quinta-feira, 13 de junho de 2024

A DOUTRINA DA REENCARNAÇÃO NO CRISTIANISMO PRIMITIVO. Parte I

 

Teosofia. Editor do Mosaico. A DOUTRINA DA REENCARNAÇÃO NO CRISTIANISMO PRIMITIVO. Parte I. Esse texto é fruto de considerações que fiz assistindo a uma palestra na Sociedade Teosófica aqui em Brasília - Brasil. Você já pensou por que foi nascer no país em que atualmente mora? Por que constituiu a família que tem hoje ou que vive nela agora?  Em São João 9: 1-3 lemos "E passando Jesus viu um cego de nascença. E os seus discípulos lhe perguntaram, dizendo: Rabi, quem pecou, este eu seus pais para que nascesse cego? Jesus respondeu: nem ele pecou nem seus pais, mas foi assim para que se manifestem nele as obras de Deus". Essa escritura bíblica é para introduzirmos alguns pressupostos da reencarnação, pois a primeira parte dele traz uma indicação de que o homem nasceu cego devido a uma anterior situação que não fora resolvida em sua encarnação passada. Se pensarmos logicamente perceberemos que não há injustiça em Deus, sendo ele justíssimo, por que a cegueira do homem? não tem sentido imaginar, que foi para que ele não visse o quanto o mundo é injusto, e muitas pessoas são egoístas havendo mais sofrimento que conforto. É razoável que exista coerência no sofrimento, pois do contrário perde-se o significado da vida e o porquê estamos vivendo nesse mundo. Sem respostas racionais ficamos presos aos conceitos dogmáticos e superstições dos céus e inferno eterno, pouco, para certezas quanto ao sentido da vida. Não vejo razão para duvidar da existência de Deus, pois o mundo não existe por acaso, e indubitavelmente uma inteligência superior anterior a tudo fê-lo surgir controlando e mantendo esse processo evolutivo cósmico. Quando observamos particularmente as pessoas, reconhecemos que para algumas as coisas são mais fáceis e para outras são difíceis, sendo isso uma evidência de que há um destino (determinismo) expresso por leis de fatos e causas, onde os primeiros resultam no segundo e nas mesmas condições à recíproca é verdadeira. Mas também o livre arbítrio – liberdade humana – é um ingrediente importante nesse sistema de desenvolvimento da vida e essa premissa foi postulada por Charles Darwin (1809-1882) "A evolução é o plano que particulariza a vida". Orígenes (182-254) de Alexandria considerado um dos Pais da Igreja defendeu em suas apologias a ideia da reencarnação. Ele se reunia com uma comunidade de cristãos primitivos tendo uma vida casta e piedosa, rigorosamente na observância dos preceitos de santidade e pureza. Sua erudição e inteligência acima do normal, o levou a escrever uma gigantesca obra que segundo fontes fidedignas incluíam mais de 3 mil volumes de próprio punho. Trocou correspondências com Clemente de Alexandria (150-215), Hipólito de Roma (199-217) e Irineu de Lyon (130-202) falando sobre o tema da transmigração da alma, reencarnação e a apocatástase. Orígenes conceituava a apocatástase - doutrina que representa a redenção e salvação final de todos os seres, inclusive os que habitam o inferno. Dedutivamente esse lugar para Orígenes não é eterno, mas transitório e temporário, sendo um evento posterior ao próprio Apocalipse. A apocatástase sintetizaria o poder do Logos ou Verbo Encarnado, ou seja, o próprio Cristo como poder redentor e salvador que não conheceria limite algum. Essa proposta levanta uma série de questões interessantes para o cristianismo. (1). Leva a supor que não há um único mundo criado, o que principia no Gênesis e finda no Apocalipse, como sugerido pelas Sagradas Escrituras. Ao contrário, em sua atividade criadora, Deus cria infinitamente uma sucessão de mundos visíveis e invisíveis, que só se esgotaria na apocatástase, quando todos os seres repousassem definitivamente em Deus. (2). Nesse contexto os demônios e o diabo caso aceitassem o seu próprio processo de expiação evolutiva, poderiam ser salvos em sucessivas encarnações nos mundos superiores invisíveis retornando a sua verdadeira origem que é Deus. (3). Orígenes com essa hipótese sugere que seja estabelecido uma distinção entre o Logos ou o Verbo e sua diferenciação como Cristo. Uma vez que Cristo é uma encarnação histórica neste mundo em particular, estaria aberta a possibilidade de outra encarnação futura do Logos ou Verbo. Suponho compatível com os textos sagrados cristãos, que falam de uma volta do Logos ou Verbo, contudo, permitem questionar a divindade de Cristo, dogma comum “absoluta verdade” no catolicismo e protestantismo. (4). Séculos após a morte de Orígenes também chamado de O Cristão, no segundo Concílio de Constantinopla no ano de 553, como veremos abaixo, os aspectos de sua doutrina que permitiriam subordinar a figura de Cristo ao Logos e ao Pai, sendo assim humano e não Deus. Rompendo também com o dogma da Santíssima Trindade, foram considerados errôneos nesse conclave de cardeais e arcebispo. Isso se deu sem nenhum procedimento teológico que mensurasse tão importante questão, fundamentando as possíveis contradições na tradição ou exegese bíblica. Segundo a verossimilhança de alguns estudiosos sobre esse tema da apocatástase, ela foi temerariamente combatida sem argumentos razoáveis que pudessem condená-la como “heresia”. Desde então o cristianismo se refere ao Apocalipse e não a apocatástase, mas até 553 os cristãos consideravam a salvação de todos os seres no juízo final como a infinita misericórdia e graça do Eterno Deus. As cartas trocadas por Orígenes com Clemente, Hipólito e Irineu, as originais, estão guardadas em alguns museus da Europa, segundo pesquisadores e investigadores da história da Igreja. Essas cartas são um capítulo à parte que envolvem a política dos interesses pessoais e eclesiásticos da Igreja Católica. Que manipulando-as impediu o ensino sobre a reencarnação nas comunidades primitivas e dioceses nos anos posteriores ao Concílio que aludimos. Pois segundo consta os originais que falam sobre esse assunto foram alterados por um certo padre chamado Rufino de Aquiléia (344-410); fato determinante no Concílio de Constantinopla II como uma suposta contraprova da autenticidade dos escritos de Orígenes sobre esse tema. A doutrina da reencarnação foi adotada como dogma pela Igreja até o século VI quando no referido Concílio em 553 a questão deveria ser revisada dando-se um parecer favorável ou desfavorável terminativo. O Imperador Romano do Oriente na época era Justiniano I (482-565) que indiretamente exercia a chefia oficial da Igreja Cristã Bizantina. O Papa Silvério I (480-557) por simpatizar com a doutrina da reencarnação, e não queremos assinar o edito para que ela fosse retirada da ortodoxia clerical foi destituído do cargo e condenado por traição, morrendo no exílio (deixado sem pão e nem água) por inanição. Justiniano I para referendar o Concílio de Constantinopla II (553) nomeou o Papa Virgílio (537-555) que desobedecendo a ordem do Imperador não compareceu à sessão do Concílio que decidiria o veto contra a doutrina da reencarnação. Assim o Papa Virgílio foi também deposto acusado de perjuro, o que jura falsamente. Exilado por 8 anos e de regresso à Roma morre ante de chegar à cidade. Assim o Colégio de Cardeais sem seu representante máximo decidira à revelia excluir dos dogmas oficiais da Igreja a doutrina da reencarnação em 5 de maio de 553. Esse é mais um triste capítulo da história do cristianismo que sob ameaças, intrigas e mortes aprovaram uma lei que convinha aos interesses pessoais de alguns Cardeais e do soberano que representava o Império Romano naqueles dias. Nada mais trivial e questionável como uma decisão desse tipo, sem critério e desprovida de uma análise séria e conscienciosa. Além do que a autoridade envolvida para referendar o edito era contra, sendo perseguido, humilhado e morto. Os interesses políticos, escusos e oportunistas foram os verdadeiros financiadores dessa fraude teológica. Mateus 5: 18 "Porque em verdade vos digo que, até que o céu e a terra passem, nem um jota ou um til jamais passará da lei, sem que tudo seja cumprido". O ensino da reencarnação que tem pressupostos bíblicos foi desde então (553) retirado da ortodoxia oficial da Igreja Cristã. Falamos agora a pouco dos originais do livro alterado por Rufino, é a famosa obra De Príncipiis de Orígenes. A obra publicada em latim com tradução para o português pela editora católica Paulus, está desconforme nos pontos que tematizam a reencarnação da obra em grego com o título Peri Arcon traduzida para o inglês. Assim a versão Inglesa do original grego é a mais indicada para leitura, pois expressa o pensamento real do filósofo cristão do século II. Evidentemente não há interesse que o público cristão em geral, leia uma literatura de um dos pais da Igreja que defenda em suas postulações a transmigração de almas. Orígenes adotou a doutrina de Platão (428-347) quanto a reencarnação, que em seu livro A República diz: "Quanto a virtude a responsabilidade é de quem escolhe, Deus está isento disso. Você é que a estima ou despreza". Desse modo virtude e vício colhem alegria ou sofrimento, segundo Platão uma lei universal imutável. Como dito nas Escrituras em Gálatas 6:8 "Tudo o que o homem semear isso também ceifará". O pagamento é proporcional a dívida. Nossas dívidas, vícios e pecados, são finitas no tempo, sendo ilógico cobrar-se juros infinitos na danação inferno eterna. O que pensar de um Pai Deus que condena seus filhos a tortura eterna, como é dito em Marcos 9:43-47 "Se tua mão te escandalizar corta-a. Melhor é para ti entrares na vida aleijado do que, tendo duas mãos, ires para o inferno, para o fogo que nunca se apaga. onde o seu bicho não morre e o fogo nunca se apaga". Não sei o que dizer de um versículo tão estranho (terrível) e incompreensível racionalmente. Nos textos da República e nos diálogos Fédon e Menon, Platão também pensou a transmigração das almas, o qual Orígenes assume em suas apologias. As almas existem antes dos corpos. Assim anjos, demônios, homens e mulheres são numa visão geral, entidades que evoluíram, de mundos ou reinos inferiores como minerais, vegetais e animais. De acordo com seus méritos e deméritos no tempo em que singularizaram seus comportamentos e atitudes nos mundos visíveis e invisíveis em que existiram. Desse modo os anjos são aqueles que praticaram mais virtudes e beatitudes, os demônios exteriorizaram mais os vícios e pecados e os homens num estágio apressado em relação aos dois grupos, expiam (redimem) seus corpos para evoluírem ou regredirem conforme as práticas realizadas pelos pensamentos, palavras e atitudes. Nessa perspectiva a humanidade está em um processo de redenção individual, em que os vários mundos possibilitarão esse ajuste ou reparação de contas a pagar e a receber. Essa era também a visão dos Estoicos (século III AC) que afirmavam que todo o universo é corpóreo e governado por um Logos Divino, noção tomada de Heráclito (535 AC 475) de Éfeso. A alma está identificada com este princípio divino como parte de um todo ao qual pertence. Este Logos ou Razão Universal ordena todas as coisas. Tudo surge de acordo com Ele, graças a Ele o mundo é um cosmo que em grego significa harmonia. Dos Estoicos é passado a ideia de que os fins têm que ser igual ao começo. Da gigantesca obra de Orígenes infelizmente apenas 3 volumes resistiram as chamas que destruíram a famosa Biblioteca de Alexandria e seu museu em (415) pulverizando o acervo inestimável de milhares de pergaminhos e papiros que compreendiam a sabedoria humana e divina disponível para todos os interessados e iniciados nos mistérios menores e nos mistérios maiores da ciência oculta. A história credita esse incêndio aos autoritarismos do imperador romano Constantino II, em comum acordo com a Igreja, que no século V em Alexandria, no Egito, havia três comunidades que disputavam a hegemonia religiosa e política da cidade: os judeus, cristãos e pagãos. Os últimos incluíam os filósofos e conhecedores do saber humano, que a iniciativa e preservação da biblioteca fora-lhes conferida. Como o culto antropomórfico – atribui características humanas a divindade destes, causando inquietação nos demais grupos, judeus e cristãos, instalou-se uma querela. Resumindo, foi resolvida arbitrariamente pela igreja, expulsando os judeus e pagãos da cidade, e não contentes apenas com esse fato. Mandaram destruir a biblioteca de Alexandria queimando seu valioso e inestimável acervo (pergaminhos e papiros) bibliográfico. Abraço. Davi

 

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