Islamismo. Livro Jesus um
Profeta do Islã. Por Muhammad Ata Ur Rahim. Capítulo VIII. O CRISTIANISMO DE
HOJE. Parte II. Os primeiros seguidores de Jesus, que eram casados, devem ter
seguido as regras de comportamento ensinadas por Moisés. Hoje, o seu exemplo já
não é emulado. A destruição das estruturas familiares, que, atualmente,
verifica-se no Ocidente, demonstra a ausência de um guia de conduta efetivo no
seio do casamento cristão, que indique como um homem deve se comportar com uma
mulher e vice-versa. Extrair um princípio moral dos Evangelhos e tentar viver
de acordo com ele, não é o mesmo que se comportar de uma dada maneira por se
saber que Jesus agiu dessa mesma forma, nessa situação — um é fruto do
conhecimento dedutivo e o outro resulta do conhecimento revelado. Não há
referências à forma como Jesus andava, sentava, como se mantinha limpo, como ia
se deitar, como acordava, como cumprimentava as pessoas, como se comportava com
os mais velhos, com os mais novos, com as mulheres idosas, com as mulheres
jovens, com estranhos, com convidados e com os seus inimigos, como fazia as
suas compras no mercado, como viajava e o que lhe era ou não permitido fazer.
Os documentos relativos à mensagem de Jesus, tal como lhe foi revelada por
Deus, são incompletos e imprecisos. As doutrinas em que o Cristianismo
atualmente se baseia não se encontram nesses documentos. Além disso, não
obstante, o fato de os documentos, sobre o modo como Jesus agia, serem quase
inexistentes e o pouco que se conhece ser virtualmente ignorado, a Igreja
sempre reclamou o título de intérprete e guardiã da mensagem de Jesus, mesmo
não tendo sido institucionalizada por ele. Ora, Jesus não estabeleceu qualquer
hierarquia aos padres, no sentido de servirem de mediadores entre Deus e o
homem e, apesar disso, a Igreja de Paulo sempre ensinou aos Cristãos a crerem
que a sua salvação estava assegurada desde que agissem e tivessem fé no que a
Igreja lhes dizia. Mas onde foi a Igreja buscar a autoridade? Essa autoridade,
reclamada nas suas formas mais extremas, pode ser encontrada na doutrina papal
da Igreja Católica Romana, que o Cardeal Carmel Heenan (1905-1975) resumiu nas
seguintes palavras: «O segredo da maravilhosa unidade da nossa Igreja está na
promessa de Cristo de que a Igreja nunca deixará de ensinar a verdade. Assim,
sabemos o que a Igreja ensina, aceitamos, pois sabemos que é necessariamente
verdade... Todos os padres católicos ensinam a mesma doutrina porque todos
obedecem ao vigário de Cristo. A palavra "vigário" significa "alguém
que toma o lugar de outrem". Portanto, o Papa é o vigário de Cristo porque
toma o seu lugar como chefe da Igreja na terra. A Igreja permanece única porque
todos os seus membros acreditam na mesma fé e acreditam nela porque a Igreja
não pode ensinar nada que seja falso. É isso que queremos dizer ao afirmar que
a Igreja é infalível. Cristo prometeu guiar a sua Igreja e uma das formas que
escolheu para guiar a Igreja foi a de deixar o seu Vigário na terra a fim de
que falasse por ele. Por isso dizemos que o Papa é infalível, porque ele é o
chefe da Igreja infalível e Deus não permitiria que ele a conduzisse ao erro»
145 É significativo que o Cardeal Heenan fale de "Cristo", mas não
diga nada sobre Jesus, nem refira os Evangelhos para apoiar suas afirmações. Muitas
vezes se provou que este dogma é estranho, pois, se de fato todos os Papas são
infalíveis, então porque foi o Papa Honório anatematisado? Quererá a recente
Encíclica papal, que afirma que os Judeus não foram responsáveis pela suposta
crucificação de Jesus, dizer que, afinal, os papas anteriores não eram
infalíveis? Atualmente, muitos Católicos Romanos rejeitam a validade da
«promessa de Cristo de que a Igreja nunca deixará de ensinar a verdade», pois
tal não se encontra em nenhum dos Evangelhos. A grande diferença entre os
ensinamentos e a prática da Igreja preocupa o Arcebispo de Cincinato, Joseph L.
Bernadin (1928-1996). Aliás, numa entrevista na U. S. Católica, Bernadin disse
o seguinte: «São tantos os que se consideram bons Católicos, muito embora as
suas crenças e práticas pareçam estar em conflito com os ensinamentos oficiais
da Igreja, que isto é quase um novo conceito do que significa ser Católico hoje
em dia... a partir do momento em que se tornou legitimo (em 1966) comer carne à
controlo de nascimentos, deixar o episcopado e se casar ou, ainda, fazer aquilo
que apetecer». A este respeito, Greely escreve o seguinte: «A prática da
abstinência da carne às sextas-feiras, que significava emular o jejum de Jesus
e comemorar o dia em que foi crucificado, tornou-se, por fim, um mandamento da
Igreja e, durante séculos, serviu como uma espécie de distintivo dos Católicos
Romanos». Dóris Grumbach (1918-2022) escreveu na sua Crítica: “O Vaticano II
(Concilio do Vaticano, de 1962), deixou-me estupefato pois trouxe a possibilidade
de dar mais do que uma resposta a um mundo mal definido, que assenta nas
consciências e nos comportamentos individuais. Mas tal como noutras áreas da
experiência humana, por regra, assim que se abre uma fresta tudo passa a ser
posto em dúvida. Dessa forma, nada permanece constante ou absoluto e, para mim,
a Igreja se tornou uma questão discutível Ainda sigo os Evangelhos, Cristo e
alguns dos seus seguidores, mas a instituição deixou de me parecer importante.
Já não vivo nela».146 O fato de a Igreja se ter investido de autoridade, tal
como a ideia de sua total infalibilidade, ainda permanecem, tendo-se enraizado
até nas Igrejas que rejeitam a autoridade do Papa. Nos dias de hoje, contudo,
começa-se a duvidar e a rejeitar a validade desta doutrina numa escala nunca
conhecida. De acordo com as palavras de George Harrison: «Quando se é novo,
nossos pais nos levam à Igreja e a escola empurra-nos a uma religião.
Obviamente, ambos tentam introduzir algo em nossa mente, porque, caso
contrário, ninguém iria à Igreja, nem ninguém acreditaria em Deus. Mas porquê?
Porque não interpretaram a Bíblia como deviam. Eu não acreditei verdadeiramente
em Deus como me tinham ensinado, pois era exatamente igual a algo saído dum
conto de ficção cientifica. Apenas, ensinam-nos a ter fé, sem termos que nos
preocupar com isso e tendo apenas que acreditar no que nos dizem». Entre os
dois polos, uma aceitação ou uma rejeição completa da segurança da Igreja
oficial como guardiã da mensagem de Jesus, há toda uma vasta gama de opiniões
acerca do que pode ser um cristão. Sobre isso, Wilfred Cantwell Smith
(1916-2000) escreve o seguinte: «Atualmente, há tanta diversidade, tantas
divergências e tanto caos no seio da Igreja Cristã, que o velho ideal de uma
verdade cristã unificada e sistemática, desapareceu e o movimento ecumênico
surgiu demasiado tarde. O que aconteceu foi que o mundo Cristão deslizou para
uma situação de grande variedade e de inúmeras alternativas opcionais. Deixou
de ser possível ouvir, ou sequer imaginar que alguém lhe possa dizer qual o
significado formal e genérico de ser cristão. Cada um terá que decidir por si e
só por si». Essa conclusão pressupõe que existem, atualmente, tantas versões do
Cristianismo como existem cristãos e que o papel que a Igreja outrora desempenhou,
de instituição guardiã da mensagem de Jesus, já se perdeu quase por completo.
Aliás, um estudioso diplomado pela U.C.L.A. pergunta o seguinte: «Qual é a
razão de ser da Igreja se tudo cabe sempre à minha consciência»? No entanto, a
Igreja permanece como parte integrante da atual cultura ocidental e a relação
que existe entre as duas é interessante. Na tentativa de compreender a natureza
da existência, foram escritas, no Ocidente, durante os últimos séculos,
numerosas obras literárias, que podem nos servir de catálogo acerca de todos os
ramos do pensamento, que a mente humana persegue sempre que não possui a
certeza do conhecimento revelado, segundo o qual deve viver e nortear sua vida.
Alguns escritores, tais como Pascal, compreenderam que a mente é um instrumento
limitado e que o coração é o centro do ser, aquele que contém o verdadeiro
conhecimento: «O coração tem razões que a razão desconhece... É o coração e não
a mente que tem consciência de Deus. É nisso que consiste a fé: na percepção
intuitiva de Deus através do coração e não através da razão». 150 Numa
tentativa para garantir o acesso ao coração, muitos rejeitaram o Cristianismo e
experimentaram outros caminhos: «Diz-se que a prática do misticismo conduz ao
conhecimento da "verdade" acerca do universo, uma verdade que é
inexprimível por palavras, mas que pode ser sentida. O caminho pode ser a
música, as drogas, a meditação...”.151 Estas tentativas de aproximação da
compreensão da Realidade têm sido adotadas em larga escala por muitas pessoas no
Ocidente, muitas vezes, apenas como meio de autossatisfação. A Igreja se
acomodou depressa a essas novas tendências da cultura Ocidental. Alguns padres,
numa tentativa de manter as Igrejas cheias, introduziram no ritual grupos de
música pop e equipamento musical para atraírem os jovens; concertos, exposições
e vendas de objetos variados, para os gostos mais conservadores. Os motivos
caridosos ajudam aqueles que se sentem atraídos por eles a estabelecer um
propósito. Estas tentativas de "modernizar" a Igreja e de mantê-la, a
todo custo, "atualizada", estão de acordo como as intenções da Igreja
de Paulo de fazer cedências e com a ideia de que, quando não puder transmitir a
mensagem de Jesus, deve, pelo menos, desempenhar uma "função social útil".
Esse processo de cedências, desenvolvido especialmente durante a última década,
teve como resultados uma continua absorção da Igreja pela cultura e a
reabsorção da cultura por esta mutante estrutura da Igreja. É um processo com
dois sentidos, que tem vindo a ser constantemente aperfeiçoado, desde que Paulo
e os seus seguidores o desencadearam. Muitas pessoas "voltaram ao
Cristianismo" em consequência das suas experiências com música, drogas e
meditação, tendendo, ou a rejeitar completamente as experiências anteriores e a
adotar uma forma puritana de cristianismo, ou a incorporar no seu modo de vida
novas versões dele. Todavia, estas duas tendências escondem a profecia de Jesus
que, assim, ou é exaltado como Deus, ou considerado como uma figura carismática,
que preconizou o bem, mas foi mal compreendido. A identificação da Igreja com a
cultura ocidental está claramente exposta quando observamos como as pessoas
vivem, boje em dia, pois, à exceção dos que se retiraram a mosteiros e
conventos de forma a louvarem Deus, o estilo de vida daqueles que se intitulam
cristãos aproxima-se muito do estilo de vida de todos os que se afirmam
agnósticos, humanistas ou ateus; as suas crenças podem ser diferentes, mas em
geral os comportamentos são os mesmos. As leis que existem nos países cristãos
do Ocidente, que governam o nascimento e a morte, a formação e a dissolução do
casamento, os direitos de propriedade no interior e fora do casamento ou, no
caso de divórcio ou morte, a adoção, tutela, o comércio e a indústria não se
encontram nos Evangelhos. Não são leis que tenham sido reveladas ao homem por
Deus, mas são, isso sim, fruto de um conhecimento dedutivo e foram, ou herdadas
do sistema de leis dos romanos, ou baseadas na prática corrente das pessoas
durante um longo período, ou ainda estatutos erguidos e emendados de acordo com
o método democrático que deriva dos antigos gregos. Nos tribunais de hoje, nas
discórdias entre pessoas, ninguém pode invocar os Evangelhos como uma
autoridade compulsiva e fazê-la valer. A cristandade dos nossos dias é
inseparável da cultura ocidental. A Igreja Cristã e o Estado são um só, mas os
indivíduos que trabalham no interior destas instituições não vivem como Jesus.
Hoje em dia, a completa enfermidade de que sofre a cristandade se deve, sem
dúvida, ao fato de que falta aos cristãos a ciência do comportamento social e
essa falta os empobreceu nesta vida e os deixou mal preparados para o que
acontece depois da morte. Tal como escreve Wilfred Cantwell Smith: «A afirmação
de que a cristandade é verdadeira não tem nada de significativo; a única
questão que diz respeito a Deus, a mim ou ao meu vizinho é se o meu
cristianismo é verdadeiro e o vosso também. E, no meu caso, relativamente a
essa questão, a essa verdadeira questão cósmica, a única resposta válida é um
desgostoso 'nem por isso...'». A luz de tudo isso, não é de fato uma surpresa
que, a medida que as igrejas de todo mundo se esvazia, as Mesquitas do
Islamismo se encham. Abraço. Davi