis que acolham este Catecismo em espírito de comunhão e que o usem assiduamente ao cumprir sua missão de anunciar a fé e de convocar para a vida evangélica. Este Catecismo lhes é dado a fim de que sirva de texto de referência, seguro e autêntico, para o ensino da doutrina católica e, de modo muito particular, para a elaboração dos catecismos locais. É oferecido a todos os fiéis que desejam aprofundar o conhecimento das riquezas inexauríveis da salvação (cf. João 8,32). Pretende dar um apoio aos esforços ecuménicos animados pelo santo desejo da unidade de todos os cristãos, mostrando com exatidão o conteúdo e a harmoniosa coerência da fé católica. O Catecismo da Igreja Católica, por fim, é oferecido a todo o homem que nos pergunte a razão de nossa esperança (cf. l Pedro 3,15) e queira conhecer aquilo em que a Igreja Católica crê. Este Catecismo não se destina a substituir os Catecismos locais devidamente aprovados pelas autoridades eclesiásticas, os Bispos diocesanos e as Conferências Episcopais, sobretudo se receberam a aprovação da Sé Apostólica. Destina-se a encorajar e ajudar a redacção de novos catecismos locais, que tenham em conta as diversas situações e culturas,  as que conservem cuidadosamente a unidade da fé e a fidelidade à doutrina católica. 5. Conclusão. No final deste documento que apresenta o Catecismo da Igreja Católica, peço à Santíssima Virgem Maria, Mãe do Verbo Encarnado e Mãe da Igreja, que ampare com sua poderosa intercessão o empenho catequético da Igreja inteira em todos os níveis, nestes tempos em que ela é chamada a um novo esforço de evangelização. Possa a luz da verdadeira fé libertar a humanidade da ignorância e da escravidão do pecado, para conduzi-la à única liberdade digna deste nome (cf. João 8,32): a da vida em Jesus Cristo sob a guia do Espírito Santo, na terra e no Reino dos Céus, na plenitude da bem-aventurança da visão de Deus face a face (cf. 1 Coríntios 13,12; 2 Coríntios 5,6-8)! Dado no dia 11 de Outubro de 1992, trigésimo aniversário da abertura do Concílio Ecuménico Vaticano II, décimo quarto ano de meu pontificado. Joannes Paulus II (1920-2005). Abraço. Davi

sexta-feira, 6 de setembro de 2024

A RELIGIÃO DO ISLAM - PARTE III

 

Islamismo. Livro Manual para o Novo Muçulmano. Por Jamaal Zarabozo. A RELIGIÃO DO ISLAM. PARTE III. ”Dize: Se verdadeiramente amais a Deus, segui-me; Deus vos amará e perdoará as vossas faltas, porque Deus é Indulgente, Misericordiosíssimo.” (3:31). O Qur’an diz, sobre o Profeta: “Realmente, tendes no Mensageiro de Deus um excelente exemplo para aqueles que esperam contemplar Deus, deparar-se com o Dia do Juízo Final, e invocam Deus frequentemente.” (33:21). De certa forma o Profeta foi um “Qur’an vivo”. Quando perguntaram a Aisha, a esposa do Profeta, como era o caráter e comportamento de seu marido, ela respondeu: “Seu caráter era o Qur’an.” (Muslim). A relação entre o Qur’an e a Sunnah é muito importante. A Sunnah demonstra como se implementar o Qur’an. É uma explicação prática do que o Qur’an ensina. Define a moral, o comportamento e as leis do Qur’an de tal maneira que se torna claro seu significado. Está completa representação humana dos ensinamentos do Qur’an é uma grande bênção para todos os muçulmanos. Indica que a orientação de Deus é completa e acessível a todos. Assim, o Qur’an e a Sunnah formam uma unidade que oferece todos os princípios retos que a humanidade necessitará até o Dia do juízo Final. Desde então, o Qur’an é um livro que pode ser compilado em umas duzentas páginas. A Sunnah, ao contrário, é bastante diferente, já que cobre todas as ações e ditos do Profeta (que a paz e as bênçãos de Allah estejam com ele). A Sunnah está compilada no que conhecemos como literatura do Hadith. Um hadith é um relato sobre o que o Profeta (que a paz e as bênçãos de Allah estejam com ele) fez ou disse. Os sábios muçulmanos reconheceram que a religião de Allah deve ser conservada adequadamente. Também reconheceram que nem tudo que é atribuído ao Profeta (que a paz e as bênçãos de Allah estejam com ele) está correto, já que até as pessoas honestas podem cometer erros. Dessa maneira, estudaram meticulosamente os diversos ahaadith e ditos atribuídos ao Profeta (que a paz e as 26 bênçãos de Allah estejam com ele), separando os que poderiam ser autenticados dos que não poderiam. Na Lei Islâmica nem toda hadith é considerado palavra autorizada. Só se consideram como autoridade aqueles que cumprem com os requisitos estritos da autenticidade. Os estudiosos chamam a estes ahaadith, hadith sahih (autêntico) ou hasan (bom). Os ahaadith inaceitáveis são classificados como daif (fraco), ou muito fraco ou falso. Apesar de estarem disponíveis os textos em árabe originais do Qur’an e os ditos do profeta, devemos recorrer a modestas traduções para levar, aos que não falam árabe, o seu significado. Com respeito ao Qur’an, pode-se recomendar dua traduções, em particular, no idioma espanhol. Elas são El Sagrado Qur’an: Traducción de su contenido al idioma español e El Corán, traduzido pelo Shaikh Isa García. Recomendasse esses dois títulos já que suas traduções se baseiam na compreensão do Qur’an que remonta à época do Profeta e seus companheiros mais próximos. Para apreciar a profundidade do Qur’an, há que se ler também um comentário do Livro. Lamentavelmente, não são muitos os bons comentários disponíveis em espanhol – entretanto, há um gama deles em muitos outros idiomas. Uma obra muito importante disponível em espanhol são os dez volumes do Tafsir Ibn Kathir (resumido). Trata-se da tradução de um compêndio de uma obra clássica de comentários corânicos escrita por Ibn Kathir (1301-1372 AD). Em seu estudo de comentários corânicos, Muhammad Hussein al Dhahabi afirma que este comentário é um dos melhores em sua categoria. Nesta obra, Ibn Kathir segue os princípios do comentário corânico tal como foi estabelecido por seu mestre, o reconhecido Ibn Taymiya. Talvez o único contra desta obra é que se trata de uma tradução de um livro clássico e, portanto, não foi escrito em um estilo cômodo de ler para muitas pessoas da atualidade. Quanto às coleções de hadith, ditos e ações do Profeta (que a paz e as bênçãos de Allah estejam com ele), existem duas importantes em espanhol. São conhecidas como sahih al Bukhari e sahih Muslim. Como disse anteriormente, a Lei Islâmica deve ser suficientemente flexível para satisfazer as necessidades de todos os povos até o dia do Juízo Final. Assim, nem todos os detalhes da lei foram escritos no Qur’an e na Sunnah. Allah deixou alguns temas para que os muçulmanos descubram por si mesmos, obrigando-os, assim, a aprender e estudar o Qur’an e a Sunnah detalhadamente. As conclusões derivadas do Qur’an e da Sunnah, e que não estejam explicitamente escritas nestes livros, são conhecidas como “analogia, racionalização pessoal”, ou ijtihad (o que implica um esforço extremo para chegar a uma conclusão). Obviamente, esta fonte de jurisprudência não é infalível. De fato, é possível que os sábios cheguem a diferentes conclusões – ainda que a verdade ante Allah seja única. O trabalho de cada sábio, caso seja sincero, será admirado por Allah, como diz no hadith: “Se um juiz se esforça e chega a uma conclusão correta, receberá duas recompensas. Se se esforça e chega a uma conclusão equivocada, receberá somente uma recompensa.” (Bukhari e Muslim). Sem dúvidas, isso não significa que suas conclusões são a autoridade máxima. Os juízos pessoais devem ser avaliados à luz do Qur’an e da Sunnah e deve-se apegar a tudo o que pareça ser mais correto segundo o Qur’an e a Sunnah. É importante para o muçulmano recordar sempre que seu principal objetivo é chegar à verdade, o que equivale àquele que é consistente com o Qur’an e a Sunnah. Ocorreu um desenvolvimento histórico em que alguns estudiosos específicos trabalharam arduamente para codificar as leis do Qur’an e da Sunnah, estendendo aquelas leis através do razoamento pessoal, pois algumas situações não estavam explicitamente acobertadas nos ditos textos. O trabalho desses estudiosos continuou até que se desenvolveram as escolas de legislação baseadas em seus ensinamentos. Entretanto essas diferentes escolas de legislação não são fontes da lei islâmica, nem devemos considerá-las infalíveis, absolutamente. É importante que cada novo muçulmano esteja familiarizado com elas, pois é provável que aqui façamos referência a elas, com certa freqüência. São quatro as mais dominantes dessas escolas de jurisprudência, batizadas em honra aos seus fundadores da seguinte maneira. Abu Hanifah (80-150) e a escola Hanifa: Abu Hanifah foi um dos primeiros estudiosos e vivia no Iraque. Hoje em dia, sua escola é a mais predominante na Turquia, Paquistão, Índia, Afeganistão, nos ex estados soviéticos muçulmanos e partes do Oriente Médio, Maalik Ibn Anas (95-179 H) e a escola Maliki: Maalis Ibn Anas viveu em Medina, a cidade do Profeta (que a paz e as bênçãos de Allah estejam com ele), toda sua vida. Na atualidade, sua escola é a mais popular no norte da África e África subsaariana. Durante séculos foi a escola predominante de Andaluz, ou a Espanha muçulmana. . Muhammad Ibn Idris ash Shafi’i (150-204 H) e a escola Shafi’i: Ash Shafi’i veio da tribo. . Quraish, a mesma tribo do Profeta (que a paz e as bênçãos de Allah estejam com ele). Estudou e viveu em diversos lugares, até instalar-se, definitivamente, no Egito. Hoje, sua escola é a maior influência na Malásia, Indonésia e algumas partes do Oriente Médio. . Ahmad Ibn Hanbal (164-241 H) e a escola Hanbali: Ahmad Ibn Hanbal viveu em Bagdá e era conhecido por ser um grande estudioso do hadith. Atualmente, sua escola é predominante na Arábia Saudita e outras partes da Península Arábica. Estes grandes sábios, igualmente aos outros, em algumas ocasiões chegaram a diferentes conclusões. É importante entender que existem muitas causas para as diferenças de opinião entre os juristas. Também há alguns pontos importantes a se levar em conta no que diz respeito a tais diferenças de opinião entre os sábios. É provável que nos deparemos com tais situações dentro do Islam. Em primeiro lugar, como foi dito anteriormente, o principal objetivo dos muçulmanos é “a verdade”. Portanto, o muçulmano deve se esforçar para descobrir a verdade e segui-la, em quaisquer circunstâncias. A maneira que chegou a revelação proporciona à pessoa a capacidade de adorar a Allah buscando a verdade, através de uma análise da revelação, tal como está no Qur’an e nos ahaadith. Também põe o homem à prova, verificando se segue a verdade e fazendo-o analisar seu comportamento. Em segundo lugar, essas diferenças de interpretação estão destinadas a continuar. Uma pessoa pode buscar com sinceridade agradar a Allah, mas chega a uma conclusão que a outro parece falha ou inaceitável. Contanto que a opinião de uma pessoa não contradiga claramente o Qur’an e a Sunnah e tenha certa base através de uma prova aceitável, a pessoa deve ser respeitada. De fato, a pessoa que se equivoca será recompensada por Allah por seu esforço, caso tenha sido feito com sinceridade, como é dito no hadith citado acima. Dessa maneira, alguém pode não estar de acordo com sua opinião e até sentir necessidade de refutá-la, ditas diferenças de opinião não devem jamais prejudicar as raízes da irmandade do Islam e entrar nos corações dos muçulmanos, destruindo-os dessa forma. Por último, é importante destacar que o Qur’an, a Sunnah e o razoamento pessoal não são simplesmente as fontes do que normalmente se considera como “lei” na atualidade. Há também muitos outros aspectos, como a moral, ética e comportamento que devem estar sujeitos a essas mesmas fontes. Em outras palavras, estas fontes são, na realidade, as fontes da lei, mas também são a orientação das ações que um muçulmano realiza em cada aspecto de sua vida. Por exemplo, como se comportar com os pais, vizinhos e outras pessoas está descrito no Qur’an e na Sunnah, como abordaremos mais adiante, ainda que a lei tradicional de hoje não se preocupe com tais temas. Portanto, quando os sábios muçulmanos falam das fontes da “lei” no Islam, na realidade, referem-se às fontes da orientação completa para o comportamento humano em todos os aspectos da vida. Abraço. Davi

quarta-feira, 4 de setembro de 2024

JESUS. PARTE III

 

Judaísmo. Livro Judaísmo e Cristianismo – As Diferenças. Por Trude Weiss (1908-1989). Capítulo 8. JESUS. Parte III. Que essas passagens dos quatro Evangelho representam o ipissimus spiritus – o próprio espírito – de Jesus é amplamente atestada pelos registros de algumas curas miraculosas nos outros Evangelhos. Portanto, por exemplo, quando o leproso pediu a ele: “Se você escolhe, senhor, podes me curar”. Jesus respondeu; “Eu sim escolho, Esteja curado”. Mateus 8,1-3. Marcos 1,40. Lucas 5,12 e seguintes. Neste caso, como em outros casos de milagres, Jesus representa quem promove a cura, ressuscita os mortos ou opera milagres. A Bíblia Hebraica também registra milagres operados pelos profetas, mas nenhum deles alguma vez operou um milagre por conta própria ou fez crer que fosse produto de sua própria força ou poder. Os profetas hebreus invariavelmente deixavam claro que eram meros instrumentos de Deus na realização do milagre e que o crédito disso devia ser atribuído a Deus, e não a eles. Assim, quando o Faraó elogiou José por sua habilidade de interpretar sonhos, ele respondeu: “Não está em mim, Deus dará ao Faraó uma resposta de paz” Gênesis 41,16. Todos os milagres operados por Moisés foram executados por ordem divina e quando certa vez se desviou das instruções divinas e golpeou a rocha, em vez de simplesmente falar com ela, ele foi considerado culpado e severamente punido. De acordo com a crença  judaica, o ser humano é simplesmente um instrumento de Deus no desempenho de milagres e portanto não é livre para se afastar sequer um “pingo no i” dos comandos e instruções divinas. Quando Elias fez a vasilha de farinha e a jarra de óleo da viúva durar por todo o período da seca. Ele deixou bem claro que não havia sido ele quem fizera o milagre. “Pois assim fala o Senhor, Deus de Israel: a vasilha de farinha não se esvaziará e a jarra de azeite não acabará, até o dia em que o Senhor enviar a chuva sobre a face da terra” I Reis 17,14. E quando Elias ressuscitou o filho da viúva, ele não transmitiu a impressão que havia operado aquele milagre, como Jesus procedeu numa circunstância similar, ver Mateus 9,23-26. Contudo “Estendeu-se três vezes sobre o menino e invocou o Senhor: “Senhor meu Deus, eu te peço, faze voltar a ele a alma deste menino. O Senhor atendeu a súplica de Elias e a alma do menino voltou a ele e ele reviveu” I Reis 17,21 e seguinte. De modo semelhante, lemos na história de Eliseu que, quando ele ressuscitou o filho de Sunamita, “ele orou a Deus” e a criança foi reavivada em resposta à sua prece, II Reis 4,33. Deus é então entronizado como o ressuscitador dos mortos. O profeta é meramente seu instrumento. Os Evangelhos registram que Jesus certa vez transformou cinco filões de pão e dois peixes em alimento suficiente para cinco mil pessoas. Com o restante, encheu doze cestas Lucas 9,13-17. Comparar com João 6,10-13. Ao operar este milagre, Jesus não fez referência a Deus, apresentando-o como prova de seus próprios poderes. É instrutivo comparar a história de Jesus alimentando as multidões com um relato semelhante da Bíblia Hebraica. Certa vez, Elizeu se confrontou com a necessidade de alimentar uma centena de pessoas com vinte pães de cevada e trigo novo em espigas. Quando seu servo se desesperou em suas tentativas, Eliseu disse: “Ofereça ao povo para que coma, pois assim falou o Senhor: Comerão e ainda sobrará. Serviu-lhes, eles comeram e ainda sobrou, segundo a palavra do Senhor” II Reis 4,42-44. Eliseu creditou a Deus este milagre, enquanto Jesus, numa situação idêntica, operou este milagre de sua própria autoria sem qualquer apelo a Deus e sem aludir a ele o crédito pelo feito. Jesus operou milagres para fazer o povo acreditar nele. Os profetas hebreus operaram milagres para fortalecer a fé em Deus. Quando Moises desejou curar Miriam de lepra, ele “orou a Deus, dizendo: “Cure-a agora. Ó Deus, eu lhe imploro” Números 12,13. E quando Eliseu curou o general arameu Naama de lepra, ele deixou tão inequivocamente claro que Deus o havia curado que Naama fez um voto: “não oferecerá holocausto nem sacrifício a outros deuses, mas só a Deus” II Reis 5,17. O operar milagres, os profetas de Israel invariavelmente deixavam claro que não eram eles que produziam os resultados desejados. Mas Deus, que os empregava como instrumentos de sua vontade. Por isso, os judeus contemporâneos de Jesus, impregnados pela tradição de sua fé, ficaram repugnados, em vez de atraídos ou convencidos, pelos milagres que ele, Jesus, operava por sua conta. A antiga crença cristã em Jesus foi quase integralmente justificada pelos milagres que ele operava. Nos últimos séculos Também, o cristianismo baseou suas reivindicações de possuir a verdade nas maravilhas e sinais realizados por Jesus e pelos apóstolos. E mesmo hoje em dia, a Igreja ainda reconhece os milagres como a prova da verdade. De acordo com a crença judaica, por outro lado, os milagres não provam qualquer coisa. Mestres judeus, através dos tempos, enfatizaram que a verdade não pode ser estabelecida por mágica ou feitiçaria. Para o judeu, os milagres são no máximo uma afirmação adicional da verdade. Porém ele se recusa a aceitá-los como único critério da retidão de um ensinamento ou crença. Na carreira dos profetas hebreus, os milagres desempenharam um papel insignificante. Os profetas se voltavam aos milagres somente em situações extremas. Mesmo então, não para provar a verdade, contudo para imprimir sua validade sobre certos tipos de pessoas. É característico da avaliação que o povo judeu faz a respeito do valor dos milagres que o Pentateuco relaciona. Que algumas das pragas que Moisés fez cair sobre o Egito também foram produzidas pelos mágicos do Faraó: “Os magos do Egito, porém, com suas ciências ocultas, fizeram o mesmo” Êxodo 7,27. Então os mágicos transformaram água em sangue e fizeram os sapos virem à terra do Egito. O judaísmo, por esse motivo, rejeita o milagre como prova conclusiva para estabelecer a verdade. Entretanto sempre haverá perigo latente de magia e bruxaria darem a sua contribuição. Assim, também os ensinamentos de Jesus não se enquadram nos padrões proféticos. Apesar de ter repetido várias das máximas e lições éticas dos profetas. Sua rejeição arbitrária de pontos importantes da lei judaica o colocara na classe daqueles que “acrescentam ou diminuem algo da torá”. Um importante lapso do ponto de vista judaico tradicional. Abraço. Davi.

segunda-feira, 2 de setembro de 2024

A RELAÇÃO CONJUGAL E A CONSCIÊNCIA DE KRISHNA

 

Hare Krishna. A RELAÇÃO CONJUGAL E A CONSCIÊNCIA DE KRISHNA. Palestra de A. C. Bhaktivedanta Swami Prabhupada (1896 – 1977) proferida na cidade de Montreal – Canadá, em julho de 1968. Pela ocasião do casamento de Paramananda Dasa e Satyabhama Devi Dasa. O amor conjugal existe primeiro na pessoa suprema.  Govinda [Krishna] não é impessoal. E é distintamente declarado na Brahman-Samhita 5.31, alola-chandraka-lasad-vanamalya-vamshi: “O Senhor é decorado por guirlanda de flores, e Ele tem uma flauta em Suas mãos”. Diz também, pranaya-keli-kala-vilasam: “E Ele está ocupado no amor conjugal transcendente, Radha e Krishna”. Assim, este amor que está na nossa experiência dentro deste mundo material, homem e mulher, não é artificial, pois existe em Deus também. O Vedanta-sutra, no começo, diz: “Quem é o Brahman, a Pessoa Suprema ou a Verdade Absoluta?”. Há este questionamento, athato brahma jijnasa: “O que é essa Verdade Absoluta?”. A resposta é janmady asya yatah: “A Verdade Absoluta é aquilo a partir de quem tudo emana”. Uma definição muito simples. É o manancial de tudo, a fonte de tudo. Portanto, aqui neste mundo material, vemos que a atração mútua entre homem e mulher é muito proeminente. Isso não se dá apenas na sociedade, mas também na sociedade animal, entre macho e fêmea. Por quê? A resposta está no Vedanta-sutrajanmady asya yatah, isto é, porque existe na Verdade Absoluta. Sem estar presente na Verdade Absoluta, como pode se manifestar na verdade relativa? Este mundo é chamado de “mundo relativo”. Ele não é Absoluto. Não podemos compreender um homem sem conhecer uma mulher. Não podemos compreender pai sem compreender um filho ou uma mãe. Isso é relatividade. De acordo com o sistema védico, todos têm que seguir o Vedanta-sutra. Há duas seções de filósofos aprovados na Índia. Não me refiro a filósofo manufaturado, especuladores mentais, mas àqueles que são considerados de valor. São eles os filósofos impersonalistas e os personalistas. Nós vaishnavas aceitamos a Verdade Absoluta em pessoa, e os filósofos mayavadis dizem que a Verdade Absoluta é impessoal. Essa é a diferença. Excetuando isso, o processo deles é quase o mesmo. Agora, o argumento do vaishnavismo é: como a Verdade Absoluta pode ser impessoal, já que aqui neste mundo, na nossa experiência, vemos que tudo é pessoal? Então, a não ser que a personalidade, a individualidade ou a atração individual estejam presentes na Verdade Absoluta, como podem ser representadas aqui, na verdade relativa? Transformando luxúria em amor. Então, fora esse ponto de vista argumentativo, a nossa apresentação é que este amor conjugal entre homem e mulher não é artificial, senão que é bastante natural por existir na Verdade Absoluta, como encontramos na descrição védica, de que a Verdade Absoluta, a Personalidade de Deus, está ocupada em casos amorosos conjugais, Radha-Krishna. Contudo, o mesmo tópico amoroso de Radha-Krishna permeia a matéria. Trata-se de reflexo pervertido. Aqui neste mundo material, o assim chamado amor não é amor de verdade. É luxúria. Aqui, o masculino e o feminino não se atraem por amor, mas por luxúria. Assim, nesta sociedade da consciência de Krishna, porque estamos tentando nos aproximar da Verdade Absoluta, a propensão à luxúria tem que ser convertida em amor puro. Eis a proposta. Então, ainda na Índia, entre os seguidores estritos dos princípios védicos, esse assunto da luxúria é ajustado espiritualmente. Como isso é feito? Os rapazes e as moças não são autorizados a se misturarem livremente antes do casamento. Um de nossos alunos daqui foi à Índia e tentou falar com uma moça jovem na rua, e ele foi insultado. Ele ficou surpreso, mas está em vigor a prática de que nenhum rapaz jovem e nenhuma moça jovem devem falar entre si. É claro que agora está diferente. Mas mesmo até a nossa juventude, vimos que, sem serem casados, nenhuma moça e nenhum rapaz podiam se misturar. Essa questão da atração luxuriosa, então, era um pouco controlada. Os pais da moça e os pais do rapaz selecionavam com quem se casariam, e essa seleção era feita muito cientificamente, pegando o horóscopo da moça e do rapaz e calculando: “Como este rapaz e está moça se combinarão? O quanto a vida deles será feliz?”. Muitíssimas coisas eram consideradas, e, quando tudo estava estabelecido, o casamento ocorria. Esse é o sistema da antiga Índia, o princípio védico. No que diz respeito ao amor livre, até onde entendemos, isso era permitido apenas nos círculos muito elevados da ordem principesca. Porque as moças eram instruídas e crescidas, dava-se a elas a oportunidade de selecionar seu esposo, mas não diretamente. Encontramos muitíssimas evidências históricas a partir da literatura védica de que a moça costumava expressar seu desejo: “Quero me casar com aquele rapaz”, e o pai apresentava um desafio, um jogo. Se alguém comparecesse e saísse vitorioso, a moça era oferecida. Isso era em casos especiais. Isso acontecia entre os kshatriyas, a ordem principesca, e não com outros. De qualquer forma, nesta era, o casamento, de acordo com os nossos princípios vaishnavas, é permitido porque existe masculino e existe feminino. Por que não deveriam se unir? Mas não o devem fazer ilegalmente. Quando vim a este país, em Nova Iorque – Estados Unidos, alguns dos rapazes e das moças que estavam comparecendo ao nosso programa se ofereceram a mim como discípulos. Então, vi que a maioria dos rapazes e das moças estava ficando juntos como namorados. Diante disso, disse-lhes que, se queriam progredir na vida espiritual, tinham que se abster de quatro tipos de atividades pecaminosas, e esses quatro tipos de atividades pecaminosas são: a vida sexual ilícita, a dieta não vegetariana, a intoxicação e os jogos de azar. A não ser que o indivíduo esteja livre dessas quatro atividades, não será capaz de progredir na vida espiritual. Uma vez que Deus é puro, pavitram paramam bhavan, nenhuma alma impura pode aproximar-se dele. Este corpo é o sinal da impureza, porque a alma não tem corpo material. Então, qualquer um que tem este corpo material deve ser considerado pecaminoso. Todavia, como sair disso? É preciso aderir à vida espiritual. É como o leite: se você ingere muito leite, haverá desordem nos intestinos, e você terá que defecar muitas vezes. Contudo, quando você busca um médico aiurvédico por estar sofrendo de diarreia ou intestino solto, o médico prescreve coalho ou iogurte com algum medicamento. Assim, o homem que tem a doença decorrente de beber leite também é curado por beber a mesma preparação láctea sob a direção do médico. O paciente não pode questionar o médico dizendo: “Eu fiquei doente por beber leite, e você está prescrevendo outra preparação de leite?”. Sim, porque está tratado. Similarmente, esta propensão à luxúria entre homem e mulher, se ela é apropriadamente tratada, pode se tornar amor a Deus. Casais regulados e filhos conscientes de Deus são benéficos a sociedade. Eu sou um sannyasi. Eu renunciei minha vida familiar. Embora eu tenha meus filhos e meus netos, e minha esposa ainda esteja viva, me separei deles. Isso se chama sannyasa. Por que estou me interessando novamente na vida familiar de meus alunos? Porque quero vê-los progredir apropriadamente em direção à vida espiritual. Então, embora não seja o afazer de um sannyasi participar de cerimônias de casamento; neste país, apenas para salvar meus alunos, tanto os rapazes quanto as moças, das atividades pecaminosas, estou pessoalmente me interessando em torná-los bons cavalheiros e boas damas através do casamento. Estou muito feliz com estes rapazes e estas moças que concordaram em se casar, e eles estão se sentindo muito felizes. Muitos deles estão presentes neste encontro. A partir do semblante e das atividades deles, parece que estão muito felizes. Assim, nesta Sociedade para a Consciência de Krishna, temos este programa de que, se algum rapaz ou alguma moça quer se casar, eu ajudo. Esta cerimônia matrimonial é feita hoje neste princípio. Os presentes noivo e noiva devem saber com toda certeza que este casamento não se destina à gratificação sensorial, mas, sim, à purificação da vida. Assim, não há questão de divórcio. Não há questão de separação. Então, não entrem na vida marital se vocês têm essa propensão. O nosso primeiro princípio é nos tornarmos conscientes de Krishna. As outras coisas são secundárias. Putrarthe kriyate bharya. Se vocês podem produzir bons filhos, filhos conscientes de KRISHNA, isso será o maior serviço à sociedade humana. Porque a sociedade humana está produzindo filhos como gatos e cães, toda a sociedade humana está transtornada. Como vocês podem esperar paz e prosperidade na sociedade de gatos e cães? Portanto, há necessidade de que se produzam filhos na consciência de Krishna, para treiná-los desde o começo. Todos vocês ficarão contentes em saber que alguns de nossos estudantes, garotos muito pequenos de San Francisco, estão sendo treinados e estão fazendo maravilhoso progresso. Não apenas aqui, mas em toda parte do mundo, o sistema educacional não é muito satisfatório. Desde o começo da vida, são autorizados a se misturar livremente, e eles são autorizados a desfrutar da vida sexual irrestrita. Isso não é bom nem para a sua saúde nem para a educação. Estamos obtendo agora o resultado da educação: comunistas e hippies. Então, aqueles que são guardiões da sociedade devem observar isso seriamente e tornar a vida muito regulada. Visto que temos este corpo material, precisamos comer, dormir, nos defender e casar – essas são as demandas deste corpo. Porém, elas têm que ser muito reguladas na consciência de Krishna, de modo que não sejam um elemento perturbador. Devemos progrediremos mais e mais rumo à realização espiritual da consciência de Krishna. A meta da vida marital é produzir bons filhos – filhos conscientes de Krishna. Este é o melhor serviço à sociedade humana: produzir bons filhos. Não produzam gatos e cães. Este é o meu pedido. Do contrário, não tenham filhos. Permaneçam separados. Separado não significa que há divórcio, mas não produzam filhos. Este é o meu pedido. Pita na sa syaj janani sa syat. O Srimad-Bhagavatam diz: “O indivíduo não deve se tornar pai, não deve se tornar mãe, a não ser que seja capaz de proteger os filhos do iminente perigo da morte”. A que isso se refere? Ao ciclo de nascimentos e mortes. Se vocês podem treinar seus filhos para a consciência de Krishna, os filhos de vocês voltarão ao Supremo nesta vida. Essa deve ser a meta. Da mesma forma que vocês tentarão voltar ao Supremo nesta vida, vocês devem cuidar de seus filhos de maneira que eles também possam, nesta vida, voltar ao Supremo. O dever da mãe e do pai deve ser: “Esta criança nasceu do meu ventre, mas esta sua vida deve ser a última – basta de corpos materiais”. Essa deve ser a responsabilidade do pai e da mãe. Essa é a direção dada pelo Srimad-Bhagavatam. Então, meus queridos filhos, rapazes e moças, peço a vocês que vivam felizes. Não há restrição alguma. Não restringimos os atos de comer, dormir, acasalar ou defender-se. Mas façam isso em relação a Krishna, tendo uma vida pura, e sejam felizes nesta vida e na próxima. Muito obrigado. www.voltaosupremo.com.br. Abraço. Davi.