sexta-feira, 1 de agosto de 2025

TAO TE CHING - INTRODUÇÃO

Lao Tsé. Tao Te Ching – O Livro que Revela Deus. TAO TE CHING. INTRODUÇÃO. Introdução Parte I. Preliminares. Huberto Rohden (1893-1981). Os livros Máximos da Humanidade. Bhagavad Gita, de Krishna, nascido na Índia, há diversos milênios, orienta cerca de dois terços da humanidade. Tão Te Ching, de Lao Tsé, nasceu na China, há dois mil e seiscentos anos, e apresenta em 81 pequenos aforismos toda a sabedoria dos grandes mestres da humanidade. Evangelho, a mensagem viva do Cristo, orienta, há quase mais de dois mil anos, a consciência de quase toda a humanidade Ocidental. Considerei como minha missão terrestre traduzir e explicar esses três livros máximos da humanidade. Se eles fossem conhecidos e vividos, a vida terrestre do homem, em vez de ser um inferno de discórdias, seria um paraíso de harmonia e felicidade. LAO TSÉ (604 a.C.517). Lao significa idoso, maduro, sábio, correspondendo ao grego presbyteros, que significa literalmente ancião, com a conotação de maduro, espiritualmente adulto. Tsé é o sufixo de muitos nomes chineses, indicando menino, menina, jovem, adolescente. De maneira que podemos transliterar Lao Tsé por “jovem sábio”, “adolescente maduro”. Lao Tsé viveu no século VI a.C. Passou a primeira metade da sua vida, cerca de 40 anos, na corte imperial da China, trabalhando como historiador e bibliotecário. Em muitos capítulos deste livro transparece a grande familiaridade que o autor tinha com a situação política do Celeste Império Chines. Fazendo lembrar, por vezes, Shakespeare (1564-1616), cujos dramas revelam as intrigas e a corrupção das cortes europeias do seu tempo. Como o grande escritor britânico, Lao Tsé verbera o descalabro dos governos e aponta o caminho para a sua regeneração. Em outros capítulos, Lao Tsé desce as últimas profundezas metafísicas da realidade cósmica, procurando atingir a raiz do Uno para além de todas as ramificações do Verso. Nas explicações dos capítulos fizemos ver que Lao Tsé seguia o mesmo caminho da nossa “Filosofia Univérsica”, que embora nascida no Brasil em sua maneira cristalizada. Forma o background de todas as grandes filosofias da Antiguidade. Homem de meia idade, Lao Tsé abandonou a corte imperial e retirou-se, como eremita, para a floresta, onde viveu a segunda metade da sua longa vida estudando, meditando, auscultando a voz silenciosa da intuição cósmica. Deixando os seus reflexos no presente livro. Finalmente, com cerca de 80 anos, Lao Tsé cruzou a fronteira ocidental da China, desaparecendo, sem deixar vestígios da sua vida ulterior. Ao cruzar a fronteira, encontrou-se com o guarda da divisa, que lhe pediu um resumo da sua filosofia, ao que Lao Tsé entregou um pequeno manuscrito, contendo a quintessência do atual Tao Te Ching. O conteúdo deste livro, 81 poemas brevíssimos, consta de pequenos aforismos, muitas vezes em forma de paradoxos. Aliás, as grandes verdades revelam-se quase sempre em simples epigramas, lembrando os Provérbios de Salomão e as Beatitudes do Cristo. Paradoxo, do grego, ou absurdo, do latim, quer dizer “além da mente”. Ultra mental, designado uma verdade que a inteligência não pode alcançar, nem afirmar, nem negar. Por isso dizia Tertuliano (160 d.C. 240): Credo quia absurdum, eu aceito a realidade espiritual, porque ela é ultra intelectual, absurda, paradoxal. O que é intelectualmente cognoscível, como as coisas do ego empírico analítico, não é espiritual, não é absurdo. Lao Tsé, em quase meio século de silêncio e solidão, deve ter auscultado a voz do Infinito, a alma do Universo. Tentando exprimir em conceitos mentais e em palavras verbais a sua sabedoria ultra mental e ultra verbal. O leitor que não estiver afinado pela mesma onda cósmica não compreenderá o verdadeiro sentido da filosofia de Lao Tsé. Lao Tsé foi contemporâneo de outro chines, Kong Fu Tsé, latinizado de Confúcio, o qual elaborou uma filosofia moral social que não transcende o plano horizontal da vida cotidiana. Mas plasmou, como nenhuma outra pessoa, a vida do povo chines. A filosofia de Kong Fu Tsé não resistiu ao impacto do comunismo de nossos dias, sucumbindo, em parte, ao ateísmo militante e ao materialismo dialético comunismo. Lao Tse professa uma sabedoria de grande verticalidade, que nunca alcançou a popularidade da filosofia do seu colega. A filosofia de Lao Tsé se parece muito com a metafísica mística da Índia. A experiência intuitiva é jovem e bela somente no instante atômico em que nasce espontaneamente das profundezas da alma cósmica. Mais tarde, quando analisada intelectualmente, marcha e é profanada, e acaba com o fóssil inerte. Por isso, somente quem vive e vivência a silenciosa experiência de Lao Tsé pode compreender a sua sapiência cósmica. Mais importante do que qualquer ato ego consciente é a atitude cosmo consciente.  A “verdade”, dizia Mahatma Gandhi (1869-1948), “é dura como diamante, mas também é delicada como a flor de pessegueiro”. Quem apenas analisa intelectualmente os aforismos filosóficos de Lao Tsé pode sentir-se repelido por sua dureza diamantina. Porém quem sabe intuir espiritualmente a alma dessa sabedoria, esse gozará a delicadeza flórea dela. Tao Te Ching convida o leitor a ser acima de tudo, um auscultador da silenciosa alma do Universo. Sendo que os chineses não escrevem com letras como nós, mas usam ideogramas para exprimir ideias, não há uniformidade nas palavras, quando produzidas pelos nossos símbolos alfabéticos. Lao Tsé, Tao Te Ching, admitem diversas grafias, como Lau Tsi, Dau Che King etc. Tao significa o Absoluto, o Infinito, a Essência, a Suprema Realidade, a Divindade, a Inteligência Cósmica, a Vida Universal, a Consciência Invisível, o Insondável etc. Nunca representa um indivíduo, uma pessoa, como Deus nas teologias Ocidentais. Te pode ser traduzido por caminho, diretriz, revelação. Ching corresponde a livro, escrito, documento. Tao Te Ching pode ser traduzido por “Livro que leva à Divindade”. 

 

Lao Tsé. Tao Te Ching – O Livro que Revela Deus. TAO TE CHING. Introdução Parte II. Na presente tradução do texto guiamo-nos pelos tradutores alemães Rudolf Backofen e Werner Zimmermann, versão essa considerada bem próxima do original. Sendo que a escrita chinesa usa ideogramas em vez de letras, cada palavra permite vastas possibilidades de sentido e variantes. Basta lembrar que os referidos tradutores recorrem a mais de trinta palavras diferentes para exprimir o sentido do ideograma chines para Tao. Não estão interessados em reproduzir o corpo da palavra, contudo, sim a alma do texto, de acordo com o contexto. Na escrita ideográfica trata-se mais de sentir, adivinhar, farejar o sentido exato de cada símbolo, do que, propriamente, transliterar o respectivo ideograma. Por essa razão os leitores da presente versão provavelmente estranharão termos que não encontraram em outras traduções. A organicidade elástica de um ideograma Oriental permite grande número de variantes, quando expressa pela mecanicidade rígida de um vocabulário Ocidental. Aliás, o mal de quase todas as traduções que conheço, mesmo sem se tratar do Tao, nem de ideogramas, está no fato de pecarem ao tentar traduzir mecanicamente, de vocábulo para vocábulo. O corpo de um livro, em vez de interpretarem organicamente a alma do livro. O conhecido ditado italiano tradutore traditore (o tradutor é traído) é justificado no caso de se fazer uma tradução mecânica, em vez de uma tradução orgânica. Como se o pensamento fosse algo parecido com um computador material, e não uma entidade espiritual. Traduzir sem trair é obra de um verdadeiro artista. Não basta inteligir o corpo do livro, é necessário sentir também a alma. Nesta tradução de Tao Te Ching fizemos o possível para interpretar o espírito do livro, sacrificando por vezes a letra. Para compreender o TAO. Deus, Brahman, Yahveh, Tao, que é que se entende por essas palavras? Para muitos, Deus é uma espécie de ditador celeste, uma pessoa que vigia os homens de longe e registra os seus créditos e débitos. Premiando-os ou castigando-os depois da morte, mandando os bons para um céu eterno e os maus para um inferno eterno. Esse infantilismo primitivo domina as teologias cristãs de quase dois mil anos e, embora haja grandes variantes dessa concepção de Deus, no fundo é essa ideia antropomorfa – semelhança de forma humana. Entretanto, essa concepção nada tem que ver com o Tao. No seu livro Mein Wetbild, descreve Einstein (1879-1955), maravilhosamente, três tipos da concepção de Deus: 1. O conceito do Deus máquina, entre os povos mais primitivos. 2. O conceito do Deus pessoa, entre os hebreus do Antigo Testamento, em geral, e entre os cristãos de todos os tempos e países. 3. O conceito do Deus cósmico, professado por uns poucos místicos avançados, cujos representantes ultrapassam igrejas e teologia. Encontrando se esporadicamente, entre todos os povos e em todas as religiões. Einstein enumera, entre os da terceira classe, Demócrito (V a.C.), São Francisco de Assis (1182-1226), Baruch de Spinoza (1632-1677), quer dizer, um pagão, um cristão e um hebreu. Dizendo que são irmãos na fé. Lao Tsé e seu conceito de Tao poderiam ser incluídos no terceiro grupo, dos místicos cosmo sapientes. A elite espiritual dos povos Orientais e os verdadeiros místicos do Ocidente são os representantes mais avançados da cultura espiritual da humanidade. Todos eles professam a ideia do Deus cósmico. Não são politeístas, nem panteístas, nem mesmo monoteístas, são monistas cósmicos. O monoteísta conhece um só Deus pessoa, residente no céu. Os hebreus, no tempo de Moisés, nunca chegaram à ideia de um Deus único para o mundo inteiro. Admitiam um Deus único pra Israel, o Deus dos Exércitos. O monoteísmo nunca atingiu as alturas do verdadeiro monismo. Todo monoteísta é dualista, isto é, admite a existência de um Deus transcendente, de um Deus pessoa, residente em alguma região longínqua do cosmos. Com o qual o homem espera encontrar-se depois da morte. Esse conceito do encontro com Deus num tempo futuro e num espaço distante é comum a todos os monoteístas. Essa concepção monoteísta dualista de Deus contagiou, desde o princípio, o cristianismo Ocidental. O que é perfeitamente compreensível, uma vez que os primeiros discípulos de Jesus vinham do judaísmo. Até hoje o cristianismo teológico do Ocidente não se libertou totalmente dessa herança. Os místicos cristãos, adeptos do monismo cósmico, foram por isso mesmo perseguido, excomungados, ou pelo menos, considerados suspeitos de heresias. Quando uma criança pensa em termos de adulto, deixa de ser criança, e os jardins de infância a expulsam como elemento estranho. Quanto mais o homem se cosmifica ou universifica, tanto menos unilateral se torna e tanto mais onilateral é sua sabedoria.  Luz colorida no seu modo de pensar humano revela a luz incolor da sua experiência divina, origem de todas as cores. Para o monista cósmico, Deus é a Realidade Uma e Única, o grande Uno da Essência, que sempre de novo se revela pela pluralidade das existências, por meio do Verso das criaturas. As criaturas não são novas realidades, mas apenas novas manifestações da única Realidade. São o Uno da Essência Infinita que se verte (verso) ou se esparrama no Verso das existências finitas. Em face da onipresença do Infinito é evidente que todos os finitos estão presentes no Infinito e que o Infinito está presente em todos os finitos. O monismo, assim concebido, é rigorosamente lógico e revela uma acribia de precisão matemática. Toda a filosofia ou sabedoria superior culmina infalivelmente no monismo cósmico, equidistante do dualismo separatista e do panteísmo identificador. Para o monista, tudo está em Deus, e Deus está em tudo. Porém tudo não é Deus, nem Deus é tudo. As criaturas não estão separadas de Deus, nem são idênticas a Deus. Todos os verdadeiros gênios da humanidade pensavam e sentiam em termos de monismo cósmico, cujo exemplo mais brilhante é o Cristo do Evangelho. E como poderia Lato Tsé , o grande gênio da sabedoria chinesa, ter pensado e sentido de outro modo? Por meio dos 81 capítulos brevíssimos do Tao Te Ching, lança-se, como um fio de luz, a experiência do Infinito, do Absoluto, do Uno, que se manifesta através dos Finitos, dos Relativos, do Verso. A sabedoria de Lao Tsé é tipicamente univérsica: do Uno emana o Verso. O Verso está no Uno e, embora o Uno do Infinito transcenda todo o Verso dos Finitos, estes estão imanentes naquele. O Tao, em torno do qual gira este livro, pode ser considerado com a Divindade, o Absoluto, o Infinito, o Eterno, o Insondável, o Uno, o Todo, a Fonte, a Causa, a Realidade, a Alma do Universo, a Vida, a Inteligência Cósmica, a Consciência Universal etc. Enquanto o leitor não se identificar totalmente com essa consciência univérsica do monismo cósmico de Lao Tsé não compreenderá a alma do Tao te Ching. Abraço. Davi

 

quarta-feira, 30 de julho de 2025

YOM KIPUR E O PODER DO PERDÃO

Judaísmo. www.morasha.com.br. Rabino Gabriel Aboultboul. YOM KIPUR E O PODER DO PERDÃO. Yom Kipur é a oportunidade dada por D’us de virar a página de nossa vida e acreditar em nossa capacidade de melhorar. Devemos corrigir os erros, mas não nos tornarmos reféns do passado, incapazes de olhar para o futuro. Durante os dias que antecedem o Yom Kipur, o Dia da Expiação, recitamos antes das orações matinais as Selichot, os pedidos de perdão a D’us. Sempre nos referimos a essas orações no plural, Selichot, e não no singular, Selichá. Nossos Sábios explicam que isso significa que o pedido de perdão tem duas vias: não apenas pedimos perdão, mas, também, perdoamos. A quem precisamos perdoar? Às outras pessoas, a D’us e a nós mesmos. Na língua hebraica, há várias palavras que significam perdão. As preces de perdão foram chamadas de Selichot porque o valor numérico de Selach é 98, que é o número de maldições mencionadas na Torá (os cinco primeiros livros da bíblia chamada Tanake em hebraico). Isso para nos ensinar que o perdão tem o poder de transformar a maldição em bênção, neutralizando tudo o que há de negativo no mundo. Mas o que significa perdoar, de acordo com o judaísmo? O que significa perdoar?. Na Torá, há mandamentos que determinam tanto nossa relação com D’us quanto com relação a outros seres humanos. Consequentemente, há dois tipos de erros que o homem pode cometer contra: D’us e contra seus semelhantes. O que significa pedir perdão a D’us pelos erros e transgressões cometidas contra Ele? Significa reconhecer que, ao longo do ano, nem sempre cumprimos Seus mandamentos. Em Yom Kipur, D’us pode perdoar-nos apenas por esse tipo de transgressões e não pelas faltas que cometemos contra outros seres humanos. E o que implica pedir perdão a uma pessoa? Não significa apenas dizer Me perdoe, apesar disto ser um bom começo. Pedir perdão implica procurar reparar o erro. Se tivermos prejudicado alguém financeiramente, devemos devolver o que devemos ou, no mínimo, admitir a dívida. Se tivermos denegrido a imagem de alguém, devemos tomar as medidas necessárias para redimi-la. Vale ressaltar, porém, que quando ofendemos ou prejudicamos outra pessoa, é necessário um pedido de perdão duplo, tanto a ela quanto a D’us. Pois ofender, ferir ou prejudicar outra pessoa de qualquer forma é, também, uma transgressão dos mandamentos Divinos, que nos ordenam amar a todos, fazer o bem e nunca fazer mal a ninguém. Portanto, para se obter o perdão em Yom Kipur, precisamos procurar consertar nosso relacionamento tanto com D’us como com as outras pessoas. Porém, não adianta bater no peito e confessar os pecados, e esperar que D’us nos perdoe inclusive pelos erros que cometemos contra os outros. Para sermos perdoados desses erros, precisamos, antes do início de Yom Kipur, pedir desculpas àqueles que, de alguma forma, prejudicamos ou magoamos. Precisamos fazer de tudo para retificar nossos erros, tanto com atos como com palavras. A verdade é que cada um de nós precisa pedir perdão e também perdoar os outros. Assim como quem falhou com outra pessoa deve pedir perdão, cabe à pessoa que recebeu um pedido de desculpas perdoar, contanto que o pedido dela seja sincero e de fato faça o possível para corrigir o erro cometido. Acima, mencionamos que há três tipos de perdão. Devemos perdoar as outras pessoas, devemos perdoar a D’us e devemos perdoar a nós mesmos. Para muitos, é mais fácil perdoar aos outros seres humano e a D’us do que a si próprio. Muitas pessoas se condenam por suas falhas e são incapazes de se perdoar. Esta inabilidade é algo negativo, pois nossa vida fica presa ao passado. O auto perdão é uma demonstração de humildade, pois demonstra que reconhecemos que somos humanos e não infalíveis. A grandeza de Rosh Hashaná e Yom Kipur é que D’us instituiu um dia no qual temos a oportunidade de “virar a página”. Precisamos estar cientes de nossos erros, e fazer todo o possível para corrigi-los, mas não podemos permitir que eles nos definam. Não podemos nos tornar reféns dos erros do passado, incapazes de olhar para frente. Yom Kipur não é o dia em que falamos para D’us que somos “inocentes”, e sim, em que admitimos nossa culpa. Mas é, também, o dia em que expressamos o desejo de melhorar. Assumir nossos erros já é parte integrante da obtenção do perdão. Há uma enorme diferença entre o que a pessoa é, e o que ela faz. Fazer algo errado não significa ser errado. Um mau comportamento, uma má atitude não pode definir quem a pessoa é. Isso, evidentemente, não significa que nossos atos não sejam importantes e significativos. Significa que eles não podem nos definir: talvez erramos ontem, talvez erramos hoje, mas amanhã podemos agir corretamente. O fato de uma pessoa errar não significa que ela não deva ser perdoada ou que não possa modificar-se. Rabi Shneur Zalman de Liadi (1745-1812), o Alter Rebe, fundador do movimento Chabad Lubavitch, explica o significado de um verso nos Salmos que, aparentemente, não faz sentido. Está escrito que “D’us nos perdoa para que possamos temê-Lo”. À primeira vista, esse conceito parece ser ilógico: se alguém sabe que será perdoado, deveria ter menos medo de pecar. O Alter Rebe explica esse verso com uma metáfora. Suponhamos que alguém tomou um grande empréstimo no banco para investir em um negócio. Infelizmente, não teve sucesso. Se o gerente do banco for exigir a devolução do empréstimo, além do pagamento de todos os juros, ele fará com que a dívida se torne impagável. Mesmo se o devedor quisesse pagar a dívida, não conseguiria. Consequentemente, ele não fará qualquer tentativa para devolver o dinheiro que tomou emprestado. Contudo, se o gerente do banco estiver disposto a negociar, se oferecer um plano viável para o devedor pagar o que deve, haverá mais chance de o banco recuperar o empréstimo. Um fenômeno parecido ocorre no relacionamento entre o homem e D’us. Se D’us fosse excessivamente exigente, se Ele cobrasse todo pecado cometido, romperíamos a relação com Ele: passaríamos a fugir Dele, a ignorá-Lo. O Eterno, então, propõe um acordo. Ele nos perdoa e facilita o pagamento de nossa dívida com Ele, para que seja possível manter o relacionamento. Muitas pessoas acreditam que perdoar é um sinal de fraqueza. Na realidade, é exatamente o oposto. A falta de perdão é sinal de fraqueza e insegurança enquanto perdoar é um ato de coragem, de força. Perdoar não significa dar permissão para que a pessoa volte a cometer o mesmo erro. Significa ter fé que a pessoa que errou não voltará a errar no futuro. Perdoar alguém significa acreditar nela. D’us nos perdoa porque Ele acredita em nós: Ele confia que nosso futuro será melhor que nosso passado. Em muitos casos, não conseguimos compreender por que alguém deveria merecer ser perdoado: por que deveria ter uma segunda ou até uma terceira chance. Daí ocorre que D’us nos faz passar por algo parecido, nós, também, acabamos falhando, e clamamos por perdão, algo que não queríamos dar a outra pessoa. Muitas pessoas não querem perdoar os outros, mas a pergunta que se deve fazer a elas é: se fosse você que tivesse errado, você também gostaria de não ser perdoado? Nossos Livros Sagrados nos ensinam que D’us se comporta conosco da forma como nos comportamos com as outras pessoas. Se formos tolerantes com outros, Ele será tolerante conosco. Por outro lado, se formos excessivamente rigorosos com as outras pessoas, Ele será excessivamente rigoroso conosco. O Baal Shem Tov (1698-1760), fundador do Movimento Chassídico, ensinou que depois que a pessoa deixa este mundo, é ela própria que decreta seu próprio veredicto perante a Corte Celestial. Mostram a ela os atos de uma pessoa, sem revelar que se trata dela mesmo, e se lhe pergunta: Qual deve ser o veredicto?. Após a pessoa julgar o caso, é revelado a ela que se trata dela própria. Isso significa que as pessoas que estão acostumadas a julgar os outros favoravelmente acabarão julgando-se favoravelmente perante a Corte Celestial. Por outro lado, aqueles que são demasiadamente rigorosos com os outros, arriscam-se a se autocondenar. Quando alguém é rigoroso demais, esse rigor acaba se voltando contra si próprio. O que impede o ato de perdoar ou de pedir perdão? Orgulho, arrogância e medo. E esses sentimentos estão entrelaçados. Muitas pessoas não pedem perdão às outras por motivo de orgulho: Por que eu deveria pedir perdão a tal pessoa? Afinal, sou muito mais importante, mais experiente, mais inteligente, mais bem-sucedido do que ela (...). O outro motivo é o medo da resposta. Muitos temem não serem atendidos e que isso seja motivo de vergonha, ou seja, de orgulho ferido. Em Yom Kipur, pedimos perdão a D´us, mas, também, precisamos perdoar D’us. Conta-se a seguinte história sobre um grande mestre chassídico, o Rabi Elimelech de Lijensk (1717-1787). Na noite que antecede Yom Kipur, ele enviou um de seus alunos a certo botequim, para que este aprendesse o significado do perdão duplo. Ao chegar ao botequim, o aluno nota que o dono pede à sua esposa uma caderneta. Ela leva uma caderneta para o marido onde ele havia recordado, ao longo do ano, tudo que D’us fizera de errado com ele: todos os sofrimentos que ele tinha passado durante o ano. Após terminar de ler essa caderneta, ele pede à sua esposa uma outra caderneta onde ele havia escrito todos os pecados que ele fizera contra D’us, ao longo do ano. Após ler essa caderneta, o dono do botequim se dirige a D’us, diz: Le Chaim e toma uma dose de bebida. Aí, diz: D’us, você me perdoa por tudo que eu fiz de errado com o Senhor ao longo do ano e eu O perdoo por tudo de mal que o Senhor fez comigo ao longo do ano. Essa história pode fazer as pessoas sorrirem, mas é algo sério. Cada um de nós falha contra D’us ao longo da vida, mas todos nós temos, também, nossas chateações e ressentimentos em relação a Ele. Às vezes, brigamos com D’us, mesmo quando certas coisas acontecem em nossa vida que não têm nenhuma ligação com Ele. Por exemplo, brigamos com alguém na sinagoga, e deixamos de frequentá-la, ou algo não ocorre como esperávamos e deixamos de colocar Tefilin (caixinhas de couro). Em certos casos, porém, é justificado o sentimento de que D’us nos desapontou. Muitos de nós carregamos esse tipo de sentimento, principalmente, quando coisas difíceis acontecem ao longo do ano. Infelizmente, esse tipo de sentimento negativo acaba tomando conta de nosso coração. Yom Kipur é o período do ano em que devemos livrar-nos desse tipo de sentimento. Yom Kipur, e os dias que antecedem essa data, é a época do ano para abrir um espaço para D’us em nossa vida, mesmo se acharmos que Ele “não merece”: mesmo se acreditamos que Ele não foi tão bom conosco no ano que se passou. Muitas pessoas pensam, Fiz tantas coisas boas e como é possível que D’us permitiu que tal coisa ruim acontecesse comigo? Na realidade, nenhum de nós tem noção da Contabilidade Celestial e do que é, de fato, bom ou ruim para nós. De qualquer forma, vale ressaltar que mesmo esse tipo de ressentimento contra D’us é uma grande mostra de fé. Pois nós não nos zangamos com alguém em quem não acreditamos, tampouco nos chateamos com alguém de quem não esperamos nada de bom. As pessoas se chateiam com D’us porque acreditam Nele e esperam que Ele faça apenas o bem. Portanto, decepcionar-se com D’us é um sinal de grande fé, tanto na existência como na bondade infinita Dele. Mas apesar desses sentimentos serem um sinal de fé, precisamos removê-los do nosso coração, pois eles obstruem nosso caminho e nossa felicidade. Sentimentos de dor, raiva e ressentimento, mesmo que totalmente justificáveis, são um grande obstáculo para tudo de bom na vida. Sentir raiva é o mesmo que tomar um copo de veneno e desejar que outra pessoa morra. Quem se prejudica é quem sente raiva, não o objeto da raiva. Como então, lidar com a dor, principalmente quando ela é profunda? A forma de lidar com a dor é tentar enxergar as coisas de forma diferente. Yom Kipur é o dia de lembranças. Nesse dia, lembramo-nos de Amalek (o arqui inimigo histórico do Povo Judeu), do mal, do Holocausto, das perseguições, dos 10 mártires que foram assassinados por Roma. Em Yom Kipur, lembramo-nos de nossos entes queridos que não mais estão entre nós. Quando nos lembramos desses entes queridos, podemos lembrar a dor causada pela perda e pela ausência ou podemos nos lembrar dos momentos alegres com eles. Quando se recita o Hashkabah  ou Yizkorem Yom Kipur lembramos as almas que partiram deste mundo, devemos nos lembrar dos momentos preciosos que passamos com elas e do privilégio de as termos tido entre nós. O Midrash (é uma maneira de interpretar histórias bíblicas que vai além de simples destilação de ensinamento religioso, legal ou moral. Ele preenche muitas lacunas deixadas na narrativa bíblica sobre eventos e personalidades que são apenas insinuados) nos ensina o seguinte: Quando Moshé Rabenu ensinou ao Povo de Israel o verso da Torá, Lembre-se o que Amalek fez quando você saiu do Egito, o povo disse a ele: Moshé, nosso mestre. Um verso da Torá afirma, Lembre-se o que Amalek fez para ti. Outro verso diz: Lembre-se do dia do Shabat para santificá-lo. Como se cumprem ambos os versos? Um nos ordena lembrar e o outro, também. Moshé respondeu: Um copo de vinho não é o mesmo que um copo de vinagre, mas esse é um copo e aquele também é um copo. Existe a lembrança do Shabat e a lembrança de Amalek. Esse Midrash contém lições profundas. O vinagre é um derivado do vinho, mas este é doce e aquele é azedo. Ambos, o vinho e o vinagre, advêm da uva e ambos são bebidos em um copo. Na vida, temos a opção de beber um copo de vinho ou de vinagre. Tudo depende de como enxergamos as coisas, como lidamos com as lembranças. Isso é uma lição muito importante para esta e para as futuras gerações de judeus. Evidentemente, elas precisam aprender sobre a dor que nosso povo passou, as perseguições, o Holocausto. Mas também precisam aprender que o judaísmo é um copo de vinho e não de vinagre. Quando o pai traz o filho à sinagoga, deve ser não apenas em Yom Kipur, mas em Simchat Torá também, para que o filho aprenda que o judaísmo não se restringe a orações e jejuns, mas é também, um modo de vida baseado na alegria. De fato, um dos fundamentos da Torá é o mandamento de servir a D´us com alegria. Mas para poder viver com alegria, precisamos aprender a perdoar. Precisamos perdoar a D’us, as outras pessoas e a nós mesmos. Uma história verídica. Cabe relatar uma história verídica, que expressa as ideias transmitidas acima. Em certa ocasião, um judeu religioso, um rabino, estava viajando pela British Airways para Nova York. Ao lado dele, estava sentado um homem que, após o avião decolar, vira-se para ele e diz: Shalom, e revela, também, ser judeu. Ambos passam a conversar e descobrem que ambos estão a caminho de Israel. O rabino, que estava viajando para passar Rosh Hoshaná e Yom Kipur em Israel, começa a falar de religião, mas o judeu sentado ao lado dele diz: Não me fale de D’us. Tenho raiva Dele. Não posso perdoá-Lo pelo que Ele me fez. Este homem, que tinha 70 anos de idade, havia passado pelo Holocausto. Ele teve um filho, mas tinha sido separado dele durante a guerra e presumia que havia morrido. Disse ao rabino que nunca perdoaria D’us por lhe ter tirado seu filho. O rabino pergunta: Por que então você vai a Israel? E o homem responde. Não quero saber de D’us, mas o Povo Dele é ótimo. Não existe lugar no mundo como Israel. O rabino tenta convencer o homem a ir à sinagoga, em Israel, durante as Grandes Festas, diz que a sinagoga que frequenta em Israel é pequena, mas possui um ótimo chazan (cantor litúrgico treinado para recitar as orações e benção com a congregação). O homem se recusa. Dias mais tarde, o rabino está em Israel. É Yom Kipur. Após a leitura da Torá, ele sai da sinagoga, durante o curto intervalo em que é recitado o Yizkor. Ele vai a uma pracinha e nota que há alguém fumando: é o seu amigo da viagem. Ele se aproxima dele e tenta convidá-lo à sinagoga. Venha rezar um pouco, diz o rabino. Mas o homem se recusa. O rabino diz o seguinte: Pelo menos entre para recitar o Yizkor pelo seu filho. Sim, você brigou com D’us, mas por que seu filho deveria sofrer por isso? Todos serão lembrados no Yizkor, seu filho deveria ser um deles. O homem responde que por seu filho faria tudo, inclusive ir à sinagoga para o Yizkor. Era uma sinagoga pequena. E por ser pequena, havia o costume de que quem quisesse, podia ir ao chazan, dar o nome do falecido e o próprio chazan recitava o nome da pessoa cuja memória seria lembrada. Ao entrar na sinagoga, esse senhor se aproxima do chazan que lhe pergunta o nome do filho. Quando o chazan ouve o nome, ele olha para esse senhor, fica pálido e grita em iídiche: Pai! Durante muitos anos, esse senhor pensou que seu filho havia morrido no Holocausto. Na realidade, seu filho havia sobrevivido, imigrara para Israel e se tornara um judeu religioso. Ele manteve as tradições que aprendeu com o pai, a mesma pessoa que desde a guerra não queria mais se relacionar com D’us. Se o pai nunca tivesse entrado em uma sinagoga em Yom Kipur, se não tivesse dado essa brecha para D’us, ele passaria o restante da vida acreditando que seu filho havia morrido. No momento em que ele deu uma chance a D´us e entrou na sinagoga em Yom Kipur, mesmo que fosse apenas para recitar Yizkor pelo seu filho, ele reencontrou aquilo na vida de mais caro, que ele acreditava ter perdido. Essa história, além de verídica, serve também como metáfora. O pai da história é D’us e todos nós somos Seus filhos. Yom Kipur é o dia em que nos reencontramos; em que Ele e nós descobrimos que Ele não nos perdeu. Yom Kipur é o dia em que vamos à sinagoga para dizer a D’us que ainda estamos juntos e que assim continuaremos, eternamente. Mas como na história relatada acima, esse nível de ligação e conexão com D´us só é alcançado quando retiramos de nós sentimentos negativos contra Ele, contra outras pessoas e contra nós mesmos. Yom Kipur é o dia mais sagrado do ano. É o momento em que se revela a essência de nossa alma. Nesse dia, revela-se o nível de conexão essencial que existe entre nós e D’us. Nesse dia do Perdão não interessa o que fizemos, e sim, o que somos. Ao tomarmos consciência de quem somos, torna-se possível expressar a essência do nosso ser. Por que as pessoas que não vão à sinagoga o ano inteiro fazem questão de ir em Yom Kipur? Há judeus que praticamente não cumprem nenhuma mitzvá, mas jejuam em Yom Kipur. A única explicação é que em Yom Kipur, o dia mais importante do ano, revelamos quem, na verdade, somos. Nesse dia, é revelado que nossa conexão com D’us é atemporal e independente de nossas ações. Em Yom Kipur, nós nos sentimos conectados com D’us, com a comunidade judaica e também com as almas dos falecidos. É na sinagoga que recitamos o Yizkor e nos lembramos dos falecidos, porque no Mundo da Verdade, as almas desejam ser lembradas em um lugar sagrado, na sinagoga. Yom Kipur é, portanto, um dia de amor: amor a D’us e amor às outras pessoas, as que se encontram conosco e as que estão no Mundo da Verdade. Sabe-se que quando um pai deseja fazer uma festa de aniversário, ele quer que todos os seus filhos estejam presentes, independentemente de onde vivam. Se todos os filhos não puderem comparecer, o pai prefere que não haja festa. Yom Kipur é o dia em que nosso Pai deseja que todos os Seus filhos venham à sinagoga. É por esse motivo que antes de se iniciarem as orações em Yom Kipur, o chazan recita uma frase, Anu Matirim, afirmando que todos, mesmo aqueles que cometeram grandes pecados e renunciaram ao judaísmo, podem rezar juntos na sinagoga naquele dia. Pois nesse momento, o Pai convoca todos os Seus filhos. Ele não quer apenas alguns deles, os que se comportaram bem. Ele quer todos eles. Em Yom Kipur, recita-se o Avinu Malkenu, Nosso Pai, nosso Rei. O Baal Shem Tov transmitiu um ensinamento a respeito dessa prece, que nos ajuda a ter uma percepção bastante diferente a respeito do Yom Kipur. De fato, é um dia em que somos julgados. Por que, então, é um dia de tanta alegria, felicidade e união? Porque o Juiz é o nosso Pai. Diz-se que nunca se sabe o que pode sair da cabeça de um juiz, mas se o Juiz é o próprio Pai, podemos ficar tranquilos. D’us é nosso Rei, que nos julga, mas antes de ser Rei, Ele é Pai. Por esse motivo, falamos Avinu Malkenu, não Malkenu Avinu. E um pai é sempre misericordioso e bondoso com seus filhos. Yom Kipur é o Dia da Expiação, o Dia do Perdão. Pedimos perdão a D’us e perdoamos aos outros, mas só podemos perdoar a D’us quando sabemos que Ele é nosso Pai, pois quando é nosso Pai quem fala, ouvimos apenas bênçãos. www.morasha.com.br. Abraço. Davi.

domingo, 27 de julho de 2025

SETE PERGUNTAS SOBRE O ISLAM

Islamismo. luzdoislam.com.br. SETE PERGUNTAS SOBRE O ISLAM. 1. O que é o Islam? O Islam é o nome da religião, ou melhor, “um sistema de vida completo” que Deus [Allah] revelou, sendo praticado pelos Profetas e Mensageiros enviados a humanidade. O nome real da religião se destaca entre as demais religiões, pois significa um estado de ser. Não faz referência a nenhuma pessoa em particular como o Cristianismo, o Budismo ou o Zoroastrismo; ou alguma tribo como o Judaísmo, ou uma nação como o Hinduísmo. A raiz árabe da palavra Islam envolve paz, segurança, saudação, proteção, ausência de culpa, saúde, submissão, entrega, aceitação, rendição e salvação. O Islam significa especificamente um estado de livre submissão e entrega a Allah, adorando somente a Ele, aceitando e obedecendo a Sua legislação com devoção. Através desta submissão e entrega, se obtêm a paz, segurança e o bem-estar envolvidos em seu significado literal. Portanto, um muçulmano, homem ou mulher, é uma pessoa em estado de submissão e entrega voluntária. O Islam de um indivíduo se enfraquece devido do pecado, da ignorância e das más ações, sendo anulado completamente quando associa parceiros a Allah ou deixa de acreditar Nele. 2. Quem são os muçulmanos? A palavra árabe “Muslim” significa aquele que está em um estado de Islam [livre submissão e entrega voluntária a legislação de Allah]. A mensagem do Islam é universal e qualquer um que aceite se torna um muçulmano. Algumas pessoas acreditam erroneamente que o Islam é uma religião só para os árabes, mas isso está muito longe da verdade. Na verdade, mais de 80% dos muçulmanos do mundo não são árabes. Se bem que a maioria dos árabes são muçulmanos, existem árabes cristãos, judeus e ateus. Se você der uma olhada nos vários povos que vivem no mundo muçulmano - da Nigéria até Bósnia e de Marrocos até Indonésia - é muito fácil ver que os muçulmanos pertencem a diferentes raças, etnias, culturas e nacionalidades. O Islam sempre foi uma mensagem universal para todos os povos. Isto pode ser visto no fato de que alguns dos primeiros companheiros do Profeta Muhammad não serem somente árabes, se não que tinham persas, africanos, romanos e bizantinos. Ser muçulmano envolve na total aceitação e obediência aos ensinamentos e leis reveladas por Allah. O muçulmano é uma pessoa que aceita livremente a basear suas crenças, valores e fé na vontade de Deus Todo-Poderoso. No passado, mesmo não sendo muito usada hoje em dia, a palavra “maometano” serve para se referir aos muçulmanos. Esta palavra está errada, pois é um resultado da distorção deliberada ou mera ignorância. Uma das razões desse equívoco é que durante séculos os europeus têm sido ensinados que os muçulmanos adoram o Profeta “Maomé” [que também é uma palavra com sentido real destorcido de Muhammad], da mesma maneira que os cristãos adoram a Jesus. Isto é totalmente falso, pois não é considerado um muçulmano aquele que adora algo além de Deus, como por exemplo, uma divindade ou uma pessoa. 3. Quem é Allah? Muitas vezes, a palavra “Allah” é mencionada quando se fala sobre o Islam. A palavra “Allah” é simplesmente a transliteração da palavra árabe para Deus Todo-Poderoso, sendo a mesma utilizada por cristãos e judeus de língua árabe. Na verdade, a palavra “Allah” foi amplamente utilizada muito antes de haver a palavra Deus, pois o português é uma língua relativamente nova. Se alguém ler uma tradução árabe da Bíblia, notará que a palavra usada é “Allah” e no português é usado “Deus”. Por exemplo, os cristãos de língua árabe dizem que Jesus é, de acordo com suas crenças, o filho de Deus. Além disso, a palavra árabe “Allah” é semelhante à palavra Deus em outras línguas semíticas. Em hebraico, por exemplo, a palavra de Deus é “Elah”. Por várias razões, algumas pessoas acreditam que os muçulmanos adoram um Deus diferente do Deus de Moisés, Abraão e Jesus. Esse é outro equívoco conceitual pois o Monoteísmo Puro do Islam convoca a todos os povos para adorar o Deus de Noé, Abraão, Moisés, Jesus e todos os outros profetas, que a paz esteja com todos eles. 4. Quem é Muhammad? O último profeta enviado por Deus para a humanidade foi o Profeta Muhammad, que a paz e as bênçãos de Allah estejam sobre ele. Aos quarenta anos de idade, recebeu a revelação de Allah. Desde então passou o resto de sua vida explicando e vivendo os ensinamentos do Islam. O Profeta Muhammad, que a paz e as bênçãos de Allah estejam com ele, foi o maior de todos os profetas por diversas razões, principalmente porque ele foi escolhido por Allah para ser o último profeta - cuja missão de guiar a humanidade continuará a Dia do Juízo Final - e também uma misericórdia para toda a humanidade. O resultado de sua missão tem atraído mais e mais pessoas para a pura crença em um Deus Único do que qualquer outro profeta vindo anteriormente. Desde os primeiros tempos, Allah enviou profetas para a terra e cada um a seu povo em particular. No entanto, o Profeta Muhammad foi enviado como o Mensageiro final para toda a humanidade. Enquanto outras comunidades religiosas afirmam crer em um Deus Único, com o passar do tempo algumas ideais depravadas penetraram em suas práticas e crenças fazendo com que se distanciassem do monoteísmo puro e sincero transmitido pelos profetas. Algumas pessoas tomaram seus profetas e santos como intercessores junto a Deus Todo-Poderoso. Alguns ainda acreditavam que seus profetas eram manifestações de Deus, “Deus Encarnado” ou o “Filho de Deus”. Todos esses equívocos conceituais levaram a adoração de seres criados em lugar do Criador, e contribuíram com a prática da idolatria acreditando que é possível aproximar-se de Deus, o Todo-Poderoso através de intermediários. Para proteger seus seguidores dessas falsidades, o Profeta Muhammad, que a paz e as bênçãos de Allah estejam com ele, ressaltou que ele era apenas um homem com a missão de pregar e obedecer à mensagem de Allah. Ensinou os muçulmanos para se referir a ele como “o Mensageiro e Servo de Deus”. Ao longo de sua vida e seus ensinamentos, Allah fez de Muhammad, que a paz e bênçãos de Allah estejam com ele, o exemplo perfeito para toda a humanidade - foi um exemplo de um profeta, estadista, líder militar, governante, professor, vizinho, marido, pai e amigo. Ao contrário dos outros profetas e mensageiros, o Profeta Muhammad, que a paz e as bênçãos de Allah estejam com ele, viveu até a plena luz da história e todas as suas palavras e ações foram cuidadosamente registradas e preservadas. Os muçulmanos não necessitam simplesmente ter “fé” que ele existiu ou que seus ensinamentos foram preservados, senão que possuem o conhecimento através da ciência e da história que isso realmente aconteceu. Allah protegeu a mensagem revelada a Muhammad evitando assim que ela fosse distorcida, perdida ou esquecida. Isso foi necessário porque Allah prometeu que Muhammad, que a paz e as bênçãos de Allah estejam com ele, seria o último mensageiro para a humanidade. Todos os mensageiros de Allah divulgaram a mensagem do Islam - ou seja, a livre submissão e entrega as leis de Allah e a adoração a um Deus Único- porém Muhammad, que a paz e as bênçãos de Allah estejam com ele, é o último profeta que trouxe a mensagem final e completa não sendo esta alterada até o Último Dia. 5. Quais são os ensinamentos do Islam? A base da fé islâmica é a crença absoluta no monoteísmo (a Unicidade de Deus). Isto significa acreditar que existe somente um Criador e Sustentador de todo o universo, e que nada é divino ou digno de ser adoração, exceto Ele. Certamente, acreditar na Unicidade de Deus significa muito mais do que simplesmente acreditar que existe “um só Deus” em vez de dois, três ou quatro divindades. Existem muitas religiões que afirmam crer em “Deus” e a existência de um único Criador e Sustentador do universo, mas o verdadeiro monoteísmo é acreditar apenas em Uma Verdadeira Divindade que deve ser adorada de acordo com a revelação de que Ele enviou através de Seu Mensageiro. O Islam também rejeita o uso de quaisquer intermediários entre Deus e o homem, insistindo que as pessoas se aproximem diretamente a Deus e reserve para Ele todas as expressões de culto e devoção. Os muçulmanos também acreditam que Deus Todo-Poderoso é Compassivo, Misericordioso e Piedoso. Um erro muito comum é dizer que Deus não pode perdoar diretamente Suas criaturas. Ao exagerar o peso e ao castigo do pecado afirmando que Deus não pode perdoar o homem diretamente, as pessoas estão subestimando a Misericórdia de Deus. Quando estão convencidos de que eles não podem se aproximar de Deus diretamente, se voltam para falsas divindades ou ajudantes como por exemplo, heróis, líderes políticos, sábios, santos e anjos. Muitas vezes vemos pessoas que adoram, rezam ou buscam a intercessão dessas divindades falsas, as quais nem são consideradas um “deus”. Dizem que acreditam em um Único Deus Supremo, mas também rezam e adoram a outros apenas para se aproximar de Deus. No Islam, existe uma clara distinção entre o Criador e a criatura. Não há nenhum mistério ou ambiguidades a respeito da divindade: Nada que seja criado merece ser adorado, somente Allah, o Criador, é digno de ser adorado. Algumas religiões acreditam erroneamente que Deus é parte de Sua criação, e isso fez com que as pessoas acreditem que podem venerar qualquer coisa criada afim de chegar ao Criador. Os muçulmanos acreditam que Deus é Único e Exaltado estando além da compreensão de qualquer especulação, que definitivamente não tem parceiros, companheiros, amigos, adversários ou descendentes. Segundo a crença muçulmana, Allah “não gerou nem foi gerado” - nem mesmo literalmente, alegoricamente, metaforicamente, física ou metafisicamente. Ele é absolutamente Único e Eterno. Tem o controle de tudo sendo perfeitamente capaz de conceder Sua infinita Misericórdia e Seu infinito Perdão a quem Ele deseja. É por isso que Allah também é chamado de Todo-Poderoso. Compassivo, Misericordiosíssimo. Allah criou o Universo para o homem, e como tal quer o melhor para todos os seres humanos.

Os muçulmanos veem tudo no Universo como um sinal da Criação e Compaixão de Allah Todo-Poderoso. Além disso, a crença na Unicidade de Deus não é meramente um conceito metafísico. É uma crença dinâmica que afeta nossa visão da humanidade, da sociedade e todos os aspectos da vida prática. Uma consequência lógica da crença islâmica na Unicidade de Allah, é a sua crença na igualdade dos homens. 6. O que é o Alcorão? O Alcorão é a revelação definitiva de Allah para toda a humanidade, ele é a palavra de Allah, o Altíssimo, enviado através do Arcanjo Gabriel em árabe para o Profeta Muhammad, em som, palavra e significado. O Alcorão (por vezes grafado incorretamente Corão), foi passado para os companheiros do Profeta, que cuidadosamente memorizaram letra por letra e o compilaram por escrito meticulosamente. O Sagrado Alcorão foi recitado continuamente pelos companheiros do Profeta e seus sucessores até os dias de hoje. Em poucas palavras podemos dizer que o Alcorão é o livro revelado das Divinas escrituras de Allah dirigido a toda humanidade como uma orientação e salvação para os homens. Atualmente, o Alcorão é memorizado e ensinado por milhões de pessoas. A língua do Alcorão, o árabe, é uma língua viva falada por milhões de pessoas. Ao contrário das escrituras de outras religiões, o Alcorão é ainda lido na sua língua original por inúmeras pessoas. O Alcorão é um milagre vivo na língua árabe, e é conhecido por ser inigualável em seu estilo, forma, impacto espiritual, bem como o conhecimento científico único contido nele. O Alcorão foi revelado em uma série de revelações ao Profeta Muhammad em um período de 23 anos. Ao contrário de muitos outros livros religiosos, o Alcorão é a certeza de que é a Palavra exata de Allah. O Alcorão foi recitado em público na frente de comunidades muçulmanas e não-muçulmanas, durante a vida do Profeta Muhammad e também após sua morte. O Alcorão inteiro foi escrito durante a vida do Profeta e vários companheiros do Profeta memorizaram o Alcorão palavra por palavra conforme foi revelado. O Alcorão sempre esteve nas mãos da sociedade: Foi sempre ensinado como a palavra de Deus, e devido a grande quantidade de pessoas que o memorizam ao longo dos tempos, foi perfeitamente preservado. Não foi alterado ou modificado por qualquer conselho religioso. Os ensinamentos do Alcorão compreendem uma escrita universal dirigida a toda a humanidade e não a uma tribo ou “povo escolhido” em particular. Sua mensagem não é nova, mas é a mesma mensagem recebida por todos os profetas: “submeter a Allah, o Único Deus e somente Ele deve ser adorado, seguir o Mensageiro de Allah para vencer na vida e obter a salvação na outra”. Como tal, a revelação de Allah no Alcorão enfoca ensinar aos seres humanos a importância da crença na Unicidade de Allah e enquadrar as suas vidas em torno da orientação que Ele enviou, a qual é exposta na legislação Islâmica. O Alcorão contém histórias dos profetas anteriores, como Noé, Abraão, Moisés e Jesus, que a paz esteja com todos eles, e também contém mandamentos e proibições de Deus. E nos tempos modernos, onde muitas pessoas caem vítimas de dúvidas, desespero espiritual e a alienação social e política, o Alcorão fornece soluções para o vazio em nossas vidas e a turbulência que está atingindo o mundo hoje. 7. Qual é a visão dos muçulmanos sobre a natureza do homem, o propósito dessa e da outra vida? No Sagrado Alcorão, Allah ensina que os seres humanos foram criados para glorificar e adorar a Ele e que a base de toda verdadeira devoção é a consciência em Deus. Todas as criaturas de Allah o adoram naturalmente e apenas os seres humanos têm livre arbítrio para adorar a Allah ou rejeitá-Lo. É um grande desafio, mas também uma grande honra. Uma vez que os ensinamentos do Islam abrangem todos os aspectos da vida e da ética, a obediência a Deus deve ser promovida em todos os assuntos da vida. O Islam deixa claro que todos os atos do ser humano são atos de devoção se realizados apenas por Deus e segundo Suas Divinas Leis e Escrituras. Como tal, a devoção no Islam não está confinada em ritos religiosos, e por esta razão é conhecido como um “sistema de vida completo” ao invés de uma simples religião. Os ensinamentos do Islam agem como um bálsamo para a alma humana e encorajam qualidades como a humildade, sinceridade, paciência e caridade. Além disso, o Islam condena o orgulho e caráter auto virtuoso, dado que somente Allah o Todo-Poderoso é o único juiz da integridade humana. A visão islâmica da natureza humana também é realista e equilibrada no sentido de que o ser humano não é essencialmente pecaminoso, é capaz de fazer o bem e o mau por igual por sua escolha. O Islam ensina que a fé e a ação andam de mãos dadas. Deus concedeu o livre arbítrio as pessoas e de acordo com a nossa fé são as nossas ações. No entanto, dado que os humanos também foram criados fracos e caem em pecado regularmente, sempre precisam ser guiados a sempre buscar o arrependimento, que é em si uma forma de adoração amada por Allah. A natureza do ser humano tal como foi criada por Deus em Sua Majestade e Sabedoria, não é naturalmente “corrupta” ou necessita de reparação. O caminho do arrependimento está sempre aberto a todos. Deus Todo-Poderoso sabia que os seres humanos haveriam de cometer erros, então o desafio real é se eles vão buscar o arrependimento dos seus pecados e evitá-los, ou preferirem uma vida de preguiça e pecado, sabendo muito bem que isso não agrada a Deus. O verdadeiro equilíbrio de uma vida islâmica é estabelecido por um temor saudável do castigo de Allah pelos pecados e faltas cometidas, junto com uma crença sincera de que Allah, em Sua infinita Misericórdia, tem o prazer de conceder Sua recompensa pelas boas ações e atos de adoração sincero pela Sua causa. Uma vida sem temor a Allah leva ao pecado e à desobediência, enquanto ao inverso disso, se acreditarmos que pecamos tanto que não haverá nenhuma maneira de que Deus nos perdoe, só teremos uma vida de desesperança. À luz desses fatos, o Islam ensina que somente aqueles que se desviam da Misericórdia do seu Senhor e os malvados criminosos estão privados do temor de Allah, seu Criador e Juiz. O Sagrado Alcorão, revelado ao Profeta Muhammad, que a paz e as bençãos de Allah estejam com ele, também contém uma série de lições sobre a vida futura e o Dia do Juízo Final. Os muçulmanos acreditam que todos os seres humanos serão julgados por Allah, o Soberano e Absoluto Rei e Juiz, por suas crenças e ações em sua vida terrena. Ao julgar os seres humanos, Allah será Absolutamente Justo, punindo apenas os verdadeiros culpados, os criminosos rebeldes e aqueles que não se arrependem, sendo Absolutamente Misericordioso, Compassivo para com aqueles que Ele, na Sua Imensa Sabedoria considera dignos dela. Ninguém será julgado por algo que esteja além de sua capacidade ou de algo que não cometeu. Basta dizer que o Islam nos ensina que a vida é um teste criado por Allah, o Criador, Todo-poderoso e Sábio, e que todos os seres humanos terão de prestar contas a Allah pelo que fizeram em suas vidas. Uma fé sincera na vida após a morte é a chave para ter uma vida equilibrada e honesta. Caso contrário, a vida será vista como um fim em si mesma, o que fará com que os indivíduos tornam-se mais egoísta, materialista e imorais, cegos pela sua busca do prazer mesmo em detrimento da razão e da ética. Abraços. Davi

quinta-feira, 24 de julho de 2025

OS PRINCÍPIOS CONFUCIONISTAS DA IDEOLOGIA CHINESA ATUAL

Confucionismo. Texto de Jacques Gernet (1921-2018). OS PRINCÍPIOS CONFUCIONISTAS DA IDEOLOGIA CHINESA ATUAL. "Não há quase nenhum pormenor no comportamento de um bom comunista que não faça lembrar exatamente aquele de um bom neo confucionista”. Jacques Gernet (1921-2018).  Introdução. A seguir à Implantação da República Popular da China, em 1949, o Japão, um país que havia invadido recentemente o território chinês, foi o primeiro país a levantar-se para defender, mesmo contra a maior potência mundial não comunista - os Estados Unidos - que a ideologia adotada por esta era um comunismo de raízes chinesas, não se tratando de comunismo soviético puro. Tal como tem a História da China testemunhado, poucas são as culturas e estilos de vida que ao entrarem em território chinês mantêm as suas características originais inalteráveis. Este povo de civilização milenar tende a absorver os valores e formas de vida, adaptando-se imediatamente à realidade local, sinalizando-os. Como não podia deixar de ser, também a ideologia comunista, adotada pela liderança chinesa pós 1949, sofreu algumas alterações e adaptações à particular situação do país. É exemplo explícito desta adaptação a adoção de uma “economia socialista com características chinesas” (中国特色社会主义的经济), medida tomada pelo governo chinês desde o Congresso de 1987. Inserida na política de reformas e abertura levada a cabo pela liderança. E porque esta ideologia teve uma adaptação tão rápida e eficiente ao povo chinês? A verdade é que muitos dos princípios base da ideologia comunista estão em conformidade com os valores tradicionais chineses, nomeadamente os valores confucionistas, e poder-se-ia mesmo dizer que algumas medidas tomadas pelo governo chinês são confucionistas em gênese. Como tal, apesar de em tempos, o confucionismo ter sido um dos principais alvos das críticas dos ideólogos comunistas, a verdade é que estas duas formas de encarar a vida se separaram e antagonizam para encontrar finalmente um ponto de encontro comum, dinâmico e mesmo muito útil na atualidade caracterizada pela globalização económica e o espírito de modernização. Trata-se afinal da filosofia chinesa da unidade dos contrários, do yin e do yang, em que estes polos nunca estão em completa oposição, mas sim se entrecruzam e se interpenetram, sucedendo-se um ao outro. As raízes do confucionismo. Confúcio. "Mais que um homem ou que um pensador, e mesmo mais que uma escola de pensamento, Confúcio representa um verdadeiro fenómeno cultural que se confunde com o destino de toda a civilização chinesa." Anne Cheng (1955 - ) A vida. Embora o seu nascimento esteja envolto em algumas histórias fantásticas, como de resto é comum encontrar-se associado a personagens importantes da História da China, Confúcio (Kongzi, 孔子) teria vivido entre (551 AC 479) numa época conturbada, dominada pela desordem do fim da Dinastia Zhou (1100 AC 476). Então, os diversos reinos em que se encontrava dividido o território chinês rivalizavam pelo domínio, desencadeando conflitos violentos, daí que este período seja conhecido como os Reinos Combatentes (475 AC 221). Mais tarde, o lugar de domínio dentre estes seria alcançado pelo Reino Qin, que acabou por unificar todos os reinos sob a liderança do cruel Qin Shi Huangdi, fundando a conhecida Dinastia Qin (221 AC 206). Interessa aqui sublinhar que este foi um período de convulsões internas originadas pelas degradantes condições de vida e pelo poderio crescente que os príncipes vinham conquistando no interior dos seus reinos. Estas condições dinamizaram o pensamento da época, surgindo diversos pensadores que procuravam propor a melhor forma de governar. A abundância de escolas de pensamento durante este período fez com que lhe fosse atribuída a designação de “Período de Ouro da Filosofia Chinesa”, ou período das “Cem Escolas de Pensamento”. Surgiram nesta época as sementes do que haveria de se tornar nas importantes filosofias do Confucionismo, Tauísmo, Moísmo e Legismo. Com exceção desta última, nenhuma das outras ideias foi imediatamente adotada pelos imperadores. Somente sob a Dinastia Han (206 AC 220 DC), viriam o Confucionismo e o Tauísmo a atingir estádios mais adiantados de desenvolvimento teórico. Confúcio nasceu na pequena cidade de Qufu (曲阜), no Reino de Lu (鲁国), na atual Província de Shandong (山东), em agosto de 551 AC., mas pouco se sabe da sua vida. Uma das fontes a que se pode recorrer para traçar a sua biografia é o livro "Memórias Históricas" (史 记) do grande historiador que viveu no século II AC, Sima Qian (司马迁), mas ainda assim esta é uma fonte pouco segura devido à dificuldade em provar os factos descritos. Aparentemente a sua família era pobre e modesta, ainda que os seus ascendentes pertencessem à família dos Duques do Estado dos Song, a qual descendia da família real da Dinastia Zhou. Como o pai de Confúcio, que era chefe do exército, tinha já uma certa idade quando se casou pela segunda vez com a que viria a ser a sua mãe, conta a lenda que ela se dirigiu a um monte para orar, para pedir que tivesse um filho. Aí ela viu um licorne e atou-lhe uma fita bordada à volta do corno para que o seu desejo se concretizasse. Quando deu à luz à sombra de uma amoreira teria sido velada por dois dragões. Por esse motivo ou talvez porque quando Confúcio nasceu tinha uma protuberância na fronte, foi-lhe dado o nome de Qiu (丘), que significa colina. Apenas com três anos de idade, Confúcio perdeu o pai e, como a sua mãe tinha somente 18 anos, teve que se dedicar ao trabalho agrícola nas terras que tinha recebido como qualidade de viúva de funcionário público para poder dar ao filho a educação que pretendia. E parece que Confúcio correspondeu às suas expectativas pois com 15 anos já frequentava a escola dos letrados e, dois anos mais tarde, recebia lições particulares, ao mesmo tempo que se iniciava na vida militar e no cerimonial da Corte. E é o próprio Confúcio que, nos "Analectos", nos descreve com determinação a sua vida: "Aos quinze anos, resolvi aprender. Aos trinta anos, firmei-me no Caminho. Aos quarenta anos, já não tinha nenhuma dúvida. Aos cinquenta anos, conhecia os decretos do Céu. Aos sessenta anos, tinha um discernimento perfeito. Aos setenta anos, agia em toda a liberdade, sem por isso transgredir nenhuma regra." (Analectos de Confúcio II-4) 4 Aos 19 anos casou-se, do qual resultaram dois rebentos: um menino e uma menina. Continuou a conciliar o trabalho com os estudos, sendo que aos 22 anos servia como intendente dos celeiros e, mais tarde, como inspetor da distribuição das mercadorias, ao mesmo tempo que abria a sua própria escola. Quando tinha 24 anos, a sua mãe faleceu, pelo que, segundo a prescrição dos ritos, não exerceu nenhuma atividade durante os devidos três anos de luto. Contudo, a história antiga e a literatura continuaram a ocupar o seu espírito, seguindo estudando os Clássicos com afinco. Posteriormente e devido ao prestígio que começou a alcançar, o Mestre Kong Zi (孔子) foi convidado para ocupar alguns cargos de destaque na Corte. Assim, aos 30 anos, foi para a Corte de Lu, e, mais tarde, com o apoio do Duque King de Qi, entrou na Corte do Imperador Zhou, em Luoyang. Foi nesta altura que se deu o célebre encontro entre Kongzi e Laozi (604 AC.). "Conta-se que Laozi recebeu Confúcio com severidade e frieza, incentivando-o a procurar o Tao. Confúcio, por seu turno, teria ficado bem impressionado com o Velho Sábio, pois segundo o relato, referiu a seus discípulos que havia visto Laozi e lhe havia parecido um dragão, que se eleva sobre as nuvens mas que não pode ser perseguido." Devido ao período de convulsões e de conflitos entre os reinos vizinhos que caracterizaram a região entre 520 e 510 AC. Confúcio teve que mudar-se por diversas vezes, acompanhando o Duque de Lu, o qual lhe chegou a confiar o governo da cidade de Tchung-tu que se tornou modelo de prosperidade. Devido a este feito, foram-lhe atribuídos locais de destaque na administração do território, primeiro como intendente dos trabalhos públicos e, depois, como ministro da Justiça. Foi durante este período que desenvolveu máximas relativas à arte de governar, que vêm descritas no capítulo XII dos "Analectos". Com 56 anos, teve a oportunidade de pôr em prática a sua doutrina de governo, quando exerceu o cargo de primeiro-ministro de Lu. Devido a uma certa independência econômica adquirida por Confúcio e também porque a sua doutrina não correspondia às exigências do seu tempo, em 495, Confúcio resolveu ausentar-se, passando a levar uma vida errante acompanhado pelos seus discípulos. Iniciou, assim, uma série de longas viagens pelos reinos de Qi, Song e Wei, ensinando a sua doutrina pela palavra e pelo seu próprio exemplo. Ao mesmo tempo que se dedicava ao ensino, o Mestre Kong oferecia também os seus serviços aos príncipes feudais que disputavam um lugar de destaque entre os restantes reinos, em plena época de decadência da Dinastia Zhou. Durante estas viagens ocorreram diversos episódios, alguns dos quais vêm descritos nos Analectos. Após todas estas aventuras, Confúcio regressou finalmente a Lu cerca de 515 AC. Tinha alcançado um tal prestígio que, segundo alguns autores, teria conseguido reunir cerca de 3000 discípulos, entre jovens letrados vindos das melhores famílias, filhos de homens de destaque do Reino, com uma grande influência na Nação, assim como de famílias mais pobres. Contudo, unia-os o respeito ao mestre e ao seu ensinamento, sendo de destacar que Confúcio tratava-os individualmente, aconselhando-os de acordo com as suas características específicas. Confúcio ensinava-lhes poesia, história, o cerimonial da Corte e música, 70 dos quais conheciam a fundo os Cinco Clássicos. Com 72 anos faleceu no Reino de Lu, em abril de 479 AC. mas parece que a "morte do Sábio não ocorreu sem grandiosidade, e a lembrança que nos transmitiu a tradição autoriza as seguintes reflexões: a) O seu apelo ao respeito filial não foi em vão no que a si lhe calhava. Se o filho, que provavelmente morreu antes dele, parece não ter sido tocado pela graça do pai, o neto [Zi Si] esteve presente para recolher as suas últimas palavras. b) O seu pensamento tinha o vigor bastante para levá-lo a esperar com serenidade os derradeiros momentos. Nenhuma revolta diante da morte, nenhum apelo a intermediários entre o Céu e ele. Capaz de afrontar sozinho a vida, também foi capaz de afrontar sozinho a morte. c) Tendo atingido uma idade respeitável e, ao que parece, gozando sempre de boa saúde, Confúcio morreu em plena posse das suas faculdade. Pronunciando as palavras: «A minha doutrina chegou ao seu termo», dá desde logo razão àqueles seus comentadores que porão em evidência a íntima conformidade entre a vida e o ensino do Sábio, a tal ponto que é impossível interpretar a sua doutrina sem ser em função da sua vida. OS ESCRITOS. A doutrina proposta por Confúcio pode ser encontrada de forma fragmentária nos que ficaram conhecidos como os "Quatro Livros" (四书), nenhum dos quais teria sido escrito por si na sua totalidade. Os "Quatro Livros" incluem: "O Grande Aprendizado" (大学), em parte escrito por Confúcio; a "Doutrina do Meio" (中庸), escrito pelo neto de Confúcio, Zi Si; "Os Analectos" (论语), que teriam sido escritos por alguns dos seus discípulos; e o "Livro de Mêncio" (孟子), escrito pelo seu seguidor Mêncio (372 AC 289). À semelhança do filósofo grego Sócrates (470 AC 399), Confúcio pouco ou nada escreveu sobre a sua filosofia e o seu método baseava-se no diálogo, a partir do qual os seus discípulos puderam retirar ensinamentos para elaborar "Os Analectos". A relação que Confúcio estabelecia com os seus alunos era exemplar, um modelo a ser seguido. Dirigia-se com afetividade e, ao mesmo tempo, cordialidade, simplicidade e, ao mesmo tempo, a dignidade necessária ao respeito existente numa relação entre professor e alunos, tal como ele mesmo ensinava. O seu método de ensino permitia o diálogo com os alunos, em que estes podiam colocar questões ao seu Mestre e, mesmo, dar opiniões e fazer críticas. Esta abertura e o tratamento personalizado que Confúcio dava aos seus discípulos suscitava a sua admiração, que não chegaria contudo aos extremos da deificação, que se deu muito mais tarde quando o confucionismo se tornou numa religião do povo. Este relacionamento cordial que tinha com os seus alunos era também o modelo que estes deviam adotar entre si e com as outras pessoas. Trata-se do ren (仁), o não fazer aos outros o que não gostamos que nos façam a nós mesmos. Para além destas considerações sobre o relacionamento entre as pessoas, os discípulos de Confúcio consagraram nos "Analectos" alguns capítulos sobre os Sábios da Antiguidade e sobre a Missão Celeste, em que apresenta a forma de governação dos Imperadores antigos como o modelo a ser seguido pelos governadores contemporâneos. Quanto ao "Grande Aprendizado" (大学), trata-se de um tratado moral elaborado em parte pelo próprio Confúcio e que sublinha a capacidade do homem de ser responsável pela sua própria salvação. Assim, Confúcio preocupa-se com a formação de uma elite, assim como com a educação dos príncipes, com o fim último de promoção do bem das massas. E a verdade é que se o soberano for justo, conforme a ordem cósmica, logo os seus súbditos o seguirão de bom grado e isso promoverá a prosperidade do reino. Por isso, conhecer a ordem natural dos fenômenos é a base da grande sabedoria, este é o ensino supremo - Da Xue. Segundo Confúcio, cabe-lhe transmitir este conhecimento pois ele é o porta-voz da sabedoria antiga, é esta a sua vocação ética. Da autoria do neto de Confúcio Zi Si, a "Doutrina do Meio" (中庸)procura sublinhar o equilíbrio que deve existir na personalidade dos homens. Mas este equilíbrio deve ser atingido sem esforço, o que não significa que seja alcançado sem ação, como ensinam os tauístas. Na realidade, este equilíbrio deve ser procurado intensivamente, através de uma reflexão profunda e deve ser colocado em prática de uma forma séria. Zi Si, na senda de seu Mestre, não fecha as portas de entrada deste equilíbrio a nenhuma classe de pessoas, pois todos podem chegar a esta via, mas só quem a alcança poderá apreender o sentido da ordem do Céu e da Terra, o Dão (道). Assim aparece o junzi (君子), o homem de bem cuja vida é uma imagem da ordem moral universal, segundo Confúcio. É esta a norma da harmonia do Universo, ou seja, a regra central – zhong (中) - e constante – yong (庸). Finalmente, o "Livro de Mêncio" (孟子) traduz a abordagem de Mêncio ao confucionismo, inspirado também no livro de Zi Si. Trata-se de uma perspectiva que sublinha a bondade natural do homem e que será desenvolvida adiante no capítulo respeitante a Mêncio. Abraço. Davi


segunda-feira, 21 de julho de 2025

A DOUTRINA DA REENCARNAÇÃO NO CRISTIANISMO PRIMITIVO

Editor do Mosaico. A DOUTRINA DA REENCARNAÇÃO NO CRISTIANISMO PRIMITIVO. Já pensou por que você foi  nascer no Brasil? Por que constituiu a família que você tem hoje?  Em São João 9: 1-3 lemos "E passando Jesus viu um cego de nascença. E os seus discípulos lhe perguntaram, dizendo: Rabi, quem pecou, este eu seus pais para que nascesse cego? Jesus respondeu: nem ele pecou nem seus pais, mas foi assim para que se manifestem nele as obras de Deus". Esse texto é para introduzirmos alguns pressupostos da reencarnação pois a primeira parte dele traz um indicação de que o homem nasceu cego devido a uma anterior situação que não fora resolvida em sua encarnação passada. Se pensarmos logicamente perceberemos que não há injustiça em Deus, sendo ele justo, por que a cegueira do homem? não tem sentido imaginar que foi para que ele não visse o quanto o mundo é injusto e muitas pessoas são egoístas havendo mais sofrimento que conforto. É razoável que exista coerência no sofrimento pois do contrário perde-se o significado da vida e o porque estamos vivendo nesse mundo. Sem respostas racionais ficamos presos aos conceitos dogmáticos do céus e infernos eterno pouco para certezas quanto ao sentido da vida. Não vejo razão para duvidar da existência de Deus, pois o mundo não existe por acaso e indubitavelmente uma inteligência superior anterior a tudo fê-lo surgir controlando e mantendo esse processo evolutivo cósmico. Quando observamos particularmente as pessoas reconhecemos que para algumas as coisas são mais fáceis  e para outras são difíceis sendo isso uma evidencia de que há um destino (determinismo) expresso por leis de fatos e causas onde os primeiros resultam no segundo e nas mesmas condições a recíproca é verdadeira. Mas também o livre arbítrio é um ingrediente importante nesse sistema de desenvolvimento da vida e essa premissa  foi postulada  por Charles Darwin (1809-1882) "A evolução é o plano que particulariza a vida". Orígenes (182-254) de Alexandria considerado um dos Pais da Igreja defendeu em suas apologias a ideia da reencarnação. Ele se reunia com uma comunidade de cristãos primitivos tendo uma vida casta e piedosa sendo rigoroso na observância dos preceitos de santidade e pureza. Sua erudição e inteligência acima do normal o levou a escrever uma gigantesca obra que segundo fonte fidedignas incluíam mais de 3 mil volumes de próprio punho. Trocou correspondências com Clemente de Alexandria (150-215), Hipólito de Roma (199-217) e Irineu de Lyon (130-202) falando sobre o tema da transmigração das almas, reencarnação e a apocatástase. Apocatástase é a doutrina que representa a redenção e salvação final de todos os seres, inclusive os que habitam o inferno. E, assim, um evento posterior ao próprio Apocalipse. Ela sintetizaria o poder do Logos ou Verbo Encarnado, ou seja, o próprio Cristo como poder redentor e salvador que não conheceria limite algum. Essa proposta levanta uma série de questões interessantes para o cristianismo. (1). Leva a supor que não há um único mundo criado, o que principia no Gênesis e finda no Apocalipse, como sugerido pelas Sagradas Escrituras. Ao contrário, em sua atividade criadora, Deus cria infinitamente uma sucessão de mundos, que só se esgotaria na apocatástase, quando todos os seres repousassem definitivamente em Deus. (2). Nesse contexto os demônios e o diabo caso aceitassem o seu processo de expiação evolutiva poderiam ser salvos em sucessivas encarnações nos mundos superiores invisíveis retornando a sua verdadeira origem que é Deus. (3). Origenes com essa hipótese sugere que seja estabelecido uma distinção entre o Logos ou o Verbo e sua distinção como Cristo. Uma vez que Cristo é uma encarnação histórica neste mundo em particular, estaria aberta a possibilidade de uma encarnação futura do Logos ou Verbo. Sendo isso compatível com os textos sagrados cristãos, que falam de uma volta do Logos ou Verbo, contudo, permitem questionar a divindade de Cristo, dogma comum (absoluta verdade) no catolicismo e protestantismo. (4). Séculos após a morte de Orígenes também chamado de O Cristão, no segundo Concílio de Contantinopla no ano de 553 (como veremos abaixo) os aspectos de sua doutrina que permitiriam subordinar a figura de Cristo ao Logos e ao Pai, rompendo também com o dogma da Santíssima Trindade foram considerados errôneos. Desde então o cristianismo se refere ao Apocalipse e não a Apocatástase, mas até 553 os cristão consideravam a salvação de todos os seres no juízo final como a infinita misericórdia e graça do Eterno Deus. As cartas trocadas por Orígenes com Clemente, Hipólito e Irineu (originais) estão guardadas em alguns museus da Europa, segundo pesquisadores e investigadores da história da Igreja. Essas cartas são um capítulo a parte que envolvem a política dos interesses pessoal e eclesiásticos da Igreja manipulados para impedir o ensino sobre a reencarnação, pois segundo consta os originais que falam sobre esse assunto foram alterados por um certo padre chamado Rufino de Aquiléia (344-410) sendo esse fato determinante no Concílio de Constantinopla II como uma suposta contraprova da autenticidade dos escritos de Orígenes sobre esse tema. A doutrina da reencarnação foi adotada como dogma pela Igreja até o século VI quando no referido Concílio em 553 a questão deveria ser revisada dando-se um parecer favorável ou desfavorável terminativo. O Imperador Romano do Oriente  na época era Justiniano I (482-565) que indiretamente exercia o chefe oficial da Igreja Cristã Bizantina. O Papa Silvério I (480-557) por simpatizar com a doutrina da reencarnação e não queremos assinar o edito para que ela fosse retirada da ortodoxia clerical foi destituído do cargo e condenado por traição morreu no exílio (deixado sem pão e nem água) por inanição. Justiniano I para referendar o Concílio de Constantinopla II (553) nomeou o Papa Virgílio (537-555) que desobedecendo a ordem do Imperador não compareceu a sessão do Concílio que decidiria o veto contra a doutrina da reencarnação. Assim o Papa Virgílio foi também deposto acusado de perjuro foi exilado por 8 anos e de regresso à Roma morre ante de chegar a cidade. Assim O Colégio de Cardeais sem seu representante máximo decidiram a revelia excluir dos dogmas oficiais da Igreja a doutrina da reencarnação em 5 de maio de 553. Esse é mais um triste capítulo da história do cristianismo que sob ameaças, intrigas e mortes aprovaram uma lei que convinha aos interesses pessoais de alguns Cardeais e do soberano que representava o Império Romano naqueles dias. São Mateus 5: 18 "Porque em verdade vos digo que, até que o céu e a terra passem, nem um jota ou um til jamais passará da lei, sem que tudo seja cumprido". O ensino da reencarnação que tem pressupostos bíblicos foi desde então (553) retirado da ortodoxia oficial da Igreja Cristã. Falamos agora a pouco dos originais do livro alterado por Rufino, é a famosa obra De Príncipiis de Orígenes. A obra publicada em latim com tradução para o português pela editora católica Paulus, desse livro, está desconforme nos pontos que tematizam a reencarnação da obra em grego com o título Peri Arcon traduzida para o inglês. Assim a versão Inglesa do original grego é a mais indica para leitura, pois expressa o pensamento real do filósofo cristão. Orígenes adotou a doutrina de Platão (428-347) quanto a reencarnação, pois esse em seu livro A República diz: "Quanto a virtude a responsabilidade é de quem escolha Deus está isento disso. Você é que a estima ou despreza". Desse modo virtude e vício colhem alegria ou sofrimento, segundo Platão uma lei universal imutável. Como dito nas Escrituras: "Tudo o que o homem semear isso também ceifará". O pagamento é proporcional a dívida. Nossas dívidas (vícios e pecados) é finita no tempo, sendo ilógico cobrar-se juros infinitos na danação eterna. O que pensar de um Pai (Deus) que condena seus filhos a tortura eterna, como é dito: "Se tua mão te escandalizar corta-a. Melhor é para ti entrares na vida aleijado do que, tendo duas mãos, ires para o inferno, para o fogo que nunca se apaga. onde o seu bicho não morre e o fogo nunca se apaga". Não sei o que dizer de um versículo tão estranho (terrível) e incompreensível racionalmente. Nesse mesmo texto da República Platão também pensou a transmigração das almas, o qual Orígenes assume em suas apologias. As almas existem antes dos corpos. Assim anjos, demônios e homens (mulheres) são numa visão geral entidades que evoluíram de acordo com seus méritos e deméritos no tempo em que singularizaram seus comportamentos e atitudes nos mundos (visíveis e invisíveis) em que existiram. Desse modo os anjos foram aqueles que praticaram mais virtudes e beatitudes, os demônios exteriorizaram mais os vícios e pecados e os homens num estágio apressado em relação aos dois grupos, expiam (redimem) seus corpos para evoluírem ou involuírem conforme as práticas realizadas pelos pensamentos, palavras e obras. Nessa perspectiva a humanidade está em um processo de redenção individual, em que os vários mundos possibilitarão esse ajuste ou reparação de contas a pagar e a receber. Essa era também a visão dos Estóicos (século III AC) que afirmavam que todo o universo é corpóreo e governado por um Logos Divino, noção tomada de Heráclito (535 AC 475) de Éfeso. A alma está identificada com este princípio divino como parte de um todo ao qual pertence. Este Logos ou (Razão Universal) ordena todas as coisas. Tudo surge de acordo com Ele, graças a Ele o mundo é um cosmo que em grego significa harmonia. Dos Estóicos é passado a ideia de que os fins tem que ser igual ao começo. Da gigantesca obra de Orígenes infelizmente apenas 3 volumes resistiram as chamas que destruíram a famosa Biblioteca de Alexandria e seu Museu em (415 d.C.) pulverizando o acervo inestimável de milhares de pergaminhos e papiros que compreendiam a sabedoria humana e divina disponível  para todos os interessados e iniciados nos mistérios menores e nos mistérios maiores da ciência oculta. Os 3 volumes escritos por Orígenes disponível em português são: Sobre os Princípios, Exacta e Contra Celsius onde ele sustentava a doutrina da reencarnação, da pré existência da alma, da transmigração da alma e da apocatástase (a redenção e salvação de todos os seres inclusive os que estavam no inferno). Orígenes pensava  não haver um inferno eterno, mas sim um lugar de disciplina temporária e após esse estágio todos continuariam evoluindo para encontrarem o Logos Eterno. São Lucas 15: 20-22 "E levantando-se foi para seu pai, e quando ainda estava longe viu o pai, e se moveu de íntima compaixão e correndo, lançou ao pescoço e o beijou. Outro aspecto do ensino esotérico de Orígenes é que ele concebia a interpretação das Escrituras em três níveis. O corpo que era a norma superficial, aquele que as Escrituras dizem: "a letra mata", onde o observador cria doutrinas estreitas e dogmas absolutos. A alma um estado mais evoluído de decifrar o texto sagrado, mas ainda intermediário apenas nos primeiros estratos da epiderme espiritual. O espiritual é a interpretação profunda e mística do texto sagrado. Nessa fase se perceba que é necessário adentra o portal dos mistérios ocultos "a vós é dado conhecer os mistérios do reino dos céus", para retirar das Escrituras sua simbologia e tipologia oculta que representa a essência daquilo que O Espírito deseja falar ao discípulo. O primeiro nível é a literalidade exteriorizado por crenças exclusivistas. O segundo é a conveniência para nosso próprio interesse e bem estar. O terceiro é a interpretação lógica e intuitiva compreendendo as alegorias e tipologias não como verdades, mas princípios e conceitos que podem ser usados em todas as religiões e espiritualidade. Nesse terceiro nível há mistérios que somente os iniciados místicos, cabalistas, sufistas, gnósticos tem acesso, pois fogem ao senso comum da espiritualidade. E alguns mistérios das Escrituras estão selados não sendo permitidos revelá-los, apenas no momento oportuno.  E o filho lhe disse: pai pequei contra o céu e perante ti, e já não sou digno de ser chamado seu filho". Em uma vida não temos como pagar todo o nosso carma é necessário outras vidas para que o ajuste e reparação possam acontecer e continuemos nosso processo evolutivo dentro das fases que distinguem nossos corpos sutis. O inferno eterno era relativizado por Orígenes em seus escrito quando ele usa a referência de Isaías 50: 11 "Eis que todos vós que acendeis fogo e vos cingis com faíscas, andai entre as labaredas dos vossos fogos, e entre as faíscas que acendestes. Isso vos ocorrerá pela minha mão e em tormentos morareis". Orígenes era flexível quanto a interpretações de textos bíblicos onde se percebiam um juízo sumário e executório preferindo uma alegoria representativa para fugir do dogmatismo. A interpretação neo platônica da reencarnação foi ensinada pelos Pais da Igrejas. São Mateus 11: 11 "Em verdade em verdade vos digo que dentre os que de mulher têm nascidos, não apareceu alguém maior do que João Batista, mas aquele que é o menor no reino dos céus é maior do que ele". A reencarnação tem a premissa de voltar à vida para reparar o carma continuando  o processo evolutivo sendo um aspecto de aprendizado para não incorrer nos mesmos erros em renascimentos posteriores. Esses estágios não estão restritos aos humanos, mas alcançam todos os reinos orgânicos evidenciados nos minerais, vegetais e animais. Dentro de suas restritas constituições de matérias e formas conscientemente primitivas e mais adiantadas. Podemos inferir um silogismo: A reencarnação e a lei da ação e reação (carma - para cada causa existe um efeito) produzem a evolução que tem como resultado o homem perfeito para ascender no Logos Eterno. São Mateus 5: 48 "Sede vós perfeitos, como é perfeito o vosso pai que está nos céus". Orígenes foi discípulo de Amônio Saccas (175-242) um mestre místico que viveu em Alexandria na primeira  metade do século III d.C. Na época era corrente dizer-se que "Amônio o que aprendeu com Deus". Ele foi o fundador do sistema eclético, nascido de pais cristãos, mas renunciou à sua religião nativa e voltou-se à filosofia "pagã". Pelo fato de ter encontrado a Sabedoria Divina em seu próprio interior, foi chamado "Theodidaktos" ou ensinado por Deus, mas ele preferia o termo "Phialethes", ou amante da verdade. Seus discípulos eram também conhecidos como "Filaleteus". Não deixou escritos, ensinamentos orais e seus pupilos foram submetidos ao voto de segredo, como de costume nas Escolas de Mistério. Por conseguinte, ele fez uma distinta tentativa de beneficiar o mundo através do ensinamento daquelas partes da Ciência Secreta que lhe eram permitidas ser reveladas por seus guardiães diretos daqueles tempos.  Outro mestre que influenciou Orígenes  foi Plotino (204-270) que dizia: "O Único (O Deus Supremo) é exaltado acima do Nous e das ideias. Ele está absolutamente acima da existência escapando a razão. Permanecendo sempre em repouso. Ele faz jorrar de Sua própria plenitude como um raio uma imagem de Si mesmo, chamada Nous e que forma o conjunto das ideias do mundo inteligível". Plotino foi discípulo direto de Amônio Saccas, com o qual permaneceu onze anos. O que Platão foi para Sócrates, e o apóstolo João para Jesus, Plotino foi em relação a Amônio. Naqueles dias participou em uma expedição à Ásia na esperança de alcançar a Índia, mas não foi bem sucedido. Seguiu a Roma, onde despendeu o resto de sua vida ensinando e escrevendo. Seu principal trabalho, as Eneadas, incorporam suas ideias teosóficas. Plotino combinou uma das maiores capacidades intelectuais com a profunda iluminação mística, e sua vida foi baseada na autodisciplina e purificação. Sua intensa aspiração espiritual resultou no êxtase, uma sublime condição de existência absorta na Vida Divina, o Samadhi da filosofia hindu. Seu discípulo Porfírio (234-305) relata que Plotino gozou tal experiência em seis ocasiões durante sua vida. Seus ensinamentos tiveram uma duradoura e profunda influência não somente no pensamento filosófico dos séculos posteriores, mas também na teologia cristã. A Igreja tomou sua seminal doutrina da Trindade dos escritos de Plotino. Helena Blavatsky (1831-1899) diz: "Tudo que é grande e nobre na teologia cristã provém do Neo platonismo". Orígenes teve um fim como de todos os mártires por suas ideias iluminadas que se opunham ao dogmatismo vigente da Igreja cristã foi torturado e morto no ano de 254 d.C. O conceito de Teosofia ou Sabedoria Arcana foi pensado inicialmente  em Alexandria no século III pelos dois mestres de Orígenes que citamos acima. Romanos 8: 28 "E sabemos que todas as coisas contribuem juntamente para o bem aqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o seu propósito". Abraço. Davi.